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Simulação e avaliação do desempenho hidrológico da drenagem horizontal de percolado em aterro sanitário

Leachate horizontal drainage hydrologic performance evaluation and simulation in sanitary landfill

Resumos

A determinação da quantidade de percolado gerado em aterros sanitários continua sendo uma tarefa difícil, principalmente no semi-árido nordestino onde predominam caracteríticas meteorológicas e geológicas bem peculiares. O programa HELP (avaliação do comportamento hidrológico em aterros sanitários), desenvolvido por Schroder et al (1984), foi utilizado na simulação de várias configurações de drenagem de fundo. Aplicou-se ao modelo, dados meteorológicos e de solos da região onde está o aterro sanitário de Caucaia (ASMOC), a qual é representativa do semi-árido nordestino. Três características da drenagem de fundo foram variadas (configuração da drenagem, inclinação de fundo e adição de uma camada drenante com alta permeabilidade) com o objetivo de avaliar a altura da coluna de percolado, a quantidade de percolado infiltrado no solo e o volume coletado para tratamento. Nas trincheiras sem camada drenante, o aumento da inclinação de fundo e a alteração da configuração dos drenos tiveram pouca influência sobre as variáveis estudadas. A adição da camada drenante proporcionou uma redução significativa da altura da coluna e na infiltração de percolado no solo, mostrando que é um componente fundamental para o bom funcionamento do sistema de drenagem horizontal em aterros sanitários.

Simulação hidrológica; aterro sanitário de Caucaia (Ceará); percolado; resíduo sólido


Leachate quantification in sanitary landfills has always been a difficult task for designers. In the semi-arid northeast of Brazil, where meteorological and geological characteristics are very peculiar, this task becomes even more complicated. With the aid of the computer program HELP-Hydrologic Evaluation of Landfill Performance developed by Schroeder et al (1984), and using local meteorological and geological data, various scenarios were simulated altering trench bottom inclination, drainage system configurations, and adding a layer with high hydraulic conductivity. With those changes, leachate head accumulated in the waste, leachate soil infiltration and collection were studied. The results showed that in the trench without drainage layer the increase in trench bottom inclination had practically no effect in the studied variables while drainage configuration changes affected those variables in a small scale. With the addition of the drainage layer, it was observed a significant decrease in the leachate head and soil infiltration. The addition of the drainage layer also makes the effects of bottom inclination and drainage system configuration changes, unimportant.

Hydrologic simulation; sanitary landfill of Caucaia (Ceará); leachate; solid waste


ARTIGO TÉCNICO

Simulação e avaliação do desempenho hidrológico da drenagem horizontal de percolado em aterro sanitário

Leachate horizontal drainage hydrologic performance evaluation and simulation in sanitary landfill

José Capelo NetoI; Marco Aurélio Holanda de Castro, PhDII

IDoutorando no Curso Engenharia Civil/Recursos Hídricos, Campus do Pici

IIProfessor Adjunto do Curso de Pós-graduação em Engenharia Civil/Recursos Hídricos, Campus do Pici

Endereço para correspondência Endereço para correspondência José Capelo Neto Campus do Pici, Centro de Tecnologia Bloco 713, Térreo 60451-970 - Fortaleza - Ceará - Brasil Tel.: (85) 3288-9630; Fax (85) 3288-9636 E-mail: zecapelo@ig.com.br

RESUMO

A determinação da quantidade de percolado gerado em aterros sanitários continua sendo uma tarefa difícil, principalmente no semi-árido nordestino onde predominam caracteríticas meteorológicas e geológicas bem peculiares. O programa HELP (avaliação do comportamento hidrológico em aterros sanitários), desenvolvido por Schroder et al (1984), foi utilizado na simulação de várias configurações de drenagem de fundo. Aplicou-se ao modelo, dados meteorológicos e de solos da região onde está o aterro sanitário de Caucaia (ASMOC), a qual é representativa do semi-árido nordestino. Três características da drenagem de fundo foram variadas (configuração da drenagem, inclinação de fundo e adição de uma camada drenante com alta permeabilidade) com o objetivo de avaliar a altura da coluna de percolado, a quantidade de percolado infiltrado no solo e o volume coletado para tratamento. Nas trincheiras sem camada drenante, o aumento da inclinação de fundo e a alteração da configuração dos drenos tiveram pouca influência sobre as variáveis estudadas. A adição da camada drenante proporcionou uma redução significativa da altura da coluna e na infiltração de percolado no solo, mostrando que é um componente fundamental para o bom funcionamento do sistema de drenagem horizontal em aterros sanitários.

Palavras-chave: Simulação hidrológica, aterro sanitário de Caucaia (Ceará), percolado, resíduo sólido.

ABSTRACT

Leachate quantification in sanitary landfills has always been a difficult task for designers. In the semi-arid northeast of Brazil, where meteorological and geological characteristics are very peculiar, this task becomes even more complicated. With the aid of the computer program HELP-Hydrologic Evaluation of Landfill Performance developed by Schroeder et al (1984), and using local meteorological and geological data, various scenarios were simulated altering trench bottom inclination, drainage system configurations, and adding a layer with high hydraulic conductivity. With those changes, leachate head accumulated in the waste, leachate soil infiltration and collection were studied. The results showed that in the trench without drainage layer the increase in trench bottom inclination had practically no effect in the studied variables while drainage configuration changes affected those variables in a small scale. With the addition of the drainage layer, it was observed a significant decrease in the leachate head and soil infiltration. The addition of the drainage layer also makes the effects of bottom inclination and drainage system configuration changes, unimportant.

Keywords: Hydrologic simulation, sanitary landfill of Caucaia (Ceará), leachate, solid waste.

INTRODUÇÃO

A metropolização intensa e acelerada dos países em desenvolvimento vem causando grandes dificuldades aos serviços públicos de limpeza. Milhares de toneladas de resíduos sólidos são produzidos, coletados, transportados e dispostos diariamente. Com o crescente interesse na preservação do meio ambiente, pesquisas e técnicas foram desenvolvidas de forma a minimizar o impacto da disposição do lixo no solo, culminando com o chamado Aterro Sanitário (Schalch e Moraes, 1988). O aterro sanitário é uma forma de disposição de lixo segura tanto do ponto de vista sanitário quanto ambiental, desde que siga os critérios de engenharia e normas operacionais adequadas.

O principal problema ambiental nos aterros sanitários é o risco de poluição das águas subterrâneas e superficiais. Em conseqüência dos processos de decomposição (químicos, físicos e biológicos) aos quais o lixo é submetido, forma-se um líquido (percolado) com carga poluidora várias vezes maior que a do esgoto doméstico (Torres et al, 1997). Tal líquido deve ser coletado e encaminhado para tratamento antes de ser lançado no meio ambiente. Dependendo da idade, natureza dos residuos e até mesmo das variáveis hidrometeorológicas da área de influência do aterro, o percolado pode variar em composição, concentração e quantidade. Dessa forma, é importante o desenvolvimento de técnicas de drenagem e de tratamento apropriadas para cada região.

O ATERRO SANITÁRIO METROPOLITANO OESTE EM CAUCAIA

O Aterro Sanitário Metropolitano Oeste em Caucaia-ASMOC foi construido como parte de um projeto que integrou o Plano Metropolitano de Limpeza Pública, elaborado pela Autarquia da Região Metropolitana de Fortaleza (AUMEF), órgão do Governo do Estado do Ceará. O terreno onde está localizado o aterro tem forma retangular e uma área de 123 ha. Está situado no município de Caucaia e é limitado pelos paralelos 3º45' e 3º47' de longitude Sul e pelos meridianos 38º43' e 38º45' de longitude Oeste. Pelo projeto inicial, a capacidade de recebimento de lixo deste aterro é de aproximadamente 16 mil toneladas/mês e sua vida útil está em torno de 15 anos (ASTEF, 1989).

A área que recebe os resíduos sólidos tem 78,47 ha, estando dividida em 17 setores e subdividida em 67 trincheiras, em sua maioria com largura de 70 m e comprimento de 100 m. A profundidade de escavação das trincheiras varia entre três e cinco metros. O solo que se extrai é armazenado ao lado da trincheira para utilizá-lo posteriormente como material de cobertura. O sistema de drenagem de percolado é então construído no fundo da trincheira antes dos resíduos sólidos serem depositados.

O sistema de drenagem de percolado deve atender ao volume de líquido produzido na trincheira e ao que atravessa a massa de lixo. Dimensionar tal sistema não é tarefa fácil em razão das dificuldades de se determinar os inúmeros fatores responsáveis pela chegada deste líquido ao sistema de drenagem. No ASMOC, tal sistema é constituído por canaletas escavadas no solo na forma de "espinha de peixe" e preenchidas com brita (Figura 1), segundo determina o projeto. Entretanto, tem-se observado que a técnica de drenagem de fundo adotada não vem atendendo ao volume de percolado gerado nas trincheiras. Esta problemática pode ser constatada pelo aumento do nível piezométrico de percolado no interior das trincheiras no período de chuva, causando significativos vazamentos pelas laterais e maiores infiltrações no solo. Dessa forma, a proposição de medidas técnicas que aumentem a eficiência do sistema de drenagem de fundo tem sido uma constante preocupação do corpo técnico da empresa operadora do ASMOC.


OBJETIVOS

Avaliar, através de simulação com o modelo computacional HELP o efeito da:

• variação da inclinação de fundo e do número de canaletas do sistema tipo "espinha de peixe" na eficiência da drenagem adotada;

• adição de uma camada de material drenante sobre o sistema de drenagem tipo "espinha de peixe" verificando também os efeitos das variações de inclinação de fundo e do número de canaletas.

MODELO MATEMÁTICO

Um grande número de modelos têm sido desenvolvidos tentando explicar o movimento de umidade em aterros sanitários. Estes modelos podem ser enquadrados em algumas categorias:

• Modelos de balanço hídrico;

• Modelos de fluxo saturado;

• Modelos de fluxo não-saturado (uni e bi-dimensional);

• Modelos bioquímicos e hidrodimâmicos.

O HELP (Hydrologic Evaluation of Landfill Performance) ou Avaliação do Comportamento Hidrológico de Aterros Sanitários, desenvolvido por Schroeder et al (1984), é um dos modelos mais usados para a avaliação do movimento de percolado e está atualmente na sua terceira versão. O modelo simula o movimento de percolado através de um sistema quasibidimensional, ou seja dois sistemas unidimensionais acoplados em série. O aterro sanitário é modelado como uma série de camadas (cobertura final, camada de resíduos, cobertura diária e sistema de drenagem de percolado) interconectadas e com propriedades hidráulicas individuais. Eventos de precipitação podem ser modelados através de um número de técnicas, incluindo dados meteorológicos reais ou probabilisticamente calculados. O programa permite que profissionais da área de projeto ou operação facilmente verifiquem o desempenho dos vários sistemas projetados ou construídos, quando submetidos a uma variedade de possibilidades meteorológicas.

O HELP usa o conceito de capacidade de campo para modelar o armazenamento de umidade no lixo. Uma camada de solo ou de lixo não produzirá percolado até que a mesma tenha atingido sua capacidade de campo e, no momento que este estado seja atingido, qualquer umidade adicionada resultará em movimento vertical de umidade.

Peyton e Schoeder (1988) estudaram o modelo HELP simulando o funcinamento de 17 aterros sanitários. Os pesquisadores sugeriram que o HELP poderia ser uma ferramenta importante na avaliação do desempenho, encontrando resultados simulados de balanço hídrico próximos aos resultados medidos. Chegaram à conclusão que a seleção do tipo de material de cobertura é um parâmetro crítico na simulação, já que seu coeficiente de permeabilidade influenciou significativamente na drenagem e acúmulo de umidade oriunda de eventos de chuva.

Stephens e Coons (1994) usaram o HELP para avaliar o desempenho de aterros sanitários em áreas semiáridas. Eles descobriram que os resultados obtidos pelo modelo se correlacionaram bem com os dados de campo. Em particular, descobriram que a taxa de infiltração calculada para tempos longos ajustou-se bem à taxa natural de recarga calculada através do balanço de massa dos cloretos. Os resultados indicaram ainda que, a camada impermeabilizante de argila impedia infiltração apenas quando padrões meteorológicos mudavam bruscamente ou quando eventos de chuva extremamente intensos ocorriam. Os valores dos parâmetros da zona evaporativa não foram facilmente estimados devido ao desconhecimento das características das múltiplas camadas existentes sob a cobertura final. A determinação da capacidade de campo foi dificultada devido às várias definições existentes em cada disciplina que aborda o tópico. Além disso, segundo estudos de Korfiatis et al (1984), a capacidade de campo tende a aumentar com o tempo durante um período de infiltração. De forma a simular vazões de percolado próximas a valores reais, foi necessário o uso de coeficientes de evaporação e capacidade de campo bem mais baixos que os propostos pelo modelo. Nesta pesquisa, a eficiência da camada de cobertura em função de variações meteorológicas em regiões semi-áridas foi investigada, nada sendo investigado sobre a avaliação do funcionamento do sistema de drenagem horizontal.

Field e Nangunoori (1993) levantaram várias questões sobre a precisão e a utilidade do modelo HELP. O trabalho desenvolvido por eles envolveu a calibração deste modelo usando dados existentes de um aterro de resíduos perigosos e, em seguida a tentativa de previsão do comportamento do mesmo nos 18 meses seguintes. Os resultados indicaram que, enquanto o HELP foi útil para prever o comportamento do aterro para tempos longos, o modelo foi altamente impreciso na previsão da produção de percolado durante eventos de chuva. Eles descobriram, especificamente, que os resultados do HELP eram altamente dependentes dos dados de intensidade e duração de eventos de precipitação e que, as técnicas de modelagem dos eventos de chuva usadas pelo modelo, davam bons resultados para tempos longos mas não para tempos curtos. Novamente, o estudo do sistema de drenagem horizontal não foi estudado especificamente. Os autores utilizaram o modelo simplesmente como uma ferrameta para avaliar o balanco hídrico do aterro, analisando entrada de água e saída de percolado.

Hannoura et al (1994) introduziram modificações no código do HELP para ajustá-lo à não linearidade do fluxo com baixos números de Reynolds. O trabalho foi baseado no fluxo Darciniano saturado e não abordava diretamente a dinâmica de estrada de ar ou o fluxo não saturado. O principal mérito desta modificação foi a introdução de um termo não linear para estimar a condutividade hidráulica. As mudanças se mostraram bastante efetivas, aumentando a precisão do modelo para aterros descobertos mas diminuindo para aterros cobertos. Suas conclusões confirmaram que o movimento do percolado está sujeito a efeitos altamente não lineares. Hannoura et al (1994) concentraram seus estudos na dinâmica do fluxo de umidade nas camadas de resíduos e, como os outros autores mencionados, não utilizaram o HELP com o propósito específico de avaliar alternativas técnicas para o sistema de drenagem horizontal.

MATERIAIS E MÉTODOS

Uma trincheira de 100 m de comprimento, 70 m de largura e 10,6 m de profundidade foi utilizada na simulação. No primeiro caso, a trincheira foi composta por uma camada de 10 metros de resíduos sólidos e outra com 60 cm de cobertura final (material com baixa permeabilidade). No segundo caso, foi composta por uma camada de fundo de um metro de um material bastante permeável (areia por exemplo), uma camada de resíduo sólido de 9 metros e por uma de cobertura final (material com baixa permeabilidade) de 60 cm. Para efeito de simulação, não foram consideradas as camadas de cobertura intermediárias, já que as mesmas não devem interferir na migração vertical do percolado. As Figuras 2 e 3 mostram esquemas simplificados dos casos um e dois.



Além da variação da sequência de camadas nos dois casos apresentados, foram alterados também o número de canaletas de drenagem e a inclinação do fundo da trincheira e das canaletas. Esta avaliação tornou-se necessária pois, através de experimentos em escala de campo desenvolvidos por engenheiros do ASMOC, estas duas variáveis foram alteradas em diferentes trincheiras, não se obtendo sucesso na diminuição da coluna de percolado. Foram assumidas três inclinaçães: 0,5%, 1,0% e 2,0% e três situações para o arranjo da drenagem de fundo, quais sejam:

• Caso A: sem canaletas de drenagem. O percolado seria drenado pelo escoamento na interface inclinada sobre a camada impermeável de fundo até o poço coletor;

• Caso B: Somente com a canaleta central. O percolado seria drenado pelo escoamento na interface inclinada sobre a camada impermeável de fundo até a canaleta central;

• Caso C: Sistema completo de drenagem composto por canaleta central e canaletas laterais. O percolado seria drenado pelo escoamento na interface inclinada sobre a camada impermeável de fundo até a canaleta central ou uma das canaletas laterais.

Vale observar que a inclinação usada no fundo da trincheira é a mesma tanto na direção laterais - centro quanto na direção inicio da trincheira - poço coletor. Assume-se que a vazão de percolado dentro das canaletas é superior à vazão que chega nas mesmas ou seja, o escoamento do líquido nas canaletas não seria limitante do processo de drenagem de percolado dentro da trincheira. A Figura 4 mostra um esquema simplificado dos casos propostos acima.


A partir das variações propostas, foram simuladas 18 situações distintas com as combinações possíveis como mostra a Tabela 1. As características hidráulicas de cada camada simulada são mostradas na Tabela 2.

A camada de impermeabilização de fundo foi estabelecida em 3 metros de espessura com uma condutividade hidráulica saturada de 10-7 cm/s. A curva de escoamento superficial foi definida pelo programa a partir do tipo de solo usado na camada de cobertura final, da vegetação especificada (pouca vegetação) e da inclinação desta camada (1%).

Os dados meteorológicos foram obtidos na estação Agrometeorológica do Centro de Ciências Agrárias da Universidade Federal do Ceará, no Campus do Pici. Devido à aparente homogeneidade e constância do clima na região, foi assumido que tal procedimento não acarretaria maiores erros. Foram utilizadas as médias mensais (1977 a 1996) de precipitação, temperatura, velocidade do vento, umidade e insolação. Esses dados são apresentado a seguir e na Tabela 3.

Velocidade media dos ventos = 14,00 km/h

Umidade relativa do 1º trimestre = 85,00 %

Umidade relativa do 2º trimestre = 80,00 %

Umidade relativa do 3º trimestre = 70,00 %

Umidade relativa do 4º trimestre = 74,00 %

Foram simulados o volume de percolado coletado, a infiltração através da camada impermeabilizante de fundo e a altura da coluna de percolado dentro da trincheira.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Nas simulações das trincheiras sem a camada drenante, a variação da inclinação de fundo teve um efeito relativamente pequeno na diminuição da coluna de percolado. Aumentando a inclinação de 0,5% para 2,0%, houve uma diminuição de, em média, 18% na altura da coluna. Já a variação na configuração dos drenos teve um efeito significativamente maior. No caso da trincheira sem dreno de fundo e 0,5% de inclinação, a altura de percolado variou entre um e dois metros, enquanto que a trincheira com drenagem completa e 0,5% de inclinação, a altura da coluna de percolado variou entre 30 e 80 cm (Figura 5).


Com a implantação da camada drenante, houve uma redução significativa na altura da coluna de percolado na massa de lixo. A coluna mais alta simulada foi de 8 cm na condição menos favorável ao escoamento (trincheira sem drenagem de fundo e com inclinação de 0,5%), chegando a menos de 1 cm no caso da trincheira com drenagem completa e inclinação de 2,0% (Figura 6).


Quanto à infiltração de percolado através da camada de fundo, verificou-se também que a variação da inclinação teve pouca influência na diminuição da quantidade de percolado infiltrado (Figura 7). No caso "sem dreno de fundo", a diferença entre os volumes infiltrados nas inclinações de 0,5% e 2,0% foi de apenas 3,1%. No caso "drenagem completa", a diferença para as mesmas inclinações ficou em 4,6%.


Com relação às mudanças na configuração dos drenos de fundo, observou-se uma maior influência nas variáveis estudadas que a observada com a variação da inclinação. Mantendo-se a inclinação constante em 2%, foi observada uma diminuição de cerca de 20% no percolado infiltrado entre as trincheiras sem dreno de fundo e a com drenagem completa.

Ao se introduzir a camada drenante, verificou-se uma redução significativa (média de 50%) na infiltração de percolado no solo em relação à situação sem camada drenante (Figura 8). Tanto as variações na configuração do dreno de fundo (sem dreno, dreno central ou dreno completo) quanto na inclinação (0,5%, 1,0% ou 2,0%) influenciaram relativamente pouco no volume de percolado infiltrado. Por exemplo, o volume infiltrado no caso mais desfavorável (sem dreno de fundo e inclinação 0,5%) foi apenas 2% superior ao volume infiltrado no caso mais favorável (dreno de fundo completo e inclinação 2,0%).


A análise do volume de percolado coletado na simulação de trincheiras sem camada drenante (Figura 9) mostrou que, também neste caso, a variação da inclinação teve pouca influência. A diferença do volume coletado entre as inclinações 0,5% e 2,0% foram 9,3% para o caso "sem dreno de fundo", 3,9% para o caso "com dreno central" e 0,6 % para o caso "dreno completo".


A variação do volume de percolado coletado em função das configurações de drenos foi mais significativa que no caso das variações de inclinação. O volume coletado no caso de "dreno completo" foi em média 25% maior que no caso "sem dreno de fundo".

A quantidade de percolado coletada com a introdução da camada drenante aumentou significativamente (Figura 10). Enquanto o maior valor, no caso "sem camada drenante", chegou a 80 mm/mês em agosto, com a introdução da camada drenante, este valor chegou a 110 mm/mês em maio e julho. Observou-se também que, com a introdução da camada drenante, as mudanças na inclinação e na configuração dos drenos pouco influenciaram na quantidade de percolado coletada.


É importante observar o comportamento da geração de percolado ao longo do ano nos casos com e sem camada drenante. Na simulação das trincheiras sem camada drenante, a geração de percolado inicia o ano na faixa de 15 mm/mês até o mês de abril, momento em que há uma ascensão até um pico de 60 mm/mês (entre julho e agosto). Apartir daí até o final do ano, há um declínio até os níveis iniciais.

No caso das simulações com camada drenate, a produção de percolado é zero no início do ano, subindo para cerca de 30 mm/mês em fevereiro e permanecendo aí até abril. A partir de abril, a produção sobe rapidamente até cerca de 100 mm/mês em maio, ficando neste patamar até julho. Neste momento tem uma queda brusca, chegando a zero em outubro e permanecendo ali até o final do ano.

CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

A partir da análise dos dados das diversas simulações executadas, foi possível chegar às seguintes conclusões:

• Nas trincheiras sem camada drenante, o aumento da inclinação de fundo de 0,5% para 2,0 % teve pouca influência na diminuição da coluna de percolado acumulado, do volume infiltrado através da camada impermeabilizante e do volume de percolado coletado;

• Ainda nas simulações das trincheiras sem camada drenante, a variação da configuração de drenos de fundo entre "sem drenagem" e "com drenagem completa", teve uma influência significativa na diminuição da coluna de percolado, do volume infiltrado e no aumento volume de percolado coletado. Este resultado vem de encontro às experiências operacionais, nas quais mesmo com o aumento do número de canaletas na drenagem de fundo, a coluna de percolado na trincheira continuou bastante alta. Analisando as duas situações, a simulada e a obtida em campo, podemos propor que, a assunção feita na simulação, qual seja, canaletas de drenagem bastante eficientes, não está ocorrendo na prática;

• A adição da camada drenante no fundo da trincheira teve um impacto significativo nos três parâmetros estudados. A coluna de percolado formada foi reduzida de 200 cm para no máximo 8 cm. A infiltração de percolado na camada impermeável de fundo foi reduzida pela metade;

• O percolado coletado por mês aumentou de no máximo 80 mm para um máximo de 110 mm, observando-se também uma mudança no comportamento da produção de percolado ao longo do ano. Enquanto esta produção era distribuída ao longo do ano no caso da trincheira sem camada drenante, no caso "com camada drenante" a resposta das vazões de saída às vazões de entrada, foram mais rápidas, ocasionando pontos de mínimos iguais a zero e de máximos de 110 mm;

• Com a adição da camada drenante, os efeitos das variações na inclinação e no número de canaletas no dreno de fundo, foram desprezíveis do ponto de vista prático;

Assim, pode-se verificar que é provável que os drenos de fundo adotados atualmente nas trincheiras não estejam funcionando a contento, acarretando um acúmulo de percolado dentro do lixo, dificultando a operação de espalhamento e compactação e contribuindo para uma maior infiltração de percolado no solo. Outro ponto importante constatado na simulação é que, a adição de uma camada drenante pode melhorar significativamente a eficiência do sistema de drenagem ao ponto de tornar o aumento da inclinação e do número de drenos instalados desprezíveis.

Recebido: 10/09/04 Aceito: 08/07/05

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  • Endereço para correspondência
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      14 Out 2005
    • Data do Fascículo
      Set 2005

    Histórico

    • Aceito
      08 Jul 2005
    • Recebido
      10 Set 2004
    Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental - ABES Av. Beira Mar, 216 - 13º Andar - Castelo, 20021-060 Rio de Janeiro - RJ - Brasil - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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