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Tamanho de bolhas de ar formadas por difusores não porosos na água

Size of air bubbles formed from non-porous diffusers in water

Resumos

Neste estudo foram realizados experimentos para investigar o tamanho de bolhas de ar formadas a partir de difusores não porosos em um tanque de água. O tamanho das bolhas individuais e o diâmetro de Sauter foram avaliados usando uma técnica de processamento de imagens. Os resultados confirmam que a vazão de ar e o diâmetro do orifício são parâmetros importantes que controlam a distribuição do tamanho das bolhas e o diâmetro de Sauter. Análise dimensional é realizada para fornecer uma relação adimensional geral para predição do diâmetro de Sauter (usando uma escala de comprimento adequada, baseada na vazão de ar) e o número de Reynolds na saída do orifício. Essa relação apresenta bom ajuste aos dados experimentais obtidos neste estudo e a partir de investigações anteriores disponíveis na literatura, incluindo também experimentos com múltiplos orifícios. Finalmente, são apresentadas aplicações potenciais da relação adimensional obtida.

análise dimensional; bolhas; diâmetro de Sauter; processamento de imagens; plumas


Experiments are conducted in this study to investigate the size of air bubbles formed from orifice diffusers in a water tank. The size of individual bubbles and the Sauter diameter are evaluated using an image processing technique. The results confirm that the air flow rate and the nozzle diameter are important parameters controlling the bubble size distribution and Sauter diameter. Dimensional analysis is performed to provide a general dimensionless relationship for the bubble Sauter diameter by using an appropriate length scale, which is based on the air flow rate, and the Reynolds number at the nozzle exit. This relationship fits well the experimental data from this study and previous investigations available in the literature, also including experiments for multiple orifice diffusers. Finally, potential applications of the dimensionless relationship obtained here are presented.

bubbles; dimensional analysis; image processing; plumes; Sauter diameter


INTRODUÇÃO

A aeração por ar difuso está presente em várias aplicações das engenharias sanitária e ambiental, incluindo desde o tratamento de água/esgoto ao controle da eutrofização de corpos hídricos (VON SPERLING, 1996aVON SPERLING, M. (1996a) Introdução à qualidade das águas e ao tratamento de esgotos - Princípios do tratamento biológico de águas residuárias. v. 1. Belo Horizonte: DESA-UFMG ABES. ., 1996bVON SPERLING, M. (1996b) Princípios básicos do tratamento de esgotos - Princípios do tratamento biológico de águas residuárias. v. 2. Belo Horizonte: DESA-UFMG ABES. .; RENSEN; ROIG, 2001RENSEN, J.; & ROIG, V. (2001) Experimental study of the unsteady structure of a confined bubble plume. International Journal of Multiphase Flow, v. 27, n. 8, p. 1431-1449.; SOCOLOFSKY et al., 2002SOCOLOFSKY, S.A.; CROUNSE, B.C.; ADAMS, E.E. (2002) Multi-phase plumes in uniform, stratified, and flowing environments Environmental fluid mechanics theories and applications. Reston: ASCE. ; ZAMBON et al., 2003ZAMBON, R.C.; MORITA, D.M.; SOUZA, P.A. (2003) Modelo matemático de remoção de compostos orgânicos voláteis em unidades de arraste com ar difuso. Engenharia Sanitária e Ambiental, v. 8, n. 1, p. 59-68.; MORUZZI & REALI, 2007MORUZZI, R.B.; & REALI, M.A.P. (2007) Método para determinação de distribuição de tamanho de microbolhas (DTMB) em sistemas flotação (FAD) para tratamento de águas utilizando a análise de imagem digital. Engenharia Sanitária e Ambiental, v. 12, n. 3, p. 273-283.; LIMA NETO et al., 2008aLIMA NETO, I.E.; ZHU, D.Z.; RAJARATNAM, N. (2008a) Air injection in water with different nozzles. Journal of Environmental Engineering, v. 134, n. 4, p. 283-294., 2008cLIMA NETO, I.E.; ZHU, D.Z.; RAJARATNAM, N. (2008c) Effect of tank size and geometry on the flow induced by circular bubble plumes and water jets. Journal of Hydraulic Engineering, v. 134, n. 6, p. 833-842.). Nesses tipos de sistemas torna-se importante determinar o tamanho das bolhas geradas, de forma que a hidrodinâmica e os processos de transferência de massa envolvidos possam ser modelados com precisão (WÜEST et al., 1992WÜEST, A.; BROOKS, N.H.; IMBODEN, D.M. (1992) Bubble plume modeling for lake restoration. Water Resources Research, v. 28, n. 12, p. 3235-3250.; MCGINNIS & LITTLE, 2002MCGINNIS, D.F. & LITTLE, J C. (2002) Predicting diffused-bubble oxygen transfer rate using the discrete-bubble model. Water Resources Research, v. 36, p. 4627-4635.; LIMA NETO, 2012aLIMA NETO, I.E. (2012a) Bubble plume modelling with new functional relationships. Journal of Hydraulic Engineering Research, v. 50, n. 1, p. 134-137., 2012bLIMA NETO, I.E. (2012b) Modeling the liquid volume flux in bubbly jets using a simple integral approach. Journal of Hydraulic Engineering, v. 138, n. 2, p. 210-215.). O foco do presente artigo foi a determinação do tamanho das bolhas formadas a partir de difusores não porosos (ou difusores de bolhas grossas), os quais são menos susceptíveis ao problema da colmatação do que os difusores porosos, o que facilita o seu uso, por exemplo, em sistemas de aeração/destratificação de lagos e reservatórios. Difusores não porosos também têm sido largamente empregados em tanques de aeração visando obter elevadas taxas de mistura de efluentes (MUELLER et al., 2002MUELLER, J.A.; BOYLE, W.C.; PÖPEL, H.J. (2002) Aeration principles and practice. New York: CRC. ).

Bolhas individuais são formadas quando uma vazão gasosa relativamente baixa é injetada em um líquido por meio de um orifício. Nessas condições, o tamanho das bolhas é geralmente estimado a partir de um balanço entre o empuxo e a força resultante da tensão superficial (KUMAR & KULOOR, 1970KUMAR, R. & KULOOR, N.R. (1970) The formation of bubbles and drops. Adv. Chem. Eng., 8. New York: Academic Press.). À medida que a vazão aumenta, o tamanho das bolhas passa a depender do empuxo e do arrasto exercido sobre a superfície das bolhas, além do movimento do líquido deslocado (RÄBIGER & VOGELPOHL, 1986RÄBIGER, N.; & VOGELPOHL, A. (1986) Bubble formation and its movement in Newtonian and non-Newtonian liquids . In: Encyclopedia of Fluid Mechanics. New York: Gulf Publishing Company. .). Nesse estágio podem ocorrer processos de coalescência e/ou rompimento das bolhas e uma larga faixa de tamanhos pode ser formada. Davidson e Amick (1956)DAVIDSON, L.; & AMICK, E.H. (1956) Formation of gas bubbles at horizontal orifices. AIChE Journal, v. 2, n. 3, p. 337-342. e Leibson et al. (1956)LEIBSON, I.; HOLCOMB, E.G.; CACOSO, A.G.; JACMIC, J.J. (1956) Rate of flow and mechanics of bubble formation from single submerged orifices. AIChE Journal, v. 2, n. 3, p. 296-306. obtiveram correlações empíricas para o diâmetro das bolhas nessas condições, as quais podem ser expressas como funções do diâmetro do orifício e do número de Reynolds na saída do orifício. Essas equações têm sido desde então largamente empregadas para a estimativa do tamanho das bolhas em sistemas de injeção de ar na água (SZEKELY & THEMELIS, 1971SZEKELY, J.; & THEMELIS, N.J. (1971) Rate phenomena in process metallurgy. New York: Wiley. .; LEITCH & BAINES, 1989LEITCH, A.M.; & BAINES, W. D. (1989) Liquid volume flux in a weak bubble plume. Journal of Fluid Mechanics, v. 205, p. 77-98.; IGUCHI et al., 1991IGUCHI, M.; NOZAWA, K.; MORITA, Z. (1991) Bubble characteristics in the momentum region of air-water vertical bubbling jet. ISIJ International, v. 31, p. 952-959.). Correlações mais recentes, como a de Iguchi et al. (1995)IGUCHI, M.; UEDA, H.; UEMURA, T. (1995) Bubble and liquid flow characteristics in a vertical bubbling jet. International Journal of Multiphase Flow, v. 21, p. 861-873., também foram propostas. No entanto, os estudos experimentais supracitados foram todos conduzidos em reatores confinados, onde o escoamento se comporta diferentemente daquele observado em plumas de bolhas não confinadas, como é o caso de sistemas de aeração em tanques largos ou corpos hídricos como lagos e reservatórios. Estudos recentes realizados por Lima Neto et al.(2008a)LIMA NETO, I.E.; ZHU, D.Z.; RAJARATNAM, N. (2008a) Air injection in water with different nozzles. Journal of Environmental Engineering, v. 134, n. 4, p. 283-294. em um tanque de aeração mostraram que o tamanho das bolhas depende tanto da vazão de ar como do tipo de difusor. Contudo, não foi obtida correlação geral para estimativa do tamanho das bolhas. É importante mencionar que mesmo o livro de Mueller et al. (2002)MUELLER, J.A.; BOYLE, W.C.; PÖPEL, H.J. (2002) Aeration principles and practice. New York: CRC. que apresenta uma síntese de trabalhos sobre aeração também não dispõe de uma equação geral para predição do tamanho das bolhas formadas por difusores.

O presente trabalho foi realizado no mesmo tanque utilizado por Lima Neto et al. (2008a)LIMA NETO, I.E.; ZHU, D.Z.; RAJARATNAM, N. (2008a) Air injection in water with different nozzles. Journal of Environmental Engineering, v. 134, n. 4, p. 283-294.. Entretanto, novas vazões de ar também foram consideradas nesta pesquisa. Além disso, o tamanho das bolhas foi determinado utilizando uma técnica de processamento de imagens em vez de um sistema de sonda ótica, como no estudo supracitado. Portanto, o objetivo do presente trabalho foi investigar experimentalmente o efeito de diferentes vazões de ar e diâmetros dos orifícios no tamanho das bolhas formadas em sistemas de aeração não confinados (como tanques para tratamento de efluentes ou corpos hídricos). Adicionalmente, dados de outros estudos disponíveis na literatura, incluindo o efeito de múltiplos orifícios, também foram usados com o intuito de se obter uma correlação geral que possa ser aplicada em casos práticos para a predição do tamanho das bolhas.

MATERIAL E MÉTODOS

Os experimentos foram realizados em um tanque de vidro com base quadrada de 1,20 m² e altura de 0,80 m, como mostrado esquematicamente na Figura 1. O tanque foi preenchido com água até uma profundidade de 0,76 m. O ar comprimido foi direcionado ao tanque por intermédio de uma linha de PVC com vazões Q variando entre 1 e 4 L.min-1, as quais foram ajustadas por um rotâmetro e descarregadas por orifícios únicos (n=1) com diâmetros do de 0,6, 1,5 e 3,0 mm (ver Tabela 1). Uma lâmpada de 500 W foi utilizada para iluminação lateral, sendo as imagens das bolhas dentro de um campo de observação de 12,5 x 18,5 cm² adquiridas usando uma câmera CCD de alta resolução (Pulnix TM-1040) controlada por um sistema computacional (Streams 5, IO Industries Inc.). A taxa de aquisição foi de 30 imagens/s e o tempo de exposição foi de 1/4000 s. O campo de observação foi posicionado a 37,5 cm acima do difusor pois a partir desse ponto não foram observados processos significativos de coalescência e/ou rompimento das bolhas. Nesta posição, a sobreposição de bolhas também foi bem menos frequente, possibilitando, assim, uma melhor visualização das mesmas individualmente.

Figura 1.
Esquema experimental (câmera CCD e computador no plano do observador).

Tabela 1.
Condições experimentais e técnicas usadas para medição do tamanho das bolhas. Autor Q

Desenvolveu-se um programa computacional em ambiente Matlab (The Mathworks Inc.) para processar as imagens e calcular ao tamanho das bolhas. Inicialmente, o código converte imagens em escala de cinza em imagens binárias usando o comando im2bw(I, level) do Matlab, sendo I a imagem capturada pelo sistema Streams 5 e level o nível (ou threshold) utilizado para a conversão dos pixels. O nível varia de 0 a 1, mas adotou-se um padrão de 0,35 para todas as imagens, já que este resultou em menores distorções das imagens devido aos processos de dilatação e/ou erosão (PRADO; CAMPOS, 2009PRADO, G.S.; & CAMPOS, J.R. (2009) O emprego da análise de imagem na determinação da distribuição de tamanho de partículas da areia presente no esgoto sanitário. Engenharia Sanitária e Ambiental, v. 14, n. 3, p. 401-410.). Assim, o diâmetro equivalente ao de uma esfera (di) de cada bolha pode ser calculado pela seguinte equação:

sendo Ai a área de cada bolha calculada no Matlab.

Comparando as imagens originais com as imagens binarizadas, obteve-se um erro no diâmetro das bolhas (di) inferior a 1%, para di variando entre 0,5 e 12 mm. Ressalta-se que a resolução adotada foi de 20 pixels.mm-1, o que resultou em um tamanho do pixel de 0,05 mm, isto é, pelo menos 10 vezes inferior ao diâmetro das bolhas. Erros inferiores a 1% também foram obtidos por Moruzzi e Reali (2007)MORUZZI, R.B.; & REALI, M.A.P. (2007) Método para determinação de distribuição de tamanho de microbolhas (DTMB) em sistemas flotação (FAD) para tratamento de águas utilizando a análise de imagem digital. Engenharia Sanitária e Ambiental, v. 12, n. 3, p. 273-283. para microbolhas com di variando entre 0,5 e 0,12 mm.

Como as bolhas formadas não possuíam diâmetro uniforme, o diâmetro de Sauter d3,2 foi adotado no presente estudo. Tal diâmetro é dado pela seguinte relação:

em que N=número de bolhas por teste. Conforme relatado por McGinnis e Little (2002)MCGINNIS, D.F. & LITTLE, J C. (2002) Predicting diffused-bubble oxygen transfer rate using the discrete-bubble model. Water Resources Research, v. 36, p. 4627-4635., o diâmetro de Sauter é mais representativo do que o diâmetro médio das bolhas no que diz respeito à hidrodinâmica e transferência de massa em escoamentos multifásicos. Portanto, a Equação 2 foi inserida no programa computacional para cálculo de d3,2 para cada teste.

Devido aos processos de dilatação e/ou erosão supracitados, além de eventuais sobreposições das bolhas nas imagens, foram realizados testes preliminares com vazões variando entre 0,5 e 3 L.min-1 para verificar a validade do método adotado. Foram utilizados os mesmos difusores do presente estudo assim como um difusor poroso para gerar bolhas menores, resultando em diâmetros de Sauter d3,2 variando entre aproximadamente 2 e 11 mm (no presente estudo, d3,2 variou entre aproximadamente 7 e 11 mm). Conforme pode ser observado na Figura 2, esses diâmetros diferiram em menos de 20% daqueles obtidos por Lima Neto (2007)LIMA NETO, I.E. (2007) Gas injection in water for artificial aeration and circulation. Tese (Doutorado) - University of Alberta, Edmonton. via sonda ótica. Logo, pode-se dizer que o método adotado no presente artigo é capaz de fornecer medições do diâmetro das bolhas com boa precisão. Salienta-se que a repetibilidade dos resultados (com diferenças inferiores a 10%) foi obtida para testes com durações superiores a 4 s. Portanto, todos os testes foram conduzidos considerando esse período, o que resultou em 120 imagens por cada experimento.

Figura 2.
Comparação entre os diâmetros de Sauter obtidos com a técnica de processamento de imagens (este estudo) e por meio de sonda ótica (obtidos de LIMA NETO, 2007LIMA NETO, I.E. (2007) Gas injection in water for artificial aeration and circulation. Tese (Doutorado) - University of Alberta, Edmonton.).

Com o intuito de normalizar os resultados e torná-los aplicáveis a outros sistemas de aeração por ar difuso, foi conduzida uma análise dimensional. Assim, usando o Teorema de Buckingham assumindo que as forças de inércia e gravidade (empuxo) dominam o processo de formação e a dinâmica das bolhas, o diâmetro de Sauter pode ser descrito pela seguinte relação:

d3,2=f(Q,n,g,v,do) (3)

sendo n o número de orifícios, g a constante gravitacional e ν a viscosidade cinemática do ar. A Equação 3 pode ser reescrita na seguinte forma adimensional:

em que L é uma escala de comprimento dada por:

e Re é o número de Reynolds:

É importante ressaltar que a Equação 4 é dimensionalmente consistente, ao contrário das equações clássicas de Davidson e Amick (1956)DAVIDSON, L.; & AMICK, E.H. (1956) Formation of gas bubbles at horizontal orifices. AIChE Journal, v. 2, n. 3, p. 337-342. e Leibson et al. (1956)LEIBSON, I.; HOLCOMB, E.G.; CACOSO, A.G.; JACMIC, J.J. (1956) Rate of flow and mechanics of bubble formation from single submerged orifices. AIChE Journal, v. 2, n. 3, p. 296-306., além de mais simples do que a equação mais recente de Iguchi et al.(1995)IGUCHI, M.; UEDA, H.; UEMURA, T. (1995) Bubble and liquid flow characteristics in a vertical bubbling jet. International Journal of Multiphase Flow, v. 21, p. 861-873.. Salienta-se que Re representa os efeitos de quantidade de movimento e turbulência, enquanto L representa o efeito do empuxo. Vale ressaltar ainda que a Equação 4 assume que as interações entre as bolhas devido à presença de múltiplos orifícios são desprezíveis, uma vez que a vazão por orifícios Q/n é utilizada no lugar da vazão Q.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

As Figuras 3 a 5 mostram imagens típicas das bolhas formadas por diferentes vazões de ar e diâmetros dos orifícios. Verifica-se que aumentos na vazão resultam em aumentos no tamanho máximo das bolhas, mas também em um número maior de bolhas pequenas, provavelmente devido à predominância do processo de rompimento sobre coalescência das bolhas. Por sua vez, aumentos no diâmetro do orifício também resultam em aumentos no tamanho máximo das bolhas, mas reduzem o número total de bolhas. De fato, os processos de rompimento das bolhas foram mais evidentes nos testes com vazões mais elevadas e com menores orifícios. A mesma tendência também foi observada nos experimentos de Lima Neto et al. (2008a)LIMA NETO, I.E.; ZHU, D.Z.; RAJARATNAM, N. (2008a) Air injection in water with different nozzles. Journal of Environmental Engineering, v. 134, n. 4, p. 283-294.. Isso sugere que tanto a vazão de ar como o diâmetro do orifício são parâmetros importantes que influenciam o tamanho das bolhas. Como esses dois parâmetros estão inseridos na definição do número de Reynolds, dada pela Equação 6 (e a viscosidade cinemática ν é constante), a quantidade de movimento e a turbulência (ou Re) podem ser consideradas os principais fatores que controlam o tamanho da bolha (LIMA NETO et al., 2008bLIMA NETO, I.E.; ZHU, D.Z.; RAJARATNAM, N. (2008b) Bubbly jets in stagnant water. International Journal of Multiphase Flow, v. 34, n. 12, p. 1130-1141.). Por sua vez, o empuxo (ou L) desempenha um papel importante no espalhamento lateral da pluma de bolhas, já que os testes com diferentes valores de Re, mas com os mesmos valores de L, resultaram em taxas de espalhamento lateral semelhantes. Isso pode ser verificado, por exemplo, nos experimentos mostrados nas Figuras 3D, 4D e 5D. Nota-se, portanto, que L controla a taxa de espalhamento lateral e pode ser considerada de fato como uma escala de comprimento. Assim, pode-se dizer que a presença de Re e L na Equação 4 é coerente.

Figura 3.
Imagens das bolhas geradas com o orifício de diâmetro do=0.6 mm e diferentes vazões de ar: (A) Q=1 L.min-1, L=7,8 mm, Re=2.359; (B) Q=2 L.min-1, L=10,3 mm, Re=4.718; (C) Q=3 L.min-1, L=12,1 mm, Re=7.077; (D) Q=4 L.min-1, L=13,5 mm, Re=9.436. O campo de observação de 12,5 x 18,5 cm² também é mostrado.

Figura 4.
Imagens das bolhas geradas com o orifício de diâmetro do = 1,5 mm e diferentes vazões de ar: (A) Q=1 L.min-1, L=7,8 mm, Re=944; (B) Q=2 L.min-1, L=10,3 mm, Re=1.887; (C) Q=3 L.min-1, L=12,1 mm, Re=2.831; (D) Q=4 L.min-1, L=13,5 mm, Re=3.775. O campo de observação de 12,5 x 18,5 cm² também é mostrado.

Figura 5.
Imagens das bolhas geradas com o orifício de diâmetro do=3,0 mm e diferentes vazões de ar: (A) Q=1 L.min-1, L=7,8 mm, Re=472; (B) Q=2 L.min-1, L=10,3 mm, Re=944; (C) Q=3 L.min-1, L=12,1 mm, Re=1.415; (D) Q=4 L.min-1, L=13,5 mm, Re=1.887. O campo de observação de 12,5 x 18,5 cm² também é mostrado.

Conforme mencionado, o programa computacional desenvolvido em Matlab converteu as imagens em escala de cinza em imagens binárias. A Figura 6A mostra uma imagem em escala de cinza referente ao experimento da Figura 4B, enquanto a Figura 6B mostra a sua imagem binária correspondente. Embora problemas de sobreposição das bolhas assim como dilatação das mesmas possam ser observados na imagem digital, os diâmetros di obtidos foram próximos àqueles medidos por Lima Neto et al.(2008a)LIMA NETO, I.E.; ZHU, D.Z.; RAJARATNAM, N. (2008a) Air injection in water with different nozzles. Journal of Environmental Engineering, v. 134, n. 4, p. 283-294. por meio de sonda ótica, com diferenças máximas da ordem de 15%. Portanto, o método adotado nesta pesquisa pode ser considerado confiável.

Figura 6.
Imagem em escala de cinza (A) e imagem binária obtida a partir do programa computacional (B). As imagens mostradas correspondem ao experimento da Figura 4B.

A Figura 7 mostra um histograma típico do diâmetro das bolhas, o qual corresponde ao experimento da Figura 4B. Nota-se que a maioria das bolhas possui diâmetro di inferior a 2 mm, com poucas bolhas excedendo o diâmetro de 10 mm. Resultados semelhantes foram obtidos para as outras condições experimentais avaliadas no presente trabalho, mas os histogramas apresentaram faixas mais estreitas para o diâmetro das bolhas à medida que os valores de Re diminuíram e faixas mais largas à medida que os valores de Re aumentaram. Isso é consistente com os comportamentos apresentados nas Figuras 3 a 5.

Figura 7.
Histograma típico do diâmetro das bolhas, correspondendo ao experimento mostrado na Figura 4B.

Os diâmetros de Sauter (d3,2) obtidos neste estudo variaram de 7,1 a 10,7 mm, aumentando tanto com a vazão de ar quanto com o diâmetro dos orifícios. Combinando os resultados experimentais aqui obtidos com aqueles disponíveis na literatura (LEITCH & BAINES, 1989LEITCH, A.M.; & BAINES, W. D. (1989) Liquid volume flux in a weak bubble plume. Journal of Fluid Mechanics, v. 205, p. 77-98.; IGUCHI et al., 1995IGUCHI, M.; UEDA, H.; UEMURA, T. (1995) Bubble and liquid flow characteristics in a vertical bubbling jet. International Journal of Multiphase Flow, v. 21, p. 861-873.; RENSEN & ROIG, 2001RENSEN, J.; & ROIG, V. (2001) Experimental study of the unsteady structure of a confined bubble plume. International Journal of Multiphase Flow, v. 27, n. 8, p. 1431-1449.; LIMA NETO et al., 2008aLIMA NETO, I.E.; ZHU, D.Z.; RAJARATNAM, N. (2008a) Air injection in water with different nozzles. Journal of Environmental Engineering, v. 134, n. 4, p. 283-294.) foi possível obter a seguinte relação adimensional baseada na equação 4:

A Figura 8 mostra que a equação 7 ajustou-se bem aos dados experimentais (coeficiente de determinação R²=0,94), o que indica que as considerações feitas na presente formulação foram aceitáveis. É importante destacar que as condições experimentais mostrada na referida figura incluíram tanto difusores com orifícios únicos como difusores com múltiplos orifícios com n variando entre 1 e 56 (ver Tabela 1). A Figura 8 mostra também um decaimento claro de d3,2/L com o número de Reynolds para 0<Re<14.000, o que confirma que a quantidade de movimento e a turbulência são os principais parâmetros que controlam o diâmetro adimensional de Sauter. Nota-se que as equações clássicas de Leibson et al. (1956)LEIBSON, I.; HOLCOMB, E.G.; CACOSO, A.G.; JACMIC, J.J. (1956) Rate of flow and mechanics of bubble formation from single submerged orifices. AIChE Journal, v. 2, n. 3, p. 296-306. superestimaram o tamanho das bolhas na região de escoamento laminar (Re<2.000) e subestimaram o mesmo na região de escoamento turbulento (Re>2.000). Esse desvio pode ser atribuído ao fato de os experimentos de Leibson et al. terem sido conduzidos em uma pequena coluna de aeração, onde o confinamento talvez tenha causado diferentes condições para rompimento e coalescência das bolhas. É interessante observar, porém, que os testes de Iguchi et al. (1995)IGUCHI, M.; UEDA, H.; UEMURA, T. (1995) Bubble and liquid flow characteristics in a vertical bubbling jet. International Journal of Multiphase Flow, v. 21, p. 861-873. (conduzidos em tanques relativamente pequenos) resultaram em tamanhos de bolhas que também se ajustaram bem à Equação 7.

Figura 8.
Ajuste da equação 7 aos dados experimentais.

APLICAÇÕES

A correlação geral obtida neste estudo (Equação 7) apresenta-se como uma ferramenta prática para a predição do tamanho das bolhas em diversas aplicações das engenharias sanitária e ambiental. Assim, os diâmetros estimados podem ser usados para avaliar importantes parâmetros na modelagem de sistemas de aeração por ar difuso por meio de difusores não porosos, tais como o coeficiente de transferência de massa (WÜEST et al., 1992WÜEST, A.; BROOKS, N.H.; IMBODEN, D.M. (1992) Bubble plume modeling for lake restoration. Water Resources Research, v. 28, n. 12, p. 3235-3250.; MCGINNINS & LITTLE, 2002MCGINNIS, D.F. & LITTLE, J C. (2002) Predicting diffused-bubble oxygen transfer rate using the discrete-bubble model. Water Resources Research, v. 36, p. 4627-4635.) e a velocidade relativa das bolhas (LIMA NETO et al., 2008bLIMA NETO, I.E.; ZHU, D.Z.; RAJARATNAM, N. (2008b) Bubbly jets in stagnant water. International Journal of Multiphase Flow, v. 34, n. 12, p. 1130-1141., 2008dLIMA NETO, I.E.; ZHU, D.Z.; RAJARATNAM, N. (2008d) Horizontal injection of gas-liquid mixtures in a water tank. Journal of Hydraulic Engineering, v. 134, n. 12, p. 1722-1731.). Por exemplo: considere um sistema de aeração por ar difuso com uma vazão por orifício Q/n=3,5 L.min-1 e orifícios com diâmetros do=1 mm. Isso resulta em Re=4.954 e L=12,8 mm. Logo, a equação 7 fornece um diâmetro de Sauter d3,2=8,5 mm. Finalmente, com esse valor de d3,2, pode-se obter um coeficiente de transferência de massa de 0,40 mm.s-1 e uma velocidade relativa das bolhas de 0,50 m.s-1utilizando-se as referências supracitadas. Além disso, de posse dessas informações, pode-se adotá-las como condições iniciais para a simulação detalhada da hidrodinâmica e da transferência de massa em sistemas de aeração por ar difuso utilizando-se os modelos de Wüest et al. (1992)WÜEST, A.; BROOKS, N.H.; IMBODEN, D.M. (1992) Bubble plume modeling for lake restoration. Water Resources Research, v. 28, n. 12, p. 3235-3250., McGinnins e Little (2002)MCGINNIS, D.F. & LITTLE, J C. (2002) Predicting diffused-bubble oxygen transfer rate using the discrete-bubble model. Water Resources Research, v. 36, p. 4627-4635. ou Lima Neto (2012a)LIMA NETO, I.E. (2012a) Bubble plume modelling with new functional relationships. Journal of Hydraulic Engineering Research, v. 50, n. 1, p. 134-137., por exemplo.

CONCLUSÕES

A presente pesquisa consistiu em um estudo experimental que utilizou uma técnica de processamento de imagens para investigar o tamanho de bolhas de ar formadas a partir de difusores não porosos em um tanque de água. Os resultados mostraram que a vazão de ar e o diâmetro do orifício tiveram um importante efeito na distribuição do tamanho das bolhas e no seu diâmetro de Sauter. A análise dimensional permitiu normalizar o diâmetro de Sauter por uma escala de comprimento apropriada, com base na vazão de ar, e uma correlação adimensional em função do número de Reynolds na saída do orifício pode ser ajustada aos dados experimentais obtidos na presente pesquisa e a partir de estudos anteriores disponíveis na literatura, incluindo também o efeito de múltiplos orifícios. Finalmente, foram apresentadas aplicações práticas dos resultados considerando condições semelhantes às observadas em sistemas de aeração por ar difuso.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Apr-Jun 2015

Histórico

  • Recebido
    14 Jun 2013
  • Aceito
    08 Jul 2014
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