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RUPTURA E COALIZÃO: A chapa Lula-Alckmin e a recomposição partidária das democracias liberais

Rupture and Coalition: The “Lula-Alckmin” Alliance and the Party Recomposition of Liberal Democracies

RESUMO

Do “golpe de gênio” ao “abraço de afogados”, a composição entre o ex-presidente Lula e o ex-governador Geraldo Alckmin tem suscitado as mais diversas interpretações. A chapa Lula--Alckmin não é apenas um produto das transformações da esquerda. Ela é uma resposta ao dilema da social-democracia no século XXI que de modo mais ou menos dramático afeta todas as democracias liberais.

PALAVRAS-CHAVE:
sistemas partidários; social-democracia; Partido dos Trabalhadores

ABSTRACT

The alliance between former president Lula and former governor of São Paulo Geraldo Alckmin has been the object of different interpretations. This article argues that the partnership between the two former opponents is more than just another electoral coalition typical of Brazilian politics. It is a pragmatic response to the dilemmas of social-democracy in the 21st century that more or less dramatically affect all liberal democracies.

KEYWORDS:
Party-systems; Social-democracy; Worker’s Party

Do “golpe de gênio” ao “abraço de afogados”, a composição entre o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-governador Geraldo Alckmin, noticiada pela primeira vez na coluna da Mônica Bergamo na Folha de S.Paulo em novembro passado e formalizada em maio deste ano com o lançamento da pré-candidatura de Lula ao Palácio do Planalto, tem suscitado as mais diversas interpretações. Seus apoiadores tentam inserir a chapa na longa tradição de alianças democráticas iniciada pelo movimento das Diretas Já (Vanucchi, 2022Vanucchi, Paulo. “União de Lula e Alckmin concretiza frente ampla contra o bolsonarismo”. Folha de S.Paulo , 8/4/2022. Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2022/04/uniao-de-lula-e-alckmin-concretiza-frente-ampla-contra-o-bolsonarismo.shtml>.
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). Já para os seus opositores, ela é apenas uma repetição do paroquial jogo de palanques que, no passado, redundou em graves crises institucionais. A comparação negativa com a chapa de Dilma Rousseff e Michel Temer, que terminou no impeachment de 2016, se tornou frequente entre críticos de todos os bordos.

Uma outra interpretação tem a ver com as mudanças internas do Partido dos Trabalhadores, comum a outros partidos da social-democracia. Desenvolvida por este autor no jornal Folha de S.Paulo quando da primeira aparição pública dos dois candidatos em dezembro do ano passado, essa tese sustenta que os partidos de centro-esquerda se dividiram entre a esquerda dita de “ruptura”, que se fortaleceu depois da crise financeira de 2008, e a de “coalizão” (Alencastro, 2021Alencastro, Mathias, “Chapa Lula-Alckmin seria uma revolução republicana”. Folha de S.Paulo, 21/12/2021. Disponível em: <https://www1.folha.uol.com.br/poder/2021/12/chapa-lula-alckmin-seria-uma-revolucao-republicana.shtml>.
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). Este artigo busca desenvolver e ampliar o argumento do ensaio. A chapa Lula-Alckmin não é apenas um produto das transformações da esquerda. Ela é uma resposta ao dilema da social-democracia no século XXI que de modo mais ou menos dramático afeta todas as democracias liberais.

O artigo avança da seguinte forma. A primeira seção discute a “pax precária da terceira via” ou o período entre 1980 e 2010, durante a qual os partidos de centro-esquerda aderiram a uma plataforma comum e se estabeleceram como forças regulares de alternância política na Europa, nas Américas e na África do Sul, junto com as formações de centro-direita. A seção termina explorando os efeitos da crise financeira de 2008 no consenso social-democrático. Ela argumenta que as transformações econômicas e sociais aprofundaram as mudanças em curso na composição do eleitorado de centro-esquerda e abriram caminho para a criação ou o fortalecimento de novos movimentos dissidentes. A seção seguinte examina em detalhe esse momento de experimentalismo político, que começou em 2008 e desacelerou a partir de 2020 com o começo da pandemia de coronavírus. A crise sanitária teve, entre outras consequências, o efeito de reaproximar a sociedade do Estado social, fortemente relacionado ao legado dos partidos sociais-democratas.

A terceira seção explora as implicações da década 2010-2020 na formação do sistema partidário das democracias representativas ocidentais. Nela, assinalo que a crise dos partidos de centro-direita e a possibilidade real da chegada da extrema direita ao poder levaram à reformação de “grandes tendas” ou partidos únicos que abrigam as diferentes correntes identificadas à social-democracia. Sinalizo também que o embate entre esquerda e direita está sendo substituído por outras oposições, entre identidade e cosmopolitismo, por um lado, e altermundialismo e globalismo, por outro, que atravessam as esferas ideológicas.

A PAX PRECÁRIA DA TERCEIRA VIA

A sentença de Perry Anderson era inequívoca. Na virada do século XX, não havia, segundo ele, “mais oposições significativas - ou seja, perspectivas sistemáticas rivais - dentro do pensamento ocidental e até mundial” (Anderson, 2000Anderson, Perry. “Renewals”. New Left Review, n. 1, 1º/02/2000, pp. 5-24.). Depois da “vitória da democracia”, o fim da Guerra Fria, o colapso da União Soviética e a instituição do liberalismo como a base dos princípios de governo, a social-democracia havia se tornado hegemônica nas democracias ocidentais. A dominação de seus partidos, que se estendia a toda a Europa, mas também às Américas e à África do Sul, era vista como o culminar de um longo processo de renovação iniciado nos anos 1970, quando o modelo keynesiano que dominava o pensamento político e econômico desde a Segunda Guerra Mundial mergulhou numa crise sistêmica (Judah, 2021Judah, Ben. “The Sphinx who Reshaped Europe”. The Critic, mai. 2021.). Desde então, uma nova geração de lideranças políticas, inserida em uma rede de elites internacionais, compartilhava, de forma quase universal, a convicção de que o modelo que regia as democracias ocidentais deveria ser profundamente revisto.1 1 Ben Judah narra a transformação do pensamento econômico das elites europeias a paartir da trajetória de Mario Draghi, presidente do Banco Central Europeu, em “The Sphinx who Reshaped Europe” (Judah, 2021).

Os partidos social-democratas tentaram se adaptar a uma hegemonia liberal bastante robusta, que durou até a crise de 2008. Eles conhecem um primeiro ciclo de vitórias na longa década entre o choque do petróleo e a queda da União Soviética, quando o Partido Socialista Operário Espanhol chegou ao poder, em 1982, depois de um ciclo de divisões internas que culminaram numa arbitragem por uma comissão da Internacional Socialista e o descarte da ideologia marxista em 1979 (Preston, 1988Preston, Paul. “The Decline and Resurgence of the Spanish Socialist Party During the Franco Regime”. European History Quarterly, v. 18, n. 2, abr. 1988, pp. 207-24. [https://doi.org/10.1177/026569148801800204]
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). Frequentemente imputada às mudanças estruturais na sociedade britânica impostas pelos dezoito anos de governo conservador, entre 1979 e 1997, a ascensão do Novo Trabalhismo, que será discutido mais detalhadamente em seguida, tem suas origens no abandono ou na modificação de suas políticas tradicionais no começo dos anos 1980, na sequência do debate intelectual iniciado por Eric Hobsbawm em defesa de um Partido Trabalhista mais plural, dinâmico e intelectualmente ativo na sua célebre intervenção na Marx Memorial Lecture de 1978 (Pike; Diamond, 2020Pike, Karl; Diamond, Patrick. “‘Better in Kung Fu Movies than in Political Parties’: Labour’s Factionalism and a Reappraisal of Eric Hobsbawm’s Political Thought”. The Political Quarterly, v. 91, n. 4, 2020, pp. 762-69. [https://doi.org/10.1111/1467-923X.12933]
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).

Junto com a ascensão de um Partido Socialista pró-europeu em Portugal, consta também como um marco desse período o tournant de la rigueur, ou guinada do rigor, em março de 1983, do governo François Mitterrand, eleito dois anos antes com o programa feito conjuntamente com o Partido Comunista. Reconduzido à Presidência triunfalmente em 1988, Mitterrand perdeu o controle sobre o Partido Socialista, que acabou dividido entre governistas e reformistas liderados por Michel Rocard no Congresso de Rennes de 1990. Além das implicações econômicas, a guinada do rigor teve um impacto estruturante na natureza da relação entre governo, partido, sindicatos e movimentos sociais na França (Burlaud, 2017Burlaud, Antony. “La Rigueur de 1983 : un tournant politique?”. Savoir/Agir 42, n. 4, 2017, pp. 23-9.).

O fim do mandato de catorze anos de Mitterrand, em 1995, coincide com o início de uma segunda fase de mudanças na centro-esquerda. Ela começa na própria França, onde a vitória inesperada de Lionel Jospin nas legislativas de 1997 promove uma nova geração de rocardistas encabeçada por Martine Aubry e Dominique Strauss-Kahn. A vitalidade da esquerda francesa só parecia perder para a britânica. Depois da derrota apertada de Neil Kinnock para o sucessor de Thatcher, John Major, e da morte prematura do líder John Smith em 1994, Anthony Blair impõe mudanças radicais no Partido Trabalhista, que implicam medidas simbólicas - como a aceitação do modelo de mercado e a introdução de um novo nome, Novo Trabalhismo, ou New Labour -, organizacionais - como as mudanças no sistema de deliberação interna - e programáticas - o partido assumiu o compromisso de não alterar o equilíbrio orçamentário estabelecido pelos conservadores (Faucher-King; Le Galès, 2010Faucher-King, Florence; Le Galès, Patrick. Les Gouvernements New Labour: Le Bilan de Tony Blair et de Gordon Brown. Paris: Presses de Sciences Po, 2010.).

O sucesso eleitoral do Novo Trabalhismo repercutiu globalmente no resto da Europa, nos Estados Unidos e no Sul Global. Em movimento paralelo, os Novos Democratas se uniram em torno da candidatura vitoriosa de Bill Clinton em 1992 a partir de um programa moderado que buscava os votos do eleitor branco de classe média com propostas como redução de impostos e reforma do Estado social (Weaver, 2015Weaver, Timothy P. R. “Chapter 3. Blair and Clinton: A Third Way?”. In: Blazing the Neoliberal Trail. Filadélfia: University of Pennsylvania Press, 2015, pp. 109-58. [https://doi.org/10.9783/9780812292220-004]
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). Num contexto diferente, o Congresso Nacional Africano, que se preparava para assumir o poder na África do Sul democrática, também se apropriou do ideário da Terceira Via, ou o caminho intermediário entre liberalismo e socialismo teorizado por Anthony Giddens (Giddens, 1999Giddens, Anthony. The Third Way: The Renewal of Social Democracy. Londres: Polity Press 1999.). Aprovado em 1996, o Growth, Employment and Redistribution (Gear) tinha como objetivo interromper a desvalorização do Rand com uma redução significativa nas despesas do Estado e na redução da dívida pública num espaço de cinco anos. O legado do Gear é geralmente descrito como desastroso para as perspectivas de desenvolvimento, mas globalmente positivo para a macroeconomia. Ele marca a versão sul-africana da guinada do rigor iniciada por outros partidos de centro-esquerda nas décadas de 1980 e 1990 (Streak, 2004Streak, Judith Christine. “The Gear Legacy: Did Gear Fail or Move South Africa Forward in Development?”. Development Southern Africa, v. 21, n. 2, 2004, pp. 271-88.). A Carta ao povo brasileiro do Partido dos Trabalhadores busca marcar a adesão da candidatura Lula ao pacto social-democrata fabricado ao longo da década.

Na virada do século, a vitória do alemão Gerhard Schroeder, um socialista da classe operária transformado em Genosse der Bosse (camarada dos capitalistas), e a do italiano Massimo d’Alema deixavam entender que a esquerda reformista estava se estabelecendo no longo prazo. Na realidade, o início dos anos 2000 marcaria o começo de um novo ciclo. Se as preocupações com os limites da virada liberal dos partidos de centro-esquerda começaram logo em 2001 com a eliminação fulminante no primeiro turno de Lionel Jospin nas eleições presidenciais francesas, elas se acentuariam com a revolta do Partido Trabalhista depois do apoio irrestrito do governo Blair à invasão do Iraque em 2003. A guerra teve um papel central nas definições dos rumos do partido na década seguinte, tanto na sucessão de Tony Blair por Gordon Brown em 2007 como na opção de militantes por Ed Miliband contra o favorito, o blairista David Miliband em 2010, e na chegada ao poder de Jeremy Corbyn, representante histórico da ala mais à esquerda do partido, em 2015 (Lambert, 2021Lambert, Harry. “Labour’s Lost Future: The Inside Story of a 20-Year Collapse”. The New Statesman, 02/9/2021.).

A guerra, junto com as frustrações com o processo de integração europeia depois da criação da Zona Euro, alimentou novas dissidências dentro da esquerda continental. Partidos de diferentes países europeus, como o português Bloco de Esquerda, fundado em 1999, se mobilizaram pelo “Não” no referendo na França e na Holanda de 2005, quando a proposta de Constituição para a União Europeia sofreu uma derrota surpreendente (Hobolt; Brouard, 2011Hobolt, Sara Binzer; Brouard, Sylvain. “Contesting the European Union? Why the Dutch and the French Rejected the European Constitution”. Political Research Quarterly, v. 64, n. 2, 2011, pp. 309-22.). A oposição do ex-ministro Laurent Fabius, um dos arquitetos da guinada do rigor de François Mitterrand, abriu caminho para uma corrente eurocética dentro do Partido Socialista, outrora intensamente pró-europeu.

A revolta contra o que muitos denunciavam como “consenso neo-liberal” dos partidos de centro-esquerda nos anos 1990 também se manifestou no Brasil e na África do Sul na década de 2000. Tratada inicialmente como um epifenômeno, a recusa de três deputados do Partidos dos Trabalhadores em aderir ao projeto de Reforma da Previdência do governo Lula levou à formação de um partido inteiramente novo em 2005, o Partido Socialismo e Liberdade (PSOL). A frustração com o governo reformista de Thabo Mbeki, idealizador do Gear e sucessor de Nelson Mandela, culminou na sua defenestração a favor do clientelista Jacob Zuma na eleição interna da Confederação Nacional Africana em 2007 (Mac Giollabhuí, 2017Mac Giollabhuí, Shane. “The Fall of an African President: How and Why Did the ANC Unseat Thabo Mbeki?”. African Affairs, v. 116, n. 464, jul. 2017, pp. 391-413. [https://doi.org/10.1093/afraf/adx003]
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).

As clivagens dentro dos partidos de centro-esquerda ficaram completamente expostas depois do colapso do sistema financeiro de 2008. De forma gradual mas decisiva, ele ampliou a base social dos movimentos de contestação nas classes médias e diplomadas. A desilusão com os resultados da mobilização social entre 2008 e 2013 deu força para lideranças políticas que opuseram as frustrações econômicas desses novos eleitores ao sistema fechado das elites. A reivindicação de mais acesso à democracia vira o “cimento ideológico”, para usar a expressão de Pierre Martin, de novas formações políticas que se unem no ataque à confiscação do poder pelas classes dirigentes econômicas e financeiras, fortemente associadas aos partidos tradicionais da social-democracia (Martin, 2017Martin, Pierre. “Un séisme politique”. Commentaire, v. 2, n. 158, 2017, pp. 249-64.). Na sua generalidade, o sistema partidário das democracias ocidentais se dividiu entre sociais-liberais e conservadores-liberais, que detinham, juntos, o monopólio do sistema partidário.

Muitos autores concordam que as transformações que se aceleraram depois de 2008 começaram a ficar visíveis logo na virada do século. Autor de artigo seminal sobre a eleição presidencial na França em 2017, que ele mesmo qualifica como “a mais impactante desde 1968”, Martin usa o “Modelo Social de Clivagem” de Seymour Martin Lipset e Stein Rokkan para revelar a emergência de duas novas divisões: entre identidade e cosmopolitismo, por um lado, e, por outro, altermundialistas e neoliberais. Ambas estão intimamente ligadas às transformações da economia política global: a formação de um sistema internacional (Otan, União Europeia, ONU) e os choques migratórios, tecnológicos e econômicos da globalização. Em seu último livro, Thomas Piketty levanta três dinâmicas principais para explicar como a competição política evoluiu nas sociedades contemporâneas (Piketty, 2020): o declínio do voto de classe, a adesão em massa dos mais ricos à direita, que ele chama de “direita mercantil”, e, por fim, a inversão da relação entre educação e alinhamento político. Os mais diplomados transferiram o voto da direita para a esquerda, formando o que ele chama de “Esquerda brâmane”, cujo foco central é a pauta dos costumes e os “rituais” culturalmente corretos, mas que permanece desconectada dos conflitos distributivos. Sublinhando o “abandono” da esquerda pelos trabalhadores, ele observa a formação de uma nova oposição entre globalistas e nativistas.

Outros autores exploram o argumento de Piketty observando o impacto das mudanças no mercado de trabalho nos alinhamentos eleitorais. Segundo Daniel Oesch, profissionais engajados no contato interpessoal (professores, jornalistas) tendem a aderir com mais facilidade às agendas culturalmente progressistas dos partidos de esquerda, enquanto profissionais empresariais e técnicos se aproximaram dos partidos de direita. Mais importante ainda, a perda de apoio dos partidos de centro-esquerda entre as categorias populares menos educadas parece estar diretamente relacionada ao esvaziamento da classe trabalhadora industrial na maioria das sociedades desenvolvidas. Tornada redundante pela automatização da indústria, ela foi substituída por uma classe trabalhadora plenamente integrada na economia de serviços, caracterizada pela ausência de sindicatos e outros movimentos (Im; Mayer; Palier; Rovny, 2019Im, Zhen; Mayer, Nonna; Palier, Bruno; Rovny, Jan. “The ‘Losers of Automation’: A Reservoir of Votes for the Radical Right?”. Research & Politics, v. 6, n. 1, 2019. [https://doi.org/10.1177/2053168018822395]
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). O impacto da transformação do mercado de trabalho na formação do voto das classes populares tem sido objeto de múltiplos estudos, e todos apontam para o enfraquecimento dos partidos tradicionais da social-democracia.

Fenômenos globais, como a migração e as mudanças na economia internacional, também são apontados como fatores determinantes. Em artigo célebre publicado logo depois da vitória apertada de Tony Blair em 2005, o cientista político Robert Ford discutiu a “questão Iceberg”, como ele chamava a imigração, que havia dobrado entre 1998 e 2004.2 2 Vale lembrar, como sempre apontaram Ivan Krastev e Stephen Holmes, que a crise migratória na Europa e em parte nos EUA foi causada pelas intervenções de mudança de regime no Oriente Médio e na Ásia, bem como por uma postura paternalista no Leste Europeu (Krastev; Holmes, 2020). Durante esse período, a preocupação dos britânicos com a questão disparou de 5% para 30%. Dois mil e cinco também marca o começo do crescimento do Ukip (United Kingdom Independence Party), que passou de 2,2 para 15% de apoiadores em uma década. A radicalização de parte do eleitor de direita levou o Partido Conservador a fortalecer as suas posições sobre a imigração e, por extensão, sobre a União Europeia (Ford, 2006Ford, Robert. “An Iceberg Issue? Immigration at the 2005 British General election”, 1º/01/2006. Disponível em: <Disponível em: https://www.academia.edu/2783528/An_iceberg_issue_Immigration_at_the_2005_British_General_election >. Acesso em: 23/05/2022.
https://www.academia.edu/2783528/An_iceb...
). Dez anos mais tarde, o Iceberg já era visível na sua totalidade e o economista renomado Paul Collier veio defender o controle da migração como uma necessidade para preservar os sistemas políticos europeus (Collier, 2015Collier, Paul. Exodus: How Migration is Changing Our World. Oxford: Oxford University Press, 2015.). Para Branko Milanović, as condições que permitiram a consolidação e ascensão da social-democracia, a predominância de trabalhadores dos países desenvolvidos sobre o resto do mundo, a rigidez na circulação de capital, a limitação do fenômeno migratório, as proteções sociais defendidas por sindicatos, não são doravante replicáveis (Milanović, 2019Milanović, Branko. Capitalism, Alone: The Future of the System That Rules the World. Cambridge, MA: Harvard University Press, 2019.). Em seu famoso “trilema” Dani Rodrik determinou que o aumento da globalização iria certamente avançar em detrimento da democracia e da soberania nacional. A pretensão de que as três frentes são compatíveis mergulhou as sociedades modernas num impasse (Rodrik, 2007Rodrik, Dani. “The Inescapable Trilemma of the World Economy”, 27/6/2007. Disponível em: <Disponível em: https://rodrik.typepad.com/dani_rodriks_weblog/2007/06/the-inescapable.html >. Acesso em: 19/5/2022.
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).

Por fim, mudanças nas estratégias de organização e comunicação política começaram a pesar no desempenho eleitoral dos partidos tradicionais logo no começo da década de 2000. A dificuldade de partidos estabelecidos em assimilar as novas tecnologias, e em particular as redes sociais, é um fenômeno comum à Europa e ao resto do mundo. O exemplo do Partido Democrata, que passou da vanguarda da tecnologia com Barack Obama ao atraso na eleição que levou ao poder Donald Trump em 2016, é um caso célebre de como os partidos tradicionais foram ultrapassados por novos atores políticos (Katz; Barris; Jain, 2013Katz, James; Barris, Michael; Jain, Anshul. The Social Media President: Barack Obama and the Politics of Digital Engagement. Nova York: Springer, 2013.). Como aponta Theda Skocpol, a mobilização extrema anti-Obama no Tea Party preparou a militância política republicana para explorar o boom das mídias sociais (Skocpol; Hertel-Fernandez, 2016Skocpol, Theda; Hertel-Fernandez, Alexander. “The Koch Network and Republican Party Extremism”. Perspectives on Politics , v. 14, n. 3, set. 2016, pp. 681-99. [https://doi.org/10.1017/S1537592716001122]
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).

Outro fator importante, a criação de partidos fortemente associados a uma causa (ecologia, identidade) quebrou o monopólio da social-democracia no debate público. Por fim, a inclusão de figuras não associadas ao cenário político, trazidas do empresariado ou de outros setores do Estado, também pressionou as burocracias partidárias. A soma de todas essas transformações abriu uma era de intenso experimentalismo na política partidária.

EXPERIMENTALISMO

Pablo Iglesias conquistou, em questão de meses, a política espanhola incendiada pelos desdobramentos da crise financeira de 2008. Seu partido-movimento Podemos surpreendeu nas eleições europeias de 2014 e se tornou a terceira força parlamentar da Espanha em 2016, depois de obter representação partidária em todas as regiões. Seu sucesso é imputado a sua estrutura híbrida, que incorporou a cultura de horizontalidade do 15-m (Indignados), aos protestos sociais que tomaram a Espanha em 2011 e à utilização de novas tecnologias para os processos de deliberação interna, que asseguravam a verticalidade da estrutura de poder (Chironi; Fittipaldi, 2017Chironi, Daniela; Fittipaldi, Raffaella. “Social Movements and New Forms of Political Organization: Podemos as a Hybrid Party”. Partecipazione e Conflitto, v. 10, n. 1, 2017, pp. 275-305. [https://doi.org/10.1285/i20356609v10i1p275]
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). A dinâmica da política espanhola, caracterizada por fortes tensões territoriais, favoreceu ainda a criação de um sistema partidário mais competitivo (Rodriguez-Teruel; Barrio; Barberà, 2016Rodríguez-Teruel, Juan; Barrio, Astrid; Barberà, Oscar. “Fast and Furious: Podemos’ Quest for Power in Multi-level Spain”. South European Society and Politics, v. 21, n. 4, 2016, pp. 561-85. [https://doi.org/10.1080/13608746.2016.1250397]
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). O Podemos também tem como principal característica sua universalidade. Paralelos foram estabelecidos entre seu modelo de partido-movimento com o do boliviano mas e do grego Syriza, ponta de lança da contestação à União Europeia (Martín, 2015Martín, Irene. “Podemos y otros modelos de partido-movimiento”. Revista Española de Sociología, n. 24, 2015, pp. 107-14. ). Lideranças da esquerda brasileira, norte-americana e europeia a elevaram a modelo a seguir. Nesse processo, o Podemos passou a ser a primeira referência da esquerda dita de “ruptura” que se desenvolveu na França, no Reino Unido e alhures. Figuras históricas das alas à esquerda dos socialistas e trabalhistas, Jean-Luc Mélenchon e Jeremy Corbyn seguiram o paradigma modernizador desenvolvido por Pablo Iglesias e apoiaram-se nas teses de Ernesto Laclau e Chantal Mouffe, que caracterizam o embate político como a oposição entre o povo e a elite (Valdivielso, 2017Valdivielso, Joaquín. “The Outraged People. Laclau, Mouffe and the Podemos Hypothesis”. Constellations, v. 24, n. 3, 2017, pp. 296-309. [https://doi.org/10.1111/1467-8675.12287]
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).3 3 Este texto recorre ao conceito de populismo elaborado por Chantal Mouffe e Ernesto Laclau para descrever conceitualmente a esquerda de ruptura. Essa interpretação do populismo não deve ser estendida a outros fenômenos políticos, como a direita também descrita como populista.

“Precisamos de um modelo [de democracia] que seja capaz de capturar a natureza do político”, afirma Chantal Mouffe; “a pergunta fundamental da política democrática não é como domesticar o poder, mas sim como instituir [constitute] formas de poder político mais compatíveis com valores democráticos” (Mouffe, 2000Mouffe, Chantal. The Democratic Paradox. Londres/Nova York: Verso, 2000., pp. 13-4). Para o agonismo, o poder popular é entendido, sobretudo, como um poder de tipo instituinte, capaz de recriar permanentemente as regras e práticas políticas tidas como “aceitáveis” em uma comunidade política, e não como a expressão de interesses estratégicos dentro de canais já previamente determinados por confrontações políticas passadas. O papel de uma concepção agonista de democracia é avaliar e fomentar a participação de novas vozes e nova constelação de valores em busca de maiorias populares em disputa, o que levará, invariavelmente, à busca por formas de participação política contestatórias e extrainstitucionais. Diminuir a desigualdade política, nesse sentido, significa promover a participação popular fora das instâncias tradicionais de exercício do poder e com isso colocar em questão falsos consensos sobre regras e razões políticas que, por definição, sempre acarretarão exclusões.

Os primeiros resultados foram contrastantes. Senador desde os anos 1980 e confidente de François Mitterrand, Mélenchon rompeu com o Partido Socialista em 2008 e transformou sua corrente, o Partido de Esquerda, em uma formação autônoma. Em sua terceira disputa presidencial, em 2022, ele ficou a menos de 500 mil votos do segundo turno . Nesse processo, seu atual partido, a França Insubmissa, constituiu uma base de eleitores urbanos e precários que assegurou sua sustentabilidade política e enfraqueceu seus rivais dentro da esquerda, sobretudo os socialistas. Alçada a principal força da oposição contra o governo Emmanuel Macron, a França Insubmissa organizou em torno de si uma nova união das esquerdas, a Nova União por uma Política Econômica e Social, ou Nupes, no período entre as eleições presidenciais e as legislativas de 2022.

Se a Nupes ainda permanece um objeto indefinido, que pode se instalar na paisagem política francesa de forma durável ou simplesmente se desfazer em poucos ciclos eleitorais, ela consolida um fato histórico para a esquerda francesa: a falência política do Partido Socialista. Sua necrologia ainda está por ser escrita, mas pode-se, desde já, avançar que sua morte súbita (o partido dominava a Assembleia Nacional e os governos regionais uma década atrás) está ligada a fatores contingenciais e estruturais: contingenciais na medida em que o dissidente Emmanuel Macron, que militou no partido por uma década antes de criar outro partido e se lançar candidato em 2016, vingou por causa do escândalo que minou a candidatura de centro-direita, tida como favorita ao pleito; estruturais porque o partido parecia invariavelmente dividido entre diferentes correntes. O próprio governo François Hollande teve amplas dificuldades para manter sua base na Assembleia da República.

No Reino Unido, a esquerda de ruptura chegou perto do poder em 2017, quando Jeremy Corbyn, que assumiu o Partido Trabalhista britânico em 2015, ameaçou a hegemonia conservadora nas eleições. Uma derrota avassaladora no ano seguinte levou, no entanto, a sua destituição a favor do moderado Keir Starmer. As interpretações diversas sobre seu legado na liderança revelam a profundidade das divisões no partido. Por um lado, ele é creditado por ter rejuvenescido a base de aderentes e modernizado suas estruturas (Whiteley; Poletti; Webb; Bale, 2019Whiteley, Paul; Poletti, Monica; Webb, Paul; Bale, Tim. “Oh Jeremy Corbyn! Why Did Labour Party Membership Soar after the 2015 General Election?”. The British Journal of Politics and International Relations, v. 21, n. 1, 2019, pp. 80-98. [https://doi.org/10.1177/1369148118815408]
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). Por outro, sua ambiguidade em relação ao Brexit, a saída do Reino Unido da União Europeia, favoreceu a vitória do “sim” no referendo. Entre outras consequências, a postura eurocética permitiu que o Partido Trabalhista fosse ultrapassado, na Escócia, pelo Partido Nacional Escocês (Beech, 2021Beech, Matt. “Brexit and the Labour Party: Europe, Cosmopolitanism and the Narrowing of Traditions”. British Politics 16, n. 2, jun. 2021, pp. 152-69. [https://doi.org/10.1057/s41293-021-00168-6]
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). Hoje, pela primeira vez desde a Segunda Guerra Mundial, o Partido Trabalhista parece incapaz de formar sozinho maioria no Parlamento. Fora do Reino Unido, a esquerda de ruptura também começou a perder fôlego, apesar de suas passagens marcantes pelo poder, com o Syriza, eternizado pelo personagem de Yanis Varoufakis, retratado pelo cineasta Costas-Gavras, liderando a Grécia durante os anos mais duros da crise da Zona Euro.

Nos Estados Unidos, Bernie Sanders, frequentemente associado a Jeremy Corbyn, perdeu duas prévias do Partido Democrata, enquanto Jean-Luc Mélenchon também fracassou em sua promessa de chegar ao segundo turno das eleições presidenciais francesas. Em clima de fim de reinado, Pablo Iglesias abdicou da liderança do Podemos em 2021, depois de múltiplas querelas e acusações de personalismo.

Embora a experiência da Nupes mostre que é prematuro decretar o fim da era da esquerda de ruptura, três elementos sugerem que a fase de formação e crescimento está dando lugar a um novo momento, de consolidação e desenvolvimento. Com efeito, os partidos da esquerda de ruptura viram uma parte de seu eleitorado regressar aos partidos tradicionais de centro-esquerda depois do advento da pandemia de coronavírus. À primeira vista, isso se deve a três motivos. Primeiro, a pandemia deu nova legitimidade ao Estado social, cujas defesa e construção são fortemente associadas à social-democracia. Segundo, o processo de radicalização da direita, que, como veremos, se intensificou depois de 2017, também tornou o eleitor de esquerda mais pragmático em suas escolhas eleitorais. Terceiro, os partidos da esquerda de ruptura também caíram nos erros cometidos por seus predecessores, como o personalismo, a falta de renovação e a burocratização. Símbolo desse processo, Pablo Iglesias se retirou da política depois de o Podemos atravessar dois congressos difíceis marcados por polêmicas sobre seu patrimônio e seu domínio sobre o partido. Talvez ainda mais importante, a esquerda de ruptura obrigou os partidos tradicionais de centro-esquerda a se transformarem para sobreviver.

PERSPECTIVAS

Esta seção discute se a transformação da esquerda vista na seção anterior se insere numa mudança mais ampla dos sistemas partidários. As consequências da crise econômica e financeira de 2008 começaram a ficar visíveis entre 2009 e 2012, com as vitórias do Syriza na Grécia e do Partido Pirata na Islândia, organizados em torno de críticas ao sistema capitalista, e se aceleraram em 2016 e 2018, com as vitórias do Brexit no Reino Unido, de Donald Trump nos Estados Unidos, de Jair Bolsonaro no Brasil. Em praticamente todas as democracias representativas ocidentais, os partidos tradicionais foram submetidos a uma forte pressão eleitoral que minou, quase em definitivo, o consenso centrista que unia a direita conservadora liberal e a esquerda social-liberal.

Na direita, assistiu-se à ultrapassagem da direita conservadora liberal por uma corrente rival, nacionalista, protecionista e socialmente reacionária. As vitórias de Boris Johnson e Donald Trump, dois de seus expoentes mais bem-sucedidos, se destacam pela capacidade de ambos em mudar a identidade histórica dos partidos social-liberais, tirando vantagem de mecanismos institucionais (prévias partidárias) e aproveitando as mudanças sociológicas de sua base eleitoral. Os sucessos conservadores anglo-saxões tiveram em comum a conquista de bastiões regionais que pertenciam à esquerda pelo menos desde os anos 1960.

Quando os partidos tradicionais resistiram, eles foram ameaçados por novas formações que buscam suas raízes nos movimentos de extrema direita. Como o espanhol Vox, o alemão afd e o português Chega surgiram depois da crise de 2008 e são globalmente definidos como “populistas radicais de direita: defendem posições anti-imigração e combatem o feminismo, propõem medidas defensoras da lei e da ordem e criticam o sistema, enquanto alegam representar a vontade popular (Manucci; Heyne, 2021Heyne, Lea; Manucci, Luca. “A New Iberian Exceptionalism? Comparing the Populist Radical Right Electorate in Portugal and Spain”. Political Research Exchange v. 3, n. 1, 2021. [https://doi.org/10.1080/2474736X.2021.1989985]
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). À imagem da italiana Liga Norte, a afd é na sua origem um partido regionalista que se tornou a terceira força política nacional nas eleições legislativas federais de 2017, mobilizando os eleitores das regiões abandonadas do leste alemão, onde os benefícios da integração europeia não foram sentidos. Enquanto o Vox cresce em cima da tensão regionalista - ele parte de uma corrente da direita espanhola que acusa o PP de ser demasiadamente moderado na repressão dos independentistas catalães -, o Chega cresce no “Portugal esquecido” do Alentejo interior, Ribatejo e Algarve (Heyne; Manucci, 2021Heyne, Lea; Manucci, Luca. “A New Iberian Exceptionalism? Comparing the Populist Radical Right Electorate in Portugal and Spain”. Political Research Exchange v. 3, n. 1, 2021. [https://doi.org/10.1080/2474736X.2021.1989985]
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).

Na França, a competição entre a extrema direita e os movimentos populistas radicais de direita ganhou em intensidade na eleição de 2022, marcada por dois fenômenos concomitantes: por um lado, a implosão do partido gaullista Os Republicanos, que atingiu seu mínimo histórico com sua candidata Valérie Pécresse - para William Rispin, o partido foi a principal vítima do realinhamento político e das divisões internas da direita sobre identidade, liberalismo e União Europeia (Rispin, 2021Rispin, William. The French Centre Right and the Challenges of a Party System in Transition. Londres: Palgrave MacMillan, 2021.); por outro, a emergência de uma nova força na direita, representada pelo polemista xenófobo Éric Zemmour. As três formações atualmente no páreo se complementam: Os Republicanos mantêm a maior base parlamentar, enquanto a chefe do Agrupamento Nacional Marine Le Pen é a principal figura presidenciável, e Éric Zemmour, o protagonista da esfera midiática, ou “trumpista”. A direita francesa passa agora pelo desafio de se reorganizar de acordo com sua divisão histórica estabelecida por René Rémond (Rémond, 1954Remond, Réné. Les Droites en France. Paris: Aubier, 1954.).

Também se tornou comum ver novas formações se organizarem com o objetivo de ocupar o vazio deixado pelo sistema bipartidário e explorar as ambiguidades crescentes em torno das divisões ideológicas. Esse fenômeno é perceptível pelo menos desde os anos 1990, quando o apresentador de televisão Silvio Berlusconi triunfou nas eleições parlamentares com um partido criado na véspera, o Forza Italia. Essas “entradas em campo” (expressão usada por Berlusconi) de personalidades de fora do mundo da política se tornaram mais comuns na segunda década do século XX. Essas novas formações compartilham características. Elas são desenhadas para servir uma aventura política pessoal, mais do que para representar uma mobilização coletiva. Elas costumam se equipar de técnicas de comunicação inovadoras e dificilmente assimiláveis por políticos tradicionais. Por fim, elas navegam deliberadamente entre as linhas ideológicas e profissionais. Ni de gauche ni de droite (nem de esquerda nem de direita), elas também não são nem políticas nem outsiders.

Na Itália, o Movimento 5 Estrelas, cuja formação foi narrada por Giuliano da Empoli, é o resultado da parceria entre uma figura pública, o comediante e blogueiro Beppe Grillo, e uma empresa privada de comunicação (Empoli, 2019Da Empoli, Giuliano. Os engenheiros do caos. São Paulo: Vestígio, 2019.). O movimento A República em Marcha de Emmanuel Macron se diz nem de esquerda nem de direita, mas seu líder militou por mais de uma década no Partido Socialista. No entorno do brasileiro Agora!, o apresentador de televisão Luciano Huck podia contar com veteranos da classe política como Armínio Fraga e Paulo Hartung. Na mesma linha, antes de se tornar uma figura das Relações Internacionais, Volodimir Zelenski era uma curiosidade política que venceu as presidenciais com um partido inspirado pela comédia que ele estreava, A serviço do povo, cuja força política dependia do jogo de equilíbrio entre as elites ucranianas pró-russas e pró-europeias. O “velho mundo”, expressão usada pelos macronistas para difamar o sistema político, nunca se separou do “novo mundo”.

A tripla transformação do sistema partidário tem estado no centro das discussões dos cientistas sociais, preocupados com os rumos da democracia. No argumento clássico de Levitsky e Ziblatt, o caráter hiperpartidário da política americana comprometeu as normas da estabilidade democrática, como a ausência de tolerância mútua e de respeito da isonomia das instituições (Levitsky; Ziblatt, 2018Levitsky, Steven; Ziblatt, Daniel. Como as democracias morrem. São Paulo: Companhia das Letras, 2018.). Outros sublinham que a radicalização se tornou um fenômeno mais importante que a polarização. Dominado pelo ideário de Donald Trump, o Partido Republicano é o principal instigador da guinada iliberal da democracia americana. Seus militantes viraram ativistas administrativos que estão assumindo o controle dos instrumentos da administração eleitoral, numa estratégia teorizada como subversão eleitoral. Michael Barber e Jeremy Pope mostram que a lealdade partidária continua forte entre Republicanos, apesar da ideologização sob Trump (Barber; Pope, 2019Barber, Michael; Pope, Jeremy C. “Conservatism in the Era of Trump”. Perspectives on Politics, v. 17, n. 3, set. 2019, pp. 719-36. [https://doi.org/10.1017/S153759271900077X]
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). O temor de que o partido defenda uma agenda abertamente antidemocrática na próxima eleição levou formadores de opinião a defender a composição de uma aliança ampla entre democratas e republicanos moderados (Friedman, 2022Friedman, Thomas. “Biden-Cheney 2024?”. The New York Times, 11/01/2022.). Com efeito, o colapso eleitoral da centro-direita tem trazido de volta o debate sobre as “Grandes Tendas”, ou formações que abrigam todas as correntes democráticas.

A questão do recuo do “clube dos partidos de governo” não está perto de ser plenamente resolvida. Tendo 2008 como fim de uma era, é possível retraçar a longa história dos partidos de governo desde o final da Segunda Guerra Mundial. As primeiras mudanças ficam aparentes nos anos 1970, quando o aumento da abstenção começa a ser acompanhado por uma dissipação do voto por novos movimentos, ecologistas ou de direita radical. Pierre Martin estabelece quatro fatores principais para o recuo desses partidos: a redução do crescimento econômico e o aumento das desigualdades; a ampliação das expectativas dos cidadãos em relação aos governos num contexto de crescimento do desejo de consumo, o que potencializa as frustrações; a revolta antiburocrática e antifiscal alimentada pela disseminação do ideário liberal que recusa a presença do Estado; e a crítica da “classe política” por parte dos eleitores. O autor aponta para a substituição da clivagem tradicional entre esquerda e direita por duas novas clivagens, uma opondo identidade e cosmopolitismo (que engloba a oposição entre pós-nacionalismo e soberanismo) e outra que opõe altermundialistas e globalistas. Essa análise permite, segundo Martin, estabelecer um elo entre os eleitores da esquerda de ruptura: as classes médias diplomadas, os jovens e desiludidos com a globalização, e as classes populares, que continuam mais atraídas pela abstenção e por outros partidos (Martin, 2017Martin, Pierre. “Un séisme politique”. Commentaire, v. 2, n. 158, 2017, pp. 249-64.).

A “esquerda de coalizão” surgiu como contraponto à “esquerda de ruptura”. Ela tem como premissa, primeiro, que a radicalização da direita deve ser combatida pela afirmação dos valores tradicionais da social-democracia e particularmente do poder transformador do Estado social. Segundo, ela estabelece que os partidos do mesmo campo ideológico devem trabalhar juntos para manter suas maiorias eleitorais, em vez de competir entre si e contribuir para a fragmentação do sistema político. Terceiro, se os agonistas defendem a dimensão “instituinte” do poder transformador do Estado social, que implica a criação de novas arenas de contestação popular contra as elites, a esquerda de coalização aceita a preservação das regras e procedimentos democráticos “instituídos”.4 4 Essa questão ficou particularmente visível na política partidária da América Latina, que não está no cerne deste artigo. O governo venezuelano de Hugo Chávez — e a esquerda chavista que se fortaleceu na região — não apenas apelava à ruptura com o modelo da Terceira Via blairista, como também defendia o abandono da democracia liberal por ela ser essencialmente incompatível com um projeto de transformação progressista. Para ela, a social-democracia rompeu esse embate de determinismos ao aderir à “primazia da política”, ou à ideia de que é possível oferecer soluções políticas institucionais para problemas econômicos. Para Sheri Berman, a “primazia da política” é a forma como a social-democracia rompeu com o debate de determinismo do começo do século XX, quando o imperialismo e o marxismo se opunham, à sua maneira, à democracia liberal (Berman, 2009Berman, Sheri. “The Primacy of Economics versus the Primacy of Politics: Understanding the Ideological Dynamics of the Twentieth Century”. Perspectives on Politics , v. 7, n. 3, 2009, pp. 561-78.).

Os socialistas ibéricos foram os primeiros a explorar esse caminho. O português António Costa recuperou um Partido Socialista desgastado pela debacle do ex-premiê José Sócrates e enfraquecido pela esquerda de ruptura local, o Bloco de Esquerda. Ele superou as divisões entre socialistas e comunistas, que remontavam aos anos 1970, para formar uma aliança de circunstância na Assembleia da República e impedir a recondução do Partido Social Democrata depois das eleições legislativas de 2015. Seu bem-sucedido governo, que organizou as diferentes correntes da esquerda portuguesa em torno de uma agenda pró-europeia e reformista, ganhou o nome de “Geringonça”. Delegações de outros partidos de centro-esquerda europeus se debateram com a tradução da expressão portuguesa, sugerida por um opositor que buscava difamar o projeto de Costa. A francesa “Briquebalante” e a holandesa “Krakende wagen” não prosperaram, mas, pela primeira vez desde a Revolução dos Cravos, a esquerda portuguesa voltava a ser objeto de estudo para seus homólogos europeus (Ames, 2017Ames, Paul. “European Left Wants Piece of Portugal’s ‘Contraption’”. Politico, 24/02/2017. Disponível em: <Disponível em: https://www.politico.eu/article/antonio- costa-ps-socialists-european-left-wants-piece-of-portugal-contraption/ >. Acesso em: 27/4/2022.
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). Pouco tempo depois, na Espanha, o Podemos, após uma sucessão de pleitos inconclusivos e desgastantes, aceitou entrar como parceiro minoritário em um governo liderado pelos socialistas. Incialmente visto como frágil e condenado ao fracasso, o atual primeiro-ministro Pedro Sánchez já está no poder há mais de um mandato. Um processo semelhante se desenrolou na Alemanha, onde o spd regressou ao poder por meio de uma grande coalizão com liberais e verdes e com uma plataforma ideologicamente mais à esquerda do que em todos os pleitos do século XXI. Terceira força eleitoral da Alemanha em 2013, a esquerda de ruptura liderada pela formação fundada em 2007 Die Linke teve de batalhar para manter seu espaço no parlamento.

O Partido dos Trabalhadores surge, nesse contexto, como exemplo paradigmático.5 5 Na comparação entre a trajetória recente do PT e de outros partidos da social-democracia, cabe também sublinhar a especificidade do contexto. No poder, o PT, como notou Lincoln Secco em sua História do PT, ampliou sua coalizão em direção aos excluídos, não à classe média, como fez a social-democracia. Isso se explica, é claro, pela diferença de estruturas de classe: no Brasil, os excluídos são muito mais numerosos (e, portanto, eleitoralmente relevantes) que na Europa. O PT não é vulnerável a críticas como o abandono dos “excluídos da globalização” como talvez outras formas de “terceira via” sejam. Frequentemente descrito como engessado ou ordenado para agir em função dos objetivos políticos de Lula, o partido passou por importantes debates internos, inclusive nos anos turbulentos da Lava Jato. Em artigo de junho de 2018, o líder do PT no Senado Lindbergh Farias citou o “discurso contundente” do britânico e o “radicalismo patriótico” do francês como exemplos de que é possível “disputar as massas em pé de igualdade” (Farias; Meneses, 2019). Em livro publicado pela Fundação Perseu Abramo, Podemos e Bloco de Esquerda são descritos como os partidos que passaram a encarnar a “esperança social-democrata radical, originária, esperançosa” (Moraes, 2016Moraes, Reginaldo. Bloco de esquerda e Podemos. São Paulo: Fundação Perseu Abramo, 2016. Disponível em: <Disponível em: https://fpabramo.org.br/publicacoes/estante/bloco-de-esquerda-e-podemos/ >. Acesso em: 03/4/2022.
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). Na política eleitoral de 2018, a disputa tomou forma com a oposição entre a plataforma de coalizão, que passava pelo lançamento da candidatura de Fernando Haddad, e a ruptura, que pleiteava a candidatura da presidente do partido, Gleisi Hoffmann. A candidatura de Fernando Haddad em 2018 carregava as contradições dessa tensão interna. Elas só seriam sanadas três anos mais tarde, quando a restituição dos direitos políticos de Lula e o imperativo de construir uma frente contra Jair Bolsonaro levaram à constituição de uma aliança de coalizão com Geraldo Alckmin.

CONCLUSÃO

O objetivo deste ensaio foi situar a formação da candidatura presidencial de Lula e Geraldo Alckmin na trajetória histórica da política partidária das democracias representativas ocidentais. A explicação estrutural-global continua sendo a forma mais eficiente de interpretar as idiossincrasias do cenário nacional. É possível distinguir três dinâmicas principais: a evolução do Partido dos Trabalhadores acompanha as transformações da centro-esquerda - a intuição de Lula, que mantém relações pessoais e regulares com lideranças europeias, africanas e asiáticas; a trajetória de quadros, militantes e intelectuais formados no exílio; e as trocas internacionais entre partidos de centro-esquerda, muito mais fortes do que entre partidos de centro-direita. De sua criação, em 1980, a 2022, o partido sempre buscou adaptar suas estratégias políticas às mudanças de orientação programática da esquerda global. Esse alinhamento local-global se deve a uma combinação de fatores que merecem ser tratados com maior profundidade.

Em seguida, a opção de Lula por se aproximar de Alckmin é uma reação à radicalização da direita, que abre espaço para o PT voltar a ocupar o centro do espectro político. Nesse sentido, o catalisador da chapa Lula-Alckmin não é o PT, mas o próprio PSDB. A quebra do chamado “cordão sanitário” com a extrema direita em 2018 colocou o partido de centro-direita numa situação de vulnerabilidade extrema. Em vez de explorar as tensões internas do PT para se aproximar do eleitor moderado, o PSDB se tornou uma caricatura de si próprio, liberal e elitista. Sob o comando de João Doria, esqueceu que a tarefa principal de um partido é criar os conflitos significativos, pensando o lado da oferta e não apenas da demanda eleitoral (Müller, 2021Müller, Jan-Werner. Democracy Rules. Nova York: Farrar, Straus and Giroux, 2021.). A centro-direita, no Brasil e no mundo, falhou miseravelmente em identificar e propor quais seriam as divisões políticas e os problemas urgentes do mundo globalizado nas democracias.

O resultado foi o espalhamento da direita brasileira, outrora unida em torno de um partido, em três correntes: a social, que hoje compõe o projeto do PT, a liberal, que forma com outros partidos a comumente chamada Terceira Via, e a radical, incorporada ao bolsonarismo. Com a consolidação de um movimento de extrema direita na política brasileira, resta saber como será organizada a dinâmica política depois de 2022. Vislumbram-se a opção francesa, que consiste na “tripolarização” entre dois partidos antissistema e um de centro, liberal e defensor da globalização, ou a opção americana, com a constituição de uma “Grande Tenda” que abrigue todas as correntes democráticas. Depois de sobreviver ao terremoto de 2008-2020, o PT surge como principal ator da recomposição. Suas chances de se impor duravelmente no centro dependem de sua capacidade de conciliar as tensões, que se dissiparam apenas momentaneamente, entre a esquerda de ruptura e a de coalizão.

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  • 1
    Ben Judah narra a transformação do pensamento econômico das elites europeias a paartir da trajetória de Mario Draghi, presidente do Banco Central Europeu, em “The Sphinx who Reshaped Europe” (Judah, 2021Judah, Ben. “The Sphinx who Reshaped Europe”. The Critic, mai. 2021.).
  • 2
    Vale lembrar, como sempre apontaram Ivan Krastev e Stephen Holmes, que a crise migratória na Europa e em parte nos EUA foi causada pelas intervenções de mudança de regime no Oriente Médio e na Ásia, bem como por uma postura paternalista no Leste Europeu (Krastev; Holmes, 2020Krastev, Ivan; Holmes, Stephen. The Light that Failed: A Reckogning. Londres: Penguin, 2020.).
  • 3
    Este texto recorre ao conceito de populismo elaborado por Chantal Mouffe e Ernesto Laclau para descrever conceitualmente a esquerda de ruptura. Essa interpretação do populismo não deve ser estendida a outros fenômenos políticos, como a direita também descrita como populista.
  • 4
    Essa questão ficou particularmente visível na política partidária da América Latina, que não está no cerne deste artigo. O governo venezuelano de Hugo Chávez — e a esquerda chavista que se fortaleceu na região — não apenas apelava à ruptura com o modelo da Terceira Via blairista, como também defendia o abandono da democracia liberal por ela ser essencialmente incompatível com um projeto de transformação progressista.
  • 5
    Na comparação entre a trajetória recente do PT e de outros partidos da social-democracia, cabe também sublinhar a especificidade do contexto. No poder, o PT, como notou Lincoln Secco em sua História do PT, ampliou sua coalizão em direção aos excluídos, não à classe média, como fez a social-democracia. Isso se explica, é claro, pela diferença de estruturas de classe: no Brasil, os excluídos são muito mais numerosos (e, portanto, eleitoralmente relevantes) que na Europa. O PT não é vulnerável a críticas como o abandono dos “excluídos da globalização” como talvez outras formas de “terceira via” sejam.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Set 2022
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2022

Histórico

  • Recebido
    23 Maio 2022
  • Aceito
    26 Ago 2022
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