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Apresentação

Apresentação

As novas democracias, que nas últimas duas décadas (mais exatamente, 18 anos, a promissora idade do regime pós-salazarista em Portugal) vêm despontando pelo mundo afora não são inteiramente novas nem inteiramente democráticas. Mas são elas que nos permitem avançar. É a partir disso que Francisco Weffort, no texto que abre este número de Lua Nova, traça o enquadramento para melhor se lerem as análises de Manoel Garretón, Claus Offe e Ralph Delia Cava. De passagem, abre-se um diálogo implícito com o exercício de Jose Nun na fina arte de captar diferenças no interior de grandes agregados. A contribuição de Luciano Oliveira incide sobre alguns aspectos sombrios do passado recente, e suscita questões éticas centrais na opção democrática. Por essa via, encaminha para o segundo aspecto do tema deste número. É que se algo avança na organização política das sociedades que buscam seus caminhos após anos ou décadas de ditadura, será que tudo avança?

Enfim, será esta uma boa hora para retomar o velho debate sobre o progresso, tão desacreditado pelos teóricos do pós-moderno quando não do fim da história? Que tudo está em movimento, e acelerado, ninguém nega. Difícil é discernir nisso alguma tendência, ou sequer direção. Falar em progresso, agora, exige portanto cautela e senso crítico.

Por que, então, não aproveitar uma pista de José Nun e revisitar o debate do progresso num dos seus pontos mais altos, há 30 anos? Assim, ao invés de dispensar o tema, Lua Nova concentra-se no modo como esse debate encontra expressão, em 1962, na obra de um dos grandes mestres da. Teoria Crítica da Sociedade (a "Escola de Frankfurt"), Theodor Adorno. É para a leitura do seu texto sobre o progresso que convergem as contribuições de Michel Lowy e Eleni Varikas (diretamente), de Wolfgang Leo Marr (com referência a Lukács), e, bem mais indiretamente, de Horacio González, que permite lembrar a presença decisiva de Walter Benjamin nesse debate (pena que Lua Nova não pudesse oferecer, neste número, um texto de Benjamin sobre o tema. Mas, quem sabe em algum próximo?).

A escolha de Adorno não é casual. Tudo indica que o tipo de pensamento que ele e Walter Benjamin representam em grau máximo deverá ser reabilitado nos debates vindouros, especialmente numa área que será quente, a da nova crítica cultural do capitalismo. Além disso, trata-se de um clássico, com explícitas afinidades com os temas da "Dialética Negativa" de Adorno. A idéia de progresso pressupõe a de humanidade, sustenta Adorno; não como seu sujeito já dado mas como algo a ser constituído. Pensado como progresso de algo o progresso é impossível. Pensada como totalidade a realização plena da humanidade é impossível. Entretanto, a exigência de que haja progresso e de que a humanidade se realize plenamente não pode ser abandonada: é uma exigência da razão, sem a qual não se pode falar de progresso e humanidade. Vale a pena acompanhar esse exemplo raro de argumentação rigorosamente dialética (porque é o desenvolvimento do tema que importa em textos como este, mais do que resultados ou resumos), até para ver como os conceitos centrais - de progresso, de humanidade, de história, de natureza -vão sendo levados aos seus limites, no seu registro negativo. É também uma boa oportunidade de corrigir a imagem de Adorno como um mero "pessimista apocalíptico".

No plano da análise própria às ciências sociais, e não tanto da reflexão filosófica como em Adorno, os diversos textos deste número apontam para o mesmo problema: talvez o rumo das coisas ameace a realização da democracia, novas ou velhas, em escala mundial: talvez não haja progresso - mas das exigências da democracia e do progresso não abriremos mão.

O Editor

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    21 Jan 2011
  • Data do Fascículo
    Dez 1992
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