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Um desenho institucional para o novo associativismo

An institutional design for the new associativism

Resumos

Apontam-se elementos de alteração no padrão do associativismo latino-americano e na auto-percepção dos participantes das associações civis. A partir dessa análise, sugere-se um modelo institucional que permitiria potencializar a contribuição desse novo associativismo para a democratização de práticas políticas que se geraram à sombra da debilidade histórica do associativismo civil.


Elements of change are pointed out in the pattern of Latin-american associativism and in the self-percetion of the participants in civil associations. Following this analysis an institutional model for this new associativism is sugested, regarding the contribution it could give to the democratization of political practices which developed on the shadow of the historical weakness of civil associativism.


GOVERNO & DIREITOS

Um desenho institucional para o novo associativismo

An institutional design for the new associativism

Leonardo Avritzer

Professor do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal de Minas Gerais

RESUMO

Apontam-se elementos de alteração no padrão do associativismo latino-americano e na auto-percepção dos participantes das associações civis. A partir dessa análise, sugere-se um modelo institucional que permitiria potencializar a contribuição desse novo associativismo para a democratização de práticas políticas que se geraram à sombra da debilidade histórica do associativismo civil.

ABSTRACT

Elements of change are pointed out in the pattern of Latin-american associativism and in the self-percetion of the participants in civil associations. Following this analysis an institutional model for this new associativism is sugested, regarding the contribution it could give to the democratization of political practices which developed on the shadow of the historical weakness of civil associativism.

Existe um consenso sobre terem-se completado os processos de transição para a democracia na América Latina. Tal consenso é justificado por um conjunto de fatores. Em primeiro lugar, o fato de que um número grande de países, como o Brasil, a Argentina e o Chile, já podem se encaixar no requisito das eleições regulares (O'Donnell & Schmitter, 1986). Em segundo lugar, podemos apontar o fato de que naqueles países nos quais ocorreram tentativas de ruptura com a ordem democrática — no caso, o Peru e a Venezuela — ou não foi possível instaurar um regime autoritário ou foi necessário reverter rapidamente a ruptura com a ordem política democrática em virtude de pressões tanto internas quanto externas. Em terceiro lugar, valeria a pena mencionar que até mesmo o octogenário regime mexicano, o regime autoritário mais antigo do mundo, tem feito reformas no sentido da ampliação da competitividade eleitoral (Aguaio, 1995; Olvera, 1994). Nesse sentido, é possível afirmar que suposição de Przeworski da existência de atores capazes de impor um veto sobre os resultados da livre competição no interior do sistema político (Przeworski, 1988 e 1991) não mais constitui parte das variáveis a serem assumidas pelos atores políticos. Por esse motivo um conjunto de autores passou a tratar daquilo que eles denominam "consolidação democrática" (Diamond 1995; O'Donnell, 1992; Przeworski 1995).

Na medida em que o caráter completo dos processos de transição para a democracia começa a se tornar consensual, toma-se bastante claro que as transições latino-americanas foram transições que mantiveram algumas das principais características da cultura e dos sistemas políticos da região. Dois fatos parecem corroborar tal afirmação:

1. A existência de uma altíssima continuidade no tocante aos indivíduos, aos partidos e às práticas políticas em praticamente todos os países latino-americanos. Fleisher (1987) mostrou que na Assembléia Nacional Constituinte brasileira havia mais deputados que haviam pertencido em algum momento ao partido representante do regime autoritário do que deputados pertencentes ao partido de oposição. Não é só no que se refere aos indivíduos que encontramos uma forte continuidade no nível político. Ela também pode ser percebida pela volta ao sistema de partidos políticos tradicionais no Uruguai, na Argentina e no Chile e na continuidade das práticas clientelistas nas relações entre Estado e sistema político (Auyero, 1995; Avritzer 1995a; Cammack 1991). Tais relações têm produzido uma rede invisível de relações entre o Estado e o sistema político, rede essa que produziu algumas das principais crises pelas quais as novas democracias latino-americanas passaram até o momento.

2. O segundo elemento da formação latino-americana que foi mantido e reforçado no decorrer das transições para a democracia foi o alto grau de desequilíbrio no poder dos diversos grupos na sociedade1 1 A idéia do equilíbrio societário está na base da concepção pluralista da democracia. Ela tem a sua origem no primeiro. Dahl que, já no Um prefácio à teoria democrática a utiliza. Em A Democracia e seus críticos Dahl descreve o impacto da desigualdade sobre a democracia da seguinte forma: "a desigualdade entre os cidadãos constitui um problema sério e constante em todos os países democráticos. A desigualdade de recursos políticos em posições estratégicas e na barganha implícita e aberta pelo poder são suficientemente grandes até mesmo nas sociedades democráticas de modo a conferir plausibilidade às teorias do controle [do poder L.A.] pela minoria". (Dahl, 1990:332). Mais recentemente, autores como Cohen e Rogers identificaram o princípio do equilíbrio societário com a idéia de justiça distributiva. Para eles, uma teoria democrática adequada deve incluir entre as suas preocupações "... a igualdade nas distribuições das vantagens [ econômicas]..." (Cohen, Joshua and Joel Rogers; 1995). Tal preocupação deve gerar medidas destinadas a equilibrar as vantagens econômicas geradas pelo mercado ou a garantir que tais desigualdades não gerem expectativas de vantagens desiguais ao nível político. . As novas democracias latino-americanas acentuaram uma distribuição desigual do poder através de dois tipos de ações: 1) por um lado, durante os processos de privatização, a redução do tamanho do Estado não implicou a tentativa de introdução de um fator de equilíbrio nas relações societárias. Pelo contrário, os processos de privatização têm sido caracterizados pela constituição de uma nova forma de desequilíbrio societário, na medida em que ou a preocupação com o equilíbrio inexiste ou o Estado privatiza suas empresas a partir do próprio modelo privatista de relação entre Estado e empresariado2 2 É importante perceber que os processos de privatização não têm necessariamente que assumir tal faceta. Especialmente no caso de alguns países da Europa do Leste e mesmo no caso inglês a privatização envolveu ou a distribuição de ações ou a sua pulverização. No entanto, na maior parte dos casos latino-americano a privatização implicou na concessão de descontos ou condições favoráveis a grupos econômicos conhecidos por sua proximidade com o Estado. Vide Schneider, B. "Lições da Privatização". Folha de S. Paulo, 19 de Agosto de 1990. . Existe ainda um segundo sentido de acordo com o qual as novas democracias latino-americanas não foram capazes de alterar a distribuição existente do poder societário que deriva da sua incapacidade de reverter o padrão existente de eficiência e de gastos na área social. Como é sabido (Draibe, 1989) tal padrão no caso de países como o Brasil é um padrão fragmentado e marcado pelo clientelismo, fazendo com que as políticas sociais se convertam muito mais em uma forma de reprodução das maquinas clientelistas3 3 Duas tentativas recentes de ruptura com as formas clientelistas de intermediação da distribuição de recursos sociais foram feitas no México e no Brasil. Trata-se do Programa Nacional de Solidariedad e do Programa Comunidade Solidária. Nos dois casos são consensuais as avaliações de que não foi possível romper com tais padrões. No caso do México devido á reação dos políticos tradicionais do P.R.I, que se revoltaram frente á possibilidade de constituição de uma base política não clientelista. (Vide Guillermo Prieto, Alma. 1996). No caso do Brasil, não está claro sequer se o objetivo de romper com os elos clientelistas foi efetivamente tentado. Artigo no jornal O Estado de São Paulo acerca da política de distribuição de alimentos do Programa Comunidade Solidária acusou o programa de "... ignorar o mapa da fome e inocentemente premiar [com suas ações] os municípios politicamente convenientes e não os mais necessitados do ponto de vista humano... Assim, 73% das cidades escolhidas para receber as salvadoras ações do "comunidade solidária" são redutos ou "feudos" a conquistar escolhidos pelos governadores eleitos em 1994." (16 de agosto de 1995). do que em um mecanismo efetivo de geração de equilibro societário. Nesse sentido, parece interessante perceber que as transições para a democracia, vistas sob a ótica da relação entre o Estado e o sistema político, implicaram a continuidade de elementos altamente problemáticos para o aprofundamente da democracia, tais como a falta de visibilidade na relação do Estado com grupos privados e a incapacidade da democracia de atuar no sentido de reverter um desequilíbrio societário patente.

Não é somente sob a ótica da relação entre Estado e sociedade política que a construção da democracia pode ser vista. Ela pode ser vista enquanto um processo de mudança na cultura política (Garreton, 1991; Moisés 1994; Sommers 1993); nas práticas sociais (Melucci, 1989; Tocqueville, 1966; Habermas, 1984)4 4 É importante ressaltar que enfatizar a dimensão da cultura política e das práticas sociais não implica estabelecer uma dicotomía entre as duas dimensões e a dimensão institucional como supõem Soares e Cheibub (1996). ; e nas formas de ação coletiva (Cohen & Arato, 1992; Melucci, 1989). É possível analisar os processos recentes de transição para a democracia na América Latina sob essa segunda ótica, tendo como parâmetro não apenas as mudanças na relação entre Estado e sistema político como também as mudanças no que se refere às atitudes e às práticas dos atores sociais. Um fenômeno merece destaque quando mudamos o foco da nossa análise da esfera do Estado para a esfera da sociedade: trata-se do assim chamado novo associativismo civil. O novo associativismo constitui um fenômeno formado por três componentes que podem aparecer juntos ou separados nos diferentes países da América Latina:

1. Em primeiro lugar, um aumento expressivo no número e no ritmo de constituição de associações civis em diversos países da América latina, países esses com pouca tradição anterior de associativismo. Nos casos de países como o Brasil e o México pode-se perceber um aumento expressivo no ritmo de constituição de associações civis (Landin, 1993; Santos, 1993; Tarrés, 1996) levando à alteração de uma tradição política caracterizada pela falta de densidade no espaço público.

2. Uma ruptura com um padrão homogeneizante de ação coletiva. Tal padrão, que predominou durante todo o período populista, teve como suposto uma concepção de ação coletiva que privilegia um tipo de ator — o movimento operário — e um objetivo para a sua ação: a integração desse ator na estrutura do Estado (Calderón, 1995; Garreton, 1991). O que se percebe a partir de meados dos anos 70, nas sociedades latino-americanas, é um movimento na direção da pluralização da ação social. Novos atores, entre os quais haveria que se destacar a classe média (Boschi, 1987b; Tarrés, 1994), e novos temas, entre os quais caberia destacar os direitos humanos, a ecologia e a questão do gênero e da raça, passam a constituir elementos centrais nas formas de ação coletiva e no motivo para a constituição de novas associações civis.

3. Ocorre também uma importante mudança na auto-concepção pelos atores das suas próprias ações. Parece bastante claro que a maior parte dos atores já não buscam a sua incorporação ao Estado (Oxhorn, 1995; Weffort, 1984) e nem a sua inserção acrítica em um mal definido setor popular. Ao mesmo tempo em que se percebe uma diferenciação dos objetivos buscados pelas diferentes associações civis percebe-se uma capacidade de atuar conjuntamente em questões específicas relacionadas com o aprofundamento da democracia. Tanto no caso do movimento pelo impeachment no Brasil (Avritzer, 1995a), quanto no caso da constituição da Aliança Cívica no México (Aguaio, 1995) pode-se perceber uma ação integrada dos grupos da sociedade civil na direção da maior visibilidade do sistema político.

É possível perceber que a completude do processo de transição para a democracia na América Latina envolve a análise de dois movimentos simultâneos: por um lado os problemas de longo prazo da formação cultural latino-americana continuam a determinar as práticas políticas no eixo Estado-sociedade política. Por outro, importantes transformações ocorreram no nível da sociedade, apontando na direção do pluralismo e da publicidade. A análise dessas mudanças e do possível papel de aprofundamento da democracia a ser jogado pelas associações civis será o objetivo da nossa discussão neste texto. Ele se dividirá em três partes. 1. Numa primeira parte pretendemos abordar a questão da debilidade histórica do associativismo civil latino-americano, atribuindo um duplo sentido à idéia de debilidade: essa se configuraria em virtude não só de um reduzido número de associações civis como também devido a uma auto-concepção problemática dos participantes das associações civis acerca do seu papel na estrutura social. A partir dessa dupla debilidade iremos explicar a "facilidade" do predomínio da proposta populista de homogeneização da ação coletiva e dos espaços públicos de participação. Em uma segunda parte, iremos caracterizar o processo recente de aumento no número e no ritmo de constituição de associações civis na América Latina e de mudança na auto-concepção dos atores acerca das suas formas de participação. O nosso argumento, nessa segunda parte, ira apontar na direção de uma renovação nos padrões de associativismo e na cultura política dos membros das associações civis. Na seção conclusiva desse trabalho pretendemos mostrar o papel que o novo associativismo civil pode jogar na superação dos elementos de continuidade que caracterizam a relação entre Estado e sociedade política na América Latina. Para isso, iremos propor um desenho institucional específico para a associações civis, desenho esse baseado na atribuição de status público a tais associações.

A DEBILIDADE ORIGINAL

O processo de formação das sociedades latino-americanas, tal como ele tem sido descrito pelos cientistas sociais da região, sofre de uma curiosa distorção. À medida em que a matriz mercado ou a matriz Estado se alternavam como variáveis explicativas centrais nas ciências sociais dos anos 70 e 80, os cientistas sociais latino-americanos foram propondo modelos teóricos baseados tanto na constituição tardia do mercado (Cardoso & Falleto, 1976) quanto na forte presença do Estado na região (Faoro, 1975; Véliz, 1980). O problema com essas duas matrizes reside na tendência a hiperdimensionar a variável explicativa em voga nas ciências sociais em um determinado momento, tentando deduzir a variável da organização societária ou da matriz mercado ou da matriz Estado. No caso da teoria da dependência, como bem assinalou Forment (1991) ela deduziu da dinâmica da economia a constituição de grupos e identidades políticas. Desse modo,"... uma mudança no preço mundial do petróleo, do cobre, ou do açúcar, produzia uma mudança correspondente nos interesses coletivos e identidades dos grupos." (Forment, 1991:44). Já no caso da chamada matriz estadocêntrica, ocorre algo diferente mas igualmente problemático, que é a suposição de uma invariabilidade na organização estatal, que se torna um "deux exmachina" explicativo, de acordo com o qual a sociedade é sempre solapada por uma matriz estatal determinante (Faoro, 1975; Schwartzman, 1975). O nosso objetivo, nessa primeira seção de caracterização da base de constituição da sociedade civil na América Latina, é evitar os equívocos de ambas as concepções, apontando de saída que a análise da debilidade do associativismo civil na América Latina não tem como objetivo propor uma terceira matriz explicativa capaz de substituir o Estado e o mercado enquanto variáveis explicativas, mas propor os elementos históricos determinadores de uma terceira esfera, que tem sido deixada de lado na análise da constituição da formação social latino-americana.

O ponto de partida para a análise do associativismo latino-americano é dado pelo momento de independência da região. Como é sabido (Guerra, 1988; Santos, 1977; Véliz, 1980), o liberalismo foi a ideologia inspiradora de todas as independências latino-americanas. No entanto, a caracterização de alguns elementos importantes das esferas pública e privada na América Latina no momento da independência é essencial para entender a parcialidade da adesão dos atores sociais da região ao liberalismo.

1. Em primeiro lugar, uma insuficiente separação entre a economia e a esfera privada5 5 Esse constitui um ponto que tem sido muito pouco destacado pela teoria democrática, que, no entanto, possui unta enorme importância no surgimento da democracia moderna. Ele foi, até agora, melhor destacado na Transformação estrutural da esfera pública onde Habermas mostra que a separação entre a casa e a fábrica enquanto espaços privados constitui precondição para a separação entre materialidade e intimidade. É na esfera da casa desvinculada de qualquer materialidade que irá surgir a subjetividade fundamento da crítica cultural e de uma esfera pública de iguais. Vide Habermas, Jürgen. 1989. . A unidade latino-americana de colonização consistiu em uma unidade agrícola na qual casa e economia estão intimamente associadas. As grandes unidades produtoras de açúcar, café e cacau ou de qualquer outro produto agrícola cíclico eram ao mesmo tempo unidades econômicas, formas de organização da esfera privada, e muitas vezes substituíam a próprias esfera pública na medida em que as festas populares se realizavam no interior das fazendas (Franco, 1974). Nesse sentido, a vida pública na América Latina não era constituída, ainda no começo do século XIX, por um local de reunião de homens livres. As grandes fazendas agrícolas, as células básicas de urna forma privada de socialização "... constituem centros populacionais mais importantes do que os povoados. Para aqueles que habitam o seu núcleo central e para os que residem na periferia... elas representam centros de intercâmbio, de exercício da religião, de festa, etc." (Guerra, 1988:134). Um primeiro fenômeno importante surge nesse processo, fenômeno esse derivado da própria forma de desenvolvimento econômico e, no entanto, ignorado pelos teóricos da dependência: trata-se da constituição de uma esfera privada hierárquica e materializada, esfera privada essa que, no momento da independência, não pode se constituir como base para uma esfera pública de homens iguais.

2. Existe um segundo elemento importante para o entendimento do liberalismo latino-americano, que é a caracterização do tipo de associativismo existente na região no momento da independência. No caso do Brasil, o associativismo existente no período pré-independência foi um associativismo de natureza eminentemente religiosa (Landin, 1993) no qual se destacavam as Santas Casas da Misericórdia e as irmandade religiosas. As Santas Casas se encarregavam de atividades de solidariedade social, tais como a alimentação dos necessitados, o cuidado com os doentes, o abrigo dos viajantes (Boxer, 1965). No entanto, a estrutura organizacional das Santas Casas era totalmente homogeneizadora. Elas requeriam a comprovação da pureza sangüínea, da situação econômica e dos antecedentes religiosos dos seus associados (Boxer, 1965:319). Desse modo, a primeira matriz do associativismo colonial latino-americano6 6 O fenômeno das Santas Casas e da proliferação de irmandades leigas foi mais importante no Brasil do que na América Hispânica. Houve, no caso da América Hispânica um decisão semelhante a da coroa portuguesa de não se responsabilizar com a prestação de serviços sociais. No entanto, não houve um associativismo de base religiosa se encarregando de tal tarefa. O papel desempenhado pelas Santas Casas no Brasil, foi, no caso da América Hispânica, executado pela própria igreja (Russel-Wood, A. J. 1968). era homogeneizante e não poderia haver se constituído na base de um processo de pluralização social. A segunda matriz do associativismo colonial, também mais forte no Brasil do que na América Hispânica, foi a proliferação de irmandade leigas no Brasil, especialmente na região de Minas Gerais, durante o século XVIII (Boschi, 1986). Tais irmandades, que tiveram o objetivo de contornar a proibição de entrada das ordens religiosas nas regiões auríferas, se caracterizaram por congregar pessoas que haviam eleito um santo padroeiro comum. "Elas cumpriam a importante função histórica de serem um veículo... talvez o único de que a população em geral dispunha... para se manifestar com relativa liberdade e autonomia."(Boschi, 1986:68). Por um lado, as irmandade representaram um avanço em relação ao associativismo característico das Santas Casas na medida em que havia irmandades de escravos, superando, portanto, a homogeneização racial. Por outro, os diferentes grupos que se associavam nas irmandade tinham como limite para a sua autonomia, as limitações de uma sociedade homogênea do ponto de vista religioso.

3. Existe um terceiro elemento decisivo na debilidade do associativismo latino-americano no momento da independência que é a forma assumida pelas lojas maçônicas na região. Como é sabido (Koselleck, 1988), as lojas maçônicas cumpriram três tipos de papéis diferentes nas sociedades européias: 1) elas constituíram uma forma de associativismo que rompeu com a identidade medieval entre estamento e organização (Guerra, 1988); 2) elas romperam com o pressuposto religioso do associativismo ao transformar a laicidade em critério para a adesão; 3) elas constituíram uma reação à tentativa do absolutismo de romper com as formas intermediárias de associação entre o indivíduo e o Estado características das sociedades pré-modernas. As primeiras lojas maçônicas na América Latina surgiram no Peru em 1755, no México em 1785 (Guerra, 1988) e no Rio de Janeiro em 1815 (Mello Moraes, 1982). No entanto, a maçonaria, seja na América Hispânica seja na América Portuguesa, não representou uma tentativa efetiva de ruptura com os padrões tradicionais de associativismo. "Tanto a maçonaria mexicana quanto a maçonaria brasileira pretenderam conciliar maçonaria e religião" (Guerra, 1988; Mello Moraes, 1982). A maçonaria brasileira não foi, tampouco, capaz de romper com a monarquia e chegou a chamar o próprio imperador para presidi-la (Oliveira Lima, 1989). É possível afirmar que a maçonaria constitui um primeiro caso de imitação institucional através da qual instituições societárias representantes de um padrão moderno de associativismo emergem na América Latina, mas a ação dos seus participantes não se pauta por um padrão laico e pluralista.

4. Um quarto elemento foi determinante no tipo de liberalismo que surgiu nas sociedades latino-americanas pós-independência: a tendência a não enfrentar as diferenças culturais entre as sociedades latino-americanas e norte-americanas, propondo a adoção de instituições políticas praticamente idênticas àquelas existentes na América do Norte. Tocqueville em Democracia na América descreveu a forma de manifestação desse fenômeno no México: "Os mexicanos, almejando estabelecer um sistema federal, tomaram emprestada a constituição do seu vizinho anglo-saxão e a copiaram quase integralmente. Mas, apesar de copiar a letra da lei, eles não puderam a mesmo tempo transferir o espírito que lhe deu vida" (Tocqueville, 1966:165).

O fenômeno descrito por Tocqueville se aplica à quase totalidade dos países latino-americanos. Quase todos os países latino-americanos adotaram, no momento da sua independência, o marco constitucional liberal: as Províncias do Rio da Prata o adotaram ainda na segunda década do século XIX, a Grã-Colômbia o fez em 1822, o México e o Brasil em 1824, No entanto, à adoção do liberalismo se segue uma reação centralista que leva Rosas ao poder na Argentina, ao segundo Império no Brasil, à reação centralizadora liderada por Bolívar na Grã-Colômbia e à promulgação da constituição centralista de Santa Ana no México (Véliz, 1980). Nesse sentido, aquilo que tem sido apresentado pela literatura estadocêntrica como a reação centralista do período pós-independência na América Latina não deve ser entendido apenas a partir da variável Estado e sim a partir da relação entre Estado e sociedade, na qual a debilidade da variável sociedade aparece com componentes próprios. A sociedade latino-americana, no momento da independência, é débil devido às próprias concepções dos atores acerca das suas formas de ação, concepções essas marcadas pelas formas específicas de organização societária prevalecentes naquele momento. Será apenas a partir da segunda metade do século XIX que ocorrerão os primeiros indícios de constituição de um associativismo civil débil porém baseado em formas modernas de ação.

A partir de 1850 ocorrem, no conjunto dos países latino-americanos uma série de transformações que serão responsáveis pelos primeiros momentos que nós poderíamos denominar de societários. Entre essas transformações caberia destacar o aceleramento da urbanização e da imigração no caso dos países do Cone Sul. O crescimento de cidades como Buenos Aires, Rio de Janeiro, São Paulo e Cidade do México é aceleradíssimo. O Rio de Janeiro praticamente dobra a sua população entre 1872 e 1890 (Hahner, 1986). São Paulo tem a sua população multiplicada em mais de sete vezes entre 1872 e 1900 (Hahner, 1986). Crescimento semelhante pode ser encontrado nas principais cidades da América Hispânica. No caso da cidade de Buenos Aires tal crescimento começa ainda na segunda metade dos anos 50 do século passado, quando a cidade contava com pouco mais de 90.000 habitantes. Em 1887 a população da cidade já havia ultrapassado a marca dos 400.000 habitantes (Sábato, 1992). Ainda que não apresentando um crescimento tão explosivo, a população da cidade do México ira crescer 36% durante os 15 primeiros anos do porfiriato (Guerra, 1988). O importante, no entanto, é perceber que o processo acelerado de urbanização pelo qual os principais países latino-americanos estão passando no final do século XIX constitui, ao mesmo tempo, um processo acelerado de mudanças no perfil da população. No caso do Brasil ocorre uma diminuição significativa no peso da população escrava, ao mesmo tempo em que aumenta o número de imigrantes (Hahner, 1986; Morse, 1975). O número de imigrantes é ainda maior em Buenos Aires, onde três entre quatro homens adultos eram imigrantes entre 1850 e 1870 (Sábato, 1992). Mudanças importantes também ocorrem na estrutura ocupacional da população de Buenos Aires, onde 34% da população já se dedicavam a atividades industriais em 1895 (Gutman, 1992). Mesmo no caso da Cidade do México, onde as transformações foram mais lentas, ocorre no final do século um significativo processo de imigração interna, com o crescimento das cidades de porte médio e diminuição da parcela da população dedicada a atividades agrícolas (Guerra, 1988: vol 1: 357). É a partir das transformações acima descritas que pretendemos analisar as inovações e as continuidades no associativismo de fim de século na América latina, especialmente, no Brasil e no México.

No caso do Brasil, o primeiro movimento que representou o surgimento de um esfera societária foi o abolicionismo. A partir da década de sessenta do século passado começaram a ser criados clubes abolicionistas no Rio de Janeiro, em Ouro Preto e em Recife (Toplin, 1971). As características desses clubes apontam na direção das modernas associações civis: eles realizaram as primeiras manifestações públicas da história do país (Nabuco, 1976), foram os primeiros clubes a admitir a participação das mulheres e constituíram, também, o primeiro momento de utilização da imprensa para a realização de discussões com conteúdo moral na esfera pública. No entanto, o interessante em relação ao abolicionismo é que ele parece ter sido o primeiro issue oriented movement da historia do Brasil. Com efeito, a análise do tipo de associações civis existentes no Rio de Janeiro nas décadas de 70, 80, e 90 demonstra o baixíssimo impacto institucional do movimento abolicionista7 7 Hahner (1986) identifica um clube abolicionista que teria dado origem a uma associação de ajuda mútua. (vide tabela abaixo):

As associações voluntárias criadas no Rio de Janeiro no fim do século foram de três tipos: um primeiro tipo, ainda forte na década de 70, foi o associativismo religioso. As irmandades continuavam representando a fonte mais importante de associativismo, com todas as conseqüências em termos de hierarquia e de restrição à livre entrada já abordadas acima. Em segundo lugar, pode-se perceber um segundo tipo de associativismo, representado pelas associações de ajuda mútua. Essas associações, constituídas por brasileiros e imigrantes, incluíam entre os seus objetivos a previdência dos seus filiados. Rapidamente, no entanto, as associações de ajuda mútua se consolidaram em um reduzido número de associações com um largo contingente de filiados. De acordo com o censo de associações feito no Rio de Janeiro em 1912, a cidade contava naquele momento com 554.109 habitantes, dentre os quais 280.000 indivíduos eram membros de associações voluntárias (Hahner; 1986:240-1). Se tal dado nos permite, certamente, apontar para a influência das formas de vida associativas na cidade, não podemos, no entanto, deixar de apontar duas debilidade na forma específica assumida pela vida associativa na cidade do Rio de Janeiro: 1) as irmandades religiosas possuem 65.000 membros, ou seja, representam quase 25% de todos os associados; 2) algumas poucas associações, dentre as quais a Sociedade de Beneficência Portuguesa, com 40.384 membros, concentravam a maior parte dos indivíduos associados (Conniff, 1975). Desse modo, uma dupla debilidade permeia o associativismo brasileiro de fim de século: por um lado ele surge ainda marcado por um forte componente religioso e, pelo outro, começa a se homogeneizar, como um associativismo sindical constituído por poucos atores e associações, antes que houvesse tido a chance de se pluralizar. Ou seja, a pluralidade e a autonomia em relação ao Estado não chegam a se firmar no associativismo brasileiro de fim de século.

Existe um segundo caso de proliferação de um associativismo de fim de século na América Latina, que é o mexicano8 8 Os casos brasileiro e mexicano não esgotam o conjunto dos movimentos associativos do fim do século passado na América latina. Para uma análise empírica mais exaustiva haveria que incluir o caso argentino. No entanto, esse constitui o caso com menos dados empíricos disponíveis. Algumas evidências existem em relação ao associativismo argentino do século passado. A forma principal de associativismo existente em Buenos Aires na segunda metade do século foram as sociedades de ajuda mútua que proliferaram entre as comunidades de imigrantes, em especial entre os imigrantes italianos Vide: Baila, Samuel, 1982. "Las sociedades de ayuda mutua y el desarollo de una comunidad italiana en Buenos Aires 1858-1918", Desarrollo Economico vol 21 (nº 84). A interrupção do movimento associativo argentino no século XX deve ser atribuída ao rápido desenvolvimento de uma dinâmica amigo/inimigo na sociedade política favorecendo a concentração de forças e a homogeneização no âmbito da sociedade civil. . Surgem em diversas regiões do México, especialmente em São Luís Potosí, um conjunto de clubes liberais em torno da virada do século. Tais clubes, que floresceram em pequenas cidades do estado de Potosi, se organizaram com o objetivo de resgatar os valores e as práticas liberais deixados de lado pelo porfiriato. Os freqüentadores dos clubes liberais eram professores, estudantes e profissionais liberais em geral (Guerra, 1988 II:21). Defendia-se, nas reuniões dos clubes liberais, o anti-clericalismo, o anti-reelecionismo, assim como a liberdade de imprensa e a difusão de uma educação cívica. Os clubes liberais se expandem de Potosi para outras regiões até se instalarem na Cidade do México, onde, em 1903, é fundado o Club Pociano Arriaga. Duas características dos clubes liberais devem ser ressaltadas: a primeira é que eles jamais deixam de ser expressão das querelas intra-elites; o segundo, e provavelmente mais importante, é que rapidamente os clubes são reprimidos, passam a se organizar secretamente e realizam uma transição perversa da ocupação plural do espaço público para a organização secreta e a solução de divergências mediante o uso da violência (Knight, 1986). Nesse sentido, é possível analisar o associativismo do começo do século XX no México como um associativismo plural incipiente, que acaba se subordinando aos conflitos militares da sociedade política.

A tese da debilidade histórica do associativismo civil latino-americano pode ser demonstrada a partir da analise de casos distintos: o brasileiro, no qual o associativismo é ainda marcado pela força do associativismo religioso com origem no período colonial, e que transita para a homogeneização corporativa antes de se tomar verdadeiramente plural, e o argentino, no qual o mutualismo e a utilização da imprensa em uma esfera pública plural acabam subordinadas à lógica amigo/inimigo na esfera política. Tal lógica acaba implicando uma forte homegeneização do que, apesar dos dados precários, parece haver sido a forma de vida associativa mais forte do fim de século latino-americano. E, por fim, o caso mexicano, que seria o caso mais complicado, no qual o associativismo civil não deixa jamais de se constituir em uma forma adicional de disputa no interior de um espaço político não pacificado. Nesse sentido, os clubes são muito mais precursores dos grupos que irão se enfrentar militarmente do que de um espaço civil plural e democrático. Em todos os três casos analisados o associativismo termina por conduzir à formas de homogeneização do espaço público, um modelo no qual a esfera societária aparece como constituída por interesses idênticos e/ou indiferenciados representados no assim chamado setor "popular". De acordo com esse modelo, a ação social se reduz a dois atores, os trabalhadores e os camponeses, e a forma por excelência da ação coletiva constitui a ação partidária visando a integração no Estado. Esse constitui o modelo de ação coletiva que ira prevalecer na América Latina durante todo o período populista e que, diferentemente do suposto pelas teorias estado-cêntricas ou mercadocêntricas, tem a sua origem na própria debilidade da sociedade, tal como procuramos demonstrar nesse seção.

O NOVO ASSOCIATIVISMO

A partir de meados dos anos 70 ocorrem mudanças importantes na arena societária nos principais países latino-americanos. Essas mudanças indicam a ruptura tanto com o padrão homogeneizador de ação coletiva, que prevaleceu em países tais como o Brasil, o México e Argentina desde meados dos anos 30 (Calderón, 1995), quanto com o baixo ritmo de constituição de associações civis, que foi, tal como apontamos acima, um dos componentes da debilidade histórica do associativismo latino-americano. Quatro fenômenos caracterizariam essa mudança no padrão de ação coletiva.

1. Uma significativa redução da influência da vida sindical nas formas de ação coletiva, um fenômeno denominado substituição da funcionalidade pela territorialidade (Oxhorn, 1995)9 9 É importante diferenciar a forma como esse fenômeno ocorre na América Latina da forma como ele ocorre nos países da Europa ocidental e nos Estados Unidos. Em ambos os casos existem análises que apontam tanto para a diminuição da importância do trabalho (Offe, Claus: 1984). Como para a diminuição da importância do sindicalismo (Galbraith). No entanto, o sindicalismo, especialmente no caso do mundo anglo-saxão, jamais chegou a ter a influência nas formas de associativismo e de ação coletiva que ele teve nos países da América Latina. Em segundo lugar, mesmo nos países europeus que participaram dos chamados arranjos corporativistas jamais houve, no período do pós-guerra, uma perda da autonomia do movimento sindical semelhante á ocorrida na América latina. Nesse sentido, três fenômenos latino-americanos são completamente únicos em uma perspectiva comparada: o aumento no ritmo de constituição de associações civis, a centralidade da concepção de autonomia social e a rapidez da perda de influência do sindicalismo. Gostaria de agradecer ao prof. Alberto Olvera pelos comentários que resultaram nessas observações. . Na verdade, tal fenômeno deve ser melhor especificado de país para país. No caso de países como a Argentina o peso global do movimento sindical foi reduzido e substituído por outros movimentos formadores de opinião, tais como os movimentos de direitos humanos (Mainwaring e Viola, 1984) ou movimentos formados por identidades locais. Ha um segundo caso, que é o brasileiro, no qual houve uma renovação significativa das práticas do movimento sindical (Alves 1985; Sader 1988; Telles, 1984). Ainda assim, o sindicalismo tem uma influência reduzida nas questões ligadas à cidadania, o que demostra a sua transformação em uma das formas possíveis de ação coletiva. Existe um terceiro caso, que é o do México, no qual o sindicalismo foi e continua sendo muito mais uma forma de inserção no Estado do que uma forma de ação coletiva (Zapata; 1994). Nesse sentido, a emergência de movimentos sociais autônomos em relação ao Estado passa completamente ao largo do movimento sindical.

2. Existe uma segunda mudança no padrão de ação coletiva, ligada à construção de solidariedades locais. Os diferentes regimes autoritários latino-americanos, ao se desresponsabilizarem pela questão social e diminuírem os direitos e os serviços sociais aos quais a população tinha acesso, contribuíram para a proliferação de um conjunto de práticas de auto-ajuda, introduzidas tanto por movimentos sociais quanto por associações civis. Ambas re-trabalharam o conteúdo da ação coletiva, que passou a estar ligada à construção, no nível local, da idéia da comunidade como autônoma e solidária. Um conjunto de novas práticas e de novas formas associativas estão ligadas a essas mudanças (Escobar, 1992; Oxhorn, 1995). Entre elas valeria a pena destacar movimentos de cozinhas coletivas, formas de mutirão para a construção de casas e equipamentos coletivos (Hirshman, 1984).

3. É interessante apontar um terceiro elemento que contribuiu para a pluralização das formas de ação coletiva. Trata-se da classe média, e da sua ruptura com a idéia de participação em algo que poderia ser definido como o setor popular (O'Donnell & Schmitter, 1986). A partir de meados dos anos 70 podemos identificar setores de classe média atuando coletivamente na esfera pública e apresentando as suas próprias reivindicações, levando à constituição de um conjunto de movimentos culturais (Brachet-Marquez, 1994; Mainwaring & Viola 1984; Tarrés, 1996), um conjunto de movimentos corporativos e também um conjunto de associações comunitárias locais (Boschi, 1987b). Desse modo, duas importantes mudanças ocorrem no padrão de ação coletiva na América Latina: rompe-se com a idéia da ação coletiva indiferenciada e passa a haver a idéia de um espaço público plural, no qual a identidade entre os atores sociais passa a ser formal.

4. Existe ainda uma quarta mudança no padrão de ação coletiva na América Latina: trata-se do surgimento de um conjunto de associações temáticas. A partir de meados dos anos 70 surgem os chamados grupos de direitos humanos. A partir dos anos 80 as organizações temáticas se estendem na direção dos grupos ecológicos (Scherer-Warren, 1995) e associações constituídas em tomo da questão de gênero (Alvarez 1990; Tarrés 1996). Essa última mudança no padrão de ação coletiva aponta na direção não apenas da pluralização dos atores sociais como também dos temas articuladores da ação coletiva.

É interessante perceber que não se trata apenas do surgimento de um conjunto de novos atores no espaço público, mas trata-se também de urna forma completamente distinta de ocupação do espaço público. A forma de ação coletiva que surge na América Latina a partir dos anos 70 rompe com duas das suas características mais limitantes no fim do século e no período populista. Em primeiro lugar, com a tendência à constituição de grupos cada vez mais amplos, nos quais a representação de interesses e a constituição de solidariedade aparecem imediatamente ligadas. Tal como apontamos na seção anterior, as associações de ajuda mútua representaram um padrão de ação coletiva no qual o desenvolvimento da solidariedade social implicava imediatamente o desenvolvimento de organizações com tendência à homogeneização dos interesses representados. A solidariedade acabou se diluindo em organizações representativas de um interesse genérico de classe e uma identidade genérica de povo. Ambos os fatores levaram à incompatibilidade entre associativismo e pluralização. A primeira importante ruptura que ocorre nos anos 70 situa-se no nível do sistema corporativo de representação de interesses. Ele perde a sua característica diluidora das demais formas de ação, o que irá permitir a multiplicação das formas societárias de solidariedade. Recupera-se, assim, um itinerário de pluralização que se iniciou com as associações de ajuda mútua e foi interrompido antes que ele pudesse gerar um associativismo verdadeiramente plural.

Há um segundo contraste importante de ser traçado, que diz respeito à pluralidade de atores e de temas. O associativismo do fim de século foi marcado por dois traços homogeneizadores. Em primeiro lugar, especialmente no caso do Brasil, a forte influência de um associativismo de fundo religioso impediu que as instâncias de solidariedade se convertessem em fonte de pluralidade. Em segundo lugar, nos casos do México, da Argentina e do Brasil, existiram diferentes motivos que impediram a pluralização do associativismo, fosse a estrutura marcadamente étnica das associações de ajuda mútua (Baily, 1982; Hahner, 1986) que impediu a pluralização das associações populares, fosse a não pacificação do espaço público, que impediu a pluralização dos clubes liberais, nos quais podia-se notar a presença de uma classe média incipiente. Ocorre, no caso do novo associativismo latino-americano, uma evidente ruptura com os dois elementos mencionados acima. Por um lado e em contraste com os períodos anteriores, a forte influência da Igreja Católica nessa forma de associativismo (Casanova 1994; Oxhorn, 1995; Sader, 1988), não resultou em homogeneização. A Igreja altera a forma como ela entende a participação: ela já não pretende incentivar associações ligadas à sua hierarquia e sim incentivar a autonomia dos próprios atores sociais. Nesse sentido, a base religiosa do novo associativismo deixa de ser contraditória com a pluralização do espaço social. Existe uma mudança adicional que diz respeito à forma assumida pelo associativismo de classe média. Especialmente nos países do Cone Sul da América Latina, a participação política da classe média deixa de estar vinculada à tentativa de mudança das regras do jogo político e passa a constituir efetivamente uma forma plural de ação. As associações de classe média passam a representar ou interesses específicos ou temas específicos dentro da agenda política. As características acima mencionadas implicaram uma importante mudança no padrão de ação coletiva e na forma de ocupação do espaço público, que assumiram formas distintas nos diferentes países. Analisaremos dois casos, o do Brasil e do México, que são os países para os quais existem mais dados disponíveis sobre o novo associativismo.

No caso do Brasil, dois fenômenos marcam o novo associativismo: a substituição da funcionalidade pela territorialidade (Oxhon, 1995) e a pluralização das formas de ocupação dos espaço público. O primeiro fenômeno está ligado à expansão do associativismo comunitário nas principais cidades do Sudeste do país. Essa expansão tem como resultado o aumento no ritmo de constituição de associações comunitárias, como nos mostra a tabela abaixo:

Existem dois outros casos que vale a pena mencionar: o das associações de profissionais liberais e o das associações organizadas tematicamente. Os dados em relação ao número de associações de profissionais mostram que quase todas foram criadas no período pós-1970. De acordo com Santos (1993), na cidade de São Paulo 92,5% das associações de profissionais de saúde, 88,11% das de advogados, 81,8% das de professores e 79,1% das de artistas foram criadas depois de 1970. Na cidade do Rio de Janeiro, 83% das associações de profissionais de saúde, 76,2 das de advogados, 66,7 das de médicos também foram criadas depois de 1970. Não é somente a pluralidade de novos atores de classe média que impressiona no caso brasileiro. Chama também a atenção o número significativo de associações civis articuladas em torno de temas tais como os direitos humanos, os direitos da mulher e a ecologia10 10 Não existem dados completos sobre o numero de associações temáticas no Brasil. A única fonte disponível é o catálogo da ABONG, que lista 21 associações de direitos humanos, 14 feministas e seis organizações ecológicas, um dado que não reflete o numero de associações existentes, uma vez que os dados disponíveis da Prefeitura de Belo Horizonte indicam a existência de 54 organizações femininas, 34 organizações ecológicas e 7 organizações de direitos humanos na cidade. Vide Landim, 1996. . Tais associações mostram que o processo de pluralização da ação coletiva envolve não apenas a constituição de formas de solidariedade a partir da identificação com certo espaço físico cultural mas também a construção de uma identidade a partir da identificação de uma condição comum (gênero) ou de um valor inegociável (direitos humanos ou ecologia).

É possível, portanto, notar a partir dos dados acima apresentados que ocorre, no caso do Brasil, uma mudança significativa nas formas de ação coletiva e de ocupação do espaço público. Ocorre em primeiro lugar um processo de socialização a partir de baixo, um processo cujo significado principal consiste na ocupação plural do espaço societário por um conjunto diversificado de atores e associações (Rosanvallon, 1988). Os atores coletivos ocupam o espaço público, criando um pólo distinto da sociedade política para a satisfação das necessidades e para a constituição de novas identidades. No entanto, esse espaço pluralizado possui apenas duas formas de relação com a sociedade política: ou uma divisão do trabalho no qual o espaço societário e o espaço político se dissociam, ficando a representação a cargo da sociedade política, ou uma estrutura de campanha que expressa um poder de veto último da sociedade civil sobre a sociedade política. Desse modo, se por um lado o caso brasileiro expressa muito bem um aspecto do novo associativismo latino-americano, que é a ocupação plural do espaço público, por outro lado ele deixa a desejar no tocante às formas de equilibrio no interior do espaço societário e na relação entre os atores sociais e o sistema político. Em ambos os casos prevalece ou uma ocupação do espaço público pela sociedade política ou uma inserção seletiva de associações no Estado, associações essas que adquirem um status semi-público atribuído pela própria sociedade política11 11 Um exemplo recente da forma problemática de utilização dos conceitos de sociedade civil e de autonomia societária pode ser visto na proposta de reforma do Estado no Brasil proposta por Luís Carlos Bresser Pereira. Tal reforma pretende transformar instituições estatais, tais como hospitais públicos e universidades, em instituições pára-estatais e para tanto, as denomina de instituições da sociedade civil. Tal proposta não passa de uma nova tentativa de fusão entre Estado e sociedade civil. . Em ambos os casos é necessário apontar um hiato entre as formas de ocupação do espaço público e as formas de legalização da vida associativa e da relação entre sociedade civil e sociedade política, uma questão à qual voltaremos na seção conclusiva desse artigo. Antes porém, iremos analisar o padrão de renovação da ação coletiva no México.

O México também um constitui um caso no qual ocorre uma importante ruptura no padrão histórico de ação coletiva, provocada por três importantes elementos: movimentos sociais urbanos que apontam na direção da constituição de identidades independentes do Estado; aumento da propensão participativa da classe média, levando à pluralização do espaço público e formação de uma coordenação de associações civis, que passam a adotar uma atitude de controle das relações entre Estado e sociedade política. Permitam-me abordar em detalhes cada um dos movimentos acima mencionados.

O surgimento de movimentos sociais urbanos pode ser remetido a dois fatos que marcaram profundamente a história do país: a crise econômica de 1982 e o terremoto ocorrido na cidade do México em 1985. Desde 1982 setores da população da cidade do México passaram a se mobilizar em torno de questões tais como o acesso a moradias e aos serviços associados à ocupação de novas áreas urbanas. No entanto, é a partir de 1985 que se pode perceber uma importante mudança na auto-compreensão dos atores urbanos acerca das suas próprias ações (Dias-Barriga, 1996; 01-vera, 1994a). A incapacidade do governo de responder às demandas da população acabou levando a um movimento de auto-organização das vítimas do terremoto, movimento esse que conferiu uma grande ênfase à organização autônoma da população carente em relação às estruturas do Estado. Esse movimento reforça entidades autônomas porém fracas, tais como a Conamup (Confederação Nacional del Movimiento Obrero Popular) e a Crmup (Coordinadora Nacional dei Vale de México), organizações essas que nos seus próprios atos de fundação já haviam postulado sua autonomia em relação ao Estado mexicano (Bennett, 1992:250-251). Temos assim, no caso mexicano, um primeiro momento de ruptura com a concepção populista de homogeneização da ação coletiva através da constituição da identidade de habitante da cidade.

Existe uma segunda fonte de ruptura com o padrão populista de homogeneização da ação coletiva, que se dá tanto pela entrada de atores de classe média na cena política quanto pelo aparecimento de associações temáticas.Grupos cuja identidade se origina no nível local passam a caracterizar uma classe média, que organiza as suas próprias reivindicações entendendo-as fora do marco tradicional da organização do popular. Tal movimento se coaduna, como no caso do Brasil, com uma significativo aumento no ritmo de constituição de associações civis e de pluralização dos temas com os quais essas associações lidam. O ritmo de constituição de associações de direitos humanos no México entre as décadas de 80 e 90 multiplica-se mais de 50 vezes. Fenômeno semelhante ocorre com as associações de defesa dos direitos da mulher, cujo ritmo de constituição se multiplica por dez (vide tabela abaixo):

A análise do novo associativismo mexicano aponta na direção de uma importante ambigüidade. Ainda que as formas de associativismo sejam débeis quando comparamos o seu número com o número de associações civis existentes no Brasil, elas conseguiram desempenhar um papel de controle das práticas vigentes no nível da sociedade política mediante o estabelecimento de entidades de coordenação, tais como a Aliança Cívical (Aguaio, 1995).No entanto, tais formas adquirem a sua legitimidade muito mais em virtude do caráter semi-autoritário do regime mexicano do que da possibilidade de atribuir um status público a instituições como a Aliança Cívica. Desse modo, a análise do associativismo mexicano, assim como o do brasileiro, aponta no sentido de uma ruptura parcial com a tradição política dominante na América Latina. Se, por um lado, é possível demonstrar, tal como fizemos nessa seção, que existe um padrão de renovação na dimensão societária, por outro lado somos obrigados a reconhecer que as associações civis ainda não conseguiram adquirir um status público que lhes permitisse efetivamente atuar na superação do problema de formação política detectado na primeira seção desse trabalho, qual seja, de um processo de formação de uma arena societária débil. Se, a partir dos anos 80, passa a existir uma esfera societária de associações civis, essa esfera não consegue influenciar suficientemente os processos de democratização de forma a contribuir na superação de problemas históricos, como o privatismo, a falta de visibilidade e a falta de equilíbrio entre os diferentes grupos societários. Nesse sentido, pode-se perceber um problema político que se transforma em um problema institucional: como conciliar a legitimidade adquirida pelas associações civis, legitimidade essa que decorre do papel positivo desempenhado por essas associações na esfera pública, com um status público que lhes permita desempenhar continuamente um papel que tem sido desempenhado topicamente em campanhas? (Avritzer, 1994). Na seção final desse trabalho pretendemos abordar essa questão a partir do marco estabelecido na sua seção inicial, qual seja, o do aprofundamento da democracia.

O STATUS PUBLICAMENTE ATRIBUIDO

Nas duas seções anteriores foi demonstrada uma importante mudança no padrão histórico de associativismo civil na América Latina. Duas rupturas simultâneas ao processo recente de redemocratização foram abordadas: a ruptura com um padrão homogeneizador da ação coletiva e o aumento no ritmo, no número e nos tipos de associações existentes. No entanto, tal como foi abordado ainda na introdução a esse artigo, a mudança significativa na forma de ocupação do espaço púbico e na própria cultura associativa existente na região não implica a incorporação desse novo padrão pela sociedade política. Pelo contrário, existe unia ampla bibliografia demonstrando a continuidade de práticas no nível da sociedade política na América Latina (Avritzer, 1995a; Cammack 1991; Hagopian, 1993; Mainwaring, 1991). Tal continuidade se expressa nos seguintes elementos: 1) na falta de visibilidade na relação entre o Estado e os grandes grupos econômicos, que se acentua ao invés de diminuir no momento em que se coloca na agenda política a diminuição do tamanho do Estado; 2) como elemento adicional, o efeito das relações entre o Estado, a sociedade política e os grupos econômicos no equilibro societário. Não é apenas o priviliegiamento de grande grupos econômicos que se constitui em fonte de desequilíbrio societário mas também a incapacidade do Estado e da sociedade política de renovarem as práticas de implementação de políticas sociais impedindo que o Estado se constitua em corretor dos desequilíbrios promovidos pelo próprio funcionamento do mercado.

É interessante, no entanto, notar que crescentemente as associações civis têm procurando atuar justamente nas duas áreas mencionadas, a da visibilização dos mecanismos privados de poder no âmbito da esfera pública e a da implementação, em parcerias com o Estado ou com agências internacionais de financiamento, de modelos mais eficientes de políticas sociais. Em ambos os casos a conseqüência consiste em um aumento significativo de associações civis lidando com ambas as questões. No entanto, o fato das associações civis se envolverem em políticas capazes de contribuir seja para a visibilização do exercício do poder, seja para o reequilíbrio social, está limitado devido à inexistência de uma forma de legitimação dessas atividades, que podem, em última instância ter o caracter representativo questionado, ou serem reduzidas a iniciativas isoladas por setores da própria sociedade política ou podem, simplesmente, representar uma forma de privatização travestida de publicização. Pode-se, portanto, perceber que existe um duplo impasse no vazio institucional-legal no qual as associações da sociedade civil têm atuado. A primeira dimensão desse impasse reside na própria forma organizativa das associações civis. Por um lado, membros das associações civis estão mais próximos da opinião pública e participam ativamente de formas de controle da sociedade política, seja através de campanhas, seja através de mecanismos de monitoramento tal como mostramos nos casos do Brasil e do México. Por outro, o problema com esses mecanismos é que sua legitimidade é gerada pela sua proximidade com as crenças e valores da opinião pública mas não podem se tornar permanentes em virtude da falta de uma forma pública de institucionalização desse tipo de ação. A segunda dimensão desse impasse envolve um problema adicional, relacionado com o próprio equilíbrio societário: mesmo nos locais nos quais a participação da associações civis em políticas sociais é bem sucedida, tal como na área de políticas sociais, tampouco existe uma forma institucional legal de garantir a continuidade e a publicidade dessas formas de ação. A organização da participação das associações civis na política passa por um impasse que pode ser resumido pela inexistência no Direito de uma forma institucional-legal que garanta o status público a associações que efetivamente desempenham um papel público.

Três formas institucionais legais poderiam ser pensadas para resolver o impasse provocado pela inexistência de status público para instituições que efetivamente desempenham um papel público:

1. A primeira dessas formas seria, evidentemente, a criação da figura legal do status público pelo qual as associações civis efetivamente poderiam optar12 12 É importante diferenciar essa proposta da proposta de semi-privatização atualmente proposta pelo governo Fernando Henrique Cardoso no Brasil. . Trata-se de criar uma nova forma institucional, não compulsória e nem atribuída pelo Estado13 13 Nesse sentido, a proposta aqui apresentada difere bastante do sentido de atribuição de status público com o qual Offe e alguns outros neocorporativistas trabalharam durante um certo período. Para esse autores é o Estado quem fundamentalmente atribui status público ás organizações societárias. Vide Offe Claus, 1984. "The Attribution of Public Status to Interests Groups". , pela qual as associações civis poderiam optar. Para tanto, elas deveriam demonstrar a sua razão pública, que seria comprovada através de: a) a livre entrada na associação, isto é, a inexistência de limitações de raça, de gênero, de renda ou religião para a filiação a uma determinada associação; b) formas democráticas de organização interna, incluindo a publicidade do processo decisório e de administração financeira; c) a inexistência do lucro como objetivo, isto é, a generalidade do objetivo proposto; d) formas públicas de relação com o sistema político, ou seja, as associações devem necessariamente publicizar e justificar suas relações com membros do sistema político. Ainda que esses requisitos não sejam exaustivos é interessante notar que eles resolvem obstáculos reais colocados para a atuação das associações civis nesse momento. Essas condições permitem estabelecer um critério público capaz de diferenciar os grupos societários com interesses generalizantes das formas de representação de interesses privados que, devido a certas atividades de interesse público por elas desempenhadas, se confundem com as associações societárias.

2. A constituição de uma instância progressiva de taxação das contribuições associativas e de constituição de um fundo de incentivo à associação dos não associados. Tal proposta tem como objetivo lidar com uma das contradições políticas centrais do novo associativismo: ao mesmo tempo em que ele desempenha um papel central tanto na visibilização da sociedade política quanto no equilibro societário, ele também se constitui em fonte de desequilíbrio societário. Isso porque se ele implica a constituição de uma dinâmica entre sociedade organizada e sociedade não-organizada, dinâmica essa que corrige um desequilíbrio histórico entre os grupos historicamente com acesso ao Estado e os grupos sem tal acesso a ele, ao mesmo tempo cria uma segmentação dos excluídos entre os organizados e os não-organizados (Reis, 1995). O desenho institucional que se propõe aqui para as associações civis visa reequilibrar a relação entre associados e não-associados através da taxação crescente das associações civis que não passam de instrumento de mobilização de recursos financeiros. Tais recursos iriam para um fundo capaz de estabelecer um mecanismo capaz de anular os motivos econômicos que diminuem a propensão associativa da parcela mais carente da população.

3. A constituição de uma câmara provisória de publicização da sociedade política. Tal câmara, que não se constituiria em um mecanismo de duplicidade da soberania devido ao caráter intermitente com que ela se reuniria, seria preenchida por representantes indicados pelas associações civis de direito público e escolhidos pela população. Tal câmara teria como objetivo regulamentar a forma de competição da sociedade política, regulação essa que tem se constituído em fonte de deslegitimação da própria sociedade política. Temos em mente o caso das campanhas políticas e da contribuição feitas por grupos privados a diversos setores da sociedade política. Em todos esses casos o que podemos perceber é que o sistema político ou o Estado regulam, em causa própria, elementos da atividade societária, retirando-lhes a generalidade, a razão pública e transferindo-lhes uma dinâmica competitiva que não lhes é própria.

Essas três propostas de organização institucional das associações civis têm como objetivo reestabelecer três princípios que, nas sociedades latino-americanas têm se mostrado fracos devido ao próprio modelo de constituição societária que prevaleceu na região: os princípios da publicidade, do equilíbrio societário e da visibilidade. O princípio da publicidade tem sido historicamente débil em virtude do prevalecimento de um modelo de organização societária que privilegiou o estabelecimento de relações verticais entre os atores sociais. O princípio da visibilidade não chegou até hoje a constituir o princípio organizador das relações societárias ou das relações entre Estado e sociedade, em virtude de um modelo de construção institucional pensado a partir das relações entre as elites e o próprio Estado. O princípio do equilíbrio jamais chegou a se constituir em uma referência em um país ou uma região nos quais a desigualdade entre os indivíduos foi o principal princípio de formação societária. Trata-se, portanto, de perceber que, ao tomar o eixo Estado-sociedade política como parâmetro para a construção e o aprofundamento da democracia, passamos a pensar a democracia enquanto construção de um arcabouço institucional de relação entre as elites e o Estado. Por outro lado, ao tentarmos pensar a democracia como uma atividade eminentemente societária a partir da construção de um novo parâmetro de relações entre o Estado e a sociedade, enfrentamos o problema de procurar um desenho institucional adequado. Tal desenho deve ter como ponto de partida o déficit societário presente nas sociedades latino-americanas, assim como a constatação empírica de que já contamos com estruturas cuja ausência permitiu uma configuração Estado-mercado-sociedade desfavorável aos atores societários. Nesse sentido, a proposta de desenho institucional feita nesse trabalho tem como horizonte a possibilidade de uma correção de rota capaz de conciliar a democracia com o processo de organização societária atualmente em curso no Brasil, de forma tal que o Estado e a sociedade política deixem de se constituir em fonte de desequilíbrio societário e que os impulsos democratizantes gerados nas associações da sociedade civil se constituam em fonte de democratização do poder. A transformação da sociedade na condição de origem do fluxo de produção de poder demonstra a possibilidade de compatibilização entre cultura política e desenho institucional, associando as mudanças na cultura associativa recentemente ocorridas na América Latina com um desenho institucional capaz de contribuir para a democratização de práticas políticas que tiveram a sua origem em uma sociedade fraca e desorganizada, sociedade essa que a América Latina de hoje parece definitivamente estar deixando para trás.

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  • Telles, Vera (1984) "A Experiência do autoritarismo e práticas instituintes". Mestrado, USP.
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  • Weffort, Francisco (1984) Porque democracia. São Paulo, Brasiliense.
  • Zapata, Francisco (1994) "Modernizacion economica y sindicalismo en Mexico". In Transformaciones Sociales y Acciones Colectivas. M. L. Tarrés, org. El Colegio de México.
  • 1
    A idéia do equilíbrio societário está na base da concepção pluralista da democracia. Ela tem a sua origem no primeiro. Dahl que, já no
    Um prefácio à teoria democrática a utiliza. Em
    A Democracia e seus críticos Dahl descreve o impacto da desigualdade sobre a democracia da seguinte forma: "a desigualdade entre os cidadãos constitui um problema sério e constante em todos os países democráticos. A desigualdade de recursos políticos em posições estratégicas e na barganha implícita e aberta pelo poder são suficientemente grandes até mesmo nas sociedades democráticas de modo a conferir plausibilidade às teorias do controle [do poder L.A.] pela minoria". (Dahl, 1990:332). Mais recentemente, autores como Cohen e Rogers identificaram o princípio do equilíbrio societário com a idéia de justiça distributiva. Para eles, uma teoria democrática adequada deve incluir entre as suas preocupações "... a igualdade nas distribuições das vantagens [ econômicas]..." (Cohen, Joshua and Joel Rogers; 1995). Tal preocupação deve gerar medidas destinadas a equilibrar as vantagens econômicas geradas pelo mercado ou a garantir que tais desigualdades não gerem expectativas de vantagens desiguais ao nível político.
  • 2
    É importante perceber que os processos de privatização não têm necessariamente que assumir tal faceta. Especialmente no caso de alguns países da Europa do Leste e mesmo no caso inglês a privatização envolveu ou a distribuição de ações ou a sua pulverização. No entanto, na maior parte dos casos latino-americano a privatização implicou na concessão de descontos ou condições favoráveis a grupos econômicos conhecidos por sua proximidade com o Estado. Vide Schneider, B. "Lições da Privatização".
    Folha de S. Paulo, 19 de Agosto de 1990.
  • 3
    Duas tentativas recentes de ruptura com as formas clientelistas de intermediação da distribuição de recursos sociais foram feitas no México e no Brasil. Trata-se do Programa Nacional de Solidariedad e do Programa Comunidade Solidária. Nos dois casos são consensuais as avaliações de que não foi possível romper com tais padrões. No caso do México devido á reação dos políticos tradicionais do P.R.I, que se revoltaram frente á possibilidade de constituição de uma base política não clientelista. (Vide Guillermo Prieto, Alma. 1996). No caso do Brasil, não está claro sequer se o objetivo de romper com os elos clientelistas foi efetivamente tentado. Artigo no jornal
    O Estado de São Paulo acerca da política de distribuição de alimentos do Programa Comunidade Solidária acusou o programa de "... ignorar o mapa da fome e inocentemente premiar [com suas ações] os municípios politicamente convenientes e não os mais necessitados do ponto de vista humano... Assim, 73% das cidades escolhidas para receber as salvadoras ações do "comunidade solidária" são redutos ou "feudos" a conquistar escolhidos pelos governadores eleitos em 1994." (16 de agosto de 1995).
  • 4
    É importante ressaltar que enfatizar a dimensão da cultura política e das práticas sociais não implica estabelecer uma dicotomía entre as duas dimensões e a dimensão institucional como supõem Soares e Cheibub (1996).
  • 5
    Esse constitui um ponto que tem sido muito pouco destacado pela teoria democrática, que, no entanto, possui unta enorme importância no surgimento da democracia moderna. Ele foi, até agora, melhor destacado na
    Transformação estrutural da esfera pública onde Habermas mostra que a separação entre a casa e a fábrica enquanto espaços privados constitui precondição para a separação entre materialidade e intimidade. É na esfera da casa desvinculada de qualquer materialidade que irá surgir a subjetividade fundamento da crítica cultural e de uma esfera pública de iguais. Vide Habermas, Jürgen. 1989.
  • 6
    O fenômeno das Santas Casas e da proliferação de irmandades leigas foi mais importante no Brasil do que na América Hispânica. Houve, no caso da América Hispânica um decisão semelhante a da coroa portuguesa de não se responsabilizar com a prestação de serviços sociais. No entanto, não houve um associativismo de base religiosa se encarregando de tal tarefa. O papel desempenhado pelas Santas Casas no Brasil, foi, no caso da América Hispânica, executado pela própria igreja (Russel-Wood, A. J. 1968).
  • 7
    Hahner (1986) identifica um clube abolicionista que teria dado origem a uma associação de ajuda mútua.
  • 8
    Os casos brasileiro e mexicano não esgotam o conjunto dos movimentos associativos do fim do século passado na América latina. Para uma análise empírica mais exaustiva haveria que incluir o caso argentino. No entanto, esse constitui o caso com menos dados empíricos disponíveis. Algumas evidências existem em relação ao associativismo argentino do século passado. A forma principal de associativismo existente em Buenos Aires na segunda metade do século foram as sociedades de ajuda mútua que proliferaram entre as comunidades de imigrantes, em especial entre os imigrantes italianos Vide: Baila, Samuel, 1982. "Las sociedades de ayuda mutua y el desarollo de una comunidad italiana en Buenos Aires 1858-1918",
    Desarrollo Economico vol 21 (nº 84). A interrupção do movimento associativo argentino no século XX deve ser atribuída ao rápido desenvolvimento de uma dinâmica amigo/inimigo na sociedade política favorecendo a concentração de forças e a homogeneização no âmbito da sociedade civil.
  • 9
    É importante diferenciar a forma como esse fenômeno ocorre na América Latina da forma como ele ocorre nos países da Europa ocidental e nos Estados Unidos. Em ambos os casos existem análises que apontam tanto para a diminuição da importância do trabalho (Offe, Claus: 1984). Como para a diminuição da importância do sindicalismo (Galbraith). No entanto, o sindicalismo, especialmente no caso do mundo anglo-saxão, jamais chegou a ter a influência nas formas de associativismo e de ação coletiva que ele teve nos países da América Latina. Em segundo lugar, mesmo nos países europeus que participaram dos chamados arranjos corporativistas jamais houve, no período do pós-guerra, uma perda da autonomia do movimento sindical semelhante á ocorrida na América latina. Nesse sentido, três fenômenos latino-americanos são completamente únicos em uma perspectiva comparada: o aumento no ritmo de constituição de associações civis, a centralidade da concepção de autonomia social e a rapidez da perda de influência do sindicalismo. Gostaria de agradecer ao prof. Alberto Olvera pelos comentários que resultaram nessas observações.
  • 10
    Não existem dados completos sobre o numero de associações temáticas no Brasil. A única fonte disponível é o catálogo da ABONG, que lista 21 associações de direitos humanos, 14 feministas e seis organizações ecológicas, um dado que não reflete o numero de associações existentes, uma vez que os dados disponíveis da Prefeitura de Belo Horizonte indicam a existência de 54 organizações femininas, 34 organizações ecológicas e 7 organizações de direitos humanos na cidade. Vide Landim, 1996.
  • 11
    Um exemplo recente da forma problemática de utilização dos conceitos de sociedade civil e de autonomia societária pode ser visto na proposta de reforma do Estado no Brasil proposta por Luís Carlos Bresser Pereira. Tal reforma pretende transformar instituições estatais, tais como hospitais públicos e universidades, em instituições pára-estatais e para tanto, as denomina de instituições da sociedade civil. Tal proposta não passa de uma nova tentativa de fusão entre Estado e sociedade civil.
  • 12
    É importante diferenciar essa proposta da proposta de semi-privatização atualmente proposta pelo governo Fernando Henrique Cardoso no Brasil.
  • 13
    Nesse sentido, a proposta aqui apresentada difere bastante do sentido de atribuição de
    status público com o qual Offe e alguns outros neocorporativistas trabalharam durante um certo período. Para esse autores é o Estado quem fundamentalmente atribui
    status público ás organizações societárias. Vide Offe Claus, 1984. "The Attribution of Public Status to Interests Groups".
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      19 Nov 2010
    • Data do Fascículo
      1997
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