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Arqueologia do trabalho com um patrimônio escolar-científico ou relatos técnicos de uma aventura

Arqueología del trabajo con un patrimonio científico escolar o los relatos tecnicos de una aventura

The archeology of work with a scientific-school patrimony or the technical reports of an adventure

Achéologie du travail auprès d’un patrimoine scientifique-scolaire ou les témoignages techniques d'une aventure

Resumo

O artigo discute o trabalho dos agentes que tornam uma coleção patrimonializada e pública, tecendo considerações sobre o aspecto técnico de tal trabalho, destacando o processo falível e imperfeito dessa atividade, diante do aspecto arqueológico e histórico das coleções, neste caso, um grande acervo de ciência e tecnologia salvaguardado em uma escola secundária, confessional, católica na cidade de São Paulo. Para tanto, faz uma discussão entre a história da ciência e a história da educação, apresentando a importância de preservação de objetos científicos no relacionamento desses dois campos epistêmicos para o fomento de investigações e outras atividades. Por fim, destaca o trabalho de inventariação da coleção de Física da escola, para jogar luz em dificuldades reais do processo de patrimonialização de coleções científico-educativas, problematizando o significado histórico da palavra “patrimônio” a partir de um exemplo situado em um determinado contexto espaço-temporal.

Palavras-chave:
Patrimônio de ciência e tecnologia; patrimônio histórico-escolar; patrimônio científico-educativo; coleções; objetos científicos

Resumen

El artículo discute el trabajo de los agentes que tornan una colección patrimonializada y pública, tejiendo consideraciones sobre el aspecto técnico de tal trabajo, destacando el proceso falible e imperfecto de esa actividad, delante del aspecto arqueológico e histórico de las colecciones, en este caso, un gran acervo de ciencia y tecnología salvaguardado en una escuela secundaria, confesional, católica en la ciudad de San Pablo. Por lo tanto, hace una discusión entre la historia de la ciencia y la historia de la educación, presentando la importancia de preservación de objetos científicos en la relación de esos dos campos epistemológico para el fomento de las investigaciones y otras actividades. Por fin, destaca el trabajo de investigación de la colección de Física de la escuela para poner luz en la dificultades reales del proceso de patrimonialización de colecciones científico educativas, problematización del significado histórico de la palabra “patrimonio” a partir de un ejemplo situado en un determinado contexto espacio temporal.

Palabras clave:
Patrimonio de ciencia e tecnología; patrimonio histórico-escolar; patrimonio científico-educativo; colecciones; objetos científicos

Abstract

The article discusses the work of the agents who make a collection patrimonial and public, making considerations about the technical aspect of such work, highlighting the fallible and imperfect process of this activity, given the archaeological and historical aspect of the collections, in this case, a large collection of science and technology safeguarded in a Catholic secondary school in the city of São Paulo. In order to do so, it discusses the history of science and the history of education, presenting the importance of preserving scientific objects in the relationship between these two epistemic fields for the promotion of investigations and other activities. Finally, it highlights the work of inventorying the school's Physics collection, to shed light on real difficulties in the process of patrimonialization of scientific-educational collections, questioning the historical meaning of the word "patrimony" from examples situated in a certain time-space context.

Keywords:
Science and technology patrimony; historical-school patrimony; scientific-educational patrimony; collections; scientific objects

Résumé

L’article discute le travail des agents qui rendent une collection patrimonialisée et publique, en tissant des considérations sur l’aspect technique de tel travail, relevant le processus faillible et imparfait de cette activité, devant l’aspect archéologique et historique des collections, dans ce cas, un grand recueil de la science et de la technologie sauvegardé dans une école secondaire, confessionelle, catolique dans la ville de Sao Paulo. Pour ce faire, il aborde l'histoire des sciences et l'histoire de l'éducation, en présentant l'importance de la préservation des objets scientifiques dans le rapport entre ces deux champs épistémiques pour la promotion des investigations et d’autres activités. Enfin, il met en exergue le travail de l’inventaire de la collection de Physique de l’école, pour mettre en lumière les difficultés réelles du processus de patrimonialisation de collections scientifiques-éducatives, de façon à problématiser le sens historique du mot “patrimoine” à partir d’un exemple situé dans un contexte spacio-temporel déterminé.

Mots-clés:
Patrimoine de science et technologie; patrimoine historique-scolaire; patrimoine scientifique-éducatif; collections; objets scientifiques

Partimos do princípio de que a ideia de “patrimônio” não é sacrossanta. Impura, polissêmica, histórica, dinâmica, é importante problematizá-la antes de seguir imediatamente em defesa de uma noção positivada pela Ilustração, principalmente francesa, do processo de organização geral de bens privados e comuns, transformando-os em “bens públicos”.

A história dessa alternância de propriedade, entre ser comum ou privado, para se tornar uma ideia “pública”, por si só já nos adverte que a noção de patrimônio foi forjada a partir de um condicionamento burocrático, científico e tecnológico que caminha em dialogia à própria construção dos Estados nacionais. Mesmo a ideia de Estado é impossível de ser pensada sem a marcação das instituições de guarda daquilo que foi apontado como os seus tesouros, em serviço da formação de uma outra categoria de pensamento: o cidadão. Este que passa à realidade histórica como elemento a ser forjado por meio de tecnologias sociais e científicas inventadas, locais dignos à guarda de itens chamados de “herança” e voltados à educação, cujo objetivo é modelá-lo à maneira civilizada. São eles os museus, arquivos, zoológicos, jardins botânicos.

Essa condição de transplante de propriedade, entre ser um bem ser comum, a privado, e a um bem público, marcou a condição de dubiedade do longo histórico mutável da palavra “patrimônio”. Como sinônimas, propriedade e patrimônio geram ruídos de significados durante o processo histórico da positivação do termo, no sentido de torná-lo algo cognoscível à apreciação, desfrute, deleite, fruição, educação, tradição, enquanto se constitui, ele mesmo, como algo que deve ser preservado.

Não por acaso, Françoise Choay (2011CHOAY, Françoise. O patrimônio em questão: antologia para um combate. Belo Horizonte: Fino Traço, 2011.), em defesa da ideia de patrimônio como estatuto antropológico, mostrando a qualificação do léxico em diferentes tempos e espaços, procura desfazer as “confusões semânticas que ocultam os valores e os desafios de que o nosso ambiente é portador” (CHOAY, 2011CHOAY, Françoise. O patrimônio em questão: antologia para um combate. Belo Horizonte: Fino Traço, 2011., p. 9). A pesquisadora mostra que ideias de patrimônio se alternam precisamente porque a sua condição de existência é política e, por isso mesmo, marca a história de quem o faz. A história da noção de patrimônio como bem público é, também, a história daqueles que o constituem. A autora mostra os interesses que apontam para os seus valores e objetivos e que, necessariamente, criam ou confundem-se em significados cunhados a partir dos interesses de quem o engendra.

Sobre o patrimônio, Poulot (2009POULOT, Dominique. Uma história do patrimônio no Ocidente, séculos XVIII-XXI. Do monumento aos valores. São Paulo: Estação da Liberdade, 2009.) diz que a sua instituição jurídica, como marco legal, surge nas legislações dos estados nacionais no século XIX, “legislações que lhe garantiam um fim específico no meio de todas as manifestações sociais dos objetos” (POULOT, 2009POULOT, Dominique. Uma história do patrimônio no Ocidente, séculos XVIII-XXI. Do monumento aos valores. São Paulo: Estação da Liberdade, 2009., p. 26). Por isso, indica que a França, na primeira metade deste mesmo século, foi “por excelência o lugar da elaboração progressiva e muitas vezes conflitante dos valores patrimoniais - em oposição, especificamente, ao direito de propriedade” (POULOT, 2009POULOT, Dominique. Uma história do patrimônio no Ocidente, séculos XVIII-XXI. Do monumento aos valores. São Paulo: Estação da Liberdade, 2009., p. 26).

A “Antologia para um Combate”, um compêndio que contém excertos documentais sobre a palavra “patrimônio”, mostra esse movimento dos significados. Pode tanto marcar a indignação de Victor Hugo em seu panfleto “Guerra aos demolidores”, lutando contra o que julgou um “vandalismo” das novas construções de Paris e de uma nova mentalidade patrimonial, salubre e monumental quanto a análise de Karl Marx, que o indicava como propriedade privada nas mãos da burguesia pós-revolucionária e que se amplia com sua tomada de poder do Estado, sob égide liberal (CHOAY, 2011CHOAY, Françoise. O patrimônio em questão: antologia para um combate. Belo Horizonte: Fino Traço, 2011., p. 110-119 e p. 134).

As tais “naturezas conflitantes” do patrimônio convivem com o espectro de uma nova ordenação social mobilizada pelos recursos da Ilustração para o fomento da identidade nacional.

Soma-se a isso o fato de que, na batalha para a estabilização do que seria um patrimônio público, cria-se, por um lado, uma nova percepção do tempo e, consequentemente, de “tradição” e “memória”, que exigem a fundação de instituições específicas para a prática desta operação. Nesse aspecto operacional, o patrimônio funda-se como uma “alegoria” (CHOAY, 2011CHOAY, Françoise. O patrimônio em questão: antologia para um combate. Belo Horizonte: Fino Traço, 2011.). É uma expressão figurada, um pensamento criado para a projeção de tempos futuros, a partir de um passado que se pode construir ou forjar. Mas, na história dessa alegoria que se positiva como “bem público”, vemos um apagamento das propriedades técnicas de sua fundação, precisamente porque elas são o registro objetivo do seu sentido artificial e manufaturado, político, modelado com o cunho de inovação social.1 1 Sobre a ideia de que o patrimônio público é uma alegoria, ou seja, aquilo que procura dar uma imagem ao que não existe de modo a torná-la cognoscível para uma generalidade e que reordena o sentido de tempo, espaço, tradição e memória, ver Poulot (2009, p. 97-98). Sobre a história do tempo histórico e as práticas concretas em que cada tempo presente administra a dimensão do passado, como experiência acumulada e o futuro como horizonte que pode ser prognosticado e, portanto, com a possibilidade de seu modelamento, ver Koselleck (2006). Também Hartog (2006) aposta na vivência do tempo histórico, como experiência, para explicar a detonação de novos patrimônios na contemporaneidade, como uma crise do “presentismo”. Usando a ideia de “regimes de historicidade”, como categoria operatória, tem por hipótese que, na contemporaneidade, o crescimento exponencial de novos patrimônios marca a ideia de futuro ameaçador e que, portanto, existe urgência deste tempo presente para a marcação de nossa própria existência.

Como nos diz Poulout (2009POULOT, Dominique. Uma história do patrimônio no Ocidente, séculos XVIII-XXI. Do monumento aos valores. São Paulo: Estação da Liberdade, 2009.):

Daí em diante, a transmissão “à posteridade” foram iniciativas ponderadas, desenvolvidas propositalmente, e não fruto dos acontecimentos; nesse sentido, o patrimônio deve ser entendido como uma forma de reorganização racional dos recursos para a nova coletividade, ao contrário dos usos que esta ou aquela herança poderia ter imposto, anteriormente, a determinada comunidade - seja ela de “raça” como se dizia, da inteligência ou da arte, porque pesa continuamente sobre as elites a suspeita de manipulação do povo (POULOT, 2009POULOT, Dominique. Uma história do patrimônio no Ocidente, séculos XVIII-XXI. Do monumento aos valores. São Paulo: Estação da Liberdade, 2009., p. 97-98).

Em outras palavras, o que antes havia como uma herança dada, poderia ser pensada como um patrimônio, uma operação racional, controlada, moldada, idealizando possíveis futuros de progresso, industrialismo, republicanismo etc. Ademais, reside nesta história de reorganização racional dos bens, pensando e agindo em nome da posteridade, o fato de que isso é, também, uma condição técnica.

Lafuente e Valverde (2022LAFUENTE, Antonio, VALVERDE, Nuria. O surgimento dos primeiros Comuns modernos: Tecnologia, Patrimônio, Iluminismo. Museologia e Patrimônio, v. 15, n. 1, p. 333-350, 2022. ) indicam que esse processo de disciplinarização das coisas exige medir, marcar, datar, contar, cifrar, criar gradientes, tabelar, comparar, catalogar etc. Isto é, patrimonializar é também o compartilhamento da ilusão de que as ideias são separadas das técnicas que as produzem. Houve um esforço em apresentar valores (cognitivos, artísticos, identitários, econômicos, de formação nacional, de continuidade e manutenção da coesão nacional, de unidade etc.), como sendo da ordem do natural, mas não como fruto de “uma relação entre pessoas e suas máquinas” de modo a postular moral. Essas são as “tecnologias de desencaixe”, ou seja, toda a ordem de conhecimento tecnocientífico que atua como instrumento político para a criação de um novo consenso. “Elas são consequentemente, máquinas morais e a base da ordem cívica. Sem elas não haveria contrato social” (LAFUENTE e VALVERDE, 2022LAFUENTE, Antonio, VALVERDE, Nuria. O surgimento dos primeiros Comuns modernos: Tecnologia, Patrimônio, Iluminismo. Museologia e Patrimônio, v. 15, n. 1, p. 333-350, 2022. , p. 336).

Doravante tais tecnologias que deslocam de um local para o outro os objetos pretensos à salvaguarda, de modo a cumprir funções que não dizem respeito ao seu emprego original, ficam a serviço da pesquisa, da educação, da instrução pública. São chamados semióforos, objetos invetidos de novos e outros significadosoutro diz respeito às suas. Choay (2011CHOAY, Françoise. O patrimônio em questão: antologia para um combate. Belo Horizonte: Fino Traço, 2011., p. 115), por exemplo, conta que anatomistas passaram a catalogar monumentos históricos usando terminologias, método descritivo, taxionômico, celebrando e transpondo conhecimento produzido na história natural, ao que era apresentado como monumento. Deste modo, temos uma condição de patrimônio com delimitação espaço-temporal, jurídica, tratamento técnico-científico, produzida artificialmente.

Cabe dizer que esse grande empreendimento para a construção da alegoria do patrimônio só é possível por meio da melhoria do público que o referenda como um legado que serve a todos. Portanto, o que se torna patrimônio é requisitado para ser útil (POULOT, 2009POULOT, Dominique. Uma história do patrimônio no Ocidente, séculos XVIII-XXI. Do monumento aos valores. São Paulo: Estação da Liberdade, 2009., p. 85). A formação do cidadão se faz por uma “pedagogia da divulgação”, agora pensando que este bem “deve contribuir para revelar identidade graças ao espelho que fornece de si mesmo e ao contato que ele permite com o outro: o outro de um passado perdido e como que tornado selvagem; o outro, se for o caso, de alhures etnográficos (POULOT, 2009POULOT, Dominique. Uma história do patrimônio no Ocidente, séculos XVIII-XXI. Do monumento aos valores. São Paulo: Estação da Liberdade, 2009., p. 14).

Quando anunciamos a ideia de “tecnologias de desencaixe”, vemos ao mesmo tempo o desenvolvimento dos sistemas de excelência técnica e o surgimento da competência profissional dividida por especialidades em espaços delimitados para tanto. A instrução pública depende dos grandes repositórios de guarda, conservação, preservação, mantidas por essas atividades tecnocientíficas. A escola como local de conhecimento, como tecnologia social de divulgação de projetos estatais, faz parte de todo esse movimento de reordenação da história, conhecida como modernidade do tipo científica. Sem a estabilização desta ideia de patrimônio mantido pela tríade de conservação, preservação, educação, animada por especialistas e instituições inventadas para a sua consolidação, não haveria a representação da tal “modernidade”, que é um de seus maiores monumentos.

Vemos, então, dois movimentos associados que entremeiam sociabilidades e criam identidades apresentadas em diferentes escalas, locais, nacionais, universais. O primeiro mostra o quadro técnico, especializado, aqueles apresentadores do que deve ser um patrimônio; o outro, diz respeito às suas formas de educar, em grande medida, pelo olhar, com exposições, catálogos e protocolos legitimados por autoridade da ciência.

Felgueiras (2011FELGUEIRAS, Margarida Louro. Herança educativa e museus: Reflexões em torno das práticas de investigação, preservação e divulgação histórica. Revista Brasileira de História da Educação. Campinas-SP, v. 11, n. 1 (25), p. 67-92, jan./abr. 2011) mostra a associação deste panorama, que une o trabalho do pesquisador à expedição pública do conhecimento no campo da história da educação. Segundo a pesquisadora, os olhos dos historiadores da educação passaram a ver a premência “cívica da salvaguarda” dos acervos escolares porque deles dependem à constituição de projetos de investigação e outras tarefas educativas. Dos processos técnicos de salvaguarda passamos “à consciência da sua importância como um legado a transmitir”. O trabalho de inventariação acompanha os interesses de estudos sobre a cultura escolar e sua materialidade (FELGUEIRAS, 2011FELGUEIRAS, Margarida Louro. Herança educativa e museus: Reflexões em torno das práticas de investigação, preservação e divulgação histórica. Revista Brasileira de História da Educação. Campinas-SP, v. 11, n. 1 (25), p. 67-92, jan./abr. 2011, p. 75).

Portanto, se a ação de patrimonializar conta muito sobre àqueles que a constituem, é interesse deste artigo discutir o processo de patrimonialização, destacando o trabalho técnico para levá-lo a cabo. O artigo tem por objetivo uma discussão sobre o processo de tornar algo, antes anônimo, um novo patrimônio. Acompanhamos a ideia de que o trabalho com coleções mostra os elementos culturais, sociais, psíquicos de quem o mantém e organiza (GRANATO e ARAÚJO, 2022GRANATO, Marcus, ARAÚJO, Bruno Melo de. Cultura Material e Patrimônio Cultural de Ciência e Tecnologia: os acervos do Colégio Pedro II e do Ginásio Pernambucano. In. BRAGHINI, Katya, MUNAKATA, Kazumi, TABORDA DE OLIVEIRA, Marcus. Novos diálogos da história da educação dos sentidos e das sensibilidades. São Paulo: EDUC, 2020. p. 79-105. , p. 86-87).

Neste caso, trata-se de divulgar o curso de ações com vistas à apresentação pública de um acervo científico que visa fomentar pesquisas conduzidas pelos interesses de uma história da educação em ciências.

O texto tem as seguintes partes. Primeiro, apresentamos um quadro do Patrimônio Cultural de Ciência & Tecnologia (PCC&T) guardado em escolas, fazendo um diálogo com as pesquisas ocupadas com a história da educação em ciências. Sendo um patrimônio histórico-escolar e de ciência e tecnologia, antes discutimos a sua importância, localizando-o na zona de fronteira entre a história da educação e a história da ciência, mostrando alguns produtos advindos desta relação.

Depois, registramos sumariamente, os trabalhos com a coleção de Física do Colégio Marista Arquidiocesano de São Paulo (CMASP)2 2 Trata-se do projeto “Museu Escolar do Colégio Marista Arquidiocesano de São Paulo (fase 1): planejamento e organização do inventário dos instrumentos científicos”, financiado pelo CNPq e desenvolvido pelo Núcleo de Estudos Escola e seus Objetos (NEO). Para saber mais sobre as etapas, desenvolvimento e resultados do projeto, ver Braghini, Pedro, Piñas (2020, 2019). Agradecimentos especiais aos colegas da Rede Iberoamericana de História da Educação em Ciências (REDiHEC) pelas amplas discussões sobre o patrimônio científico educativo. , considerando suas camadas históricas. Além disso, o movimento de organização de uma coleção pressupõe uma discussão metodológica do tipo arqueológica.

Essa condição arqueológica pode ser visualizada no diálogo entre passado e presente, disposto na própria coleção que se quer apresentar. Primeiro porque é reconhecida como parte de um museu escolar, o que por si só necessita de uma definição, dado o seu caráter “polissêmico”. Por uma divisão temporal, pensamos o museu escolar como um material didático que surge com uma função especializada, como uma coleção, de tamanho variado, com objetos usados para o ensino das ciências da natureza e que contém materiais diversos, fundamentalmente voltados à disciplina de História Natural.

Depois, no momento dos trabalhos com o inventário, pensamos este espaço como um local de “armazenamento de memórias” e seguimos as problematizações feitas por Gaspar da Silva e Souza (2021GASPAR DA SILVA, Vera Lucia, SOUZA, Gizele de. Material school culture in the fields and gardens1 of the history of education: a look at academic production in Brazil (2000-2020). Educació i Història: revista d’història de l’educació, n. 38, p. 79-104, 2021. ). As autoras mostram a importância dos trabalhos de inventariação de museus escolares como centros de memória, reafirmando a sua relevância. Além disso, indicam a necessidade de se compreender as “sobreposições desconexas de elementos de diferentes origens e temporalidades, que enredam os espectadores e os conduzem a um ‘desvio’ histórico” (GASPAR DA SILVA e SOUZA, 2021GASPAR DA SILVA, Vera Lucia, SOUZA, Gizele de. Material school culture in the fields and gardens1 of the history of education: a look at academic production in Brazil (2000-2020). Educació i Història: revista d’història de l’educació, n. 38, p. 79-104, 2021. , p. 103). Trabalhar com acervos, pensando essas “sobreposições desconexas” é um dos elementos desafiadores que quer se registrar neste texto.

Em outras palavras, deve-se ter em mente que o trabalho com coleções carrega consigo as estratificações do tempo resultantes do seu próprio histórico. As tais “tecnologias de desencaixe” são prospectivas, no sentido de buscar a compreensão das diferentes camadas de tempo e uso (ou desuso) dessa reunião de objetos, a fim de torná-los, como já dito, semióforos.

Por fim, há um relato das ações que conviveram com problemas de toda ordem, materiais, intelectuais, emocionais etc. Sem dúvida, não se trata de mostrar o resultado pelo sucesso, pois já existem outros textos contando isso, dentre artigos, relatórios, vídeos etc. Pretende-se uma discussão não pelos resultados, mas pelos processos, com os seus medos, ignorâncias, dúvidas e imperfeições.

Patrimônio Cultural de Ciência e Tecnologia e a história da educação em ciências naturais

Quando Lafuente (2001LAFUENTE, Antonio. El ensache de la Ciencia. In: CRESPO, Virgilio Pinto. Atlas Histórico de la Ciudad de Madrid (1850-1939). Madrid: Lunwerg Editores - Fundación Caja, 2001, p.140-169. ) apresenta a ciência como res publica, fala da impossibilidade de compreendê-la sem a formação de seus públicos por novas técnicas de observação e uso dos aparatos tecnocientíficos que vão sendo erigidos nas cidades, principalmente durante o século XIX. Constituir o público da ciência é ganhar uma legitimidade por meio da formação daqueles que tornam seus feitos credíveis. Essa condição de pensar a ciência a partir dos espaços que a constituem, também fala de uma aproximação da história da ciência com a história da educação.

A ciência é intrínseca aos processos de formação escolarizada não apenas porque as disciplinas científicas adentram ao currículo. Não se pode esquecer de que, progressivamente, a ciência torna-se parte fundamental da escola quando, na condução de suas perspectivas pedagógicas, vê a criança como objeto científico. Está presente na organização planificada dos edifícios, na modelagem disciplinada dos corpos, na composição de materiais de ensino, nas ideias de salubridade, higiene, saúde etc.

Isso significa que a salvaguarda do patrimônio escolar de ciência e tecnologia é tributária deste ponto de análise, levando em consideração que tais objetos são testemunhos desse diálogo entre os dois campos de investigação.

A conexão entre eles é interessante no sentido de desfazer alguns entraves dados por certo histórico de ciência que balizou suas epistemologias sob a ideia de que ela é produto de um grupo especializado que só pode ser compreendido a partir de seus feitos em laboratórios. A ciência se ampara na ideologia de sua inevitabilidade e muito dessa representação se deve ao público educado, que a configurou como tal coisa.

O historiador da ciência Dominique Pestre PESTRE, Dominique. Por uma nova história social e cultural das ciências: novas definições, novos objetos, novas abordagens. Cadernos IG/Unicamp, Campinas, v. 6, n. 1, p. 3-56, 1996indica que a história da ciência não deve se ocupar com os seus valores absolutos, mas na fabricação do que a torna uma especialidade, suas práticas (ROMERO, 2016ROMERO, Mariza. A nova história das ciências: entrevista com Dominique Pestre. História, Ciências, Saúde-Manguinhos, v.23, n.3, p. 899-905, jul./set. 2016. ). Seus saberes dependem de situações contextuais e situacionais (locais de produção, contendas por financiamento, quadros hierárquicos de pesquisa, disputas de gênero). Por sua natureza operacional, a ciência “sempre esteve ligada a algum tipo de poder” e os seus feitos podem ou não impactar a sociedade, por meio da engenharia social, tecnologias de diferentes tipos, ações de indústrias, impactos ambientais etc. Essas práticas não estão neutralizadas, no sentido ético, de suas postulações sobre a manutenção do progresso. Portanto, os saberes científicos estão imediatamente coligados aos espaços de sua produção, circulação, reprodução, divulgação e estímulo por novos conhecimentos, de onde não se descarta a escola.

Belhoste (2011BELHOSTE, Bruno. Das ciências instituídas às ciências ensinadas, ou como levar em conta a atividade didática na história das ciências. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n. 3 (27), p. 47-61, set./dez. 2011.) reforça a relação da educação e a ciência na historiografia. As demarcações hierárquicas sobre os dois campos são frutos de escolhas políticas dentro da própria ciência para gerar estamentos em relação aos seus saberes, colocando o espaço escolar em um limbo de reprodução de uma ciência de “segunda categoria”. O autor remata com convicção de que os problemas da educação científica, tanto de nível superior, quanto no ensino básico é uma “questão fundamental da própria ciência” (BELHOSTE, 2011BELHOSTE, Bruno. Das ciências instituídas às ciências ensinadas, ou como levar em conta a atividade didática na história das ciências. Revista Brasileira de História da Educação, v. 11, n. 3 (27), p. 47-61, set./dez. 2011., p. 60).

Basta uma rápida observação em pesquisas produzidas tanto no campo da história da ciência como da educação para perceber como é infundada essa separação entre os campos de investigação e pensar uma “história da educação em ciências” imediatamente associada à sua materialidade.

Heering e Wittje (2011HEERING, Peter, WITTJE, Roland (Eds.). Learning by doing, experiments and instruments in the history of science teaching. Stuttgart, DE: Franz Steiner Verlag, 2011. ), na Alemanha, apresentam tanto um histórico sobre as práticas com os objetos científicos quanto a dinâmica histórica do seu ensino.3 3 Organizado por esses autores, destaca-se o dossiê apresentado na revista Science & Education, denominado Historical perspective on Instruments and Experiments in Science Education (2012). Na Espanha, há uma significativa produção relacionando os campos. López-Ocón, Aragón, Pedrazuela (2012LÓPEZ-OCÓN, Leoncio; ARAGÓN, Santiago; PEDRAZUELA, Mariano. (eds.) (2012). Aulas con memoria. Ciencia, educación y patrimonio en los institutos históricos madrileños (1837-1936). Madrid: Comunidad de Madrid, 2012.) produziram uma historiografia sobre o ensino científico, secundário, mostrando as relações entre ciência e escola e, paralelamente, fazendo um grande trabalho patrimonial.4 4 Soma-se a obra uma ampla discussão sobre o patrimônio científico-educativo em grandes Institutos de ensino da cidade de Madrid. Os Institutos apresentados são: San Isidro, Cardenal Cisneros, Isabel la Católica e Cervantes. O projeto “Ciencia y Educación en los Instituos Madrileños de Enseñanza Secudaria (1837-1936) resultou no museu virtual que pode ser acessado emhttps://ceimes.cchs.csic.es/ Um dos trabalhos destacados conta-nos sobre a formação de coleções de objetos para o ensino de Física e Química que se conservam nos institutos espanhóis (BERTOMEU SÁNCHEZ E SIMON CASTEL, 2012BERTOMEU SANCHÉZ, José Ramón, SIMON, Josep. Viejos objetos y nuevas perspectivas historiográficas: la cultura material de la ciencia en las aulas del siglo XX. In: LÓPEZ-OCÓN, Leoncio; ARAGÓN, Santiago; PEDRAZUELA, Mario. (Eds.) Aulas com memoria. Ciencia, educación y patrimonio en los Institutos históricos de Madrid (1837-1936), Madrid: CEIMES y Comunidad de Madrid, 2012. ).

Guijarro Mora (2018GUIJARRO MORA, Víctor. Artefactos y acción educativa. La cultura del objeto científico en la enseñanza secundaria en España (1845-‍1930). Madrid. Dykinson. 2018) estuda a cultura material das escolas secundárias espanholas, abertas pelo estado liberal, indicando uma corporação entre professores, construtores, fabricantes, comerciantes na apresentação massiva de instrumentos científicos como inovação de ensino.

Gomes (2019GOMES, Inês. Os Museus Escolares de História Natural: Análise histórica e perspectivas de futuro (1836-1975). Lisboa: Edições Colibri, 2019.) mostra, por meio de uma abordagem multidisciplinar (história das ciências, história das coleções e museologia), o patrimônio para o ensino de História Natural desde os acervos das escolas secundárias portuguesas entre 1836 e 1975, inclusive, saudando a proteção deste patrimônio.

No caso da história da educação no Brasil, as preocupações sobre o patrimônio educativo são sentidas desde os anos 1990. Vemos chamados seminais de pesquisadoras como Warde (1990WARDE, Mirian Jorge. Contribuição da História para a Educação. Brasília: Em Aberto. V. 9, n. 47, p.03-10, jul./set.1990. ) e Nunes & Carvalho (1993NUNES, Clarice, CARVALHO, Marta Maria Chagas de. Historiografia da Educação e Fontes. Cadernos ANPEd - Nova Fase, Porto Alegre, n. 5, p. 7-64, setembro. 1993.). A primeira, ao apontar a história da educação como um objeto historiográfico, incluindo-a na “lógica histórica”, pela relação entre teoria e empiria (WARDE, 1990WARDE, Mirian Jorge. Contribuição da História para a Educação. Brasília: Em Aberto. V. 9, n. 47, p.03-10, jul./set.1990. , p. 5 e 8). Depois, Nunes e Carvalho (1993NUNES, Clarice, CARVALHO, Marta Maria Chagas de. Historiografia da Educação e Fontes. Cadernos ANPEd - Nova Fase, Porto Alegre, n. 5, p. 7-64, setembro. 1993.) falando de políticas de salvaguarda, expandem a percepção do que devam ser as fontes para as pesquisas: “os desenhos, apontamentos de aula, filmes televisivos escolares, fontes orais, fotografias etc.” (CARVALHO e NUNES, 1992, p. 35).

Três décadas adiante, Gaspar da Silva e Souza (2021GASPAR DA SILVA, Vera Lucia, SOUZA, Gizele de. Material school culture in the fields and gardens1 of the history of education: a look at academic production in Brazil (2000-2020). Educació i Història: revista d’història de l’educació, n. 38, p. 79-104, 2021. ) mostram que a cultura material escolar deixou de ser um item secundário, “ilustrativo” para se tornar um tema pluridimensional que favoreceu a ampliação dos seus conhecimentos teóricos-metodológicos e o aumento de trabalhos com o patrimônio. Também sentem a expansão da atividade patrimonial em torno da materialidade científica e estudos voltados à história da educação em ciências naturais (GASPAR DA SILVA e SOUZA, 2021GASPAR DA SILVA, Vera Lucia, SOUZA, Gizele de. Material school culture in the fields and gardens1 of the history of education: a look at academic production in Brazil (2000-2020). Educació i Història: revista d’història de l’educació, n. 38, p. 79-104, 2021. , p. 104).

Vidal e Alcântara (2021VIDAL, Diana Gonçalves; ALCÂNTARA, Wiara. The material turn in the History of Education. Educació i Història: revista d’història de l’educació, Barcelona: CSUC, n. 38, p. 11-32, jun./dez. 2021. ) indicam, inclusive, uma “guinada material” no campo da história da educação que circunscreve a ação coletiva, por diálogos entre diferentes áreas dos conhecimentos. No que tange aos estudos sobre a materialidade científica, as autoras também enxergam uma tentativa de esvanecimento entre as fronteiras da história da ciência e história da educação (VIDAL e ALCÂNTARA, 2021VIDAL, Diana Gonçalves; ALCÂNTARA, Wiara. The material turn in the History of Education. Educació i Història: revista d’història de l’educació, Barcelona: CSUC, n. 38, p. 11-32, jun./dez. 2021. ). Algumas destas pesquisas podem ser avistadas no decorrer do texto que segue.

Granato et al. (2018GRANATO, Marcus, RIBEIRO, Emanuela. Souza., ABALADA, Victor Emmanuel Teixeira Mendes, ARAÚJO, Bruno Melo de. Objetos de ensino e o patrimônio cultural de ciência e tecnologia no Brasil e em Portugal: contribuições sobre levantamentos e inventários como instrumentos de preservação em escolas de ensino médio. Anais do Museu Paulista: História e Cultura Material, n. 26, e. 30, 2018.) faz um levantamento do patrimônio cultural de ciência e tecnologia no âmbito das escolas de ensino médio no Brasil, centralizando os trabalhos pela perspectiva da Museologia.5 5 A ênfase do artigo recai no estudo do patrimônio brasileiro cujo levantamento foi feito pelo projeto “Valorização do patrimônio científico e tecnológico brasileiro”, coordenado por Marcus Granato no Museu de Astronomia e Ciências Afins (MAST). Explica que eram buscados os artefatos depositados em instituições científicas e que, depois, passaram a procurar peças no ensino secundário. (GRANATO et al., 2018GRANATO, Marcus, RIBEIRO, Emanuela. Souza., ABALADA, Victor Emmanuel Teixeira Mendes, ARAÚJO, Bruno Melo de. Objetos de ensino e o patrimônio cultural de ciência e tecnologia no Brasil e em Portugal: contribuições sobre levantamentos e inventários como instrumentos de preservação em escolas de ensino médio. Anais do Museu Paulista: História e Cultura Material, n. 26, e. 30, 2018., s.n.). O interesse deste estudo recaiu em como são apresentados os processos de salvaguarda e gestão do conhecimento dos objetos científicos nas escolas captadas pelo projeto, apontadas na Tabela 1.

Tabela 1.
Dados sobre as Instituições de Ensino Médio registradas pelo projeto Valorização

O registro da quantidade de artefatos escolares contabilizados por esta panorâmica não pode ser desprezado do cômputo geral. Em todo o Brasil, considerando o objetivo do projeto, foram contabilizadas 38 mil peças. Portanto, o percentual relacionado somente às escolas de ensino médio, chega a mais de 19%. Este foi um dos motivos para a inclusão do patrimônio de ensino na definição de Patrimônio Cultural de Ciência e Tecnologia (PCC&T) brasileiro, mostrando-o como “legado tangível” relacionado ao conhecimento científico produzido pela humanidade em todas as “áreas do conhecimento, que faz referência às dinâmicas científicas de desenvolvimento tecnológico e de ensino, e a memória e ação de indivíduos em espaços de produção de conhecimento científico” (GRANATO et al., 2018GRANATO, Marcus, RIBEIRO, Emanuela. Souza., ABALADA, Victor Emmanuel Teixeira Mendes, ARAÚJO, Bruno Melo de. Objetos de ensino e o patrimônio cultural de ciência e tecnologia no Brasil e em Portugal: contribuições sobre levantamentos e inventários como instrumentos de preservação em escolas de ensino médio. Anais do Museu Paulista: História e Cultura Material, n. 26, e. 30, 2018., s.n.).7 7 O conteúdo desse debate está registrado na Carta do Rio de Janeiro. Este documento foi elaborado no IV Seminário Internacional Cultura Material e Patrimônio de Cultural de Ciência e Tecnologia, realizado no Museu de Astronomia e Ciências Afins, entre 05 e 08 de dezembro de 2016. Sendo a memória da ciência e o seu ensino indicado como “cultural”, integra-se ao conteúdo Artigo 216 da Constituição Federal (1988), como bem reconhecido com direitos constituídos. O NEO é signatário da Carta.

Zancul (2018ZANCUL, Maria Cristina Senzi. Patrimônio educativo e patrimônio histórico-científico no Brasil: alguns apontamentos. Museologia e Patrimônio. v. 8, n. 2, p. 104-122, 2015. ), uma das representantes desse movimento, mostra um panorama dos objetos científicos remanescentes de 24 ginásios que estavam em funcionamento em 1936, segundo os registros do Anuário de Ensino (1936-1937). A autora faz um estudo amplo desses artefatos nas dependências das escolas e os seus atuais estados de conservação, o que vemos a seguir (Quadro 1):

Quadro 1.
Objetos científicos remanescentes em escolas secundárias Estado de São Paulo

De maneira geral, a pesquisadora conclui que a maioria das peças está em péssimas condições de conservação. Há indícios de uma grande quantidade de descarte. Não há investimentos para fazer o trabalho de patrimonialização e, mesmo que houvesse este incentivo, existe a necessidade de conhecimentos específicos para a guarda e salvaguarda de tais materiais.

Ainda assim, é imprescindível que os materiais sejam protegidos. Dentre os trabalhos que imediatamente estão ligados ao patrimônio de ciência e tecnologia depositado em escolas, resultando em pesquisas, destacamos os seguintes grupos e pesquisadores. No caso de São Paulo, há o trabalho do grupo de pesquisa “História da Educação em Ciências” (Unifesp), cujas pesquisas já resultaram em diferentes discussões teórico-metodológicas sobre a história da materialidade científica no estado.8 8 Destacam-se os pesquisadores Reginaldo Alberto Meloni, que pode ser considerado um inaugurador desta temática com o seu doutoramento “Saberes em Ciências Naturais: o ensino de Física e Química no Colégio Culto à Ciência de Campinas - 1873/1910” e, posteriormente, tratou do acervo científico da escola Normal Caetano de Campos. Há também, Wiara Rosa Rios Alcântara, que tem somado esforços para o conhecimento dos artefatos científicos com diferentes pesquisas sobre aquisições para escolas, circulação econômica e transnacional, ensino em escolas modelares. Por fim, destacamos, Renato Barboza, com o projeto “Os usos e a conservação de objetos de ensino de história natural e biologia”. O projeto “Os instrumentos antigos do Laboratório de Física da escola estadual Bento de Abreu de Araraquara”, de autoria da profa. Maria Cristina Zancul (UNESP), é um trabalho chave neste sentido, por introduzir a condição de salvaguarda especializada para os instrumentos de Física. No Rio de Janeiro, há os trabalhos do MAST em parceria com o Colégio Pedro II também pela proteção de sua coleção científica de Física (FERREIRA et. al. 2010FERREIRA, Marcela de Almeida, GRANATO, Marcus, BRASIL, Zenilda F. CALVÃO, Alexandre. O conjunto dos objetos de ensino do laboratório de Física do Colégio Pedro II. In: GRANATO, Marcus e LOURENÇO, Marta. Coleções científicas luso-brasileiras: património a ser descoberto. Rio de Janeiro: Museu de Astronomia e Ciências Afins, 2010, p. 123-142.). Outro trabalho importante é o registrado no Ginásio Pernambucano, no Museu de História Natural Louis Jacques Brunet, nascido como um museu escolar no século XIX, mas que, logo nos primeiros anos de sua fundação, ampliou a sua função de ensino, tornando-se um museu de história natural (GONZALES, 2022GONZALES, Rômulo José Benito de Freitas. A musealização de coleções de ensino no século XIX: o caso do Ginásio Pernambucano. 2022. 144f. Tese (Doutorado em Museologia e Patrimônio) - Programa de Pós-graduação em Museologia e Patrimônio (UNIRIO). Rio de Janeiro, 2022.).

Essas pesquisas abordam a ciência como uma prática, um saber-fazer; os objetos científicos passaram a ser interpretados e adquiriram relevância nas explicações sobre as transformações históricas dos conhecimentos e foram tornados fundamentais na compreensão da organização de culturas científicas em diferentes tempos e lugares.

O estudo dos objetos científicos não se encerra na sua funcionalidade específica e laboratorial, muito embora isso seja importante às etnografias de laboratório. No caso da história da educação, cabe apresentá-los fora de seus parâmetros originais de uso, mas dentro de um universo concêntrico de relações que vão da ciência dos cientistas aos professores de ciências nas escolas que, não raro, são cientistas.9 9 Exemplos abundam e citamos alguns: Margarida Comas Camps, (BERNAL MARTÍNEZ, 2001); Santiago Ramón y Cajal, (LÓPEZ-OCÓN, 2015); Frei Germano d’Annecy, (MADI FILHO, 2022); Myriam Krasilchik, (SILVA, 2022). A discussão sobre a posição do objeto científico encontrado em escolas passa pelo entendimento de uma educação dos sentidos na história da instrumentação e das lógicas instrumentais.

Não os ter disponíveis é fazer uma historiografia possível, porém, menos realista, com carência de detalhes. Como se verá, existem dificuldades de toda ordem no trabalho com este tipo de coleção. Nomeá-las por suas “camadas estratigráficas” concede sentido ao trabalho prospectivo da inventariação e é uma metáfora erudita para dizer “aventura”.

Museu Escolar do Colégio Marista Arquidiocesano de São Paulo como espaço de memória: da efeméride ao trabalho de inventariação

Sabemos que o próprio sentido de humanidade só existe a partir da interação e do relacionamento com as materialidades, frente à natureza cíclica da vida. Isso inclui todas as ações, voluntárias ou não, que mostram, ao longo do tempo e espaço, os processos de criação ou perda de significados dos artefatos dentro de contextos específicos.

Granato e Araújo (2020GRANATO, Marcus, ARAÚJO, Bruno Melo de. Cultura Material e Patrimônio Cultural de Ciência e Tecnologia: os acervos do Colégio Pedro II e do Ginásio Pernambucano. In. BRAGHINI, Katya, MUNAKATA, Kazumi, TABORDA DE OLIVEIRA, Marcus. Novos diálogos da história da educação dos sentidos e das sensibilidades. São Paulo: EDUC, 2020. p. 79-105. ) mostram que os significados surgem diante dos “signos do objeto” de maneira conjuntural e relacional e que esse movimento existencial, de relação com os objetos, depende de espacialidades que “influenciam nosso comportamento social e os significados a eles atribuídos” (GRANATO e ARAÚJO, 2020GRANATO, Marcus, ARAÚJO, Bruno Melo de. Cultura Material e Patrimônio Cultural de Ciência e Tecnologia: os acervos do Colégio Pedro II e do Ginásio Pernambucano. In. BRAGHINI, Katya, MUNAKATA, Kazumi, TABORDA DE OLIVEIRA, Marcus. Novos diálogos da história da educação dos sentidos e das sensibilidades. São Paulo: EDUC, 2020. p. 79-105. , p. 84).

Isto é, as pesquisas que indicam o estado de conservação (ou não) dos objetos depositados na escola demarcam o diálogo, ou silêncio, diante desta rede de sentidos condicionados por contextos situados. Por este aspecto, produzir significados depende de códigos que estão em circulação, seja pelo uso, seja pela tradição. Caso não exista isso, surge o silêncio e o esquecimento. Os esquecimentos compõem uma das camadas históricas das coleções e as de tipo científicas têm um processo dificultado, durante a patrimonialização, quando não há nenhum membro formado em áreas das ciências naturais na equipe.

O Museu Escolar do Colégio Marista Arquidiocesano é patrimônio de uma instituição católica, confessional, fundada em 1858. Guarda uma coleção iniciada há 162 anos, composta por diversos objetos voltados ao ensino das ciências (Física, Química e História Natural). Este Museu Escolar, ao longo de sua existência, não deixou de receber acréscimos. Hoje, a coleção abriga peças de diversos períodos do século XIX e XX. Existem quatro disposições espaço-temporais no histórico deste museu: 1) O museu como material didático desde o final do século XIX; 2) O museu que ao longo da sua história foi acumulando materiais inovadores; 3) O museu como espaço de memória; 4) O museu como ambiente de gerenciamento de documentos permanentes da escola que não cessam de surgir.

No tempo presente, é um espaço de memória. Ele faz parte do Memorial do colégio e ambos estão sob a responsabilidade de sua Biblioteca, unificados em um “Centro de Documentação”.

Este Memorial originou-se das demandas da comunidade escolar em comemoração aos 100 anos de transferência do Colégio Diocesano de São Paulo à congregação Marista, acontecida em 1908, e aos 150 anos de fundação da escola, nascida do Seminário Episcopal em 1858. O Memorial é fruto dos embates dos membros da escola em nome de sua memória e foi criado como um local que agregasse a documentação reconhecida como seu legado, textual e tridimensional.

O processo de inventariação da coleção de Física foi organizado para cumprir os objetivos vinculados às categorias de guarda e salvaguarda de materiais escolares.10 10 Sobre a sua coleção dos animais taxidermizados, que hoje contabiliza 109 animais, dos mais diversos biomas, mas com predominância da fauna paulista, ver Madi Filho (2013). Sobre os espaços de ciências da escola estudado em relação às prescrições escolares, ver Bocchi (2013). Para acompanhar a divulgação científica, ver a página do NEO, disponível em https://web.facebook.com/neo.pucsp O projeto tratou das peças adquiridas entre os anos de 1858 até aproximadamente 1940.

Por serem, ao mesmo tempo, recursos didáticos e tecnocientíficos, estes objetos passam por um processo de abandono e descarte quando deixam de ser reconhecidos como “inovações”. Esta coleção passou por uma fase de ostracismo, entre o final dos anos 1950 até os anos 1990. Dentre os muitos problemas está a alegada falta de espaço para guardá-los, o desgaste das peças, seus desmontes etc., houve a sugestão de eliminação do acervo.

O caso da organização da Coleção de Física não é diferente de muitos relatos e trabalhos apresentados no campo da história da educação. O que havia era um acervo relativamente bem cuidado a partir do trabalho diletante de um professor que, vendo as raridades históricas acumuladas em um depósito, inicia um processo interno de valorização do que, aos seus olhos, eram relíquias.11 11 O professor em questão era Luiz Hermínio Marcarini, professor de Física entre os anos de 1967 e 1999. O trabalho gradativo de organização primeva do Museu Escolar aconteceu em conjunto com alunos do curso colegial em Ciências Exatas e, depois, com os trabalhos da técnica, documentalista Raquel Quirino Piñas.

Por fim, diante de tal contexto, foi iniciado os trabalhos de inventariação da coleção de Física e, aqui, tratamos de alguns aspectos da “caixa preta” dos processos de sua organização pela apreciação de alguns excertos de trabalhos que registram os caminhos das imprecisões e ignorâncias. No desafio de dar um sentido de organização a uma coleção, há provocações de todos os tipos, sentimentais, emocionais, intelectuais, científicas, bem como exercícios de decisão, que são constantemente reiterados nos processos técnicos.

Sabores da imperfeição durante um processo de inventariação

Falar do trabalho técnico de inventariação é falar de refinamento sensorial e, principalmente, do uso das mãos. O trabalho exige um olhar atento para ver marcas, inscrições, ranhuras, sujidades etc. Mas, as mãos acessam a massa, o peso, a densidade, o volume, a superfície etc. E se há um trabalho de percepção e intuição, enquanto se tenta acertar, há erro. Aqui não justificaremos este aspecto emocional separado da “técnica”, visto que esta diz respeito ao funcionamento do aparato sensorial mobilizado para um trabalho que, muitas vezes, falha. Para nós, não houve um caminho de “humanização para além da técnica”. A técnica é a humanização mesma durante o saber fazer e o aprender com as mãos. Por isso, a paráfrase de “sabor” dos arquivos, sentida por Farge (2009FARGE, Arlette. O sabor do arquivo. São Paulo: Edusp, 2009.), cabe ao momento.

Se contar, medir, registrar, numerar, catalogar, identificar fala dos protocolos legitimados pela ciência para que exista um patrimônio, vale dizer que seres humanos fazem isso, com dúvidas, com sensações e com o acaso. Isso, além de sentir o aroma das matérias-primas, o acre da madeira, a densidade das massas, a robustez dos materiais, o refinamento dos cortes de vidros e lentes, a cor do bronze, do latão, do ferro, do chumbo e saber identificá-los, o que necessita de amostras comparativas etc.

Sobre o processo técnico, sensorial, humano e complicado de se inventariar uma coleção de Física, contamos três casos ilustrativos. Mas, poderiam ser outros.

O desafio das peças perdidas ou as ausências presentes

A ausência de peças é uma condição inalterável durante a inventariação de um grande acervo. Não raro, encontram-se pedaços de peças e centenas de fragmentos, que são guardados, gerando um grande mosaico sem sentido, mas que não pode ser descartado ou lançado fora.

Também acontece de sentir a falta de uma peça, dando-a por perdida, por todo o tempo de trabalho. O seu retorno é aguardado com ansiedade. É uma ausência presente, uma espécie de saudade.

Esse foi o caso da minúscula medida (Figura 1) de uma das balanças analíticas de dois pratos da coleção, datada de 1900.12 12 Lutz, Ferrando & Cia Ltda. (1900). São acessórios da balança, o estojo de pesos e uma pinça de trabalho. Este é um instrumento científico de precisão que serve para medir massas muito pequenas. A sua composição está acompanhada de um estojo com pesos minúsculos para o exercício de sua função. A ausência de um deles é uma grande perda.

Figura 1.
Peso (1g) da balança analítica

Conviveu-se com um 1g de perda, durante muito tempo. Essa falta gerou angústia aos pesquisadores, pois o conjunto de padrões estava incompleto e assim permaneceu dando vida à falta. Seria ótimo completar o estojo mantido com um nicho minúsculo, vazio.

Tempos depois, o trabalho seguia com o estudo de um kit de química do projeto “Ciranda da Ciência”. Ele foi aberto para limpeza e observação. Este conjunto está repleto de diferentes recipientes com amostras de elementos químicos. Um deles, continha centenas de microesferas de chumbo. Dentro, havia um objeto estranho.

Era o peso faltante.

Intrínseco ao conto, há a própria história do acervo sendo ainda utilizado como material didático, pois supõe-se que um professor usou o conjunto de química e guardou o pequeno peso de maneira indiscriminada. Vale dizer que a continuidade de uso das peças do museu escolar em aulas gera debates com o campo da Museologia.

Modernidades abandonadas e o enigma pela ignorância

A Lanterna Mágica13 13 Lanterna mágica ou lanterna megalográfica. (1900) é um aparelho usado para projeção de imagens pintadas em cores sobre lâminas de vidro, cromatopes, utilizados para o estudo da física ótica. Para o seu pleno funcionamento, é necessário ter o conjunto, projetor e placas de vidro, unidos. Trata-se de um aparato científico que funciona com os seus acessórios.

Na coleção, a lanterna e as cromatropes estavam separadas como peças sem nenhuma relação. Diante do histórico de abandono e recomposição do acervo, o aparato foi apartado de seus acessórios, permanecendo por décadas em armários diferentes. Isso significa que durante esse tempo não se sabia qual era a função das placas de vidro, cujas imagens eram acionadas por uma pequena manivela. Havia um enigma: como as lâminas eram utilizadas com os alunos, se as suas dimensões eram tão reduzidas? Impossível enxergar os seus efeitos, se as representações figurativas eram tão pequenas.

Por um acaso, foi encontrado um vídeo na internet. Essa pista revelou uma outra lanterna mágica contabilizada pelos membros da L'Association de Sauvegarde et d'Etude des Instruments Scientifiques et Techniques de l'Enseignement (ASEISTE), mostrando a unificação dos dois artefatos que, pelo histórico de abandono deste acervo, não compunham um conjunto.14 14 Disponível em http://www.aseiste.org/ Acessado em 10/08/2022. Inventaries, descritor “lanterne magique”. Para conferir o uso dinâmico do aparato, acesse no You Tube: https://youtu.be/sU9AfktYLQg

Esse relato mostra o sentido de modernidades abandonadas e a ignorância gerada pelo não reconhecimento dos objetos. Esses são os tais silêncios das espacialidades perdidas. Acompanhar o estudo de outras instituições creditadas nas investigações sobre a instrumentação científica foi imprescindível, porque a trama das redes de pesquisa estabelece um amplo leque de conhecimentos compartilhados.

Por fim, as imagens das cromatropes se tornam imensas com a lente de projeção. Assim, monta-se o espetáculo para ensinar a função do olho e sua relação com os processos matemáticos de estudos da visão.

Podemos visualizar a composição total do aparato com suas respectivas peças e encaixes por meio da Figura 2.

Figura 2.
Composição fotográfica. Lanterna mágica e cromatopes

A saga das válvulas: do aborrecimento às descobertas

A válvula termiônica serve para modificar, alternar ou amplificar um sinal elétrico. Seu funcionamento controla os movimentos dos elétrons com baixa pressão em um espaço vazio. Radares, rádios, televisores, amplificadores são aparelhos úteis que já utilizaram esse componente elétrico.

Durante as ações, o grupo de pesquisadores tomou a decisão de fazer a descrição dessas peças pelos seus conjuntos, ou por lotes das empresas apresentadas. Equívoco. Durante o I Seminário do Patrimônio Científico-Educativo15 15 Ocorrido na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, entre 1 e 3 de agosto de 2018. surgiu a advertência dos museólogos sobre a necessidade e importância de se contabilizar cada uma delas. Isso gerou uma longa procrastinação.

Foram inventariadas 167 válvulas.16 16 Disponível em https://biblioteca.grupomarista.org.br/pesquisa_geral Acessado em 10/08/2022 (BRAGINI, PEDRO, PIÑAS, 2019). Pergamum, descritor: “válvula”. Depois, surgiram as descobertas.

Abaixo, podemos ver alguns exemplares de válvulas que foram catalogadas (Figura 3).

Figura 3.
Composição: Variedades de válvulas

Entre 1922 e 1950, as válvulas do acervo são de procedência dos Estados Unidos da América (EUA) de maneira predominante. Com o registro “made in USA” marcado nas peças, destacaram-se as seguintes empresas: General Eletric Co. (GE), Radio Corporation of America (RCA), Admiral. O que vemos na história de tais válvulas é o relacionamento pleno da tecnociência fundida ao histórico de holdings bilionárias, não apenas para industrializar produtos eletrônicos, mas pela geração do que se entende por indústria cultural, na difusão de comunicação, entretenimento.

Um exemplo é dado pela história da GE, originalmente fundada por Thomas Edson como Edison Electric Light Company, refundada por J.P Morgan e Vanderbilt. Mais tarde, esta mesma empresa se utiliza da RCA como braço de suas vendas no varejo de rádios e, por essa fusão, surgem a National Broadcasting Company (NBC), em 1926, e o Radio City Music Hall no Rockefeller Center, em 1933.

Após os anos 1950, detecta-se, no acervo, o crescimento da indústria japonesa de eletrônicos. Hitachi, Nippon Electronic, Toshiba são os exemplos de empresas registradas. A Hitachi (1910) foi fundada como oficina de consertos elétricos. A Nippon Electric Limited (NEC) (1898) se tornou a primeira joint-venture japonesa com capital estrangeiro. A Toshiba (1939) foi fundada como Tokyo Shibaura Denki K.K. em fusão com a Shibaura Seisaku-sho (1875) e Tokyo Denki (1890).

O que se vê pela coleção de válvulas, no caso da indústria japonesa, é que as três empresas surgem no período conhecido como fase do capitalismo industrial tardio, que despontou no Japão na era da Restauração Meiji (1868). Estando a coleção despontada na escola a partir dos anos 1950, parece acompanhar o que ficou conhecido como o “milagre econômico japonês”, advindo dos esforços de reconstrução do país, após a Segunda Guerra Mundial, mediante a sua associação política com os EUA.

O que se constata desse episódio é que do aborrecimento de contabilizar válvulas foi percebido que a escola acompanhou o desenvolvimento da eletroeletrônica durante a primeira metade do século XX, sendo possível constatar, inclusive, uma alternação geopolítica do desenvolvimento e na compra das peças.

No sentido de preparo técnico, é importante a aquisição de uma lupa com diodo de emissão de luz (LED), pois, falamos muito de visão e pouco da cegueira, e é quase impossível registrar as marcações minúsculas e já desgastadas pelo tempo, nas peças, sem uma iluminação adequada.

A felicidade do processo de contar e identificar válvulas acontece quando ele termina.

Considerações finais

Tornar visível e público um patrimônio privado repõe a discussão sobre a polissemia do termo. Há muito a ser discutido sobre a condição pública de uma propriedade que continua privada, já que ela pertence a um grupo empresarial. Essa dinâmica entre parceria público-privada gera controvérsias, e elas são ainda maiores, quando os levantamentos patrimoniais constatam que o dito “patrimônio” que nasce público está abandonado, desintegrando em muitos casos.

A tentativa deste artigo era focar o processo técnico de sistematização desses estoques informacionais de modo a indicar e problematizar a ação mesma do pesquisador durante o processo de organizar coleções. Os objetos científicos não são apenas coisas, são fragmentos patrimonizáveis de um (eco)sistema epistêmico e isso exige muitas ações propositivas para o recolhimento de informações creditadas. Por isso é importante uma discussão sobre o papel dos agentes do campo patrimonial durante a elaboração de seus métodos, os caminhos de suas escolhas, das conduções de suas decisões.

Isso significa ter uma ponderação sobre os processos técnicos de trabalho que qualificam tais objetos por suas especialidades, contando-os, classificando-os, mantendo-os e procurando práticas as mais referendadas, para a conservação de diferentes materiais. São produzidos acessos à produção de conhecimentos novos, mas também conhecimentos novos, de base tecnológica, tanto pensando as máquinas construídas para inventariação (banco de dados, sistemas operacionais, livros tombos etc.) quanto no sentido de guarda e conservação. Logo, é importante pensar que o patrimônio que se apresenta é todo o conjunto de conhecimentos que o estrutura e o mantém, além das peças postas a público e sob proteção.

O ato de patrimonializar aponta aos sujeitos que se envolvem nesse tipo de projeto, produtores e reprodutores das práticas sociais nas quais os bens estão inseridos, para destacá-los também como indivíduos, cujos processos técnicos têm intrínsecas a imperfeição e a angústia, enquanto caminham pela exigência dos protocolos científicos.

Um histórico sobre as necessidades da guarda de um patrimônio público diz respeito às pesquisas que dele dependem. Mas sabendo que este tipo de patrimônio, sendo uma escolha, porque é uma alegoria política, exige tanto de ética quanto de cuidado. Primeiro, porque, via de regra, ele só aparece quando sofre ameaças de extinção e abandono. Por isso destacamos os sujeitos que o fazem aparecer, estes que se juntam aos protocolos técnicos referendados e dependentes de redes de apoio, para que os trabalhos não sejam sempre um recomeço, isolados, solitários. Por este motivo, o artigo reitera o convite pela defesa coletiva do patrimônio histórico-educativo em nosso país.

Já existe um pedido “para pensar a memória da educação como um dos direitos culturais garantidos pela Constituição” (SOUZA, 2013SOUZA, Rosa Fátima de. Preservação do patrimônio escolar no Brasil: notas para um debate. Revista Linhas, Florianópolis, v. 14, n. 26, p. 199 - 221, 2013., p. 213). O campo da museologia fez este movimento, tendo em vista, inclusive, o temor pela inconstância e quase negação das questões legais, jurídicas em relação ao patrimônio público. Ter o patrimônio educativo como um direito cultural exige o estudo deste quadro amplo de ações dos investigadores do campo da história da educação. São todas elogiáveis, porém, desconectadas, pois a opção histórica pelo patrimônio público é uma luta política que se reforça na forma de movimento social.

Ao final, devemos pensar seriamente neste assunto de movimento social e político, a extinção de um patrimônio representa o apagamento do nosso trabalho, de nós mesmos.

Referências

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  • 1
    Sobre a ideia de que o patrimônio público é uma alegoria, ou seja, aquilo que procura dar uma imagem ao que não existe de modo a torná-la cognoscível para uma generalidade e que reordena o sentido de tempo, espaço, tradição e memória, ver Poulot (2009POULOT, Dominique. Uma história do patrimônio no Ocidente, séculos XVIII-XXI. Do monumento aos valores. São Paulo: Estação da Liberdade, 2009., p. 97-98). Sobre a história do tempo histórico e as práticas concretas em que cada tempo presente administra a dimensão do passado, como experiência acumulada e o futuro como horizonte que pode ser prognosticado e, portanto, com a possibilidade de seu modelamento, ver Koselleck (2006KOSELLECK, Reinhart. Futuro passado. Rio de Janeiro: Contraponto, 2006.). Também Hartog (2006HARTOG, François. Tempo e patrimônio. Vária História. Belo Horizonte, v. 22, n.36, p. 261-273. Jul./Dez. 2006.) aposta na vivência do tempo histórico, como experiência, para explicar a detonação de novos patrimônios na contemporaneidade, como uma crise do “presentismo”. Usando a ideia de “regimes de historicidade”, como categoria operatória, tem por hipótese que, na contemporaneidade, o crescimento exponencial de novos patrimônios marca a ideia de futuro ameaçador e que, portanto, existe urgência deste tempo presente para a marcação de nossa própria existência.
  • 2
    Trata-se do projeto “Museu Escolar do Colégio Marista Arquidiocesano de São Paulo (fase 1): planejamento e organização do inventário dos instrumentos científicos”, financiado pelo CNPq e desenvolvido pelo Núcleo de Estudos Escola e seus Objetos (NEO). Para saber mais sobre as etapas, desenvolvimento e resultados do projeto, ver Braghini, Pedro, Piñas (2020BRAGHINI, Katya, PEDRO, Ricardo Tomasiello, PIÑAS, Raquel Quirino, LIMA, Danielle Barreto. O sistema Pergamum e seu uso como ferramenta para gerenciamento de dados do acervo de ciência e tecnologia do Colégio Marista Arquidiocesano de São Paulo. In. RIBEIRO, Emanuela Souza, ARAÙJO, Bruno Melo de, GRANATO, Marcus. Cadernos do patrimônio da ciência e tecnologia: epistemologia e políticas. Recife: UFPE, 2020. p.168-192., 2019BRAGHINI, Katya M. Z., PEDRO, Ricardo Tomasiello, PIÑAS, Raquel Quirino. Base de dados de objetos científicos: Museu Escolar do Colégio Marista Arquidiocesano de São Paulo. São Paulo: Grupo Museu Escolar do Colégio Marista Arquidiocesano de São Paulo, 2019. ). Agradecimentos especiais aos colegas da Rede Iberoamericana de História da Educação em Ciências (REDiHEC) pelas amplas discussões sobre o patrimônio científico educativo.
  • 3
    Organizado por esses autores, destaca-se o dossiê apresentado na revista Science & Education, denominado Historical perspective on Instruments and Experiments in Science Education (2012).
  • 4
    Soma-se a obra uma ampla discussão sobre o patrimônio científico-educativo em grandes Institutos de ensino da cidade de Madrid. Os Institutos apresentados são: San Isidro, Cardenal Cisneros, Isabel la Católica e Cervantes. O projeto “Ciencia y Educación en los Instituos Madrileños de Enseñanza Secudaria (1837-1936) resultou no museu virtual que pode ser acessado emhttps://ceimes.cchs.csic.es/
  • 5
    A ênfase do artigo recai no estudo do patrimônio brasileiro cujo levantamento foi feito pelo projeto “Valorização do patrimônio científico e tecnológico brasileiro”, coordenado por Marcus Granato no Museu de Astronomia e Ciências Afins (MAST).
  • 6
    No momento deste levantamento, o processo de inventariação da coleção de Física do Colégio Marista Arquidiocesano estava iniciando. Atualmente, o banco de dados instalado no Pergamum registra 1.123 itens apenas na sua coleção de Física.
  • 7
    O conteúdo desse debate está registrado na Carta do Rio de Janeiro. Este documento foi elaborado no IV Seminário Internacional Cultura Material e Patrimônio de Cultural de Ciência e Tecnologia, realizado no Museu de Astronomia e Ciências Afins, entre 05 e 08 de dezembro de 2016. Sendo a memória da ciência e o seu ensino indicado como “cultural”, integra-se ao conteúdo Artigo 216 da Constituição Federal (1988), como bem reconhecido com direitos constituídos. O NEO é signatário da Carta.
  • 8
    Destacam-se os pesquisadores Reginaldo Alberto Meloni, que pode ser considerado um inaugurador desta temática com o seu doutoramento “Saberes em Ciências Naturais: o ensino de Física e Química no Colégio Culto à Ciência de Campinas - 1873/1910” e, posteriormente, tratou do acervo científico da escola Normal Caetano de Campos. Há também, Wiara Rosa Rios Alcântara, que tem somado esforços para o conhecimento dos artefatos científicos com diferentes pesquisas sobre aquisições para escolas, circulação econômica e transnacional, ensino em escolas modelares. Por fim, destacamos, Renato Barboza, com o projeto “Os usos e a conservação de objetos de ensino de história natural e biologia”.
  • 9
    Exemplos abundam e citamos alguns: Margarida Comas Camps, (BERNAL MARTÍNEZ, 2001BERNAL MARTÍNEZ, José Mariano. (2001). Renovación Pedagógica y Enseñanza de las Ciencias. Medio siglo de propuestas y experiencias escolares (1882-1936). Madrid: Biblioteca Nueva, 2001. ); Santiago Ramón y Cajal, (LÓPEZ-OCÓN, 2015LÓPEZ-OCÓN, Leoncio. Santiago Ramón y Cajal (1852-1934). Encontros do Arquivo de Ciência e Tecnologia, 2015, Lisboa. Ciclo Atores da Política Científica. Lisboa: Fundação para a Ciência e Tecnologia, 2015, s.n.); Frei Germano d’Annecy, (MADI FILHO, 2022MADI FILHO, José Ismael. Frei Germano de Annecy (1822-1890): lugares, saberes e práticas. 2022, 342 f. Tese (Doutorado em Educação)- Pontifícia Universidade de São Paulo. 2022.); Myriam Krasilchik, (SILVA, 2022SILVA, Tiago Rodrigues da. A Renovação da Disciplina Escolar História Natural e Biologia no Ensino Secundário (1946-1965). 2022 248 f. Dissertação (Mestrado em Educação). Universidade Estadual de São Paulo. 2022).
  • 10
    Sobre a sua coleção dos animais taxidermizados, que hoje contabiliza 109 animais, dos mais diversos biomas, mas com predominância da fauna paulista, ver Madi Filho (2013MADI FILHO, José Ismael. Animais taxidermizados como materiais de ensino em fins do século XIX e começo do século XX. 2013, 132 f. Dissertação (Mestrado em Educação). Pontifícia Universidade de São Paulo. 2013.). Sobre os espaços de ciências da escola estudado em relação às prescrições escolares, ver Bocchi (2013BOCCHI, Luna Abramo. A configuração de novos locais e práticas pedagógicas na escola: o museu escolar, os laboratórios e gabinetes de ensino do Colégio Marista Arquidiocesano de São Paulo (1908-1940). 2014. 135 f. Dissertação (Mestrado em Educação) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo. 2013.). Para acompanhar a divulgação científica, ver a página do NEO, disponível em https://web.facebook.com/neo.pucsp
  • 11
    O professor em questão era Luiz Hermínio Marcarini, professor de Física entre os anos de 1967 e 1999. O trabalho gradativo de organização primeva do Museu Escolar aconteceu em conjunto com alunos do curso colegial em Ciências Exatas e, depois, com os trabalhos da técnica, documentalista Raquel Quirino Piñas.
  • 12
    Lutz, Ferrando & Cia Ltda. (1900). São acessórios da balança, o estojo de pesos e uma pinça de trabalho.
  • 13
    Lanterna mágica ou lanterna megalográfica.
  • 14
    Disponível em http://www.aseiste.org/ Acessado em 10/08/2022. Inventaries, descritor “lanterne magique”. Para conferir o uso dinâmico do aparato, acesse no You Tube: https://youtu.be/sU9AfktYLQg
  • 15
    Ocorrido na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, entre 1 e 3 de agosto de 2018.
  • 16
    Disponível em https://biblioteca.grupomarista.org.br/pesquisa_geral Acessado em 10/08/2022 (BRAGINI, PEDRO, PIÑAS, 2019BRAGHINI, Katya M. Z., PEDRO, Ricardo Tomasiello, PIÑAS, Raquel Quirino. Base de dados de objetos científicos: Museu Escolar do Colégio Marista Arquidiocesano de São Paulo. São Paulo: Grupo Museu Escolar do Colégio Marista Arquidiocesano de São Paulo, 2019. ). Pergamum, descritor: “válvula”.
  • Financiamento

    Este trabalho foi financiado pelo Programa de Incentivo à Internacionalização (PRIPINT-PUCSP), pelo processo 26748.

Editado por

Editora responsável:

Terciane Ângela Luchese

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    31 Out 2022
  • Aceito
    08 Fev 2023
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