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Fórum Vascular: inteligência coletiva na resolução de casos clínicos vasculares

Resumo

Contexto

A inteligência coletiva tem extrema importância em grupos coletivos de discussão de casos clínicos médicos, auxiliando tanto os profissionais na pronta tomada de decisão como seus pacientes.

Objetivos

Avaliar a resolutividade e as características das discussões clínicas realizadas em grupo fechado de mensagens instantâneas e sua aplicabilidade clínica.

Métodos

Análise retrospectiva de discussões clínicas e eventos no Fórum Vascular, grupo aberto para especialistas em dispositivos móveis.

Resultados

No período de julho de 2015 a julho de 2017, foram discutidos 1.013 assuntos, com 680 membros. Desses assuntos, 26 (2,57%) foram curiosidades, 101 (9,97%) foram dúvidas de diagnóstico, 492 (48,57%) foram dúvidas de tratamento, 205 (20,24%) foram dúvidas gerais e 189 (17,5%) foram relatos de casos. O número médio de interações por evento foi de 16,599 (±1,366). O tempo médio para a primeira resposta foi de 42,14 min (±7,55). Os assuntos discutidos foram 358 casos com miscelânea, 336 casos venosos, 15 casos linfáticos e 304 casos arteriais, totalizando 15.985 respostas.

Conclusões

A interação entre especialistas utilizando a tecnologia de troca de mensagens instantâneas mostrou-se capaz de levantar discussões e abordagens rapidamente. A resolutividade, considerada o tempo da primeira resposta correta, também foi alta. O Fórum Vascular evidenciou-se uma ferramenta de grande valia clínica para seus participantes, confirmando a importância da inteligência coletiva na área médica.

Palavras-chave:
inteligência; fóruns de discussão; informática médica; educação médica

Abstract

Background

Collective intelligence is extremely important in collective groups that discuss clinical medical cases, assisting professionals in their decision-making processes, and consequently, helping their patients.

Objectives

To evaluate the rate of resolution and characteristics of the clinical discussions carried out in a private instant messaging group and its clinical applicability.

Methods

Retrospective analysis of clinical discussions and events on the Vascular Forum, an open group for specialists accessed with mobile devices.

Results

From July 2015 to July 2017, 1013 subjects were discussed among 680 members. Twenty-six (2.57%) of these subjects were curiosities, 101 (9.97%) related to diagnostic doubts, 492 (48.57%) to treatment doubts, and 205 (20.24%) to general doubts, while 189 (17.5%) were case reports. The mean number of interactions per event was 16.599 (±1.366). The mean time from posting of a new subject to the first reply was 42.14 (±7.55) min. The subject discussed was miscellaneous in 358 cases, venous in 336 cases, lymphatic in 15 cases, and arterial in 304 cases and the total number of replies was 15985.

Conclusions

Interaction between experts using instant messaging technology proved capable of raising subjects for discussion and eliciting management approaches quickly. The rate of resolution, defined as the time taken for the first correct answer to be posted, was also high. The Vascular Forum proved to be a tool of great clinical value for its participants, confirming the importance of collective intelligence in medicine.

Keywords:
intelligence; discussion forums; medical informatics; medical education

INTRODUÇÃO

A inteligência coletiva tem como princípios reconhecer que cada ser humano tem algum conhecimento, porém não em sua totalidade, e considerar as experiências vividas ao longo da vida e que podem ser partilhadas. No contexto da saúde, esse conceito adquire extrema importância em grupos coletivos de resolução de casos clínicos médicos, auxiliando tanto os médicos na pronta tomada de decisão como, consequentemente, os pacientes dependentes de uma medicina de excelência 11 Bembem AHC, Santos PLVAC. Inteligência coletiva: um olhar sobre a produção de Pierre Lévy. Perspect Cienc Inf. 2013;18(4):139-51. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-99362013000400010.
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.

Desde a década de 1990 22 Van Bellen B. Um forum de discussão por e-mail. Cir Vasc Angiol. 2000;16:82-95. ,33 Van Bellen B. As 100 questões do Fórum Cibernético Vascular. São Paulo: Editora Revinter; 2002. , grupos de especialidades médicas têm sido criados e difundidos, recorrendo às tecnologias de mídias sociais e mensagens instantâneas largamente utilizadas para fins cotidianos. A troca de experiências e a facilidade de acesso à informação têm se mostrado de grande valia, principalmente longe dos grandes centros de informação.

A telemedicina formal apresentou importante evolução e consolidação no Brasil nos últimos anos 44 Wen CL. Telemedicina e Telessaúde: um panorama no Brasil. Inf Pública. 2008;10:7-15. , mas o avanço e a popularização das tecnologias permitiu o crescimento de iniciativas informais, como as redes de aprendizagem colaborativas. Elas utilizam tecnologias interativas para ampliar as possibilidades de construção de conhecimentos, seja aumentando as facilidades de acesso a materiais educacionais de qualidade, seja permitindo o acesso a centros ou colegas de referência ou a estruturação de novas sistemáticas educacionais 44 Wen CL. Telemedicina e Telessaúde: um panorama no Brasil. Inf Pública. 2008;10:7-15. .

Entre as iniciativas que promovem educação permanente para os profissionais de saúde visando a qualificação profissional, a teleducação interativa pode ser um importante recurso para disponibilizar materiais e unidades educacionais de qualidade. Embora grande parte do desenvolvimento educacional seja focada em cursos, a integração com a prática profissional é fundamental para a motivação dos profissionais. Assim, a utilização de métodos de segunda opinião formativa especializada pode ser importante, pois permite desenvolver uma estratégia educacional com foco no aprendizado baseado na problemática real 33 Van Bellen B. As 100 questões do Fórum Cibernético Vascular. São Paulo: Editora Revinter; 2002. .

Após o início informal de grupo de especialistas em aplicativo seguro de troca de mensagens instantâneas, houve a necessidade de expandir a iniciativa com a criação de novos grupos temáticos para possibilitar a acomodação de mais especialistas interessados. Experiências anteriores 22 Van Bellen B. Um forum de discussão por e-mail. Cir Vasc Angiol. 2000;16:82-95. com outros meios de comunicação mostraram rápida adoção da tecnologia e prontidão em participar, permitindo uma discussão produtiva de assuntos polêmicos apesar da distância geográfica entre os participantes, com grupos menores de 24 participantes. Com o crescimento rápido dos grupos e a constante troca de informações, houve necessidade de quantificar a qualidade e o impacto dessa iniciativa na atuação profissional 55 Erzinger FL, Amato, ACM, Araujo WJB, et al. Fórum vascular: inteligência coletiva na resolução de casos clínicos vasculares. In: Anais do 42° Congresso Brasileiro de Angiologia e de Cirurgia Vascular; 2017; Natal. São Paulo: SBACV. . Até o presente momento, não há avaliação de grupos vasculares em aplicativos de mensagens instantâneas na literatura.

O presente estudo tem como objetivo avaliar a eficácia e a eficiência na análise de casos clínicos em um grupo de discussões de mensagens instantâneas, por meio do tempo e número de respostas.

MÉTODOS

Foi realizado um levantamento retrospectivo observacional dos casos discutidos entre cirurgiões vasculares em um grupo aberto de discussões de mensagens instantâneas com 680 membros, no período de julho de 2015 a julho de 2017. O trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética da instituição com protocolo nº 00012017.

Os dados do fórum foram compartilhados entre os membros dos casos clínicos utilizando uma plataforma de mensagens instantâneas (WhatsApp), sendo extraídos por meio de software especializado (Whatsapp Pocket) 66 WhatsApp Pocket. 2018. [citado 2018 abr 4]. http://www.fireebok.com/whatsapp-pocket.html
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, exportados e convertidos para formato de documento comum. A seguir, foram analisados e tabulados em planilha colaborativa online segura (GoogleDocs®).

Foi realizada a estratificação dos seguintes dados de cada caso clínico: médico que iniciou a discussão, assunto, data, hora de início, momento da primeira resposta correta, número de respostas, características da discussão (dúvida de tratamento, dúvida diagnóstica, curiosidade, dúvida geral, relato de caso), características do relato (resumo), presença de informações extras no relato (imagem, exames, texto e tratamento) e diagnóstico definitivo. A resposta correta foi considerada a de maior consenso entre os participantes da discussão.

Após a verificação manual da consistência dos dados, procedeu-se à análise descritiva e estatística. Para as características expressas como dados categóricos, foram apresentadas as frequências absolutas e as proporções. Na análise estatística, utilizou-se o teste t, o qui-quadrado e a análise de variância (ANOVA). A análise estatística multivariada dos dados foi efetuada utilizando o software Excel (Microsoft) e Wizard 1.9.20 (Evan Miller). Para as características expressas como dados quantitativos, foram calculados a média e o desvio padrão e apresentados os valores mínimo e máximo 77 Moraes IN, Amato ACM. Metodologia da pesquisa científica. São Paulo: Roca; 2007. .

RESULTADOS

No período de julho de 2015 a julho de 2017, foram discutidos 1.013 assuntos diversos no grupo de troca de mensagens instantâneas. Desses, 26 (2,57%) foram curiosidades, 101 (9,97%) foram dúvidas de diagnóstico, 492 (48,57%) foram dúvidas de tratamento, 205 (20,24%) foram dúvidas gerais e 189 (17,5%) foram relatos de casos ( Figura 1 ). O número médio de interações por evento foi de 16,6 ± 1,37. O tempo médio para a primeira resposta foi de 42,14 ± 7,55 min, enquanto o tempo médio para a primeira resposta correta, considerada a de maior consenso, foi de 193,21 ± 19,73 min. Dessas discussões, 385 (38%) incluem fotos, 353 (34,8%) incluem exames subsidiários, e 426 (42,1%) incluem o tratamento. Com relação à distribuição das horas, o grupo mostrou-se ativo principalmente das 8 h às 22 h ( Figura 2 ).

Figura 1
Distribuição da característica das discussões (A) e dos assuntos (B).
Figura 2
Número de discussões por hora do dia (A) e taxa de chegada por hora (B).

Com relação aos assuntos discutidos, miscelânea liderou com 358 casos (35,3%) e a participação de 5,15 ± 0,47 integrantes do grupo. Quanto a assuntos venosos, foram 336 relatos (33,2%), com a participação de 5,86 ± 0,45 integrantes. Quanto a assuntos linfáticos, foram 15 casos (1,5%), com a participação de 5,43 ± 1,58 integrantes. Quanto a assuntos arteriais, foram 304 casos (30%), com a participação de 5,19 ± 0,44 integrantes (ANOVA, p = 0,1133).

Avaliando o número de participantes das discussões com relação à característica, 5,56 ± 0,75 integrantes do grupo participaram de dúvidas em geral, 4,87 ± 0,57 de relatos de caso, 3,72 ± 1,92 de curiosidades, 5,41 ± 0,71 de dúvidas de diagnóstico e 5,61 ± 0,64 de dúvidas de tratamento (ANOVA, p = 0,0728). Quanto ao número de respostas, nos casos de dúvidas de diagnóstico houve 13.979 ± 2.586 respostas, nas dúvidas de tratamento, 17.06 ± 1.70 respostas, nas curiosidades, 6,88 ± 3,65 respostas, nas dúvidas em geral, 19,98 ± 4,28 respostas, e nos relatos de caso, 14,45 ± 3,27 respostas (ANOVA, p = 0,0103).

A distribuição das variáveis coletadas nos assuntos discutidos pode ser observada nas Tabelas 1 , 2 e 3 . Com relação às respostas, no assunto arterial, a primeira resposta ocorreu com tempo médio de 58,48 ± 17,76 min e a primeira resposta correta surgiu com 229,43 ± 38,24 min; no assunto linfático, 28,66 ± 22,09 min para primeira resposta e 136.00 ± 140,77 min para primeira resposta correta; no assunto venoso, 27,89 ± 9,56 min para primeira resposta e 170,14 ± 33,614 min para primeira resposta correta; e no assunto miscelânea, 42,20 ± 12,08 min para primeira resposta e 186,51 ± 32,28 min para primeira resposta correta ( Figura 3 ). Pelas características da discussão, as dúvidas diagnósticas foram respondidas em 42,68 ± 20,66 min e corretamente em 172,52 ± 51,68 min; curiosidades em 63,76 ± 61,92 min e corretamente em 315,88 ± 185,03 min; dúvidas de tratamento em 37,26 ± 8,99 min e corretamente em 138,84 ± 23,66 min; dúvidas gerais em 53,52 ± 20,81 min e corretamente em 143,08 ± 40,99 min; e relatos de casos em 39,24 ± 20,16 min e corretamente em 383,29 ± 56,49 min (qui-quadrado, p = 0,0094 para tempo de resposta e p = 0,0587 para tempo de primeira resposta correta).

Tabela 1
Distribuição dos assuntos e das características da discussão de acordo com o número de discussões.
Tabela 2
Distribuição dos assuntos e das características da discussão de acordo com o número de participantes.
Tabela 3
Distribuição dos assuntos e das características da discussão de acordo com o número e o tipo de respostas.
Figura 3
Tempo da primeira resposta e da primeira resposta correta por assunto (A e B) e característica da discussão (C e D).

DISCUSSÃO

Entre as mudanças mais notáveis de comportamento nas últimas décadas está a comunicação baseada na internet, que acarretou uma maior interação social sem fronteiras 88 Baumöl U, Jung R, Krämer BJ. Advances in collective intelligence and social media. Int J Coop Inf Syst. 2013;22(3):1302001. http://dx.doi.org/10.1142/S0218843013020012.
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, assim como a transmissão do conhecimento tem evoluído em paralelo ao avanço da tecnologia. A comunicação sempre exerceu grande participação no aprendizado, pois, segundo Vygotsky, é na relação entre as pessoas que o conhecimento é construído, permitindo o desenvolvimento mental do indivíduo 99 Vygotsky LS. A formação social da mente. 3. ed. São Paulo: Martins Fontes; 1989. .

A busca por conhecimento passa pela vivência de cada pessoa e gera sabedoria, que é aprimorada com aquilo que aprendemos ao longo da vida. Ao interagirmos com outras pessoas, que tiveram outras vivências relacionadas ao mesmo tema, podemos assimilar e desenvolver um novo conhecimento sobre aquele assunto, adquirido coletivamente 1010 Lopes LCJA. A Web como ferramenta para a construção da inteligência coletiva. Coimbra: Universidade de Coimbra; 2012. [citado 2018 abr 4]. https://estudogeral.sib.uc.pt/jspui/bitstream/10316/40742/1/Web%20como%20ferramenta%20para%20a%20constru%C3%A7%C3%A3o%20da%20intelig%C3%AAncia%20coletiva.pdf
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. Assim, um grupo de aprendizes pode desenvolver conjuntamente novos pontos de vistas e conhecimentos 1111 Hewitt J, Scardamalia M. Design principles for distributed knowledge building processes. Educ Psychol Rev. 1998;10(1):75-96. http://dx.doi.org/10.1023/A:1022810231840.
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,1212 Scardamalia M, Bereiter C. Knowledge building. In: Guthrie JW, editor. Encyclopedia of education. New York: Macmillan; 2003. p. 1370-3. , o que representa outra forma de aquisição e transmissão do conhecimento 1313 Kerckhove D. Connected intelligence. Toronto: Somerville House; 2009. .

Tal fato tem sido observado nas mídias sociais, onde a interação social permite a aquisição, armazenamento, transmissão, manipulação e uso de informações para fins de decisões e julgamentos 1414 Kimmerle J, Moskaliuk J, Oeberst A, Cress U. Learning and collective knowledge construction with social media: a process-oriented perspective. Educ Psychol. 2015;50(2):120-37. http://dx.doi.org/10.1080/00461520.2015.1036273. PMid:26246643.
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. Da mesma forma, tais características também foram observadas no grupo de discussão em estudo. Pôde-se perceber que, apesar de seus integrantes iniciarem suas atividades médicas cedo e terminarem tarde, sempre estavam disponíveis para participar, fosse apresentando dúvidas ou dando opiniões, a qualquer hora do dia. Isso contribuiu para a geração de um grande montante de informações, com mais 15 mil respostas.

O avanço das formas de comunicação é evidenciado na internet, onde é gerada e armazenada uma grande quantidade de informações, formando uma biblioteca virtual. Com o uso de smartphones, o acesso e a transmissão dessas informações foram facilitados, gerando um maior número de dados para melhorar o conhecimento. No entanto, são geradas muitas informações desnecessárias e incorretas, cabendo a cada um a filtragem delas. A criação de grupos para discussões de assuntos específicos, independentemente da plataforma, possui um propósito comum, que depende fundamentalmente da capacidade dos indivíduos e do grupo de interagirem 22 Van Bellen B. Um forum de discussão por e-mail. Cir Vasc Angiol. 2000;16:82-95. . Dessa relação, eles podem produzir, trocar e utilizar o conhecimento individual para construir uma ideia de senso comum, sendo assim mais objetivos e contribuindo para a melhoria da qualidade das informações 1515 Teixeira RR. O desempenho de um serviço de atenção primária à saúde na perspectiva da inteligência coletiva. Interface. 2005;9(17):219-34. http://dx.doi.org/10.1590/S1414-32832005000200002.
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No grupo de discussão analisado, a maior quantidade de assuntos foi relacionada a dúvidas de tratamento (48,6%), evidenciando que o recurso é utilizado principalmente para auxílio ao tratamento, após o diagnóstico já estar firmado, pois as dúvidas de diagnóstico ocorreram em apenas 10% dos casos apresentados. Houve maior velocidade na primeira resposta em assuntos venosos e linfáticos, e na primeira resposta correta em assuntos linfáticos e venosos, nessa ordem. O intervalo de confiança em assuntos linfáticos foi grande, possivelmente pela pequena quantidade de casos apresentados. A prontidão em ajudar o colega é evidente nos baixos tempos de primeira resposta, porém a qualificação da resposta requer tempo maior.

Tem-se observado uma fraca relação entre inteligência individual e inteligência coletiva, demonstrando que, nos grupos, não há a necessidade da participação somente de pessoas inteligentes, sendo mais importante a maneira como os participantes se relacionam dentro do grupo 1515 Teixeira RR. O desempenho de um serviço de atenção primária à saúde na perspectiva da inteligência coletiva. Interface. 2005;9(17):219-34. http://dx.doi.org/10.1590/S1414-32832005000200002.
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. Portanto, fazem parte do processo de melhorar o conhecimento as respostas erradas, pois a inteligência coletiva é influenciada pela diversidade dos indivíduos envolvidos. Em um processo colaborativo, não pode haver somente concordâncias e tendências consensuais, correndo-se o risco de obtenção de resultados mais pobres. Surowiecki 1616 Surowiecki J. A sabedoria das multidões. Porto: Lua de Papel; 2007. afirma que a diversidade e a independência são importantes porque as melhores decisões coletivas são fruto de discordância e contestação, não de consenso ou acordo. O autor define quatro condições necessárias que devem ser levadas em conta ao atribuir a sabedoria aos coletivos: a diversidade de opiniões, em que cada indivíduo deve possuir uma vivência intelectual pessoal, nem que seja apenas uma interpretação individual; a independência, de forma a não deixar que as opiniões diversas determinem a sua opinião própria; a descentralização; e a agregação, na tentativa de unir as contribuições pessoais no sentido de chegar a uma decisão coletiva 1616 Surowiecki J. A sabedoria das multidões. Porto: Lua de Papel; 2007. .

A partir desses dados, quando avaliados globalmente, sugere-se para os membros do grupo que não baseiem sua conduta nas primeiras respostas rápidas, mas esperem o assunto maturar, em média, 193,21 min. Esse tempo pode parecer alto para aqueles que buscam uma resposta imediata, mas para aqueles que buscam a discussão de um caso em uma reunião clínica ou congresso e podem, portanto, esperar semanas é muito rápido.

A preocupação em auxiliar as condutas contribui para a formação de uma comunidade virtual, construída com base em afinidades e interesses. Nela, desenvolve-se um processo de cooperação 1717 Lévy P. Cibercultura: relatório para o Conselho da Europa no quadro do projecto “Novas Tecnologias: cooperação cultural e comunicação”. Lisboa: Instituto Piaget; 1997. , e novos conhecimentos públicos surgem e são compartilhados 1818 Murphy PK. The eye of the beholder: the interplay of social and cognitive components in change. Educ Psychol. 2007;42(1):41-53. http://dx.doi.org/10.1080/00461520709336917.
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O conceito de inteligência coletiva foi criado a partir de alguns debates realizados por Pierre Lévy relacionados às tecnologias da inteligência. Caracteriza-se pela nova forma de pensamento sustentável através de conexões sociais que se tornam viáveis pela utilização das redes abertas de computação da internet 11 Bembem AHC, Santos PLVAC. Inteligência coletiva: um olhar sobre a produção de Pierre Lévy. Perspect Cienc Inf. 2013;18(4):139-51. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-99362013000400010.
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. Em dois estudos com 699 pessoas, trabalhando em grupos, encontraram-se evidências convergentes de um fator geral de inteligência coletiva que explica o desempenho de um grupo. Este está fortemente correlacionado à maneira como os profissionais percebem as emoções dos outros membros do grupo (sensibilidade social), à igualdade na distribuição das opiniões e à proporção de mulheres no grupo, pois elas têm maior facilidade de lidar com as emoções de outras pessoas 1919 Woolley AW, Chabris CF, Pentland A, Hashmi N, Malone TW. Evidence for a collective intelligence factor in the performance of human groups. Science. 2010;330(6004):686-8. http://dx.doi.org/10.1126/science.1193147. PMid:20929725.
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. Ao contrário da inteligência artificial, na qual procura-se criar máquinas inteligentes para substituir as pessoas, a inteligência coletiva procura deixar as pessoas mais inteligentes 1919 Woolley AW, Chabris CF, Pentland A, Hashmi N, Malone TW. Evidence for a collective intelligence factor in the performance of human groups. Science. 2010;330(6004):686-8. http://dx.doi.org/10.1126/science.1193147. PMid:20929725.
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As tecnologias da inteligência são representadas especialmente pelas linguagens, sistemas de sinais, recursos lógicos e instrumentos dos quais nos servimos. Todo o nosso funcionamento intelectual é induzido por essas representações. Segundo o filósofo e sociólogo criador do conceito de inteligência coletiva, Pierre Lévy, os seres humanos são incapazes de pensar sós e sem o auxílio de qualquer ferramenta 11 Bembem AHC, Santos PLVAC. Inteligência coletiva: um olhar sobre a produção de Pierre Lévy. Perspect Cienc Inf. 2013;18(4):139-51. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-99362013000400010.
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Devido à grande incidência de dúvidas em casos clínicos, o Fórum Vascular mostrou-se uma ferramenta de grande valia clínica para seus participantes, confirmando a percepção indireta dos usuários do instrumento da importância da inteligência coletiva na área médica. Este estudo abre caminho para novas pesquisas que podem abordar o grau de evidência das respostas corretas e, assim, mensurar a assertividade da inteligência coletiva em grupos de discussão na resolução de casos clínicos.

A inteligência coletiva é uma forma de o homem pensar e compartilhar melhor seus conhecimentos com outras pessoas. Essa prática é utilizada na forma escrita nos livros, mas com a utilização de recursos mecânicos, como a internet, consegue-se aumentar a conectividade e transmitir de uma maneira mais rápida o conhecimento. Nela, os próprios usuários geram o conteúdo através da interatividade com o website11 Bembem AHC, Santos PLVAC. Inteligência coletiva: um olhar sobre a produção de Pierre Lévy. Perspect Cienc Inf. 2013;18(4):139-51. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-99362013000400010.
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CONCLUSÃO

A interação entre especialistas utilizando a tecnologia de troca de mensagens instantâneas mostrou-se capaz de levantar discussões e abordagens rapidamente. A resolutividade, considerada o tempo da primeira resposta correta, também foi alta.

AGRADECIMENTOS

Agradecimento a todos os colegas participantes do Fórum Vascular que, de maneira direta ou indireta, contribuem diariamente para a geração da inteligência vascular.

  • Fonte de financiamento: Nenhuma.
  • O estudo foi realizado no Amato - Instituto de Medicina Avançada, São Paulo, SP, Brasil.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Ago 2018
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2018

Histórico

  • Recebido
    02 Maio 2018
  • Aceito
    11 Jun 2018
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