Acessibilidade / Reportar erro

O Organizar de Práticas de Gestão de Atividades Artísticas e Culturais em uma Escola pública 1 1 . Os autores usam linguagem inclusiva, que reconhece a diversidade, demonstra respeito por todas as pessoas, é sensível a diferenças e promove oportunidades iguais.

Resumo

Este artigo objetivou analisar o organizar das práticas de gestão de atividades artísticas e culturais em uma instituição federal de ensino. Para isso, utiliza as contribuições do organizing e da prática como lente como abordagens epistemológicas e se caracteriza como uma pesquisa de natureza qualitativa, desenvolvida em duas fases: uma exploratória, que envolve análise de documentos e duas entrevistas projetivas, e uma fase de imersão em campo, caracterizada pelo método da observação participante e pela análise das práticas de gestão na implantação de um Núcleo de Arte e Cultura na instituição federal de ensino estudada. Como resultados, obteve-se que a abordagem do organizing articulada às práticas de gestão de atividades artísticas e culturais possibilita entender a gestão de maneira menos ortodoxa em relação ao binarismo comum ao campo da gestão escolar, que envolve constante disputa entre elementos e ideologias da gestão democrática e da gestão tradicional. O estudo contribui por caracterizar o processo de ressignificação dos aspectos materiais na prática da gestão escolar, o que possibilita problematizar o uso dos planejamentos administrativos e o papel da contextualidade na atribuição de competências das dinâmicas grupais e apontar os efeitos das tomadas de decisões na gestão escolar.

devir da prática; lente da prática; organizing; gestão escolar; arte e cultura na escola

Abstract

This paper aims to analyze the organizing of art and culture management practices in a federal education institute. To that end, we utilize the contributions of two epistemological approaches, organizing and the practice lens. The study is characterized as qualitative research, developed in two main steps: an exploratory step, which involves the analysis of documents and two projective interviews; and a field immersion step, characterized by participant observation and by the analysis of management practices in the implantation of an Art and Culture Nucleus at the studied institute. As a result, an organizing approach articulated with art and culture management practices enables one to understand school management in a less orthodox manner in opposition to the usual binarism of the school management research field, which involves the disputes between elements and ideologies of the traditional school management and the democratic school management approaches. The study contributes by characterizing the process of re-signification of material aspects in the practice of school management, which makes it possible to problematize the use of administrative planning and the role of contextuality in the attribution of competences of group dynamics, and to point out the effects of decision-making in school management.

becoming of practice; practice lens; organizing; school management; art and culture in school

Introdução

De maneira geral, os estudos que exploram atividades artísticas e culturais na escola brasileira se interessam pela promoção e pela trajetória de atividades diversas, apresentam os benefícios das atividades de extensão para a escola e a comunidade na qual ela se insere e podem estar articulados ou não à corrente da Extensão Escolar (i.e. Crepalde, 2015Crepalde, N. J. B. F. (2015). Produção musical, consumo cultural e extensão universitária. Revista Tecer, 8(15). Recuperado de https://bit.ly/3Xjwfpe
https://bit.ly/3Xjwfpe...
; Francelino & Bregalda, 2020Francelino, V. C. S., Bregalda, M. M. (2020). Poesia, arte e sensibilidade: contribuições de um projeto de extensão para a formação de estudantes de terapia ocupacional. Cadernos Brasileiros de Terapia Ocupacional, 28(1), 50-73. doi:10.4322/2526-8910.ctoAO1820 ; Gagliardi, 1998Gagliardi, M. (1998). O teatro, a escola e o jovem espectador. Comunicação & Educação, (13), 67-72. doi: https://doi.org/10.11606/issn.2316-9125.v0i13p67-72
https://doi.org/10.11606/issn.2316-9125....
; Japiassu, 1998Japiassu, R. O. V. (1998). Jogos teatrais na escola pública. Revista da Faculdade de Educação, 24(2), 81-97. doi:10.1590/S0102-25551998000200005
https://doi.org/10.1590/S0102-2555199800...
; Madureira, 2013Madureira, J. R. (2013). A dança e a formação da criança: algumas reflexões sobre a experiência na Vila Educacional de Meninas. Extramuros, 1(2), 77-84. Recuperado de https://bit.ly/3XW1Y6S
https://bit.ly/3XW1Y6S...
; Madureira & Moura, 2016Madureira, J. R., Moura, P. C. de. (2016). O ensino de música em debate: uma síntese dos 5 anos de atividades do projeto “Rítmica Dalcroze e a Formação de Crianças Musicistas”. Revista ELO – Diálogos em Extensão, 5(1), 19-28. doi:10.21284/elo.v5i1.109 ; Silva & Neves, 2015Silva, J. A. P., Neves, M. C. D. (2015). Arte e ciência: possibilidades de reaproximações na contemporaneidade. Interciencia, 40(6), 423-432. Recuperado de https://bit.ly/3gLHz3D
https://bit.ly/3gLHz3D...
; Sousa Carvalho et al., 2015)Sousa Carvalho, H., de Almeida, D. A., de Sousa Castro, M., Rodrigues, M. D. R. D., & dos Santos, F. K. D. S. (2015). Arte e educação: uma experiência extensionista do teatro na escola pública. Revista Conexão UEPG, 11(2), 158-167. Recuperado de https://bit.ly/3UlEx3Q
https://bit.ly/3UlEx3Q...
. Uma característica notada nos estudos citados, que são o excerto da busca por pesquisas que contemplassem atividades artísticas e culturais na escola, é a pouca atenção dada aos aspectos organizativos de tais atividades. De fato, uma busca realizada nas plataformas Scopus, Periódicos CAPES e Scielo com os termos “ art ”, “ culture ” ou “ art and culture ” e “ school management ” ou “ education management ”, no período entre 2017 e 2022, não retornam resultados significativos. Mesmo variações como “ artistic activities ” e “ cultural activities ”, quando casadas com “ school management ” ou “ education management ”, não retornam resultados, indicando uma lacuna de estudos que abordem o processo organizativo de atividades artísticas e culturais no contexto da gestão escolar.

A partir da constatação de tal lacuna, desenvolvemos um estudo que articula a perspectiva de prática como lente, discutida em Gherardi (2009a), ao processo de implantação de um Núcleo de Arte e Cultura (NAC) em uma instituição federal de ensino, pensando uma abordagem contemporânea da Administração ( Bispo, 2021Bispo, M. de S. (2021). Refletindo sobre administração contemporânea. Revista de Administração Contemporânea, 26(1), 1-5. doi:10.1590/1982-7849rac2022210203 ), com o objetivo de analisar o organizar das práticas de gestão de atividades artísticas e culturais em uma instituição federal de ensino.

A instituição da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, que cria os Institutos Federais de Educação a partir da lei nº 11.892, de 29 de dezembro de 2008, é um marco para o desenvolvimento da educação pública brasileira ( Otranto, 2010Otranto, C. R. (2010). Criação e implantação dos institutos federais de educação, ciência e tecnologia – IFETs. Retta, 1(1), 89-110. Recuperado de https://bit.ly/3UekEeU
https://bit.ly/3UekEeU...
, 2012Otranto, C. R. (2012). Reforma da educação profissional no Brasil: marcos regulatórios e desafios. Revista Educação em Questão, 42(28), 199-226. Recuperado de https://bit.ly/3AWxcRg
https://bit.ly/3AWxcRg...
). O artigo 6º da lei citada inclui, entre as finalidades dos Institutos Federais, a produção da cultura local. Apesar disso, a rede ainda alimenta uma característica tecnicista (Nascimento, Cavalcanti, & Ostermann, 2020), na qual as atividades voltadas à cultura assumem posição diminuta. Como resposta à necessidade legalmente reconhecida de desenvolvimento de atividades culturais, o NAC é um órgão de apoio à extensão escolar idealizado por um professor da rede há mais de dez anos. O propósito do NAC é operacionalizar a política cultural do Instituto Federal do estado por meio da organização e promoção de atividades artísticas e culturais, principalmente que estejam articuladas à cultura local.

Apesar de existir como planejamento há mais tempo, a história do desenvolvimento de atividades artísticas e culturais sob a bandeira do NAC só foi reconhecida formalmente em meados de 2013, seguindo um longo processo de implantação de NAC em toda a rede do Instituto. Atualmente, o órgão está presente em todos os campi do Instituto Federal do estado. Esta pesquisa acompanhou o último processo de implantação do órgão, observando as implicações dessa jornada para a escola estudada.

Para sustentar a articulação entre administração e extensão escolar, buscamos apoio na perspectiva de Abdian, Nascimento e Silva (2016), Abdian (2018)Abdian, G. Z. (2018). Revezamento teoria e prática na análise da escola pública democrática. Educar em Revista, 34(68), 107-122. doi:10.1590/0104-4060.57481
https://doi.org/10.1590/0104-4060.57481...
e Andrade e Abdian (2019)Andrade, É., Abdian, G. Z. (2019). A construção de objetos de estudo em currículo e gestão escolar: desafios aos pesquisadores em educação. Notandum, 50(22), 143-161. doi:10.4025/0.4025/notandum.v0i50.47643 , segundo os quais devemos buscar novos rumos teóricos para a compreensão da gestão escolar, entendendo que tais rumos e suas reais possibilidades de transformação precisam envolver um olhar sobre o cotidiano. Os autores explicam ainda que a gestão escolar tem uma característica binária baseada tanto na perspectiva teórica da administração empresarial como na perspectiva da gestão democrática da escola, surgida a partir do processo de redemocratização ( Silva, 2011Silva, L. G. A. (2011). Os limites culturais para a consolidação da gestão escolar democrática em um contexto tradicional. Revista Inter Ação, 36(1), 225-244. doi:10.5216/ia.v36i1.15038
https://doi.org/10.5216/ia.v36i1.15038...
). Essa dualidade ocasiona o distanciamento dos estudos do campo em relação ao objeto estudado graças a um excesso de prescrição ( Abdian et al., 2016Abdian, G. Z., Nascimento, P. H. C., Silva, N. D. B. D. (2016). Desafios teórico-metodológicos para as pesquisas em administração/gestão educacional/escolar. Educação & Sociedade, 37(135), 465-480. doi:10.1590/ES0101-73302016154123
https://doi.org/10.1590/ES0101-733020161...
; Andrade & Abdian, 2019Andrade, É., Abdian, G. Z. (2019). A construção de objetos de estudo em currículo e gestão escolar: desafios aos pesquisadores em educação. Notandum, 50(22), 143-161. doi:10.4025/0.4025/notandum.v0i50.47643 ). O caminho que encontramos para contornar a dualidade e nos aproximarmos do campo envolveu o organizing , entendido como uma maneira de tratar a gestão como um conjunto contínuo de processos por meio do qual o organizar se sustenta ( Duarte & Alcadipani, 2016Duarte, M. D. F., Alcadipani, R. (2016). Contributions of Organizing for Organizational Studies. Organizações & Sociedade, 23(76), 57-72. doi:10.1590/1984-9230763
https://doi.org/10.1590/1984-9230763...
; Silva, Dias, & Santos, 2021; Souza, Costa, & Pereira, 2015). Nessa abordagem, a gestão não é tratada como uma estrutura rígida e binária, mas de maneira fluída, que se apresenta aparentemente estável, articulando diversas práticas conforme uma aparente ordem.

A prática, neste estudo, é um tipo de atividade fluida que se justifica socialmente e se desenvolve a partir de circuitos de reprodução que a institucionalizam. Tais circuitos envolvem ações, aprendizado, conhecimento e recursividade ( Geiger, 2009Geiger, D. (2009). Revisiting the Concept of Practice: Toward an Argumentative Understanding of Practicing. Management Learning, 40(2), 129-144. doi:10.1177/1350507608101228
https://doi.org/10.1177/135050760810122...
; Gherardi, 2009a; 2009b; Schatzki, 2018Schatzki, T. (2018). On Practice Theory, or What’s Practices Got to Do (got to do) with it?. In C. Edwards-Groves, P. Grootenboer, & J. Wilkinson (Eds.), Education in an Era of Schooling (pp. 151-165). Nova Iorque: Springer. doi:10.1007/978-981-13-2053-8_11
https://doi.org/10.1007/978-981-13-2053-...
). A noção de prática adotada se ancora nas contribuições da abordagem do “poder crítico” da prática apresentada por Gherardi (2009a), na qual, conforme Corradi, Gherardi e Verzelloni (2010), estuda-se o fazer gestão em três dimensões, quais sejam: o conjunto articulado de atividade; a maneira como o fazer é significado; e os efeitos da prática a partir da metáfora da lente, ou seja, como algo que pode ser visto.

O trabalho está dividido em seis seções principais, começando a partir da articulação teórica entre a gestão escolar e a abordagem da prática como uma lente. Em seguida, descrevemos as características metodológicas das duas fases da pesquisa, bem como as limitações observadas. Ao final, apresentamos três seções: uma contendo os resultados das duas fases da pesquisa, uma seção de análise e outra para discutir as contribuições do estudo para além do NAC. A análise dos resultados se desenvolve a partir de quatro chaves, quais sejam: o uso da tecnologia, o vir a ser da prática, as dinâmicas de grupo e os efeitos da prática. Por fim, apresentamos as considerações finais do estudo.

Gestão escolar democrática e gestão escolar tradicional

Segundo Paro (2010Paro, V. H. (2010). A educação, a política e a administração: reflexões sobre a prática do diretor de escola. Educação e Pesquisa, 36(3), 763-778. doi:10.1590/S1517-97022010000300008 , 2018Paro, V. H. (2018). Gestão escolar, democracia e qualidade do ensino. São Paulo, SP: Intermeios. ), a administração/gestão escolar é o aspecto de principal importância para a discussão sobre a educação brasileira. Para o autor, a gestão escolar representa o “. . . meio para realização de fins e de uma concepção de política como convivência (conflituosa ou não) entre sujeitos . . .” ( Paro, 2010Paro, V. H. (2010). A educação, a política e a administração: reflexões sobre a prática do diretor de escola. Educação e Pesquisa, 36(3), 763-778. doi:10.1590/S1517-97022010000300008 , p. 765). Partindo de outra perspectiva sobre a gestão escolar, estudos como os de Oliveira e Carvalho (2018)Oliveira, A. C. P. D., Carvalho, C. P. D. (2018). Gestão escolar, liderança do diretor e resultados educacionais no Brasil. Revista Brasileira de Educação, 23. doi:10.1590/S1413-24782018230015 e Lima, Fonseca e Santos (2018), que analisam o papel do gestor na escola, demonstram como a gestão da escola não atinge o ideal prescrito. De acordo com Paro (2010Paro, V. H. (2010). A educação, a política e a administração: reflexões sobre a prática do diretor de escola. Educação e Pesquisa, 36(3), 763-778. doi:10.1590/S1517-97022010000300008 , 2018Paro, V. H. (2018). Gestão escolar, democracia e qualidade do ensino. São Paulo, SP: Intermeios. ), a gestão escolar é ruim e ineficiente, o que justificaria o não atendimento do ideal prescrito. Entretanto, argumentamos que a dissociação entre a escola real e a escola prescrita está relacionada à maneira como a gestão escolar é estudada, o que conflita com a maneira como ela é praticada ( Abdian et al., 2016Abdian, G. Z., Nascimento, P. H. C., Silva, N. D. B. D. (2016). Desafios teórico-metodológicos para as pesquisas em administração/gestão educacional/escolar. Educação & Sociedade, 37(135), 465-480. doi:10.1590/ES0101-73302016154123
https://doi.org/10.1590/ES0101-733020161...
). As razões para que isso ocorra envolvem aspectos históricos que estão além da discussão sobre eficiência.

a gestão/administração escolar pública brasileira se baseou, até 1980, no aporte teórico das diferentes escolas de administração de empresas (Abdian, Hojas, & Oliveira, 2012; Abdian et al., 2016Abdian, G. Z., Nascimento, P. H. C., Silva, N. D. B. D. (2016). Desafios teórico-metodológicos para as pesquisas em administração/gestão educacional/escolar. Educação & Sociedade, 37(135), 465-480. doi:10.1590/ES0101-73302016154123
https://doi.org/10.1590/ES0101-733020161...
; Russo, 2004)Russo, M. H. (2004). Escola e paradigmas de gestão. EccoS–Revista Científica, 6(1), 25-42. doi:10.5585/eccos.v6i1.366
https://doi.org/10.5585/eccos.v6i1.366...
. Contudo, naquela década, ocorreu a apropriação do paradigma crítico da pedagogia sobre a gestão escolar ( Maia, 2010)Maia, G. Z. A. (2010). As publicações da ANPAE e a trajetória do conhecimento em administração da educação no Brasil. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, 24(1), 31-50. doi:10.21573/vol24n12008.19237 . Isso levou a um rompimento epistemológico por meio do qual surgem estudos sobre o cotidiano escolar que inserem a própria escola como objeto de desenvolvimento de sua gestão ( Abdian et al., 2016)Abdian, G. Z., Nascimento, P. H. C., Silva, N. D. B. D. (2016). Desafios teórico-metodológicos para as pesquisas em administração/gestão educacional/escolar. Educação & Sociedade, 37(135), 465-480. doi:10.1590/ES0101-73302016154123
https://doi.org/10.1590/ES0101-733020161...
.

De acordo com Abdian et al. (2016)Abdian, G. Z., Nascimento, P. H. C., Silva, N. D. B. D. (2016). Desafios teórico-metodológicos para as pesquisas em administração/gestão educacional/escolar. Educação & Sociedade, 37(135), 465-480. doi:10.1590/ES0101-73302016154123
https://doi.org/10.1590/ES0101-733020161...
, é a partir desse rompimento epistemológico que surge a chamada teoria da gestão democrática, que se refere à gestão escolar considerando a especificidade da escola e a participação da comunidade no processo de tomada de decisões. A teoria da gestão democrática constrói um referencial crítico para a análise da escola, oferecendo ferramentas para a sua transformação ( Abdian et al., 2016Abdian, G. Z., Nascimento, P. H. C., Silva, N. D. B. D. (2016). Desafios teórico-metodológicos para as pesquisas em administração/gestão educacional/escolar. Educação & Sociedade, 37(135), 465-480. doi:10.1590/ES0101-73302016154123
https://doi.org/10.1590/ES0101-733020161...
; Russo, 2004Russo, M. H. (2004). Escola e paradigmas de gestão. EccoS–Revista Científica, 6(1), 25-42. doi:10.5585/eccos.v6i1.366
https://doi.org/10.5585/eccos.v6i1.366...
). Entretanto, para que a transformação da educação em torno de ideais democráticos ocorra, é preciso repensar a escola em face do modelo de organização burocrática. Para Russo (2004)Russo, M. H. (2004). Escola e paradigmas de gestão. EccoS–Revista Científica, 6(1), 25-42. doi:10.5585/eccos.v6i1.366
https://doi.org/10.5585/eccos.v6i1.366...
, o grande desafio no campo da educação é, a partir das pesquisas com orientação crítica, colocar a educação a serviço das camadas populares, transformando-a em instrumento de emancipação e de construção da hegemonia da classe trabalhadora e reconhecendo que há, historicamente, uma divergência no que se refere à forma como a gestão ocorre e como ela é apresentada, discutida e estudada ( Maia, 2010Maia, G. Z. A. (2010). As publicações da ANPAE e a trajetória do conhecimento em administração da educação no Brasil. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, 24(1), 31-50. doi:10.21573/vol24n12008.19237 ).

Entre as divergências do campo da educação, segundo Souza (2007)Souza, A. R. D. (2007). Perfil da gestão escolar no Brasil (Tese de doutorado). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, SP. , está a ênfase em trabalhos sobre gestão escolar voltados a demonstrar como a escola deve se organizar para ser democrática, com menor atenção à descrição e análise de como tem se organizado a gestão da escola. Poubel e Junquilho (2015Poubel, L., Junquilho, G. (2015). A organização das práticas na gestão das escolas públicas brasileiras: uma alternativa de estudo para o contexto escolar. Pensamento & Realidade, 30(3). Recuperado de https://bit.ly/3EOxlaM
https://bit.ly/3EOxlaM...
, 2019Poubel, L., Junquilho, G. S. (2019). Para além do management: o processo de managing em uma escola pública de ensino fundamental no Brasil. Cadernos EBAPE.BR, 17(3), 539-551. Recuperado de https://bit.ly/3VcXffb
https://bit.ly/3VcXffb...
) tangenciam as contribuições de Souza (2007)Souza, A. R. D. (2007). Perfil da gestão escolar no Brasil (Tese de doutorado). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, SP. e criticam a baixa recorrência de pesquisas voltadas para o que as pessoas efetivamente fazem no âmbito da gestão. Para os autores, têm surgido muitos estudos voltados à eficiência da gestão escolar que redundam em demonstrar que esta não é democrática.

Embora a discussão sobre a dissociação entre a escola estudada e a escola praticada seja relevadora, segundo Abdian et al. (2016)Abdian, G. Z., Nascimento, P. H. C., Silva, N. D. B. D. (2016). Desafios teórico-metodológicos para as pesquisas em administração/gestão educacional/escolar. Educação & Sociedade, 37(135), 465-480. doi:10.1590/ES0101-73302016154123
https://doi.org/10.1590/ES0101-733020161...
, não devemos nos ater a analisá-la, pois muitos estudos do campo já se dedicam a esta questão (ver Passone, 2019Passone, E. F. K. (2019). Gestão escolar e democracia: o que nos ensinam os estudos de eficácia escolar. Laplage em Revista, 5(2), 142-156. ). Abdian et al. (2016)Abdian, G. Z., Nascimento, P. H. C., Silva, N. D. B. D. (2016). Desafios teórico-metodológicos para as pesquisas em administração/gestão educacional/escolar. Educação & Sociedade, 37(135), 465-480. doi:10.1590/ES0101-73302016154123
https://doi.org/10.1590/ES0101-733020161...
sugerem que devemos ir além, buscando novos rumos para o estudo da gestão escolar. Essa “terceira via” pode envolver o cotidiano, como na pesquisa de Gobbi, Carvalho e Dumer (2017), na qual o cotidiano, tratado a partir das práticas de diálogo, representa um fator relevante para o estudo da gestão escolar. Os autores demonstram que a gestão escolar pode ser estudada como um processo emergente ancorado no equilíbrio entre múltiplas perspectivas e na necessidade de manter o funcionamento da escola. Apesar disso, os estudos da área de administração que abordam o cotidiano na gestão escolar no Brasil são relativamente recentes. Almeida e Junquilho (2013)Almeida, R. A., Junquilho, G. S. (2013). Funções administrativas ou práticas? As “artes do fazer” gestão na escola mirante. Revista de Ciências da Administração, 15(35), 180-195. doi:10.5007/2175-8077.2013v15n35p180 , Poubel e Junquilho (2015)Poubel, L., Junquilho, G. (2015). A organização das práticas na gestão das escolas públicas brasileiras: uma alternativa de estudo para o contexto escolar. Pensamento & Realidade, 30(3). Recuperado de https://bit.ly/3EOxlaM
https://bit.ly/3EOxlaM...
, Abdian et al. (2016)Abdian, G. Z., Nascimento, P. H. C., Silva, N. D. B. D. (2016). Desafios teórico-metodológicos para as pesquisas em administração/gestão educacional/escolar. Educação & Sociedade, 37(135), 465-480. doi:10.1590/ES0101-73302016154123
https://doi.org/10.1590/ES0101-733020161...
e Almeida e González (2018)Almeida, W. D. F. T., González, D. G. (2018). Concepção e práticas de gestão escolar democrática da Escola Padre Antônio Barbosa–Lajedo, Pernambuco–Brasil. Revista Científica de Iniciación a la Investigación, 3(1). Recuperado de https://bit.ly/3H7dpSW
https://bit.ly/3H7dpSW...
são exemplos de trabalhos que oferecem contribuições para a gestão escolar.

Argumentamos que existem possibilidades ainda não exploradas na abordagem da gestão escolar a partir do cotidiano. Para nós, o conhecimento em potencial no cotidiano não se encerra na demonstração de como as metas prescritas não são cumpridas e nem na prescrição de práticas de gestão, mas na utilização do conhecimento do cotidiano para gerar novos rumos propostos por Abdian et al. (2016)Abdian, G. Z., Nascimento, P. H. C., Silva, N. D. B. D. (2016). Desafios teórico-metodológicos para as pesquisas em administração/gestão educacional/escolar. Educação & Sociedade, 37(135), 465-480. doi:10.1590/ES0101-73302016154123
https://doi.org/10.1590/ES0101-733020161...
. Sendo assim, de maneira semelhante aos estudos de Almeida e González (2018)Almeida, W. D. F. T., González, D. G. (2018). Concepção e práticas de gestão escolar democrática da Escola Padre Antônio Barbosa–Lajedo, Pernambuco–Brasil. Revista Científica de Iniciación a la Investigación, 3(1). Recuperado de https://bit.ly/3H7dpSW
https://bit.ly/3H7dpSW...
e Almeida e Junquilho (2013)Almeida, R. A., Junquilho, G. S. (2013). Funções administrativas ou práticas? As “artes do fazer” gestão na escola mirante. Revista de Ciências da Administração, 15(35), 180-195. doi:10.5007/2175-8077.2013v15n35p180 , entendemos que a gestão é um processo emergente e contínuo, e que um caminho para novas maneiras de estudar a gestão escolar pode se apropriar das contribuições do organizing e da prática como uma lente.

Organizing, a metáfora da lente e o vir a ser da prática

O organizing é uma abordagem na qual a gestão é tida como um conjunto contínuo de processos por meio do qual o organizar se sustenta ( Duarte & Alcadipani, 2016Duarte, M. D. F., Alcadipani, R. (2016). Contributions of Organizing for Organizational Studies. Organizações & Sociedade, 23(76), 57-72. doi:10.1590/1984-9230763
https://doi.org/10.1590/1984-9230763...
; Silva et al., 2021Silva, Í. da, Dias, P. K., & Santos, E. C. dos. (2021). Organizing e gestão ordinária na economia criativa local. Administração Pública e Gestão Social, 13(3). doi:10.21118/apgs.v13i3.10159 ; Souza et al., 2015)Souza, E. M. D., Costa, A. S. M. da, & Pereira, S. J. N. (2015). A organização (in)corporada: ontologia organizacional, poder e corpo em evidência. Cadernos EBAPE.BR, 13(4), 727-742. doi:10.1590/1679-395118624 . Nessa perspectiva, defendemos a possibilidade de, além de fugir de uma concepção tradicional do estudo da gestão escolar, assumir como uma organização um braço da extensão escolar, como é o caso do NAC.

No que se refere à prática como uma lente, uma alternativa para a aproximação com a gestão escolar envolve as contribuições da abordagem do “poder crítico” da prática como uma lente para investigar a gestão (Gherardi, 2009a). Nessa abordagem, a lente propicia a análise dos efeitos das práticas ( Geiger, 2009Geiger, D. (2009). Revisiting the Concept of Practice: Toward an Argumentative Understanding of Practicing. Management Learning, 40(2), 129-144. doi:10.1177/1350507608101228
https://doi.org/10.1177/135050760810122...
; Gherardi, 2009a; Reckwitz, 2002Reckwitz, A. (2002). Toward a Theory of Social Practices: A Development in Culturalist Theorizing. European Journal of Social Theory, 5(2), 243-263. doi:10.1177/13684310222225432
https://doi.org/10.1177/1368431022222543...
).

Segundo Corradi et al. (2010)Corradi, G., Gherardi, S., Verzelloni, L. (2010). Through the Practice Lens: Where is the Bandwagon of Practice-Based Studies Heading? Management Learning, 41(3), 265-283. doi:10.1177/1350507609356938 , a abordagem da prática como uma lente está associada aos Estudos Orientados pela Prática (EOP). Nesses estudos, aborda-se o que as pessoas efetivamente fazem em contrapartida ao que elas dizem fazer. Os autores destacam que, ao estudar o que as pessoas fazem, é relevante considerar também as consequências de tais fazeres. Ou seja, a metáfora da lente é uma das formas de estudar o que as pessoas efetivamente fazem e os circuitos de reprodução de seus fazeres ( Corradi et al., 2010Corradi, G., Gherardi, S., Verzelloni, L. (2010). Through the Practice Lens: Where is the Bandwagon of Practice-Based Studies Heading? Management Learning, 41(3), 265-283. doi:10.1177/1350507609356938 ; Gherardi, 2009a).

A metáfora da lente foi primeiramente utilizada por Orlikowski (2000)Orlikowski, W. J. (2000). Using Technology and Constituting Structures: A Practice Lens for Studying Technology in Organizations. Organization Science, 11(4), 404-428. doi:10.1287/orsc.11.4.404.14600
https://doi.org/10.1287/orsc.11.4.404.14...
. O objetivo da autora era discutir tecnologia a partir de uma perspectiva alternativa às proposições estruturalistas que, hegemonicamente, dedicam-se à discussão sobre o uso e significações da dimensão material da organização. Posteriormente, a metáfora da lente foi revisada por Gherardi (2009a), que atribui um poder questionador a essa abordagem. Segundo Gherardi (2009a), a lente pode ser utilizada de modo a transparecer o “poder crítico” da prática.

Tal dimensão compreende as implicações éticas e morais do estudo dos modos por meio dos quais a prática pode ser significada (Gherardi, 2009a). A partir disso, Geiger (2009)Geiger, D. (2009). Revisiting the Concept of Practice: Toward an Argumentative Understanding of Practicing. Management Learning, 40(2), 129-144. doi:10.1177/1350507608101228
https://doi.org/10.1177/135050760810122...
e Gherardi (2009a) defendem a existência de duas perspectivas sobre o conceito de prática. Na primeira delas, leva-se em consideração o que as pessoas fazem, enquanto na segunda, os autores explicam que aquilo que as pessoas fazem é a ponta do iceberg de algo instituído socialmente. Desse modo, a prática é fluida, justifica-se socialmente e se desenvolve em circuitos de reprodução que a institucionalizam, envolvendo ações, aprendizado, conhecimento, recursividade etc. ( Geiger, 2009Geiger, D. (2009). Revisiting the Concept of Practice: Toward an Argumentative Understanding of Practicing. Management Learning, 40(2), 129-144. doi:10.1177/1350507608101228
https://doi.org/10.1177/135050760810122...
; Gherardi, 2009a, 2009b).

Desde sua concepção, a abordagem do “poder crítico” da prática vem sendo utilizada em diversas frentes, com destaque para Davel e Oliveira (2018)Davel, E. P. B., Oliveira, C. A. D. (2018). Intensifying Reflexivity in Organizational Learning: A Autoethnography of Practices in an Educational Organization. Organizações & Sociedade, 25(85), 211-228. doi:10.1590/1984-9250852
https://doi.org/10.1590/1984-9250852...
, que aprofundam as contribuições sobre a reflexividade duplamente: pela posição que o pesquisador ocupa no campo e pela relevância da construção de uma postura intensiva de reflexão na educação. Outro estudo a se destacar sobre a perspectiva da lente e seu “poder crítico” é o de Bjørkeng, Clegg e Pitsis (2009), que discute o vir a ser da prática. Para este estudo, o vir a ser da prática se refere aos circuitos de reprodução e institucionalização das práticas no NAC. Segundo Bjørkeng et al. (2009)Bjørkeng, K., Clegg, S., Pitsis, T. (2009). Becoming (a) Practice. Management Learning, 40(2), 145-159. doi:10.1177/1350507608101226 , embora toda prática esteja em constante vir a ser, algumas características do devir se tornam mais evidentes quando se pesquisa uma nova prática que ainda não atingiu o ponto de cristalização. São elas: (a) um processo de definição de fronteiras, em que são formados os contornos da prática em questão; (b) um processo de negociação de competências, que envolve a atribuição de fazeres; e (c) um processo de adequação da materialidade, que envolve o processo de significação da tecnologia. Essas características são reforçadas por estudos posteriores, como o de Pimentel e Nogueira (2018)Pimentel, R., Nogueira, E. E. D. S. (2018). Estudos baseados na prática: possibilidades metodológicas para pesquisas em estudos organizacionais. Organizações & Sociedade, 25(86), 350-370. doi:10.1590/1984-9250861
https://doi.org/10.1590/1984-9250861...
, e caracterizam a fluidez e a maleabilidade dos modos como as práticas se estabelecem, dando a elas efeitos de acordo com a maneira como estes elementos se articulam.

Para esta pesquisa, a noção de devir da prática é relevante porque o que esperamos como efeitos das práticas de gestão do NAC são maneiras de fazer gestão escolar articuladas com as contribuições do organizar de atividades artísticas e culturais com as quais o órgão trabalha. Partimos das contribuições sobre o poder questionador da lente (Gherardi, 2009a) como uma forma de captar o devir de práticas de gestão escolar.

Procedimentos metodológicos

Objetivamos analisar o organizar das práticas de gestão de atividades artísticas e culturais em uma instituição federal de ensino. Para isso, adotamos uma abordagem qualitativa (Cassell, Cunliffe, & Grandy, 2018; Creswell, 2010Creswell, J. W. (2010). Projeto de pesquisa: métodos qualitativo, quantitativo e misto (3ª ed). Porto Alegre, RS: Artmed. ; Kvale, 2007)Kvale, S. (2007). Doing Interviews. Londres: SAGE Publications. doi:10.4135/9781849208963 , assumindo que as pessoas participam da geração da ordem social que estudamos (Gherardi, 2009a). Tomando uma abordagem baseada no organizing ( Duarte & Alcadipani, 2016Duarte, M. D. F., Alcadipani, R. (2016). Contributions of Organizing for Organizational Studies. Organizações & Sociedade, 23(76), 57-72. doi:10.1590/1984-9230763
https://doi.org/10.1590/1984-9230763...
; Silva et al., 2021Silva, Í. da, Dias, P. K., & Santos, E. C. dos. (2021). Organizing e gestão ordinária na economia criativa local. Administração Pública e Gestão Social, 13(3). doi:10.21118/apgs.v13i3.10159 ; Souza et al., 2015)Souza, E. M. D., Costa, A. S. M. da, & Pereira, S. J. N. (2015). A organização (in)corporada: ontologia organizacional, poder e corpo em evidência. Cadernos EBAPE.BR, 13(4), 727-742. doi:10.1590/1679-395118624 , na prática como lente (Gherardi, 2009a) e no papel da prática para o estudo da gestão escolar ( Almeida & Junquilho, 2013Almeida, R. A., Junquilho, G. S. (2013). Funções administrativas ou práticas? As “artes do fazer” gestão na escola mirante. Revista de Ciências da Administração, 15(35), 180-195. doi:10.5007/2175-8077.2013v15n35p180 ; Almeida & González, 2018)Almeida, W. D. F. T., González, D. G. (2018). Concepção e práticas de gestão escolar democrática da Escola Padre Antônio Barbosa–Lajedo, Pernambuco–Brasil. Revista Científica de Iniciación a la Investigación, 3(1). Recuperado de https://bit.ly/3H7dpSW
https://bit.ly/3H7dpSW...
, argumentamos que existem possibilidades ainda não exploradas na abordagem da gestão escolar a partir do cotidiano.

Nesse sentido, resumimos organizing como um conjunto contínuo de processos por meio do qual o organizar se sustenta ( Silva et al., 2021Silva, Í. da, Dias, P. K., & Santos, E. C. dos. (2021). Organizing e gestão ordinária na economia criativa local. Administração Pública e Gestão Social, 13(3). doi:10.21118/apgs.v13i3.10159 ); a prática, a partir da metáfora da lente (Gherardi, 2009a), é um tipo de atividade institucionalizada que envolve três dimensões: (a) o que as pessoas fazem; (b) a maneira como significam seus fazeres; e (c) os efeitos destes fazeres ( Corradi et al., 2010Corradi, G., Gherardi, S., Verzelloni, L. (2010). Through the Practice Lens: Where is the Bandwagon of Practice-Based Studies Heading? Management Learning, 41(3), 265-283. doi:10.1177/1350507609356938 ). Já a gestão escolar se refere a um processo emergente e contínuo ( Almeida & González, 2018Almeida, W. D. F. T., González, D. G. (2018). Concepção e práticas de gestão escolar democrática da Escola Padre Antônio Barbosa–Lajedo, Pernambuco–Brasil. Revista Científica de Iniciación a la Investigación, 3(1). Recuperado de https://bit.ly/3H7dpSW
https://bit.ly/3H7dpSW...
; Almeida & Junquilho, 2013)Almeida, R. A., Junquilho, G. S. (2013). Funções administrativas ou práticas? As “artes do fazer” gestão na escola mirante. Revista de Ciências da Administração, 15(35), 180-195. doi:10.5007/2175-8077.2013v15n35p180 . A partir disso, desenvolvemos a pesquisa em duas fases. Primeiro, realizamos uma fase exploratória, desenvolvida a partir de documentos cedidos por um dos sujeitos da pesquisa e de duas entrevistas projetivas realizadas com sujeitos-chave; em seguida, houve uma fase de imersão em campo, a partir da qual desenvolvemos a observação participante por meio da qual foram escritos dois diários de campo sobre a implantação do NAC na instituição estudada.

Fase exploratória

Nesta pesquisa, utilizamos uma série de documentos institucionais como base para desenvolvimento de uma narrativa sobre o NAC. O material é composto pela política cultural da escola estudada, pela orientação normativa que instrui a implantação do NAC, pelas portarias que instituem o núcleo e aprovam seu regimento, pelos regimentos internos com os objetivos e competências do órgão, pelas atas das reuniões, por uma revista produzida pelos esforços da equipe de desenvolvimento da política cultural e, por fim, pelos programas e projetos desenvolvidos e geridos pelo órgão. Esses materiais caracterizam o primeiro contato com o campo, logo em outubro de 2017, e foram cedidos por um dos sujeitos da pesquisa, o próprio idealizador do NAC, que se demonstrou muito interessado em nosso estudo, inclusive pela oportunidade de divulgação do seu trabalho, como ele mesmo pontuou.

Segundo Godoy (1995)Godoy, A. S. (1995). Pesquisa qualitativa: tipos fundamentais. Revista de Administração de Empresas, 35(3), 20-29. doi:10.1590/S0034-75901995000300004
https://doi.org/10.1590/S0034-7590199500...
, documentos são úteis para se ter acesso a informações em períodos longos, como é o caso da história do NAC. A documentação que temos é muito diversa e envolve questões para além do interesse da nossa pesquisa. Utilizando uma técnica simples de leitura flutuante, organizamos os materiais cronologicamente para ter uma ideia da versão formalizada da história do NAC que não se limita aos eventos na escola estudada, mas envolve a trajetória do professor que o idealizou. Não houve análise em profundidade desse material, em vez disso, optamos por utilizá-lo como base para realizar duas entrevistas projetivas.

Segundo Batista, Matos e Nascimento (2017), entrevistas projetivas referem-se à produção de relatos sobre determinado fenômeno utilizando artefatos, documentos, vídeos, imagens e/ou áudios para projetar o entrevistado em uma experiência vivida. Neste trabalho, as entrevistas foram gravadas presencialmente utilizando um aplicativo de smartphone, e posteriormente transcritas manualmente com o auxílio de um software reprodutor de áudio. As entrevistas tiveram como objetivo entender o contexto do NAC e da escola estudada, sendo assim, o roteiro era o próprio material documental ao qual tivemos acesso. Além disso, os relatos serviram para: (a) atender ao princípio reflexivo da coconstrução ( Davel & Oliveira, 2018Davel, E. P. B., Oliveira, C. A. D. (2018). Intensifying Reflexivity in Organizational Learning: A Autoethnography of Practices in an Educational Organization. Organizações & Sociedade, 25(85), 211-228. doi:10.1590/1984-9250852
https://doi.org/10.1590/1984-9250852...
), dando espaço para uma perspectiva dos sujeitos de pesquisa, assumindo que (b) tal perspectiva reflete o que os servidores da instituição consideram relevante para compor uma pesquisa sobre a escola.

Após a fase de contextualização, a produção de dados se voltou para a imersão de um dos pesquisadores no campo, caminho pelo qual pretendeu-se participar do processo organizativo das práticas de gestão do NAC em sua implantação. Nesta segunda fase da pesquisa, a documentação e os relatos colhidos anteriormente serviram de base para nos contextualizarmos durante a observação participante.

Imersão em campo

Para realizar a fase de imersão em campo, um dos pesquisadores se tornou membro interino do NAC. uma observação participante mais centrada na participação que na observação foi utilizada com intuito de se envolver ao máximo com o processo narrado. Creswell (2010)Creswell, J. W. (2010). Projeto de pesquisa: métodos qualitativo, quantitativo e misto (3ª ed). Porto Alegre, RS: Artmed. apresenta esse modelo de observação participante, caracterizado mais pela participação do que pela observação, como uma das variantes do método de observação participante. O método consistiu em cinco atividades principais: (a) desenvolvimento de um diário de campo caracterizado pelas observações do pesquisador em campo; (b) produção de um diário reflexivo em conjunto com um sujeito-chave, a partir da leitura do diário de campo; (c) participação nas atividades de gestão do NAC, incluindo o desenvolvimento de programas e de normativos; (d) produção de relatos sobre como escrever na pesquisa sobre determinado assunto, por exemplo, a organização das etapas da pesquisa e alguns aspectos históricos foram inseridos a pedido de sujeitos de pesquisa e da forma como eles propuseram, já que nosso intuito era fazê-los participar da pesquisa, terem parte em sua construção; (e) diálogo com os sujeitos de pesquisa, convidando-os à análise das informações recolhidas.

A respeito dos dois diários, destacamos que eles não foram desenvolvidos ao mesmo tempo. O diário de campo foi desenvolvido durante as atividades do NAC, das quais o pesquisador participou ao longo de treze meses de imersão, entre outubro de 2017 e outubro de 2018; já o diário reflexivo começou a ser desenvolvido em maio de 2018, a partir do diálogo dos pesquisadores com sujeitos da pesquisa, com destaque para o coordenador do NAC. O conteúdo do segundo diário é uma versão revisada do primeiro diário, entendendo que isso possibilitaria olhar para aquilo que tinha sido realizado tendo como base a perspectiva de, pelo menos, um dos sujeitos pesquisados.

Análise de dados

As entrevistas projetivas foram transcritas em sua totalidade, incluindo trejeitos de fala e as anotações de reflexões dos pesquisadores ao longo e imediatamente após as entrevistas. Para analisá-las, recorremos a um processo de codificação baseado nos próprios dados ( Gibbs, 2009Gibbs, G. (2009). Análise de dados qualitativos: coleção pesquisa qualitativa. Porto Alegre, RS: Bookman. ), organizando as ideias em relação aos marcos da história da instituição e da criação do NAC.

A análise dos diários, por sua vez, envolveu um estudo contínuo do conteúdo produzido ( Cavedon, 1999Cavedon, N. R. (1999). O método etnográfico em estudos sobre a cultura organizacional: implicações positivas e negativas. Artigo apresentado no 23º Encontro Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Administração, Foz do Iguaçu, PR. ; Serva & Jaime, 1995Serva, M., Jaime Júnior, P. (1995). Observação participante pesquisa em administração: uma postura antropológica. Revista de Administração de Empresas, 35(3), 64-79. doi:10.1590/S0034-75901995000300008 ). A partir da leitura e da interpretação das informações, recorrendo ao referencial teórico, ao próprio campo e aos diários, notamos que a implantação do NAC na instituição estudada pode ser classificada em três grandes atividades, quais sejam: (a) o processo de desenvolvimento do Regimento Interno do NAC; (b) o cotidiano da gestão do NAC, com reuniões mensais formais e encontros informais entre os membros; e (c) atividades do NAC na escola estudada que articulam a gestão no NAC à gestão na escola.

Os sujeitos observados foram muitos: professores, estudantes, técnicos administrativos e membros da comunidade externa. Entretanto, uma das características do NAC observadas ao longo do processo de implantação foi a rotatividade de membros. No primeiro momento havia cerca de doze membros no núcleo; ao final, somente o coordenador e o idealizador do NAC e o próprio pesquisador se mantiveram ao longo dos treze meses de pesquisa. Essa situação ocasionou a principal limitação da pesquisa, que é o foco estrito nesses dois sujeitos que, ao longo do período, foram aqueles que efetivamente implantaram o NAC. Apesar de considerarmos isso uma limitação, precisamos refletir que é um resultado da própria característica do campus em relação ao desenvolvimento de atividades artísticas e culturais. Retornaremos a este raciocínio mais tarde.

Resultados

O Instituto Federal e o Núcleo de Arte e Cultura – fase exploratória

Os resultados apresentados nesta seção se baseiam em duas entrevistas. Uma delas foi realizada com um servidor identificado como coordenador do NAC, que trabalha como técnico administrativo educacional e já realizou diversas funções na administração da escola, tendo inclusive auxiliado na implantação do campus onde o estudo foi realizado. Este servidor tem um histórico de cerca de 15 anos na instituição federal de ensino. A outra entrevista foi realizada com um professor de língua portuguesa e literatura com histórico de mais de 30 anos de carreira na instituição federal de ensino, tendo, inclusive, sido estudante enquanto a instituição ainda era uma escola técnica – este sujeito foi identificado na pesquisa como idealizador do NAC.

O principal resultado da fase exploratória diz respeito à maneira como a história da instituição tem uma série de detalhes que impactam no desenvolvimento de atividades artísticas e culturais. Para ilustrar esse impacto, utilizamos excertos das entrevistas organizados de acordo com a cronologia dos eventos. Começamos pela implantação da própria escola, que

. . . apesar de estar localizado em uma região metropolitana, o campus teve uma implantação muito tardia . . . a ideia do campus já existia desde 1998, aproximadamente, porém, devido a divergências políticas entre os prefeitos do município, não se dispunha de um local para construir a escola. . .. (Coordenador do NAC, entrevistado 2, 2018)

A instituição só recebeu um terreno para a construção da unidade em questão quando um político local foi eleito como prefeito da cidade, em 2009. O drama do terreno ilustra a ineficiência descrita por Paro (2010Paro, V. H. (2010). A educação, a política e a administração: reflexões sobre a prática do diretor de escola. Educação e Pesquisa, 36(3), 763-778. doi:10.1590/S1517-97022010000300008 , 2018Paro, V. H. (2018). Gestão escolar, democracia e qualidade do ensino. São Paulo, SP: Intermeios. ), que envolve também as dinâmicas políticas e legislativas que se sobrepõem na gestão da escola pública.

O campus foi inaugurado em 2010, oferecendo cursos técnicos e de licenciatura. Entre 2010 e 2019, o leque de cursos técnicos aumentou, sendo criados também os cursos de bacharelado e mestrado profissional e diversas especializações. O processo de expansão envolveu significativo aumento do número de estudantes e de atividades sendo realizadas no campus . Contudo, arte e cultura nunca tiveram muito espaço. Segundo o coordenador do NAC,

. . . apesar de haver disciplinas relacionadas à cultura no curso de licenciatura e de haver professores da área de humanas com consciência de como ações artístico-culturais podem contribuir na construção de um profissional, existem professores da área técnica que não têm a menor consciência disso. . .. (Coordenador do NAC, entrevistado 2, 2018)

É também em meados de 2010 que o idealizador do NAC, depois de se tornar reconhecido por desenvolver, em outro campus da rede, um festival de teatro que, em seu auge, segundo o entrevistado, tinha um público de cerca de 3 mil pessoas por dia, foi convidado a desenvolver a política cultural do Instituto Federal do estado. Entretanto, alguns trechos da entrevista mostram como a temática da arte e cultura era um problema da rede, que primeiro precisava ser resolvido na esfera política.

. . . não tinha sala, não tinha computador, nem mesa e o momento que dava para trabalhar era em um computador dividido com outras duas pessoas. . . eu percebi que era a única pessoa ali, naquele setor, na reitoria, na parte administrativa, pensando no desenvolvimento cultural da Instituição. . . No instituto federal as coisas só funcionam se tiver amparo legal. . . Daí eu fui buscar justificativas para institucionalizar a política cultural, pensando que. . . com a institucionalização aí poderíamos requerer atenção às atividades artísticas e culturais. . . (Idealizador do NAC, entrevistado 1, 2018)

Em contraste, o coordenador do NAC compara os esforços em prol do desenvolvimento de atividades ligadas à arte e cultura entre a escola estudada e outros campi da instituição.

. . . a falta de reconhecimento da relevância de arte e cultura é uma característica do campus [estudado], pois em outros campi é possível identificar maior interesse por essas atividades, como no [outro campus ], berço do [idealizador do NAC], que é o mais ativo no desenvolvimento de atividades artísticas e culturais . . . No campus [outro campus ] e no [outro campus ] há servidores lotados exclusivamente para o desenvolvimento da política cultural da instituição, tanto é que tem professor que é maestro e só é maestro, não dá aulas. Tem professor que é regente do coral e é regente, não dá aula, melhor, dão aulas daquilo para o qual trabalham, como instrumentos musicais, canto etc. . . .. (Coordenador do NAC, entrevistado 2, 2018)

O cruzamento dessas informações mostra que, além de elas não estarem institucionalizadas na rede, havia certa resistência no campus estudado às atividades artísticas e culturais articulada principalmente pela característica tecnicista, que é apontada por Nascimento et al. (2020)Nascimento, M. M., Cavalcanti, C., Ostermann, F. (2020). Dez anos de instituição da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica: o papel social dos institutos federais. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, 101(257), 120-145. doi:10.24109/2176-6681.rbep.101i257.4420 como um dos empecilhos para se pensar educação de maneira menos ortodoxa. Nossa análise evidencia também que a abertura para a arte e a cultura na escola estudada envolve um processo histórico caracterizado por questões políticas nacionais que impactaram no recebimento de investimento para a adequada implantação da escola ( Nascimento et al., 2020Nascimento, M. M., Cavalcanti, C., Ostermann, F. (2020). Dez anos de instituição da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica: o papel social dos institutos federais. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, 101(257), 120-145. doi:10.24109/2176-6681.rbep.101i257.4420 ), além do fato de o campus ter sido tardiamente implantado. Alguns trechos da entrevista com o coordenador do NAC evidenciam este raciocínio:

Na época da implantação do Campus , o diretor tinha a visão de que era preciso algo que comportasse arte e cultura. . . havia um projeto maravilhoso, com teatro, área de exposição, uma biblioteca imensa com áreas de vivência. . . com o fim do governo Lula, o dinheiro começou a se tornar escasso. . . os projetos inicialmente desenvolvidos para o campus acabaram bastante afetados e não puderam ser executados. . . é muito difícil desenvolver arte no campus porque não existe infraestrutura. . . não tem nem um auditório, mínimo que seja para receber nada, as salas de aula são disputadas a tapa, pois tem muitas aulas… vai usar que espaço e para fazer o que? Então, mesmo hoje, utiliza-se num limite muito curto. . .. (Coordenador do NAC, entrevistado 2, 2018)

Outra questão ligada à não institucionalização das atividades artísticas e culturais é o déficit de pessoal. A partir das falas do coordenador do NAC, entendemos que as pessoas que participam da operacionalização de atividades artísticas e culturais são as mesmas poucas que são mais engajadas e interessadas pela temática, principalmente os professores da área de humanidades e alguns servidores. Uma das preocupações correntes do Instituto Federal, também discutida por Nascimento et al. (2020)Nascimento, M. M., Cavalcanti, C., Ostermann, F. (2020). Dez anos de instituição da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica: o papel social dos institutos federais. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, 101(257), 120-145. doi:10.24109/2176-6681.rbep.101i257.4420 , é que, apesar do crescimento da rede, o investimento em recursos humanos não recebe aporte suficiente, seja de pessoal, seja de estímulo para uma formação continuada que garanta a qualidade da educação. Em um trecho que sintetiza a articulação desses dois impeditivos, o coordenador do NAC, entrevistado 2 (2018), reclama que “ os servidores da escola trabalham em seus limites, o que dificulta que eles se tornem aptos a arcar com uma carga de trabalho extra, extra porque inicialmente tratam-se de atividades que não estão institucionalizadas na escola ”.

De maneira sintetizada, identificamos como resultados das entrevistas que as principais características do contexto da implantação do NAC na escola estudada dizem respeito: (a) à questão da institucionalização das atividades artísticas e culturais; (b) à falta de pessoal, que ora se caracteriza por déficit de equipe do próprio campus e ora se relaciona com a baixa aderência da comunidade acadêmica à temática; e (c) à falta de infraestrutura, ocasionada por questões que se sustentam desde a implantação do campus .

Implantação do NAC – imersão em campo

Os resultados apresentados nesta seção se baseiam nos dois diários de campo produzidos durante a fase de imersão. O principal resultado dos diários repete o distanciamento entre a gestão prescrita e a gestão que acontece no cotidiano (vide Abdian et al., 2016Abdian, G. Z., Nascimento, P. H. C., Silva, N. D. B. D. (2016). Desafios teórico-metodológicos para as pesquisas em administração/gestão educacional/escolar. Educação & Sociedade, 37(135), 465-480. doi:10.1590/ES0101-73302016154123
https://doi.org/10.1590/ES0101-733020161...
). As raízes desse distanciamento remetem ao confronto entre o modelo de gestão tradicional e o modelo de gestão democrática, em que as ferramentas apropriadas da administração de empresa competem com a preocupação em colocar a educação a serviço dela mesma ( Abdian et al., 2016Abdian, G. Z., Nascimento, P. H. C., Silva, N. D. B. D. (2016). Desafios teórico-metodológicos para as pesquisas em administração/gestão educacional/escolar. Educação & Sociedade, 37(135), 465-480. doi:10.1590/ES0101-73302016154123
https://doi.org/10.1590/ES0101-733020161...
; Abdian et al., 2012Abdian, G. Z., Hojas, V. F., Oliveira, M. E. N. (2012). Formação, função e formas de provimento do cargo do gestor escolar: as diretrizes da política educacional e o desenvolvimento teórico da administração escolar. ETD-Educação Temática Digital, 14(1), 399-419. doi:10.20396/etd.v14i1.1260 ; Maia, 2010Maia, G. Z. A. (2010). As publicações da ANPAE e a trajetória do conhecimento em administração da educação no Brasil. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, 24(1), 31-50. doi:10.21573/vol24n12008.19237 ; Russo, 2004Russo, M. H. (2004). Escola e paradigmas de gestão. EccoS–Revista Científica, 6(1), 25-42. doi:10.5585/eccos.v6i1.366
https://doi.org/10.5585/eccos.v6i1.366...
).

Os membros fundadores do NAC eram, entre técnicos administrativos, o coordenador do NAC, a secretária do NAC e a comunicação do NAC, e, entre os professores, o idealizador do NAC e outras duas professoras de química. Essa formação só durou até o final de 2017, e mesmo assim a primeira reunião foi a única em que todos os membros iniciais participaram. A comunicação do NAC continuou acompanhando ativamente o órgão, e suas atividades estavam centradas na parte de divulgação, pelo site institucional e redes sociais.

Alguns registros do diário de campo narram as saídas dos demais membros:

. . . A configuração de sete membros não durou muito desde aquela primeira reunião. ... A secretária do NAC trocou de setor no campus e isso lhe trouxe muitas atribuições, forçando-a a deixar o órgão. Em seu lugar eu assumi informalmente a secretaria do NAC fornecendo uma versão revisada de minhas anotações no desenvolvimento das atas de reuniões . . . Uma das professoras saiu de licença maternidade. As atribuições de fim de ano, sempre corridas na escola, afastaram a outra professora que só comparecia ocasionalmente. . . .

Como as atribuições do NAC e da extensão se confundiam, após o ano novo essas pessoas passaram a se dedicar a atividades de extensão, saindo efetivamente do NAC.. . .

Ao final, o NAC, embora possuísse dez membros registrados, tinha apenas quatro ainda se reunindo e realizando atividades junto ao órgão, essas pessoas éramos eu, o coordenador do NAC, o idealizador do NAC e a Comunicação do NAC. . .. (Pesquisador, diário de campo, 2017, 2018)

Os três primeiros meses de implantação caracterizaram um processo tumultuado. O estabelecimento do órgão se embolava nas atividades da coordenadoria de extensão do campus , e os membros atuavam sem muita articulação, em uma mistura de atividades de extensão e atividades do NAC. Esse tumulto pode ser justificado pelo distanciamento entre a gestão na prática e as ferramentas da gestão tradicionais da escola, que, conforme Abdian et al. (2016)Abdian, G. Z., Nascimento, P. H. C., Silva, N. D. B. D. (2016). Desafios teórico-metodológicos para as pesquisas em administração/gestão educacional/escolar. Educação & Sociedade, 37(135), 465-480. doi:10.1590/ES0101-73302016154123
https://doi.org/10.1590/ES0101-733020161...
, não dão conta de responder às demandas do cotidiano, como foi com a implantação do NAC. Além disso, havia o desejo de operacionalizar um plano de ação 2018-2022, que se tornou, de acordo com o diário reflexivo do pesquisador (2018), um ideal questionável. Tendo em vista a realidade das atividades artísticas e culturais no campus , o plano me pareceu demasiadamente robusto e misturava as atribuições do NAC com as da coordenadoria de extensão.

Apesar dos anseios do pesquisador em campo, nos primeiros meses de 2018, o plano até ganhou impulso.

. . . a operacionalização do Plano de Ação 2018-2022 pôde ser iniciada pelas mãos do próprio idealizador, que formou parcerias com uma universidade privada local, com uma escola pública próxima, com uma associação de conguistas e com a Prefeitura Municipal de Vila Velha. . . . Nesse período, o NAC do campus esboçou projetos de Teatro, Coral, Maculelê e Capoeira. . .. (Pesquisador, diário de campo, fevereiro de 2018)

O plano tinha uma forte característica da administração tradicional. Ele era demasiado robusto no papel para que um núcleo com sete pessoas, três participando ativamente, operacionalizasse. Notamos que a construção do plano não considerava que a falta recursos e as dificuldades financeiras da instituição se encontravam em uma situação tão alarmante que afetava serviços básicos do campus . Diante dessa realidade, não foi possível desenvolver as parcerias que a extensão havia formalizado, e por conseguinte, o NAC não poderia operacionalizar as atividades pleiteadas. O plano 2018-2022 foi – para nós, pesquisadores – a ferramenta mais transparente do excesso burocrático da produção de índices que caracteriza a gestão tradicional criticada por Abdian et al. (2016)Abdian, G. Z., Nascimento, P. H. C., Silva, N. D. B. D. (2016). Desafios teórico-metodológicos para as pesquisas em administração/gestão educacional/escolar. Educação & Sociedade, 37(135), 465-480. doi:10.1590/ES0101-73302016154123
https://doi.org/10.1590/ES0101-733020161...
, principalmente por criar objetivos inexequíveis que se tornaram planos de gaveta, distanciados daquilo que a gestão enfrentava na prática.

A falta de amparo do que realmente estava acontecendo na escola em relação aos planos desenvolvidos fez com que os projetos debandassem.

. . . O coral não vingou porque a maestrina já enfrentava problemas em sua vida pessoal; como não tínhamos outro maestro o projeto foi engavetado. O teatro não podia ser realizado, pois não se dispunha de um meio de locomover os alunos para a universidade. Os conguistas precisavam de ajuda para desenvolver os projetos de capoeira e Maculelê, mas a escola não tinha como fornecer esta ajuda e os projetos foram revertidos para a Diretoria de Ensino. . .. (Pesquisador, diário reflexivo, 2018)

De maneira geral, o processo mostra repetidamente uma falta de traquejo com o cotidiano do NAC, especificamente no que concerne à dificuldade da gestão em organizar suas próprias atividades a partir do que realmente estava acontecendo na escola. Planos robustos, mistura de atribuições, uma série de parcerias construídas umas sobre as outras. O próprio fato de o NAC, naquele momento, ser apenas um nome solto em meio às atividades da coordenadoria de extensão é característico de um conflito iniciado por causa da articulação da gestão propriamente dita a um modelo de gestão burocratizado característico da escola.

Os resultados da fase de imersão apontam para um desdobramento das dificuldades anunciadas pela fase exploratória ( Tabela 1 ).

Tabela 1
: Desdobramento dos resultados entre as fases e suas relações com o referencial teórico

Análise e discussão

A seguir, quatro tópicos analisam a implantação do NAC a partir das frentes de atuação dos membros. Em cada um deles, exploramos de maneira diferente as práticas articuladas. Começamos com uma seção sobre o regimento interno, na qual exploramos principalmente aspectos relacionados ao vir a ser da prática e ao uso de tecnologia. Em seguida, continuamos a analisar o papel da tecnologia a partir das reuniões do NAC, em que pudemos acompanhar seu uso para, principalmente, descrever o vir a ser da prática de reunir-se. O tópico sobre a participação do NAC nas atividades da escola envolve a discussão sobre práticas no tempo, explorando a maneira como as práticas de gestão no NAC apresentam uma temporalidade própria. Finalmente, no tópico sobre o efeito das práticas, aprofundamos a análise dos efeitos das práticas.

O organizar do regimento interno do NAC e o uso da tecnologia

O Regimento Interno é uma ferramenta institucional da escola estudada. Diversos setores possuem regimentos internos, inclusive o próprio campus tem o seu. No que diz respeito ao NAC, trata-se de um documento que, para os sujeitos envolvidos, formaliza o núcleo em face da gestão da escola (algo que pode ser atribuído de antemão ao processo de adequação da materialidade, conforme Bjørkeng et al., 2009Bjørkeng, K., Clegg, S., Pitsis, T. (2009). Becoming (a) Practice. Management Learning, 40(2), 145-159. doi:10.1177/1350507608101226 ). O próprio idealizador do NAC era um dos defensores da necessidade de se desenvolver um Regimento Interno para o NAC. Segundo ele, era “ por meio deste documento que o desenvolvimento de atividades artísticas e culturais se vincula formalmente à gestão da escola ” (idealizador do NAC, diário de campo, 2017).

Sabendo disso, o desenvolvimento do Regimento Interno se tornou uma das principais atividades dos membros, mas foi levado adiante principalmente pelo coordenador do NAC e por um dos pesquisadores. O documento levou aproximadamente um ano para ficar pronto e envolveu, principalmente, três fazeres: (a) extensos diálogos entre o coordenador do NAC e o pesquisador; (b) reuniões formais e informais do NAC; e (c) a utilização de ferramentas informatizadas como mensageiros instantâneos, projetores de imagem e e-mails.

Os diálogos entre o Coordenador do NAC e o pesquisador foram, em muitas ocasiões, mediados pelo uso da tecnologia. Como não tínhamos espaço físico na instituição, substituímos reuniões pessoais pelo uso de um mensageiro instantâneo. Sobre isso, considerando as contribuições de Orlikowski (2000)Orlikowski, W. J. (2000). Using Technology and Constituting Structures: A Practice Lens for Studying Technology in Organizations. Organization Science, 11(4), 404-428. doi:10.1287/orsc.11.4.404.14600
https://doi.org/10.1287/orsc.11.4.404.14...
, sabíamos que as pessoas ressignificam as tecnologias de acordo com as especificidades do contexto, e, embora o mensageiro instantâneo tenha substituído reuniões presenciais e possibilitado fluidez ao trabalho, havia desentendimentos e éramos confrontados pela dificuldade de transmitir nossas ideias com clareza pelo meio virtual. Alguns trechos do diário de campo reproduzem falas do coordenador do NAC sobre as dificuldades que enfrentamos ao longo do processo:

. . . O coordenador do NAC reclamou que é ‘difícil lidar com os Regimentos de outros campi porque cada um tem características bem diferentes e não tem um padrão entre eles’ quando tentamos nos balizar a partir de um regimento de NAC de outro campus . . . ‘uma das coisas que me engessa no desenvolvimento desse documento é que eu acho que o NAC não tem sentido nenhum’, quando não encontrávamos aderência ao processo de significação atribuída ao documento. . . . O Coordenador do NAC parece frequentemente angustiado com o site do [nome da escola], ele diz que é ‘difícil encontrar outros Regimentos de NAC, o site institucional do Ifes é muito ruim, a plataforma que a gente usa é ultrapassada’ . . ..(Pesquisador, diário de campo, 2018)

O impasse que o trabalho mediado ocasionava só foi resolvido quando a atividade que estávamos desenvolvendo se tornou uma prática, entendida como um tipo de atividade institucionalizada que envolve o que as pessoas fazem, a maneira como significam seus fazeres e os efeitos desses fazeres ( Corradi et al., 2010Corradi, G., Gherardi, S., Verzelloni, L. (2010). Through the Practice Lens: Where is the Bandwagon of Practice-Based Studies Heading? Management Learning, 41(3), 265-283. doi:10.1177/1350507609356938 ; Gherardi, 2009a). A prática de “escrever o regimento interno” abrange os diálogos, o uso da tecnologia e as reuniões como fazeres principais, tem o significado articulado ao valor do aparato regimental para os envolvidos e, como efeito, formaliza o NAC na instituição.

Para que “escrever o regimento interno” se tornasse uma prática, era preciso que a atividade fosse dotada de sentido próprio. Gherardi (2009a) chama este processo de cristalização da prática. Em março de 2018, em uma reunião ocorrida no próprio campus , os fazeres convergiram para a escrita do regimento interno. Antes de março, a importância do regimento estava articulada à característica burocrática da gestão escolar. Naquele período, a escrita do documento era um fazer secundário. Durante a reunião, que tinha o Regimento como pauta, observamos uma convergência dos fazeres em torno da escrita do documento. Essa virada marca o “escrever o regimento interno” como uma atividade do NAC.

Nesse processo, destacaram-se também os processos do vir a ser da prática, caracterizados por Bjørkeng et al. (2009)Bjørkeng, K., Clegg, S., Pitsis, T. (2009). Becoming (a) Practice. Management Learning, 40(2), 145-159. doi:10.1177/1350507608101226 , que no desenvolvimento do Regimento Interno entendemos conforme a Tabela 2 .

Tabela 2
: Devir do regimento interno com base em Bjørkeng et al. (2009)Bjørkeng, K., Clegg, S., Pitsis, T. (2009). Becoming (a) Practice. Management Learning, 40(2), 145-159. doi:10.1177/1350507608101226

Cabe destacar que, em relação a Bjørkeng et al. (2009)Bjørkeng, K., Clegg, S., Pitsis, T. (2009). Becoming (a) Practice. Management Learning, 40(2), 145-159. doi:10.1177/1350507608101226 , nosso estudo apresenta um quarto elemento que caracteriza o vir a ser da prática e envolve, além do que os autores apontam sobre o reconhecimento e legitimação de estar praticando algo, a reprodução de impressões que os sujeitos envolvidos criam uns sobre os outros. Como exemplo, o idealizador do NAC era visto como visionário, criativo e com muita facilidade de comunicação; o coordenador do NAC era visto pelos membros como organizado, justo e pontual; outra servidora que esteve presente na reunião de março de 2018, e teve posição relevante no desenvolvimento do regimento, era reconhecida como referência em aparatos processuais. Ao serem questionados sobre a maneira como viam o pesquisador, caracterizavam-no como uma espécie de crítico assertivo do NAC.

As implicações teóricas sobre as impressões compartilhadas entre os praticantes dizem respeito à dimensão afetiva articulada no vir a ser de uma prática. Se o processo de definição de fronteiras delimita, pela ação, quando um praticante está ou não inserido em uma prática, o processo de reconhecimento de impressões delimita quando um praticante está ou não inserido na prática pela maneira compartilhada pela qual os praticantes reproduzem impressões uns sobre os outros.

Vale destacar que o que estamos chamando de reprodução das impressões pessoais entre os membros não é igual ao processo de negociação de competências, uma vez que este diz respeito à performance da atividade propriamente dita ( Bjørkeng et al., 2009Bjørkeng, K., Clegg, S., Pitsis, T. (2009). Becoming (a) Practice. Management Learning, 40(2), 145-159. doi:10.1177/1350507608101226 ). Especificamente sobre o processo de negociação de competências, adicionamos que as competências no NAC passaram por um processo social de institucionalização, caracterizado principalmente por aquela reprodução de impressões entre os membros. Ou seja, o reconhecimento da performance de um praticante articula-se à impressão reproduzida sobre ele (i.e. esperava-se que o documento seria organizado por causa da impressão de que o coordenador do NAC era uma pessoa organizada que, ainda, assumiu a atribuição de organizar o documento).

Por fim, no que se refere ao processo de significação da materialidade, além de ressignificar o Regimento, algo que se insere na abordagem de Bjørkeng et al. (2009)Bjørkeng, K., Clegg, S., Pitsis, T. (2009). Becoming (a) Practice. Management Learning, 40(2), 145-159. doi:10.1177/1350507608101226 , observamos um relevante processo de ressignificação da tecnologia ( Orlikowski, 2000Orlikowski, W. J. (2000). Using Technology and Constituting Structures: A Practice Lens for Studying Technology in Organizations. Organization Science, 11(4), 404-428. doi:10.1287/orsc.11.4.404.14600
https://doi.org/10.1287/orsc.11.4.404.14...
), seja no uso dos mensageiros instantâneos ou, como ficará mais evidente no tópico seguinte, no uso da tecnologia como elemento norteador da prática.

O organizar das reuniões do NAC

Se o uso da tecnologia ocasionava certa limitação quando almejávamos maior capacidade dialógica, era um facilitador quando precisávamos tomar decisões. Isso se evidenciou na utilização de ferramentas informatizadas nas reuniões. Ao todo, acompanhamos nove reuniões ordinárias do NAC, entre outubro de 2017 e outubro de 2018, além da reunião em que pedimos para realizar a pesquisa, dos encontros nos quais foram gravadas as entrevistas projetivas e dos encontros entre pesquisadores e o coordenador do NAC.

Reunir-se é uma das práticas mais recorrentes na gestão da escola. No Instituto Federal, toda e qualquer coisa vira reunião, apelando novamente à característica burocrática da gestão escolar ( Abdian, 2018Abdian, G. Z. (2018). Revezamento teoria e prática na análise da escola pública democrática. Educar em Revista, 34(68), 107-122. doi:10.1590/0104-4060.57481
https://doi.org/10.1590/0104-4060.57481...
; Abdian et al., 2016Abdian, G. Z., Nascimento, P. H. C., Silva, N. D. B. D. (2016). Desafios teórico-metodológicos para as pesquisas em administração/gestão educacional/escolar. Educação & Sociedade, 37(135), 465-480. doi:10.1590/ES0101-73302016154123
https://doi.org/10.1590/ES0101-733020161...
). Destacamos um trecho do segundo diário para ilustrar a prática de reunir-se mediada pela tecnologia.

. . . A maneira que as reuniões se organizaram como uma prática é bastante peculiar. O [idealizador do NAC] criava planilhas com suas ideias de projetos. Desde o começo, o uso destas planilhas ajudava a ordenar os trabalhos nas reuniões. Tal mediação tecnológica se cristalizou como uma prática no momento em que o coordenador do NAC utilizou uma planilha para tentar organizar diversos diálogos que se sobrepunham na quarta reunião [fevereiro de 2018]. Diferente do que havia ocorrido nas primeiras reuniões, que era o uso do projetor para apresentar ideias já prontas e discuti-las, na quarta reunião a atividade passou a ser mediada pelo planilhamento de informações construídas na própria reunião. Dali em diante, utilizar a projeção de planilhas e documentos tornou-se uma prática para reuniões em que se tomavam decisões em conjunto, prática que, inclusive, foi repetida posteriormente levada para a atividade de desenvolvimento do Regimento Interno. . .. (Pesquisador, diário reflexivo, 2018)

Observamos que diversas reuniões realizadas pela gestão têm caráter de cumprimento de procedimento normativo e não estão atreladas a ações ou tomadas de decisão que efetivamente gerem resultados. Das nove reuniões dos membros do NAC, por exemplo, podemos destacar três que tiveram algum desenvolvimento para além de tempestades de ideias, de produção e aprovação de atas descrevendo as diversas ideias e de criação de planejamentos diversos. Entre as três reuniões relevantes, uma ocorreu em março e tinha o regimento interno como pauta, e as outras duas ocorreram em junho e setembro para planejamento de atividades artísticas na escola.

Nesse processo, apesar de, do ponto de vista da prática, o uso da tecnologia ter se configurado como um trunfo para a atividade de reunir-se, organizando o fazer em torno da materialidade ( Orlikowski, 2000Orlikowski, W. J. (2000). Using Technology and Constituting Structures: A Practice Lens for Studying Technology in Organizations. Organization Science, 11(4), 404-428. doi:10.1287/orsc.11.4.404.14600
https://doi.org/10.1287/orsc.11.4.404.14...
), quando analisamos a contribuição da tecnologia para a gestão escolar, destacamos uma expressão de uma professora do campus (2018), segundo a qual “ é como ir de Porsche para o abismo ”.

Uma última análise sobre a maneira como significamos a tecnologia, a partir do contexto, diz respeito ao modo como uma mesma atividade pode se repetir com significados bem distintos ( Orlikowski, 2000Orlikowski, W. J. (2000). Using Technology and Constituting Structures: A Practice Lens for Studying Technology in Organizations. Organization Science, 11(4), 404-428. doi:10.1287/orsc.11.4.404.14600
https://doi.org/10.1287/orsc.11.4.404.14...
). Nesse caso, trata-se da apresentação de conteúdos utilizando o projetor. Na primeira reunião, essa atividade era uma forma de delegação de tarefas, mas à medida que o grupo se organizou em torno de um ideal mais participativo, a apresentação de conteúdos utilizando o projetor se tornou uma maneira de inteirar os membros de atividades paralelas que ocorriam informalmente no NAC e de atualizar membros ausentes em reuniões.

O organizar das práticas no tempo, planejamento de eventos de extensão

Outro aspecto relevante das práticas de gestão é que elas se desenvolvem em um tempo próprio. O desenvolvimento do Regimento Interno, que nos parecia algo que pudesse ser resolvido rapidamente, demorou quase todo o período que estivemos em campo para ser concluído. Em contrapartida, alguns projetos foram iniciados, discutidos, elaborados, mas nunca realizados, como é o caso do calendário proposto pelo Plano de Ação 2018-2022 e do calendário de 2018, que foram dois planejamentos desenvolvidos, mas nunca concretizados, ou, pelo menos, não concluídos. Esses dois exemplos de atividades que acabaram não se realizando remetem a algo que não é tão incomum na administração de empresas.

Tendo em vista que a gestão da escola incorpora elementos da administração de empresas ( Abdian et al., 2016Abdian, G. Z., Nascimento, P. H. C., Silva, N. D. B. D. (2016). Desafios teórico-metodológicos para as pesquisas em administração/gestão educacional/escolar. Educação & Sociedade, 37(135), 465-480. doi:10.1590/ES0101-73302016154123
https://doi.org/10.1590/ES0101-733020161...
), o que ocorreu com essas atividades demonstra que, ao incorporar tais elementos, a gestão escolar também incorpora os problemas da administração de empresas. A partir de Abdian et al. (2016)Abdian, G. Z., Nascimento, P. H. C., Silva, N. D. B. D. (2016). Desafios teórico-metodológicos para as pesquisas em administração/gestão educacional/escolar. Educação & Sociedade, 37(135), 465-480. doi:10.1590/ES0101-73302016154123
https://doi.org/10.1590/ES0101-733020161...
e Abdian (2018)Abdian, G. Z. (2018). Revezamento teoria e prática na análise da escola pública democrática. Educar em Revista, 34(68), 107-122. doi:10.1590/0104-4060.57481
https://doi.org/10.1590/0104-4060.57481...
, podemos refletir sobre a maneira como a qualidade da gestão está atrelada à produção de índices. O que ocorre é a criação e sobreposição de muitos índices uns sobre os outros – havia um plano de ação de 2018-2022, um plano de 2018, o plano de desenvolver uma Imersão Cultural, o plano de um programa de extensão, o plano de fazer parcerias com a comunidade externa –, e todos esses planejamentos se atropelaram, concretizando experiências diversas. Isso não quer dizer que planejar é algo ruim, mas que é preciso refletir o organizar da gestão, conforme apontam Duarte e Alcadipani (2016)Duarte, M. D. F., Alcadipani, R. (2016). Contributions of Organizing for Organizational Studies. Organizações & Sociedade, 23(76), 57-72. doi:10.1590/1984-9230763
https://doi.org/10.1590/1984-9230763...
e Gobbi et al., (2017)Gobbi, B. C., Carvalho, N., Dumer, M. C. R. (2017). Falo desse chão, da nossa casa, vem que tá na hora de arrumar: os sentidos da direção escolar. Pensamento & Realidade, 32(4), 43-60. Recuperado de https://bit.ly/3B3BjLz
https://bit.ly/3B3BjLz...
, como algo emergente e processual.

Para Gherardi (2009a), as práticas reproduzem essa mesma característica de fluidez. Lidar com essa maleabilidade, entendendo que a efetiva operacionalização de planejamentos acontece a partir do contexto, é uma forma de nos desvencilharmos da produção de índices que refletem um quadro descontextualizado (e inatingível) do desenvolvimento das atividades em uma escola.

Efeitos das práticas do NAC na gestão da escola

Segundo Reckwitz (2002)Reckwitz, A. (2002). Toward a Theory of Social Practices: A Development in Culturalist Theorizing. European Journal of Social Theory, 5(2), 243-263. doi:10.1177/13684310222225432
https://doi.org/10.1177/1368431022222543...
, uma prática pode apresentar duas dimensões de efeitos: uma teórico-social, que diz respeito à visão heurística da atividade, que é articulada por decisões e fazeres, e uma dimensão ética e moral, que relaciona as decisões e fazeres aos valores e crenças dos praticantes.

Dois exemplos se destacam sobre a análise dos efeitos das práticas na perspectiva teórico-social e ética e moral na implantação do NAC: (a) a maneira como o coordenador do NAC costumava centralizar em si as atividades (decisões e fazeres), porque acreditava que ninguém o ajudaria (crença), por vezes reclamando que o NAC “não faz sentido” e “não tem um papel definido na escola”, e justificando que “estou cheio de coisas para fazer”, “não tenho tempo” e “ninguém ajuda com o NAC”; e (b) a forma como o idealizador do NAC externalizava a manutenção de um status quo antidemocrático (fazer), porque se preocupava com a delegação de atribuições ser um pré-requisito para que as atividades acontecessem (crença), quando o que ele desejava era a democratização da escola, conforme ele defendia com a implantação do NAC (valor).

Ainda no que diz respeito aos efeitos das práticas, nosso papel como pesquisadores também chama atenção. Utilizamos os ideais de Gherardi (2009a) e Davel e Oliveira (2018)Davel, E. P. B., Oliveira, C. A. D. (2018). Intensifying Reflexivity in Organizational Learning: A Autoethnography of Practices in an Educational Organization. Organizações & Sociedade, 25(85), 211-228. doi:10.1590/1984-9250852
https://doi.org/10.1590/1984-9250852...
para refletir que nossa posição como pesquisadores também conduzia a forma como as práticas se organizavam. Com isso, vimos que o sentido construído ao longo da implantação do NAC teve contribuições daquilo que acreditávamos que deveria ser o núcleo e partia do que estávamos desenvolvendo na pesquisa.

Outros efeitos éticos e morais da prática observados em nossa participação em campo, o que Gherardi (2009a) chama de efeitos éticos e morais, diz respeito à maneira como os novos membros eram introduzidos ao NAC. Os membros novos não sabiam, não supunham e nem eram apresentados às dificuldades que o NAC enfrentava, havia sempre uma grande necessidade de reforçar os aspectos positivos do núcleo. A partir daí, podemos observar, pelo menos, duas linhas de acontecimentos envolvendo os novos membros. A primeira diz respeito à maneira como os membros antigos do NAC conduziam os novos membros em torno de um sentido dado ao órgão recém-implantado. A segunda perspectiva se refere ao modo como os membros novos, que partiam de diferentes entendimentos do NAC, poderiam contribuir para que o núcleo alcançasse forma própria.

Gherardi (2009a) defende que o conhecimento que envolve determinada atividade une e mantém uma configuração de pessoas. O desenvolvimento desse conhecimento se dá a partir do fazer, como exemplificamos, e, para se inserirem nesse conhecimento, as pessoas que chegam precisam aprender a fazer. A autora defende que o grupo não preexiste à prática. O que envolve as pessoas na atividade é, acima de tudo, a capacidade de se inserirem no conhecimento fluido que norteia tal atividade. Conforme tratamos anteriormente, a atividade tem sentido por si mesma, e a entrada de novos membros no NAC é a maneira como o fio que envolve os membros antigos passa a envolver aqueles que chegam e se modifica nesse processo.

Observe que acompanhamos a maneira como as pessoas se tornam praticantes, mas o que ocorre quando as pessoas deixam de ser praticantes? Para entender esse processo, vale destacar que o NAC passou por vários rodízios de membros, que aconteciam principalmente porque a escola estudada tem dificuldade com a falta de pessoal. Nesse contexto, encontrar e manter pessoas que se dispusessem a participar da organização de atividades artísticas e culturais era sempre desafiador, porque lidar com arte e cultura em uma escola significa trabalho extra. Assim, muitos membros se encantavam com a proposta do NAC, mas em seguida deixavam de frequentar as reuniões e de contribuir com a organização das atividades. Com a aprovação do Regimento do NAC, criamos regras para entrada e saída dos membros, e todos que não estavam participando foram excluídos do grupo. Esse processo, segundo Gherardi (2009a), pode ser analisado a partir de seus efeitos deliberados e não deliberados.

Os efeitos deliberados eram as próprias exclusões de membros. Por outro lado, os efeitos não deliberados dizem respeito à maneira como a saída dos membros contribuiu para tirar de foco os planejamentos que engessaram o núcleo em torno da produção de índices, já que excluir os membros ausentes significava limpar o NAC das ideologias passadas. Principalmente as ideias em torno da dependência da Coordenadoria de Extensão, já que os membros excluídos eram pessoas que chegaram ao NAC por meio desse departamento. É interessante pontuar que, segundo Gherardi (2009a), toda prática cria um contexto; no caso observado, o contexto criado pelos acontecimentos estudados nesta pesquisa foi o NAC implantado.

Para além do NAC

Observamos que a gestão da escola ainda é influenciada pelo aporte da administração de empresas ( Almeida & González, 2018Almeida, W. D. F. T., González, D. G. (2018). Concepção e práticas de gestão escolar democrática da Escola Padre Antônio Barbosa–Lajedo, Pernambuco–Brasil. Revista Científica de Iniciación a la Investigación, 3(1). Recuperado de https://bit.ly/3H7dpSW
https://bit.ly/3H7dpSW...
; Almeida & Junquilho, 2013Almeida, R. A., Junquilho, G. S. (2013). Funções administrativas ou práticas? As “artes do fazer” gestão na escola mirante. Revista de Ciências da Administração, 15(35), 180-195. doi:10.5007/2175-8077.2013v15n35p180 ; Poubel & Junquilho, 2015, 2019)Poubel, L., Junquilho, G. (2015). A organização das práticas na gestão das escolas públicas brasileiras: uma alternativa de estudo para o contexto escolar. Pensamento & Realidade, 30(3). Recuperado de https://bit.ly/3EOxlaM
https://bit.ly/3EOxlaM...
, 2019Poubel, L., Junquilho, G. S. (2019). Para além do management: o processo de managing em uma escola pública de ensino fundamental no Brasil. Cadernos EBAPE.BR, 17(3), 539-551. Recuperado de https://bit.ly/3VcXffb
https://bit.ly/3VcXffb...
). Notamos que a ênfase em procedimentos burocráticos faz com que as ferramentas da gestão, como regimentos internos, tornem-se artefatos desencontrados do cotidiano, algo já argumentado por Abdian et al. (2016)Abdian, G. Z., Nascimento, P. H. C., Silva, N. D. B. D. (2016). Desafios teórico-metodológicos para as pesquisas em administração/gestão educacional/escolar. Educação & Sociedade, 37(135), 465-480. doi:10.1590/ES0101-73302016154123
https://doi.org/10.1590/ES0101-733020161...
ao criticarem a ênfase da administração escolar na produção de índices. Em sequência, as pesquisas sobre gestão escolar, que historicamente se voltam para estudar tais índices e seus melhoramentos, contribuem para o distanciamento em relação à gestão da escola que está acontecendo no cotidiano.

Quando falamos sobre atividades artísticas na escola, o distanciamento se torna ainda mais crítico, porque, de um lado, o desenvolvimento artístico e cultural é secundarizado e, do outro, as ferramentas da gestão tradicional se chocam com a intempestividade do organizar artístico. Na escola estudada, desde antes da construção, havia um projeto que previa a instalação de áreas voltadas exclusivamente para a promoção de atividades artísticas e culturais, mas embora isso fosse parte da obrigação legal do Instituto Federal, dificuldades infraestruturais e burocráticas ainda são utilizadas como justificativa para a não adequação da escola.

As tentativas de institucionalizar a cultura como elemento necessário para a educação sofrem secundarização em prol do tecnicismo corrente na instituição, o que também não impede que as atividades relacionadas a arte e cultura aconteçam. Nos mais de dez anos da escola estudada, notamos um esforço, de certa forma, “clandestino”, preocupado em oferecer uma educação cultural. Mesmo o NAC ficou engavetado por um longo tempo até que houvesse pessoas com fôlego para fazê-lo sair do papel. E tal fôlego envolveu, principalmente, superar a trama iniciada pelo contexto da gestão escolar brasileira, pensando a gestão na prática.

Uma contribuição deste estudo é oferecer, a partir do organizing ( Duarte & Alcadipani, 2016Duarte, M. D. F., Alcadipani, R. (2016). Contributions of Organizing for Organizational Studies. Organizações & Sociedade, 23(76), 57-72. doi:10.1590/1984-9230763
https://doi.org/10.1590/1984-9230763...
; Silva et al., 2021Silva, Í. da, Dias, P. K., & Santos, E. C. dos. (2021). Organizing e gestão ordinária na economia criativa local. Administração Pública e Gestão Social, 13(3). doi:10.21118/apgs.v13i3.10159 ; Souza et al., 2015)Souza, E. M. D., Costa, A. S. M. da, & Pereira, S. J. N. (2015). A organização (in)corporada: ontologia organizacional, poder e corpo em evidência. Cadernos EBAPE.BR, 13(4), 727-742. doi:10.1590/1679-395118624 e das teorias da prática ( Geiger, 2009Geiger, D. (2009). Revisiting the Concept of Practice: Toward an Argumentative Understanding of Practicing. Management Learning, 40(2), 129-144. doi:10.1177/1350507608101228
https://doi.org/10.1177/135050760810122...
; Gherardi, 2009a, 2009b; Schatzki, 2018)Schatzki, T. (2018). On Practice Theory, or What’s Practices Got to Do (got to do) with it?. In C. Edwards-Groves, P. Grootenboer, & J. Wilkinson (Eds.), Education in an Era of Schooling (pp. 151-165). Nova Iorque: Springer. doi:10.1007/978-981-13-2053-8_11
https://doi.org/10.1007/978-981-13-2053-...
, um caminho para articular a gestão de atividades artísticas na escola pública federal. Argumentamos que ressignificar a gestão escolar de maneira fluida envolve pensar as ferramentas da gestão escolar de modo contextual-processual. Envolve, também, pensar que tais processos se organizam a partir das múltiplas ações que se cristalizam e se institucionalizam interconectadamente, enquanto acontecem as práticas.

Ao mudar a perspectiva sobre o estudo da gestão escolar, pudemos questionar a busca por ideais prescritos, criticada por Abdian et al. (2016)Abdian, G. Z., Nascimento, P. H. C., Silva, N. D. B. D. (2016). Desafios teórico-metodológicos para as pesquisas em administração/gestão educacional/escolar. Educação & Sociedade, 37(135), 465-480. doi:10.1590/ES0101-73302016154123
https://doi.org/10.1590/ES0101-733020161...
, substituindo-a pela ressignificação das ferramentas prescritivas no contexto de cada uma delas. Especificamente, a ressignificação da gestão em torno do seu próprio contexto processual permite maior aderência às dinâmicas fluidas das atividades artísticas e oferece um caminho para articular a gestão de atividades artísticas e culturais na escola ( Tabela 3 ).

Tabela 3
: Mudança perspectiva da gestão escolar a partir do organizing e da prática

De modo específico, três observações sintetizam as contribuições do “escrever o regimento interno” para além do NAC: (a) encontrar o ponto de cristalização, ou construir sentido para o fazer, a partir da própria atividade auxilia no desenvolvimento de ferramentas de gestão articuladas ao que efetivamente acontece na gestão; (b) para isso, é válido saber que, quando uma atividade se estabelece, determinam-se também os significados articulados a este fazer, que podem alterar o sentido de um elemento material (i.e. o significado do regimento interno deixou de envolver a formalização do NAC e se tornou uma espécie de manifesto dos membros); e (c) os sujeitos envolvidos com uma atividade não são inertes, eles apresentam predisposição uns com os outros e acumulam habilidades que podem ser articuladas para construir sentido para as atividades, aprimorando a interação entre os praticantes com a atividade a partir de suas afinidades e habilidades.

Para a gestão escolar de modo geral, ressignificar instrumentos normativos, retirando deles a estaticidade, para construir sentido para as atividades a partir do cotidiano pode ser interessante para aproximar a gestão da escola dos seus objetos de interesse no cotidiano escolar. Essa é uma via interessante para refletir a gestão da escola e lidar com o distanciamento que ocorre entre a escola planejada e a escola praticada.

Uma segunda contribuição do estudo para gestão escolar diz respeito especificamente ao papel do ato de se organizar atividades artísticas e culturais na rede federal. Notamos que uma das dificuldades enfrentadas nesse processo é a falta de pessoal, que ora se caracteriza por déficit de pessoal da própria escola e ora se relaciona com a baixa aderência à temática entre a comunidade acadêmica. A falta de pessoal ocasionou tamanha rotatividade de membros do órgão que, dos sete integrantes iniciais de 2017, restaram apenas o pesquisador, o coordenador e o idealizador do NAC. Isso gerou uma limitação na pesquisa, que acabou centrada na atuação desses três sujeitos, mas, ao mesmo tempo, isso é um resultado da própria coisa.

Conforme argumentamos ainda na introdução, o interesse pelo processo organizativo de atividades artísticas e culturais no âmbito da gestão escolar pública é baixo. Apesar disso, a contrapartida do processo é interessante: a implantação do NAC permitiu a criação de atividades voltadas exatamente para trabalhar a pressão por sobrecarga de trabalho. Um dos empreendimentos do NAC, uma parceria com a diretoria de ensino, ofertou maculelê, capoeira e teatro para auxiliar a comunidade acadêmica com ansiedade, depressão e burnout. Apesar de o projeto ter passado por fases conturbadas na sua elaboração, conforme narrado na seção de resultados, para o público geral, o resultado foi positivo. As dinâmicas de atividades artísticas reuniram a comunidade acadêmica ao longo de seis meses e, na avaliação final, a constatação da contribuição para a melhoria do ambiente escolar foi unânime. Isso reforça o papel da arte e cultura para a educação e a necessidade de repensar o protagonismo do tema como forma de contrapor o tecnicismo que caracteriza a rede federal.

A este respeito, vale destacar que, a criação dos Institutos Federais foi um marco para a educação brasileira ( Otranto, 2010Otranto, C. R. (2010). Criação e implantação dos institutos federais de educação, ciência e tecnologia – IFETs. Retta, 1(1), 89-110. Recuperado de https://bit.ly/3UekEeU
https://bit.ly/3UekEeU...
, 2012Otranto, C. R. (2012). Reforma da educação profissional no Brasil: marcos regulatórios e desafios. Revista Educação em Questão, 42(28), 199-226. Recuperado de https://bit.ly/3AWxcRg
https://bit.ly/3AWxcRg...
). A rede que se condensou nos Institutos Federais carrega o apego ao conhecimento técnico em detrimento da educação de maneira ampla. No primeiro momento, a educação técnica foi importante para estabelecer um padrão educacional no Brasil ( Nascimento et al., 2020Nascimento, M. M., Cavalcanti, C., Ostermann, F. (2020). Dez anos de instituição da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica: o papel social dos institutos federais. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, 101(257), 120-145. doi:10.24109/2176-6681.rbep.101i257.4420 ), de toda sorte, analogamente ao que ocorreu no NAC, a derradeira implantação do Instituto Federal não se resume à aprovação normativa, nem se restringe à educação tecnicista. É preciso pensar a própria instituição em torno da necessidade de se construir um sentido próprio, e o fomento de atividades artísticas e culturais pode ser significativo para esse processo.

Por último, outra contribuição deste estudo para a gestão escolar se relaciona à falta de infraestrutura, que é um problema que extrapola o campus estudado ( Nascimento et al., 2020Nascimento, M. M., Cavalcanti, C., Ostermann, F. (2020). Dez anos de instituição da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica: o papel social dos institutos federais. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, 101(257), 120-145. doi:10.24109/2176-6681.rbep.101i257.4420 ), e à exacerbada burocracia do modelo de gestão do instituto. O interessante é que a defasagem infraestrutural evidencia as contribuições do organizing como uma via interessante para pensar o andamento das atividades de gestão. Articulada por um conjunto de processos ( Duarte & Alcadipani, 2016Duarte, M. D. F., Alcadipani, R. (2016). Contributions of Organizing for Organizational Studies. Organizações & Sociedade, 23(76), 57-72. doi:10.1590/1984-9230763
https://doi.org/10.1590/1984-9230763...
; Silva et al., 2021Silva, Í. da, Dias, P. K., & Santos, E. C. dos. (2021). Organizing e gestão ordinária na economia criativa local. Administração Pública e Gestão Social, 13(3). doi:10.21118/apgs.v13i3.10159 ; Souza et al., 2015)Souza, E. M. D., Costa, A. S. M. da, & Pereira, S. J. N. (2015). A organização (in)corporada: ontologia organizacional, poder e corpo em evidência. Cadernos EBAPE.BR, 13(4), 727-742. doi:10.1590/1679-395118624 , a organização de atividades artísticas e culturais se desenvolveu sem uma sala fixa, sem um setor fixo, sem sujeitos fixos, sem organograma definido, mas a partir de articulações em frentes diversas, de maneira contínua e fluída. Não queremos propor aqui uma anarquia em relação à estrutura organizacional do instituto, mas chamar atenção para a maneira que as atividades se desenvolvem articulando fazeres, principalmente quando se constrói sentido para estes fazeres, rompendo com a necessidade de uma estrutura burocrática rígida que distancia a gestão do cotidiano.

Considerações finais

Neste estudo, objetivamos analisar o organizar das práticas de gestão de atividades artísticas e culturais em uma instituição federal de ensino. Utilizamos duas abordagens epistemológicas principais, as contribuições do organizing ( Duarte & Alcadipani, 2016Duarte, M. D. F., Alcadipani, R. (2016). Contributions of Organizing for Organizational Studies. Organizações & Sociedade, 23(76), 57-72. doi:10.1590/1984-9230763
https://doi.org/10.1590/1984-9230763...
; Silva et al., 2021Silva, Í. da, Dias, P. K., & Santos, E. C. dos. (2021). Organizing e gestão ordinária na economia criativa local. Administração Pública e Gestão Social, 13(3). doi:10.21118/apgs.v13i3.10159 ; Souza et al., 2015)Souza, E. M. D., Costa, A. S. M. da, & Pereira, S. J. N. (2015). A organização (in)corporada: ontologia organizacional, poder e corpo em evidência. Cadernos EBAPE.BR, 13(4), 727-742. doi:10.1590/1679-395118624 e da prática como lente ( Corradi et al., 2010Corradi, G., Gherardi, S., Verzelloni, L. (2010). Through the Practice Lens: Where is the Bandwagon of Practice-Based Studies Heading? Management Learning, 41(3), 265-283. doi:10.1177/1350507609356938 ; Gherardi, 2009a). Desenvolvemos um estudo qualitativo com duas fases principais, uma exploratória e outra de imersão em campo, contabilizando aproximadamente dois anos de pesquisa, sendo treze meses em campo participando da implantação do NAC na instituição federal de ensino estudada. Notamos que fatores políticos e históricos arrastados desde o estabelecimento do campus impactam a maneira como arte e cultura são tratadas na escola e, consequentemente, a implantação do NAC.

Em termos de teoria, analisamos que a abordagem do organizing articulada às práticas de gestão de atividades artísticas e culturais possibilita entender a gestão escolar de maneira menos ortodoxa em relação ao binarismo comum ao campo. Esse binarismo envolve constante disputa entre elementos e ideologias da gestão democrática e da gestão tradicional ( Abdian et al., 2016Abdian, G. Z., Nascimento, P. H. C., Silva, N. D. B. D. (2016). Desafios teórico-metodológicos para as pesquisas em administração/gestão educacional/escolar. Educação & Sociedade, 37(135), 465-480. doi:10.1590/ES0101-73302016154123
https://doi.org/10.1590/ES0101-733020161...
; Andrade & Abdian, 2019Andrade, É., Abdian, G. Z. (2019). A construção de objetos de estudo em currículo e gestão escolar: desafios aos pesquisadores em educação. Notandum, 50(22), 143-161. doi:10.4025/0.4025/notandum.v0i50.47643 ). Ao apresentar o fazer gestão a partir da prática, caminhamos em direção a uma terceira via, que não descarta nem substitui as proposições anteriores, mas reconhece, dá ênfase e articula o cotidiano e sua característica emergente que permeia a gestão como a constante ressignificação da materialidade.

Quanto às práticas de gestão, observamos o aprofundamento dos elementos que envolvem o vir a ser da prática primeiramente apresentados por Bjørkeng et al. (2009)Bjørkeng, K., Clegg, S., Pitsis, T. (2009). Becoming (a) Practice. Management Learning, 40(2), 145-159. doi:10.1177/1350507608101226 , chamando a atenção para um processo que articula as competências de acordo com as impressões compartilhadas entre os praticantes e com o contexto. Esse aprofundamento pode indicar uma maneira de articular o afeto (ver Gherardi, 2017a, 2017b; Reckwitz, 2016Reckwitz, A. (2016). Practices and Their Affects. In A. Hui, T. Schatzki, E. Shove, The Nexus of Practices (pp. 126-137). Abingdon: Routledge. ) como elemento do vir a ser da prática.

Antes de terminar, defendemos que a abertura do diário de campo para os sujeitos da pesquisa contribuiu para a reflexividade que norteia a abordagem da prática e propicia a participação dos pesquisados no desenvolvimento da pesquisa, não como seu objeto, mas como seus cocriadores (Gherardi, 2009a, 2009b; Davel & Oliveira, 2018Davel, E. P. B., Oliveira, C. A. D. (2018). Intensifying Reflexivity in Organizational Learning: A Autoethnography of Practices in an Educational Organization. Organizações & Sociedade, 25(85), 211-228. doi:10.1590/1984-9250852
https://doi.org/10.1590/1984-9250852...
).

Por fim, vale destacar que a abordagem da gestão escolar a partir do processo organizativo de um órgão voltado para o desenvolvimento de atividades ligadas à arte e à cultura apresenta um eixo relevante para a discussão sobre a escola. A implantação do NAC, com seu discurso sobre a relevância da arte e da cultura para a educação e seu objetivo de operacionalizar a política cultural do Instituto Federal em um cenário em que arte e cultura nem sempre foram bem recebidas, mostrou-se um desafio parcialmente vencido. Apesar das dificuldades com pessoas e grupos na escola que limitavam a atuação do NAC, da falta de recursos e da rotatividade de membros, o núcleo foi implantado, cresceu e, em 2022, anunciou à comunidade a segunda edição de um Festival de Arte e Cultura.

Agradecimentos

Os autores agradecem o apoio e a orientação do professor Alfredo Rodrigues Leite da Silva, importante incentivador sem o qual este estudo não seria possível.

References

  • Abdian, G. Z. (2018). Revezamento teoria e prática na análise da escola pública democrática. Educar em Revista, 34(68), 107-122. doi:10.1590/0104-4060.57481
    » https://doi.org/10.1590/0104-4060.57481
  • Abdian, G. Z., Hojas, V. F., Oliveira, M. E. N. (2012). Formação, função e formas de provimento do cargo do gestor escolar: as diretrizes da política educacional e o desenvolvimento teórico da administração escolar. ETD-Educação Temática Digital, 14(1), 399-419. doi:10.20396/etd.v14i1.1260
  • Abdian, G. Z., Nascimento, P. H. C., Silva, N. D. B. D. (2016). Desafios teórico-metodológicos para as pesquisas em administração/gestão educacional/escolar. Educação & Sociedade, 37(135), 465-480. doi:10.1590/ES0101-73302016154123
    » https://doi.org/10.1590/ES0101-73302016154123
  • Almeida, R. A., Junquilho, G. S. (2013). Funções administrativas ou práticas? As “artes do fazer” gestão na escola mirante. Revista de Ciências da Administração, 15(35), 180-195. doi:10.5007/2175-8077.2013v15n35p180
  • Almeida, W. D. F. T., González, D. G. (2018). Concepção e práticas de gestão escolar democrática da Escola Padre Antônio Barbosa–Lajedo, Pernambuco–Brasil. Revista Científica de Iniciación a la Investigación, 3(1). Recuperado de https://bit.ly/3H7dpSW
    » https://bit.ly/3H7dpSW
  • Andrade, É., Abdian, G. Z. (2019). A construção de objetos de estudo em currículo e gestão escolar: desafios aos pesquisadores em educação. Notandum, 50(22), 143-161. doi:10.4025/0.4025/notandum.v0i50.47643
  • Batista, E. C., Matos, L. A. L. de, & Nascimento, A. B. (2017). A entrevista como técnica de investigação na pesquisa qualitativa. Revista Interdisciplinar Científica Aplicada, 11(3), 23-38. Recuperado de https://bit.ly/3FgUQuy
    » https://bit.ly/3FgUQuy
  • Bispo, M. de S. (2021). Refletindo sobre administração contemporânea. Revista de Administração Contemporânea, 26(1), 1-5. doi:10.1590/1982-7849rac2022210203
  • Bjørkeng, K., Clegg, S., Pitsis, T. (2009). Becoming (a) Practice. Management Learning, 40(2), 145-159. doi:10.1177/1350507608101226
  • Brasil. (2008, 30 de dezembro). Lei nº 11.892, de 29 de dezembro de 2008. Institui a Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica, cria os Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF.
  • Cassell, C., Cunliffe, A., Grandy, G. (2018). Introduction: qualitative research in business and management. In C. Cassell, A. Cunliffe, & G. Grandy (Orgs.), The SAGE Handbook of Qualitative Business and Management Research Methods (pp. 1-13). Thousand Oaks: SAGE Publications.
  • Cavedon, N. R. (1999). O método etnográfico em estudos sobre a cultura organizacional: implicações positivas e negativas. Artigo apresentado no 23º Encontro Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Administração, Foz do Iguaçu, PR.
  • Corradi, G., Gherardi, S., Verzelloni, L. (2010). Through the Practice Lens: Where is the Bandwagon of Practice-Based Studies Heading? Management Learning, 41(3), 265-283. doi:10.1177/1350507609356938
  • Crepalde, N. J. B. F. (2015). Produção musical, consumo cultural e extensão universitária. Revista Tecer, 8(15). Recuperado de https://bit.ly/3Xjwfpe
    » https://bit.ly/3Xjwfpe
  • Creswell, J. W. (2010). Projeto de pesquisa: métodos qualitativo, quantitativo e misto (3ª ed). Porto Alegre, RS: Artmed.
  • Davel, E. P. B., Oliveira, C. A. D. (2018). Intensifying Reflexivity in Organizational Learning: A Autoethnography of Practices in an Educational Organization. Organizações & Sociedade, 25(85), 211-228. doi:10.1590/1984-9250852
    » https://doi.org/10.1590/1984-9250852
  • Duarte, M. D. F., Alcadipani, R. (2016). Contributions of Organizing for Organizational Studies. Organizações & Sociedade, 23(76), 57-72. doi:10.1590/1984-9230763
    » https://doi.org/10.1590/1984-9230763
  • Francelino, V. C. S., Bregalda, M. M. (2020). Poesia, arte e sensibilidade: contribuições de um projeto de extensão para a formação de estudantes de terapia ocupacional. Cadernos Brasileiros de Terapia Ocupacional, 28(1), 50-73. doi:10.4322/2526-8910.ctoAO1820
  • Gagliardi, M. (1998). O teatro, a escola e o jovem espectador. Comunicação & Educação, (13), 67-72. doi: https://doi.org/10.11606/issn.2316-9125.v0i13p67-72
    » https://doi.org/10.11606/issn.2316-9125.v0i13p67-72
  • Geiger, D. (2009). Revisiting the Concept of Practice: Toward an Argumentative Understanding of Practicing. Management Learning, 40(2), 129-144. doi:10.1177/1350507608101228
    » https://doi.org/10.1177/135050760810122
  • Gherardi, S. (2009a). Introduction: The Critical Power of the ‘Practice Lens’. Management Learning, 40(2), 115-128. doi:10.1177/1350507608101225
    » https://doi.org/10.1177/1350507608101225
  • Gherardi, S. (2009b). Practice? It’s a Matter of Taste!. Management Learning, 40(5), 535-550. doi:10.1177/1350507609340812
    » https://doi.org/10.1177/1350507609340812
  • Gherardi, S. (2017a). One turn… and Now Another One: Do the Turn to Practice and the Turn to Affect Have Something in Common?. Management Learning, 48(3), 345-358. doi:10.1177/1350507616688591
    » https://doi.org/10.1177/1350507616688591
  • Gherardi, S. (2017b). Unplugged – “Carte blanche”. M@n@gement, 20(3), 208-220. doi:10.3917/mana.202.0208
    » https://doi.org/10.3917/mana.202.0208
  • Gibbs, G. (2009). Análise de dados qualitativos: coleção pesquisa qualitativa. Porto Alegre, RS: Bookman.
  • Gobbi, B. C., Carvalho, N., Dumer, M. C. R. (2017). Falo desse chão, da nossa casa, vem que tá na hora de arrumar: os sentidos da direção escolar. Pensamento & Realidade, 32(4), 43-60. Recuperado de https://bit.ly/3B3BjLz
    » https://bit.ly/3B3BjLz
  • Godoy, A. S. (1995). Pesquisa qualitativa: tipos fundamentais. Revista de Administração de Empresas, 35(3), 20-29. doi:10.1590/S0034-75901995000300004
    » https://doi.org/10.1590/S0034-75901995000300004
  • Japiassu, R. O. V. (1998). Jogos teatrais na escola pública. Revista da Faculdade de Educação, 24(2), 81-97. doi:10.1590/S0102-25551998000200005
    » https://doi.org/10.1590/S0102-25551998000200005
  • Kvale, S. (2007). Doing Interviews. Londres: SAGE Publications. doi:10.4135/9781849208963
  • Lima, C. N., Fonseca, L. D. da, & Santos, P. S. M. B. dos. (2018). Diretores escolares do Rio de Janeiro e sua relação com a gestão democrática: a experiência da especialização em gestão escolar (Escola de Gestores) UFF/SEB/MEC. Research, Society and Development, 7(4), e1074166. doi:10.17648/rsd-v7i4.222
  • Madureira, J. R. (2013). A dança e a formação da criança: algumas reflexões sobre a experiência na Vila Educacional de Meninas. Extramuros, 1(2), 77-84. Recuperado de https://bit.ly/3XW1Y6S
    » https://bit.ly/3XW1Y6S
  • Madureira, J. R., Moura, P. C. de. (2016). O ensino de música em debate: uma síntese dos 5 anos de atividades do projeto “Rítmica Dalcroze e a Formação de Crianças Musicistas”. Revista ELO – Diálogos em Extensão, 5(1), 19-28. doi:10.21284/elo.v5i1.109
  • Maia, G. Z. A. (2010). As publicações da ANPAE e a trajetória do conhecimento em administração da educação no Brasil. Revista Brasileira de Política e Administração da Educação, 24(1), 31-50. doi:10.21573/vol24n12008.19237
  • Nascimento, M. M., Cavalcanti, C., Ostermann, F. (2020). Dez anos de instituição da Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica: o papel social dos institutos federais. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, 101(257), 120-145. doi:10.24109/2176-6681.rbep.101i257.4420
  • Oliveira, A. C. P. D., Carvalho, C. P. D. (2018). Gestão escolar, liderança do diretor e resultados educacionais no Brasil. Revista Brasileira de Educação, 23. doi:10.1590/S1413-24782018230015
  • Orlikowski, W. J. (2000). Using Technology and Constituting Structures: A Practice Lens for Studying Technology in Organizations. Organization Science, 11(4), 404-428. doi:10.1287/orsc.11.4.404.14600
    » https://doi.org/10.1287/orsc.11.4.404.14600
  • Otranto, C. R. (2010). Criação e implantação dos institutos federais de educação, ciência e tecnologia – IFETs. Retta, 1(1), 89-110. Recuperado de https://bit.ly/3UekEeU
    » https://bit.ly/3UekEeU
  • Otranto, C. R. (2012). Reforma da educação profissional no Brasil: marcos regulatórios e desafios. Revista Educação em Questão, 42(28), 199-226. Recuperado de https://bit.ly/3AWxcRg
    » https://bit.ly/3AWxcRg
  • Paro, V. H. (2010). A educação, a política e a administração: reflexões sobre a prática do diretor de escola. Educação e Pesquisa, 36(3), 763-778. doi:10.1590/S1517-97022010000300008
  • Paro, V. H. (2018). Gestão escolar, democracia e qualidade do ensino. São Paulo, SP: Intermeios.
  • Passone, E. F. K. (2019). Gestão escolar e democracia: o que nos ensinam os estudos de eficácia escolar. Laplage em Revista, 5(2), 142-156.
  • Pimentel, R., Nogueira, E. E. D. S. (2018). Estudos baseados na prática: possibilidades metodológicas para pesquisas em estudos organizacionais. Organizações & Sociedade, 25(86), 350-370. doi:10.1590/1984-9250861
    » https://doi.org/10.1590/1984-9250861
  • Poubel, L., Junquilho, G. (2015). A organização das práticas na gestão das escolas públicas brasileiras: uma alternativa de estudo para o contexto escolar. Pensamento & Realidade, 30(3). Recuperado de https://bit.ly/3EOxlaM
    » https://bit.ly/3EOxlaM
  • Poubel, L., Junquilho, G. S. (2019). Para além do management: o processo de managing em uma escola pública de ensino fundamental no Brasil. Cadernos EBAPE.BR, 17(3), 539-551. Recuperado de https://bit.ly/3VcXffb
    » https://bit.ly/3VcXffb
  • Reckwitz, A. (2002). Toward a Theory of Social Practices: A Development in Culturalist Theorizing. European Journal of Social Theory, 5(2), 243-263. doi:10.1177/13684310222225432
    » https://doi.org/10.1177/13684310222225432
  • Reckwitz, A. (2016). Practices and Their Affects. In A. Hui, T. Schatzki, E. Shove, The Nexus of Practices (pp. 126-137). Abingdon: Routledge.
  • Russo, M. H. (2004). Escola e paradigmas de gestão. EccoS–Revista Científica, 6(1), 25-42. doi:10.5585/eccos.v6i1.366
    » https://doi.org/10.5585/eccos.v6i1.366
  • Schatzki, T. (2018). On Practice Theory, or What’s Practices Got to Do (got to do) with it?. In C. Edwards-Groves, P. Grootenboer, & J. Wilkinson (Eds.), Education in an Era of Schooling (pp. 151-165). Nova Iorque: Springer. doi:10.1007/978-981-13-2053-8_11
    » https://doi.org/10.1007/978-981-13-2053-8_11
  • Serva, M., Jaime Júnior, P. (1995). Observação participante pesquisa em administração: uma postura antropológica. Revista de Administração de Empresas, 35(3), 64-79. doi:10.1590/S0034-75901995000300008
  • Silva, Í. da, Dias, P. K., & Santos, E. C. dos. (2021). Organizing e gestão ordinária na economia criativa local. Administração Pública e Gestão Social, 13(3). doi:10.21118/apgs.v13i3.10159
  • Silva, J. A. P., Neves, M. C. D. (2015). Arte e ciência: possibilidades de reaproximações na contemporaneidade. Interciencia, 40(6), 423-432. Recuperado de https://bit.ly/3gLHz3D
    » https://bit.ly/3gLHz3D
  • Silva, L. G. A. (2011). Os limites culturais para a consolidação da gestão escolar democrática em um contexto tradicional. Revista Inter Ação, 36(1), 225-244. doi:10.5216/ia.v36i1.15038
    » https://doi.org/10.5216/ia.v36i1.15038
  • Sousa Carvalho, H., de Almeida, D. A., de Sousa Castro, M., Rodrigues, M. D. R. D., & dos Santos, F. K. D. S. (2015). Arte e educação: uma experiência extensionista do teatro na escola pública. Revista Conexão UEPG, 11(2), 158-167. Recuperado de https://bit.ly/3UlEx3Q
    » https://bit.ly/3UlEx3Q
  • Souza, A. R. D. (2007). Perfil da gestão escolar no Brasil (Tese de doutorado). Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, SP.
  • Souza, E. M. D., Costa, A. S. M. da, & Pereira, S. J. N. (2015). A organização (in)corporada: ontologia organizacional, poder e corpo em evidência. Cadernos EBAPE.BR, 13(4), 727-742. doi:10.1590/1679-395118624

Nota

  • 1
    . Os autores usam linguagem inclusiva, que reconhece a diversidade, demonstra respeito por todas as pessoas, é sensível a diferenças e promove oportunidades iguais.
  • Verificação de plágio
    A O&S submete todos os documentos aprovados para a publicação à verificação de plágio, mediante o uso de ferramenta específica.
  • Disponibilidade de dados
    A O&S incentiva o compartilhamento de dados. Entretanto, por respeito a ditames éticos, não requer a divulgação de qualquer meio de identificação dos participantes de pesquisa, preservando plenamente sua privacidade. A prática do open data busca assegurar a transparência dos resultados da pesquisa, sem que seja revelada a identidade dos participantes da pesquisa.
  • Financiamento: Os autores agradecem o apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Espírito Santo (FAPES).
Editora Associada: Letícia Dias Fantinel
Autoria
Bruno Ricardo Peixoto de Rezende
Mestre em Administração pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Pós-graduando no Doutorado em Administração da Ufes. Docente voluntário no curso de Especialização em Educação e Divulgação em Ciências do Instituto Federal do Espírito Santo. Membro do Grupo de Estudos em Simbolismos e Práticas no Organizar (dgp.cnpq.br/dgp/espelhogrupo/0164392716484982). E-mail: brunoricardo.pr@gmail.com
Dério José Faustino Junior
Mestre em Administração pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Cursando Pós-Graduação Lato Sensu em Educação para Relações Étnico-Raciais pelo Instituto Federal de Minas Gerais Campus Bambuí. Servidor Técnico Administração em Educação no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Espírito Santo (Ifes). Membro do Raízes: Grupo de Estudos e Pesquisas Afro-brasileiros e Indígenas de Cariacica.E-mail: derio.faustino@gmail.com

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Fev 2023
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2023

Histórico

  • Recebido
    21 Jan 2022
  • Aceito
    10 Ago 2022
Escola de Administração da Universidade Federal da Bahia Av. Reitor Miguel Calmon, s/n 3o. sala 29, 41110-903 Salvador-BA Brasil, Tel.: (55 71) 3283-7344, Fax.:(55 71) 3283-7667 - Salvador - BA - Brazil
E-mail: revistaoes@ufba.br