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A educação especial em Portugal: Uma memória do movimento associativo dos pais de cidadãos deficientes: as Cooperativas de Educação e Reabilitação (CERCIS)

Special education in Portugal: Parents of handicapped citizen associative movement recollection: Cooperatives of Education and Rehabilitation (CERCIS)

Resumos

Em dois momentos se estrutura o texto. Um primeiro dá conta do movimento de integração na escola pública das crianças e jovens deficientes mentais. Um segundo sublinha o nascimento e consolidação de cooperativas de pais de cidadãos deficientes mentais enquanto momento fundamental na criação de uma sociedade inclusiva; nesta reflexão ainda se marca como as iniciativas dos pais se vão posicionando face às mudanças políticas que se têm sucedido no Portugal pós 25 de abril de 1974.

deficiência mental; inclusão; cooperativas de pais


In two moments one can structure the text: the first one informs on the moment of integration in the public school of the children and young people with mental disability; the second one emphasis the beginning and consolidation of the Cooperatives of Parents of Mentally Handicapped Citizens as a main reason for the creation of an inclusive society; in this reflexion is remarkable again as these parents' initiatives are increasing and taking new positions facing the political alterations occurred in Portugal since April 25th, 1974.

mental disability; inclusion; cooperatives of parents


ARTIGOS DE DEMANDA CONTÍNUA

A educação especial em Portugal. Uma memória do movimento associativo dos pais de cidadãos deficientes: as Cooperativas de Educação e Reabilitação (CERCIS)

Special education in Portugal. Parents of handicapped citizen associative movement recollection: Cooperatives of Education and Rehabilitation (CERCIS)

José António AfonsoI; José António Martin Moreno AfonsoII

IDocente do Departamento de Pedagogia do Instituto de Psicologia e Educação da Universidade do Minho (Portugal)

IISócio fundador da CerciGaia e militante da causa da integração do Cidadão Deficiente Mental e do Cooperativismo (Portugal)

RESUMO

Em dois momentos se estrutura o texto. Um primeiro dá conta do movimento de integração na escola pública das crianças e jovens deficientes mentais. Um segundo sublinha o nascimento e consolidação de cooperativas de pais de cidadãos deficientes mentais enquanto momento fundamental na criação de uma sociedade inclusiva; nesta reflexão ainda se marca como as iniciativas dos pais se vão posicionando face às mudanças políticas que se têm sucedido no Portugal pós 25 de abril de 1974.

Palavras-chave: deficiência mental, inclusão, cooperativas de pais.

ABSTRACT

In two moments one can structure the text: the first one informs on the moment of integration in the public school of the children and young people with mental disability; the second one emphasis the beginning and consolidation of the Cooperatives of Parents of Mentally Handicapped Citizens as a main reason for the creation of an inclusive society; in this reflexion is remarkable again as these parents' initiatives are increasing and taking new positions facing the political alterations occurred in Portugal since April 25th, 1974.

Key-words: mental disability, inclusion, cooperatives of parents.

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Full text available only in PDF format.

Texto recebido em 16 out. 2004

Texto aprovado em 19 dez. 2004

1 Escolas Especiais recobrem genericamente as escolas criadas pelas associações e cooperativas de pais, que emergiram nos anos 60/70 do século XX, sem fins lucrativos e as escolas privadas com fins lucrativos que começaram a proliferar a partir dos anos 70/80 de modo acentuadamente assimétrico: 85% desses estabelecimentos situam-se na região de Lisboa.

2 O conceito de Necessidades Educativas Especiais surge em 1991 e responde à progressiva democratização da sociedade, reflectindo o postulado da filosofia da integração e proporcionando uma igualdade de direitos, nomeadamente no que concerne à não discriminação de toda a criança e adolescente em idade escolar.

3 Poder-se-ão convocar duas ilustrações pertinentes de como as práticas de inclusão ainda não estão assimiladas na escola regular - sistema público de educação - (ver "Envolver quem está de fora", p. 33-34) nem disseminadas no que se refere à mobilidade e qualidade de vida (ver "Deficientes e edifícios públicos..." p. 8-13).

4 Para um aprofundar das questões relativas à trajectória da estruturação da Educação Especial ver Afonso (1997), Rodrigues (1999).

5 Relativamente à recepção no ordenamento jurídico do modelo social (ARAÚJO, 2001, p. 120-145).

6 Quanto à generalização da integração escolar, veja-se Pereira (1996); no que se refere ao modo como se foi consolidando um modelo de formação de professores para o Ensino Especial, com as suas virtualidades mas, também, os seus limites, Sanches (1995). Relativamente à face do vivido quotidianamente como drama e incerteza por famílias de deficientes mentais, leiam-se os relatos em Costa et al. (1996); no que se refere à dimensão da inclusão escolar ainda se verificam muitas resistências por parte dos profissionais da educação, seja por formação, seja por rigidez de adaptação da estrutura escolar aos "novos públicos", seja, ainda, por questões que se prendem às representações que ainda permanecem sobre a deficiência, Lopes (1997), Vaz (1995)¸ veja-se, também, Rogério Cação, "Paradigmas e paradoxos de um processo em construção" na Revista Fenacerci (1998, p. 12-13).

7 Para uma visão sobre um conjunto de práticas pedagógicas inovadoras que se prendem com uma sólida colaboração entre escolas regulares e cooperativas consultem-se Costa et al. (1996) e Pereira et al. (1996); no que se refere à construção de itinerários personalizados na formação profissional, Freitas et al. (1994).

8 Uma memória interessante sobre o processo de construção de uma Cerci é-nos transmitida num registro romanesco, por Manuel Rodrigues (2001). Interveniente directo nos idos anos de 1974, dá-nos uma reconstrução de todos os passos dados numa comunidade rural para contrariarem o destino das crianças "aleijadinhas" e "tolinhas" que não tinham lugar na escola e que durante anos vagueavam, sem qualquer expectativa de futuro, pela aldeia. Especialmente do Capítulo IX ao Capítulo XIII, os pormenores da consolidação da associação Arco Íris (nome fictício que Manuel Rodrigues atribuiu à cooperativa) são-nos transmitidos com vivacidade e com o detalhe de quem viveu com intensidade e paixão os anos decisivos dessa associação, desde os primeiros momentos em que desmontando concepções, representações e práticas de ocultação e marginalização se procedeu ao "levantamento no nosso concelho de pessoas com problemas" (p.107) até à organização e preparação de um cortejo e baile de Carnaval que comemorava o 5º aniversário.

9 Alguns relatos sobre a constituição das Cercis fornecidos pelos protagonistas estão contidos em Afonso (1997) e Veiga (1999). Sobre os projectos das Cercis e testemunhos das actividades desenvolvidas há cerca de 26 anos, podem-se encontrar informações úteis em Revista Fenacerci (1998 e 2002. p. 36-51; 54-77); veja-se, ainda, Martins (2002).

10 Cf. Fenacerci (1993a, 1993b, 1993c) Note-se que o desenvolvimento da formação social portuguesa após1974 vai evidenciando cada vez mais nitidamente as contradições subjacentes ao processo de modernização.

11 Sobre os ciclos de vida das Cercis consulte-se Veiga (1999, p. 24-53 e 165-177).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Mar 2015
  • Data do Fascículo
    Jun 2005

Histórico

  • Recebido
    16 Out 2004
  • Aceito
    19 Dez 2004
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