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Prevalência de suicídio no Sul do Brasil, 2001-2005

Prevalence of suicide in the South of Brazil, 2001-2005

Resumos

OBJETIVO: Descrever e avaliar a incidência de suicídio em indivíduos procedentes da Associação dos Municípios da Região de Laguna (Amurel), no período de 2001 a 2005. MÉTODOS: Estudo transversal com coleta de dados no Instituto Médico Legal (IML) de Tubarão, referentes a todos os óbitos ocorridos entre 2001 e 2005, que tiveram como causa de morte o suicídio. Para todos os casos inclusos no estudo, os dados foram retirados dos prontuários do IML por meio do preenchimento de uma ficha de dados. RESULTADOS: A idade média dos suicidas pesquisados ficou em 44 anos, com predomínio do sexo masculino (79,6%). A maioria dos casos não tinha união estável (38,8%) e utilizou com mais freqüência o enforcamento como método, com 68,4% dos óbitos. As profissões mais comuns entre os suicidas foram os serviços gerais e agricultores. A cidade com mais incidência foi Grão Pará com coeficiente de 20,2. CONCLUSÃO: Verificou-se que a incidência da região de Amurel está dentro das estatísticas catarinenses com coeficiente de 7,9. O principal método para cometer o suicídio foi o enforcamento, e os homens se matam quase quatro vezes mais que as mulheres.

Suicídio; epidemiologia; fatores de risco


OBJECTIVE: To Describe and evaluate the incidence of suicides among individuals from the Associação dos Municípios da Região de Laguna (Amurel) (Association of the Counties of Laguna Region), in the period from 2001 to 2005. METHODS: Transversal study with data collection from the Legal Medical Institute (LMI) in Tubarão referring all deaths occurred between 2001 and 2005, which had a suicide as the cause of death. For all cases included in the study, the data was obtained from the LMI forms. RESULTS: The average age of the individuals in the search was 44 years old and the majority was of the male gender (79, 6%). Most of cases had no stable union (38, 8%) and used the hanging as the main method of suicide, representing 68,4% of the deaths. The most common occupations among the individuals who committed suicides were general service workers and farmers. The city with the highest incidence was Grão Pará with a coefficient of 20.2. CONCLUSION: It was observed that the incidence of the Amurel region is similar to the one found in Santa Catarina, which has a coefficient of 7,9. The main method of suicide was hanging, and the men committed four times more suicides than women.

Suicide; epidemiology; risk factors


ARTIGO ORIGINAL

Prevalência de suicídio no Sul do Brasil, 2001-2005

Prevalence of suicide in the South of Brazil, 2001-2005

Greta Nazario VianaI; Felipe de Moura ZenknerII; Thiago Mamôru SakaeIII; Bráulio Tercius EscobarIII

IMédica, Clínica Geral

IIFaculdade de Medicina da Universidade Luterana do Brasil (ULBRA)

IIIUniversidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL)

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Greta Nazario Viana Av. João Pessoa, 1065, apto. 209, Farroupilha 90040-000 - Porto Alegre, RS E-mail: greta_viana@yahoo.com.br

RESUMO

OBJETIVO: Descrever e avaliar a incidência de suicídio em indivíduos procedentes da Associação dos Municípios da Região de Laguna (Amurel), no período de 2001 a 2005.

MÉTODOS: Estudo transversal com coleta de dados no Instituto Médico Legal (IML) de Tubarão, referentes a todos os óbitos ocorridos entre 2001 e 2005, que tiveram como causa de morte o suicídio. Para todos os casos inclusos no estudo, os dados foram retirados dos prontuários do IML por meio do preenchimento de uma ficha de dados.

RESULTADOS: A idade média dos suicidas pesquisados ficou em 44 anos, com predomínio do sexo masculino (79,6%). A maioria dos casos não tinha união estável (38,8%) e utilizou com mais freqüência o enforcamento como método, com 68,4% dos óbitos. As profissões mais comuns entre os suicidas foram os serviços gerais e agricultores. A cidade com mais incidência foi Grão Pará com coeficiente de 20,2.

CONCLUSÃO: Verificou-se que a incidência da região de Amurel está dentro das estatísticas catarinenses com coeficiente de 7,9. O principal método para cometer o suicídio foi o enforcamento, e os homens se matam quase quatro vezes mais que as mulheres.

Palavras-chave: Suicídio, epidemiologia, fatores de risco.

ABSTRACT

OBJECTIVE: To Describe and evaluate the incidence of suicides among individuals from the Associação dos Municípios da Região de Laguna (Amurel) (Association of the Counties of Laguna Region), in the period from 2001 to 2005.

METHODS: Transversal study with data collection from the Legal Medical Institute (LMI) in Tubarão referring all deaths occurred between 2001 and 2005, which had a suicide as the cause of death. For all cases included in the study, the data was obtained from the LMI forms.

RESULTS: The average age of the individuals in the search was 44 years old and the majority was of the male gender (79, 6%). Most of cases had no stable union (38, 8%) and used the hanging as the main method of suicide, representing 68,4% of the deaths. The most common occupations among the individuals who committed suicides were general service workers and farmers. The city with the highest incidence was Grão Pará with a coefficient of 20.2.

CONCLUSION: It was observed that the incidence of the Amurel region is similar to the one found in Santa Catarina, which has a coefficient of 7,9. The main method of suicide was hanging, and the men committed four times more suicides than women.

Key-words: Suicide, epidemiology, risk factors.

INTRODUÇÃO

Suicídio é a ação de tirar a própria vida de maneira voluntária e intencional1-3, que é iniciada e levada a cabo por uma pessoa com pleno conhecimento ou expectativa de resultado fatal4. Etimologicamente, quer dizer, sui = si mesmo e ceades = ação de matar, vocábulo que surgiu no século XVII, na Inglaterra3,5.

O suicídio é resultado de alteração tanto no conteúdo do pensamento quanto na conduta do paciente3,6. É a maneira encontrada para o alívio do sofrimento, do sentimento de desesperança, do desamparo, dos conflitos pessoais ou interpessoais e do estresse, ou seja, o suicídio está associado com as necessidades frustradas ou não satisfeitas2. Entretanto, antes do ato propriamente dito do suicídio, o paciente apresenta ideações suicidas e, normalmente, se enquadra nos fatores para risco de suicídio3,4,7.

A ideação suicida é caracterizada por perda da vontade de viver, desejo de estar morto ou acabar com a própria vida e autodestruição. Essas idéias (ideação suicida) apresentarão risco de suicídio variável, indo de baixo a alto risco, que é determinado pelo número e pela intensidade desses fatores3.

Anualmente, em média, um milhão de pessoas cometem suicídio no mundo, e, aproximadamente 10 a 20 milhões de pessoas tentam o suicídio4,5. Esses dados demonstram que o suicídio é um importante problema de saúde pública mundial3-5,8,9. O Brasil apresenta taxa média de suicídio de 4 a 6 óbitos por 100.000 habitantes3. São dados preocupantes, porém não tão altos se relacionados a outros países, como a França, que têm uma média de 19 suicídios por 100.000 habitantes. Em geral, as maiores taxas de suicídio mundiais (mais de 16/100.000 habitantes) encontram-se na China, na Suíça, na França, na Bélgica, na Áustria, nos Estados Unidos e no leste europeu. Já os países islâmicos apresentam as menores taxas mundiais, podendo chegar a valores quase nulos, como no Egito7.

Entre os estados brasileiros com maiores taxas de suicídio estão Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná4,7,10, São Paulo e Goiás, em ordem decrescente4,7. No Rio Grande do Sul, a taxa anual está entre 8 e 10 mortes por suicídio por 100.000 habitantes6,10, Santa Catarina está em segundo lugar nas estatísticas de suicídio, com média de suicídio de 7 e 8,5/100.000 habitantes6, e Paraná, com 7,1 suicídios por 100.000 habitantes10.

Considerando a idade como fator de risco para suicídio, as taxas para ambos os sexos são mais altas na meia-idade e na velhice. Nos últimos 15 anos, tanto no Brasil quanto nos demais países, tem-se observado aumento progressivo de tentativas de suicídio e suicídios consumados entre adolescentes e adultos jovens2,3,7, tornando-se uma tendência global e apresentando-se como a terceira causa de morte dos 15 aos 34 anos, só perdendo para homicídios e acidentes, e em alguns países chegando a ser a primeira causa de morte nessa população4,5,8,11. No Brasil, as taxas continuam a subir, porquanto na região Sul são mais altas do que no restante do país2,5,7,8,10.

Apesar disso, os índices de pessoas que se suicidam acima dos 45 anos de idade continuam sendo maiores do que em pessoas mais jovens. Os idosos tentam o suicídio menos freqüentemente do que as pessoas jovens, mas obtêm sucesso com maior freqüência, sendo responsáveis por 25% dos suicídios, embora perfaçam apenas 10% da população2,12.

Com exceção da China, onde as mulheres estão acima dos homens nas estatísticas de suicídio, nos demais países do mundo, o predomínio se dá entre os homens em todas as faixas etárias5. Observando-se uma relação de homem/mulher média de 3:1 até 4:1, dependendo do país estudado2,3,5,7,10,12-15. Não se sabe exatamente ainda a causa dessa diferença, porém acredita-se que os homens tenham comportamento de competitividade e impulsividade maior que as mulheres, apresentam mais consumo de drogas e álcool, fator predisponente ao suicídio5,10,12, e buscam maior acesso a tecnologias letais e armas de fogo, métodos que acarretam lesões fatais rapidamente5,12. Já as mulheres, apresentam maior número de tentativas de suicídio, chegando a valores inversos aos do suicídio consumado pelos homens2,3,5,7,10,12-14.

As regiões compostas por imigrantes europeus merecem destaque porque apresentam maior número de suicídios, se comparados a outras regiões. A hipótese de isolamento social em virtude do distanciamento de familiares combinado a outros fatores não pode ser descartada, já que esse caracteriza uma possível desordem psicológica, bem como possíveis envolvimentos genéticos e ambientais que podem ser decorrentes do novo habitat4,5,7.

A prevalência de suicídio é descrita na literatura científica como maior entre os divorciados, os solteiros e os viúvos2,3,7,8,13,14,16,17. É descrita predominância nos divorciados, porém os solteiros apresentam índices ainda mais altos quando jamais foram casados, chegando ao risco até duas vezes maior do que as pessoas casadas2,8,14. Entre os viúvos o efeito também é considerável, o que pode ser constatado pelo o grande número de suicídios ocorrido logo após a morte do cônjuge3,8,14. O isolamento social, a perda de um ente querido ou a ruptura de uma relação afetiva podem desencadear pensamentos e até o ato suicida, cuja incidência é maior nas mulheres sem filhos2,3,5,16,17.

Outro aspecto relevante no risco de suicídio é a situação profissional, pois diversas literaturas apontam o desemprego como fator de risco modificável para tal ato2,3,7,10,13,14,17,22. Porém, essa associação pode ser considerada controversa, diante do fato de que o desempregado pode desencadear suicídio, ou então indivíduos com transtornos psiquiátricos têm maiores dificuldades em manter ou arrumar emprego3. Além dos desempregados, pessoas de situação empregatícia instável têm risco aumentado. Como também, mudanças na situação socioeconômica mostram-se relacionadas ao evento5,10,17.

Ressaltamos a profissão dos agricultores, pois estudos recentes mostram altas incidências de suicídio neste meio. Principalmente, em determinadas regiões do país onde se utilizam pesticidas de maneira indiscriminada, do tipo organofosforados, que são nocivos e trazem vários prejuízos à saúde, como a depressão5,18,19.

Pacientes com anteriores tentativas de suicídio ou planos suicidas têm maior predisposição para sua efetivação, do que pacientes que nunca tiveram tais sinais e/ou sintomas, por conseguinte, a tentativa é um sinal que deve ser considerado5,16,27. Dois terços dos pacientes que cometeram suicídio buscaram auxílio médico até um mês antes do ato, ou estiveram hospitalizados neste mesmo período14-16,20,21. As comorbidades psiquiátricas estão presentes na maioria dos pacientes que tentam ou consumaram o suicídio, deixando apenas 3% a 5% dos casos sem diagnóstico2,5,15,22.

Em primeiro lugar em todos os estudos encontrados, o transtorno psiquiátrico mais observado entre estes pacientes foi a depressão, e, com o transtorno afetivo bipolar corresponde a 45% a 80% de mortalidade. Porém, a associação deste transtorno do humor ao abuso de álcool traz risco ainda maior, tornando-a ainda mais perigosa. O abuso de álcool apresenta-se como a segunda maior comorbidade, representado com um quarto dos pacientes, englobando também o abuso de drogas ilícitas, como cocaína, heroína, maconha etc. Contudo, de forma geral, todos os diagnósticos duplos acarretam maior risco2,3,7,17,24-26.

A esquizofrenia mostra-se também como um transtorno de alta prevalência, com até 10% dos afetados por tal patologia, apresentando mortes por suicídio principalmente nos primeiros anos da doença2,3,5,7,24-26.

Os transtornos de personalidade representam a média de 9% dos casos de suicídio, sendo este um determinante do comportamento suicida por predispor a transtornos psiquiátricos maiores, como a própria dependência de álcool ou o transtorno depressivo, levando a dificuldades em relacionamentos, ajustamento social e problemas para lidar com eventos indesejáveis2,3,5,7,17,24,25.

As doenças físicas crônicas podem estar associadas ao suicídio, observado principalmente em pacientes idosos. Entre as condições mais freqüentes destacam-se as doenças incapacitantes, dor crônica, pacientes renais em diálise, câncer, infecção pelo HIV/Aids, entre outros3,5,8.

Diversos são os meios utilizados para o ato suicida, dependendo também de fatores socioeconômicos, culturais e políticos, como leis de porte de arma ou controle de venda de substâncias tóxicas. Pode-se também observar que os homens geralmente utilizam meios mais violentos do que as mulheres para executar o ato5,7,12.

O método mais utilizado em nosso país é o enforcamento, chegando a 71% dos suicídios no estado de Santa Catarina nos anos de 1996 a 2001 do total de 2.064 suicídios. Em segundo lugar está a morte causada por projétil de arma de fogo, sendo mais observado o seu uso por homens, e as intoxicações exógenas em menos quantidade e mais comum no sexo feminino7,12. Entre as intoxicações exógenas encontramos desde a ingestão de inseticidas, superdosagem de medicamentos até produtos de uso de limpeza doméstica, que, em grande parte, não leva o paciente à morte, mas pode deixar seqüelas orgânicas7,12.

Existem estudos, desde a década de 1970, em que foi demonstrada a diminuição do ácido 5-hidroxi-indolacético (5-HIAA), metabolito principal da serotonina, no cérebro dos suicidas. Desde então, são realizados estudos com dosagens desse metabólito no liquor de pacientes deprimidos, já que se sabe que há deficiência de serotonina no cérebro de deprimidos, ou seja, quanto mais baixo for o nível de 5-HIAA maior será a chance desses indivíduos se suicidarem. E se essa diminuição for em valores muito baixos indica que há maior letalidade na tentativa de suicídio5,26,27.

Porém, não só pacientes potencialmente suicidas apresentam níveis baixos de serotonina; pacientes violentos de modo geral, bipolares, esquizofrênicos, com transtornos de personalidade (principalmente os borderline), apresentam níveis de serotonina diminuídos. Este dado faz parecer que o suicídio está relacionado com a impulsividade5,25.

Estudos entre familiares de suicidas e famílias em que não houve casos de suicídio demonstraram aumento do risco de suicídio de 2 a 10 vezes mais em parentes de primeiro grau5,22, porém, isso não comprova o componente genético, que pode ser dado por causa ambiental5.

Em estudos com taxa de concordância entre gêmeos, 12% dos irmãos monozigóticos cometeram suicídio, já entre os dizigóticos houve a morte de ambos em 2% dos casos. Como os monozigóticos têm quase 100% dos genes em comum e apenas 12% cometeram suicídio, há indícios de que vários outros fatores influenciem o comportamento suicida. Entretanto, comparando-se gêmeos dizigóticos e monozigóticos temos neste último seis vezes mais chance de suicídio, mostrando, então, possível associação com a genética5,7.

Diante do exposto, o objetivo desta pesquisa é descrever e avaliar a incidência de suicídio em indivíduos procedentes da Associação dos Municípios da Região de Laguna (Amurel), no período de 2001 a 2005.

MÉTODOS

Foi realizado um trabalho com delineamento transversal na coleta dos dados, em que foram estudados todos os suicídios registrados no Instituto Médico Legal (IML) de Tubarão, SC, no período de janeiro de 2001 a dezembro de 2005, representando a Amurel, região que se localiza no sul de Santa Catarina, e compreende 17 cidades.

Procedeu-se à análise das variáveis gênero, idade, situação conjugal, ocupação, município de residência, método utilizado para cometer o suicídio e mês do suicídio.

Os dados foram processados utilizando o programa Epidata versão 3.1 e analisados utilizando o programa EpiInfo, versão 6.04. Foram descritas as taxas de suicídio, conforme o ano e as variáveis de interesse, e feitas comparações entre a ocorrência de suicídio, de acordo com diferentes grupos, bem como testadas associações por meio do teste quiquadrado com nível de confiança de 95% (p < 0,05). Para o cálculo das taxas de incidência, foram utilizadas as populações disponíveis pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)28.

O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade do Sul de Santa Catarina.

RESULTADOS

Foram preenchidos 98 protocolos, que correspondem a to-dos os suicídios ocorridos nas cidades pertencentes à Amurel, no período de 2001 a 2005. No ano de 2001, foi encontrado o total de 19 casos, com coeficiente de 6,14 casos para cada 100.000 habitantes. Já no ano de 2002, houve diminuição no número de casos e na taxa de incidência, perfazendo o total de 14 suicídios. Porém nos anos consecutivos, houve aumento gradual nestes valores, assim como na população estimada; obtendo-se 16 casos no ano de 2003, 23, em 2004 e 26, em 2005, visto que neste ano ocorreu maior número de casos. Em relação ao sexo, a população masculina foi predominante nos cinco anos estudados, com o total de 78 casos (79,6%), e a feminina (20 casos) correspondeu a 20,4% do total de suicídios.

A média de idade dos casos pesquisados ficou em 44 anos (DP = 15,5), variando de 17 a 84 anos. Quase metade dos casos de suicídio (47%) foi praticada por pessoas acima dos 45 anos de idade. Em relação ao estado civil, foram encontrados 28 casos (28,6%) de pacientes casados, 26 solteiros (26,5), 6 separados/divorciados (6,2%), 6 viúvos (6,1%) e 32 fichas de dados (32,7%) não foram preenchidas nos prontuários do IML.

Foram observadas 15 profissões distintas entre os prontuários investigados, de modo que a mais freqüente foi a dos trabalhadores de serviços gerais com 28 casos (28,6%), seguido de agricultor/lavrador com 20 casos (20,4%), aposentados com 8,2% (8 casos), do lar com 6 casos (6,1%), comerciantes com 4 casos (4,1%) e 3 que tinham como atividade a pesca (3,1%); em 16 prontuários este dado não constava, perfazendo uma perda de 16,3%.

Sendo o estudo realizado na região de Amurel, foram separados os casos segundo o município de ocorrência do suicídio, estando Grão Pará com a maior taxa de incidência de suicídio nos últimos cinco anos, com 20,2 suicídios por 100.000 habitantes, seguido por Gravatal com 15, Rio Fortuna com 13,6, Treze de Maio com 11,6 e Imaruí, em quinto lugar, com 11 suicídios por 100.000 habitantes. A taxa de mortalidade média por suicídio na região da Amurel foi de 7,9 por 100.000 habitantes nos cinco anos estudados.

O método mais utilizado para cometer o suicídio nos cinco anos estudados foi o enforcamento com o total de 67 casos (68,4%), pacientes que fizeram uso de arma de fogo totalizaram 12 casos (12,2%), intoxicação exógena 8 casos (8,2%) e afogamento 6 casos (6,1%). Cada um dos seguintes com apenas um caso: queda de altura, utilização de arma branca, carbonização, eletrocutação e atropelamento.

De todas as mortes do sexo masculino, o enforcamento foi a mais prevalente, com 70,5% dos casos, seguido de projétil por arma de fogo com 12,8% e intoxicação exógena com 7,7%. No sexo feminino, a maior prevalência também foi do enforcamento, com o total de 60%, o afogamento com 20% e a intoxicação exógena com 10%. De acordo com o mês de ocorrência, não foi encontrada diferença estatisticamente significativa dos casos de suicídio (p = 0,85).

DISCUSSÃO

Realizando-se uma média de toda a população de Amurel, os números de suicídio ficaram acima da média brasileira de 4 a 6 óbitos por suicídio por 100.000 habitantes3. De 2001 a 2003, esses valores encontraram-se próximos ou dentro das estimativas brasileiras. Os dois anos seguintes, 2004 com coeficiente de 7,19 e 2005 também com alto coeficiente, 7,93, estavam acima das estatísticas brasileiras, porém dentro da média catarinense, que é a segunda de maior impacto no Brasil, com 7 a 8,5 suicídios por 100.000 habitantes7. Corroborando as literaturas estudadas2,3,5,7,10,12-15, foi encontrado predomínio de suicídios no gênero masculino de maneira global. A relação de gênero masculino/feminino no presente estudo foi de 3,9:1.

No que se refere à idade dos pacientes que cometeram suicídio, os dados aqui coletados estão de acordo com as tendências mundiais com altos índices em pacientes maiores de 45 anos de idade4,5,8,11. O número de suicídios, consoante as faixas etárias, aumentou gradativamente, porquanto entre 15 e 19 anos representaram 7% do total, e nos casos acima de 45 anos aumentou para 47%. Dados estes que se correlacionam com as literaturas consultadas, em razão do alto índice nas idades mais avançadas e do aumento nos adultos jovens2,12.

No que tange ao estado civil, todos os pacientes que não possuíam união estável (solteiros, separados/divorciados e viúvos) representaram 38,8% dos casos. Fato este que é mostrado de modo unânime nas literaturas, principalmente em se tratando de solteiros, que é observado aqui com grande número. No entanto, em 32,7% dos prontuários este item não estava respondido, de maneira que ultrapassa os 10% de perda tolerados nos métodos epidemiológicos.

Entre os métodos mais utilizados para cometer o suicídio, observa-se a prevalência do enforcamento, com 68,4% dos casos, parecendo ser um método simples e de fácil alcance, semelhante aos 71% que retratam a literatura fundamentada nos dados catarinenses e brasileiros, já que em todo o âmbito nacional o enforcamento ocupa o primeiro lugar7,12. Em seguida, observamos o suicídio por projétil de arma de fogo, com predomínio de 12,2% na região de Amurel, dado este que se mostra em segundo lugar nas estatísticas brasileiras5,7, porém varia em outros países, podendo ser o primeiro método utilizado para cometer o suicídio em países como os Estados Unidos, que têm política diferente da brasileira em relação à liberação de armas de fogo, e cidadãos comuns têm facilmente acesso5. As intoxicações exógenas se encontram como o terceiro método mais utilizado, perfazendo o total de 8,2% dos casos, em que os pacientes fizeram ingestão de diversos produtos, como inseticidas de utilização em lavouras ou de uso doméstico, superdosagem de medicamentos de variados tipos, até mesmo produtos para uso de limpeza doméstica7,12; estes dados se correlacionam com a literatura, já que nas diversas fontes estudadas a intoxicação exógena também estava em terceiro lugar nas mortes por suicídio.

A relação do gênero com o método utilizado mostrou que o enforcamento predominou em ambos os gêneros, porém com maior índice nos homens, com 70,5% dos casos, e 60% nas mulheres. No gênero masculino, a utilização de armas de fogo ficou em segundo lugar, com porcentagem de 12,8% e, em seguida, as intoxicações exógenas (7,7%). Nas mulheres, houve predomínio em segundo lugar do afogamento, com 20% dos casos, seguido pelas intoxicações exógenas com 10% (método este que pode ser revertido com mais facilidade por não ser tão violento). Este dado também corrobora com a literatura, tendo em vista que é descrito o predomínio do gênero masculino em métodos mais violentos e com números maiores de intoxicação exógena no gênero feminino5,10,12.

Quanto às profissões mais prevalentes, a dos trabalhadores de serviços gerais obteve maior número de casos neste estudo com 28,6%, e, em seguida, os pacientes caracterizados como agricultores ou lavradores. Acredita-se que uma das possibilidades desse número elevado comparado com as demais profissões seja por causa da utilização de agrotóxicos nesta região, principalmente os organofosforados, já que obtivemos altas taxas de suicídios em municípios onde a principal atividade socioeconômica é a agricultura5,18,19.

Analisando-se todas as 17 cidades pertencentes à região de Amurel nos cinco anos estudados, obtivemos o coeficiente de 7,9 óbitos por suicídio por 100.000 habitantes, número que está dentro da média catarinense. Porém, os coeficientes variaram muito entre as cidades, indo desde valores tão altos quanto os países com maior incidência no mundo (como a França com 19 suicídios/100.000 habitantes)7 até valores menores que as estimativas brasileiras. Em virtude das regiões estudadas serem compostas por imigrantes europeus e herdarem a cultura de seus países de origem, o alto índice de mortalidade pode ser justificado, fazendo que o número dessa mortalidade se pareça com as européias.

Esses dados revelam a importância de uma política de prevenção para o suicídio, de maneira que englobe toda a população, para que sejam detectados precocemente fatores de risco e, assim, evitado o suicídio. Já que é um ato que acarreta um milhão de mortes ao ano no mundo e está entre as três principais causas de morte nos adultos jovens. Entre os com altos coeficientes de mortalidade nota-se que seis municípios estão acima do coeficiente catarinense, que é de 7 a 8,57. Localidades como Sangão e Imbituba são inferiores aos coeficientes nacionais.

É de conhecimento geral a dificuldade de notificação exata dos casos de suicídio, visto que há um grande número de sub-registros, tanto por parte de funcionários das instituições quanto por familiares das vítimas, já que mortes por suicídio podem acarretar conseqüências desagradáveis, como até mesmo a dificuldade encontrada por parte de algumas religiões para o sepultamento dessas vítimas. Porém, além do aspecto sociocultural, há, muitas vezes, dificuldade em diferenciar se a causa da morte foi acidental ou realmente um suicídio.

Cabe aqui ressaltar a importância da detecção dos fatores de risco de suicídio, porque tal comportamento faz pensar que a idéia suicida é projetada como forma da resolução de problemas da vida pessoal, antes de ser um propósito de acabar com a própria vida.

CONCLUSÕES

A região estudada mostrou-se dentro das estatísticas catarinenses com 7,9 óbitos por suicídios por 100.000 habitantes. A preocupação quanto à alta incidência de suicídios deve ser mais reforçada no sul do Brasil, em virtude dessa região ter os maiores números nacionais. Quanto ao gênero, houve predominância dos homens (79,6%), porquanto eles utilizaram os métodos mais violentos. Porém, em ambos os gêneros, o enforcamento aparece em destaque como a maneira mais utilizada para cometer o suicídio.

Recebido em 7/11/2007

Aprovado em 12/3/2008

Fundamentado em trabalho de conclusão de curso da autora principal.

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  • Endereço para correspondência:
    Greta Nazario Viana
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Jun 2008
    • Data do Fascículo
      2008

    Histórico

    • Aceito
      12 Mar 2008
    • Recebido
      07 Nov 2007
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