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Como é que vai ser de agora em diante?

EDITORIAL

Como é que vai ser de agora em diante?

Os nós que ao longo de nossa história não pudemos, não quisemos ou simplesmente não resolvemos estão aí, inflexíveis, a balizar nossa atualidade: com toda sua força, a perguntar-nos como sairemos adiante.

Deixemos de lado aquela frase famosa, de que estamos num momento decisivo de nossa história. Talvez estejamos, como já estivemos antes e como estaremos no futuro. Mas o certo é que a debilidade das políticas econômicas governamentais veio com toda sua intensidade à tona. Esta debilidade parecera afastada durante longos meses de 1986, meses em que se viveu um sonho um pouco mais extenso do que uma noite de verão.

Nos parece que as classes dominantes brasileiras, mais uma vez, demonstram seriíssima dificuldade em oferecer à sociedade um projeto com "p" maiúsculo. Com medo de cometer equívocos, talvez se possa afirmar que o Plano Cruzado e o núcleo central da equipe que o formulou, com Dilson Funaro à frente, tenham representado — nas intenções, não nas propostas correias — nos anos 80 o que Roberto Simonsen representou para a burguesia brasileira nos anos 30 e 40. Mas é a própria burguesia que derruba o esboço de projeto, já que não consegue e não quer repensar suas formas de dominação, por certo arcaicas, mas adequadas às leis de um capitalismo subdesenvolvido. Esta variável foi subestimada, mas veio duramente à tona.

Mas os nós, certamente velhos, são evidentes: questão agrária, dependência externa estrutural, modelo econômico voltado à reprodução da concentração do capital e da renda. Amarrando tudo isto, profunda dificuldade de armação de um sistema representativo efetivamente democrático. Se é inevitável que quem possui força orgânica no plano social se represente mais que proporcionalmente, seria de se esperar uma maior capacidade dos dominantes de se contrapor a isto. O Congresso Nacional e a Assembléia Constituinte, agora ao trabalho em Brasília, se deixados à própria sorte elaborarão uma Carta que refletirá uma tendência majoritária longe de ser progressista, o que não impede aberturas democráticas e algumas concessões na área social. Mas a questão central — e sem isto não há democracia — é, sem desconhecer o papel das instituições, contribuir para que o debate constitucional se enraíze na sociedade, no cotidiano da vida das massas, na luta dos trabalhadores, saindo dos palácios e constituindo-se em tema de afloramento deformas populares de representação.

É verdade, além dos aspectos políticos, há aqueles culturais: a decisão de participar ativamente, diminuindo a delegação de poderes a outros, não está suficientemente enraizada. Mas, por isso mesmo, de agora em diante há o que pensar, o que fazer.

O editor

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    16 Mar 2011
  • Data do Fascículo
    Mar 1987
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