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Impacto da erva-moira na produção do tomateiro e ajuste de modelos matemáticos

Impact of black nightshade on tomato plant production and mathematical model fitness

Resumos

Modelos matemáticos são úteis para estimar o impacto das infestantes nas culturas. Os objetivos deste trabalho foram: elucidar a interação de Solanum nigrum (ervamoira ou maria-pretinha) com o tomateiro no sistema de sementeira direta e transplantado; e avaliar o impacto de diferentes densidades de infestação e períodos de tempo de competição na quantidade de frutos do tomateiro. Entre os anos 1991 e 2001, foram conduzidos cinco experimentos em campo na região tomaticultora de Portugal. Os experimentos seguiram o método aditivo, mantendo-se constante a densidade da cultura, enquanto o número de ervas-moiras variou entre 0 e 6 plantas m-2. Outro fator avaliado foi o período de convivência da infestante na cultura, incluindo os períodos do transplante/semeadura e o início da floração até a colheita. Os resultados de perda de produção foram ajustados aos modelos linear e hiperbólico. O comportamento das perdas de produção nas densidades mais baixas de erva-moira é do tipo linear. A erva-moira é uma espécie muito competitiva em relação ao tomateiro tanto quando a cultura é semeada quanto quando é transplantada. As perdas de produção foram maiores quando a cultura foi semeada, em comparação com a transplantada.

competição; modelo linear; modelo hiperbólico


Mathematical models are useful for estimating the impact of weeds on crops. The objectives of this study were to elucidate the interaction of Solanum nigrum (black nightshade) with tomato plants in direct and transplanted sowing and to evaluate the impact of different infestation densities and competition time periods on tomato plant production. Between 1991 and 2001, five field experiments were conducted in the tomato growing region of Portugal using the additive method, keeping crop density constant, while changing the number of weeds from 0 and 6 plants m-2. The weed and crop coexistence period was also evaluated, from transplantation/sowing to the beginning of flowering or until harvest. The tomato yield loss results were fitted to linear and hyperbolic models. Yield losses at the lowest densities of black nightshade follow a linear model. Black nightshade is a highly competitive species in relation to the tomato plant either when the crop is sown or when it is transplanted. Production losses were higher when the crop was sown than when it was transplanted.

competition; linear model; hyperbolic model


Impacto da erva-moira na produção do tomateiro e ajuste de modelos matemáticos

Impact of black nightshade on tomato plant production and mathematical model fitness

Portugal, J.M.I; Moreira, I.II

IEngº-Agrº., Dr., Professor do Instituto Politécnico de Beja, Rua Pedro Soares 7800-295 Beja, Alentejo, Portugal, <jportugal@ipbeja.pt>

IIEngº-Agrº., Dr., Professor do Instituto Superior de Agronomia, Tapada da Ajuda 1349-017 Lisboa, Portugal, <ilidiomor@sapo.pt>

RESUMO

Modelos matemáticos são úteis para estimar o impacto das infestantes nas culturas. Os objetivos deste trabalho foram: elucidar a interação de Solanum nigrum (ervamoira ou maria-pretinha) com o tomateiro no sistema de sementeira direta e transplantado; e avaliar o impacto de diferentes densidades de infestação e períodos de tempo de competição na quantidade de frutos do tomateiro. Entre os anos 1991 e 2001, foram conduzidos cinco experimentos em campo na região tomaticultora de Portugal. Os experimentos seguiram o método aditivo, mantendo-se constante a densidade da cultura, enquanto o número de ervas-moiras variou entre 0 e 6 plantas m-2. Outro fator avaliado foi o período de convivência da infestante na cultura, incluindo os períodos do transplante/semeadura e o início da floração até a colheita. Os resultados de perda de produção foram ajustados aos modelos linear e hiperbólico. O comportamento das perdas de produção nas densidades mais baixas de erva-moira é do tipo linear. A erva-moira é uma espécie muito competitiva em relação ao tomateiro tanto quando a cultura é semeada quanto quando é transplantada. As perdas de produção foram maiores quando a cultura foi semeada, em comparação com a transplantada.

Palavras-chave: competição, modelo linear, modelo hiperbólico.

ABSTRACT

Mathematical models are useful for estimating the impact of weeds on crops. The objectives of this study were to elucidate the interaction of Solanum nigrum (black nightshade) with tomato plants in direct and transplanted sowing and to evaluate the impact of different infestation densities and competition time periods on tomato plant production. Between 1991 and 2001, five field experiments were conducted in the tomato growing region of Portugal using the additive method, keeping crop density constant, while changing the number of weeds from 0 and 6 plants m-2. The weed and crop coexistence period was also evaluated, from transplantation/sowing to the beginning of flowering or until harvest. The tomato yield loss results were fitted to linear and hyperbolic models. Yield losses at the lowest densities of black nightshade follow a linear model. Black nightshade is a highly competitive species in relation to the tomato plant either when the crop is sown or when it is transplanted. Production losses were higher when the crop was sown than when it was transplanted.

Keywords: competition, linear model, hyperbolic model.

INTRODUÇÃO

A utilização de modelos matemáticos em estudos de interferência de infestantes em culturas pode ser instrumento útil para descrever, estimar e simular os impactos causados pela interferência de plantas daninhas em certa cultura (Adati et al., 2006). Como principal benefício da sua adoção, destaca-se o fato de eles poderem ser usados no cálculo de alguns níveis econômicos de prejuízos, como o nível prejudicial de ataque, que contém uma componente biológica e outra econômica (Cousens, 1988; Fernandes, 2003).

A determinação de níveis econômicos de prejuízos intensificou-se na década de 1960. Fernandes (2003) contabilizou mais de uma centena de trabalhos feitos nessa área, realizados em apenas três países (Espanha, França e Itália), abrangendo mais de duas dezenas de culturas. No Brasil têm sido realizados trabalhos nessa área, principalmente para as culturas de arroz (Galon et al., 2007a,b; Agostinetto et al., 2007), milho (Vidal et al., 1999, 2004) e soja (Chemale & Fleck, 1982; Fleck et al., 2002; Rizzardi et al., 2003, 2004; Bianchi et al., 2006; Silva et al., 2009a,b). Em Portugal, além do trigo (Godinho & Costa, 1980), uma das culturas que têm sido objeto desses estudos é a do tomate para indústria (João, 1997; Fernandes, 1994, 2003).

Portugal é o oitavo produtor de tomate em nível mundial, e cerca de 90% da produção destina-se aos mercados externos (Paiva, 2009). Essa cultura é conduzida com alta tecnologia, com a utilização da rega gota-agota, fertirrigação e mecanização da colheita. Entre 1998 e 2008, o número de agricultores portugueses que se dedicavam ao cultivo do tamateiro passou de 5.870 para apenas 554 produtores. Em contrapartida, a produtividade média passou de 33 toneladas ha-1 para 85 toneladas ha-1, no período (Azevedo, 2009).

O cultivo do tomateiro no sistema de sementeira direta permite diminuir os custos da implantação da cultura, pois elimina o transplante e possibilita a uniformidade na maturação dos frutos. No entanto, esse sistema de cultivo favorece a germinação e posterior desenvolvimento da erva-moira (Solanum nigrum) (Abd Elfatah, 1987).

S. nigrum apresenta como sinonímia no Brasil o nome S. americanum, sendo conhecida pelo nome popular de maria-pretinha (Lorenzi, 1991). As plantas são muito competitivas com a cultura do tomate, pois ambas as espécies pertencem á mesma família botânica: Solanaceae. Essa infestante está amplamente distribuída no Brasil (Lorenzi, 1991), bem como em toda a região tomateira de Portugal (Fernandes, 2003).

Os objetivos deste trabalho foram: elucidar a interação de S. nigrum com o tomateiro no sistema de sementeira direta e transplantado; e avaliar o impacto de diferentes densidades de infestação e períodos de tempo de competição na quantidade da produção de frutos do tomateiro.

MATERIAL E MÉTODOS

Localização e características do solo

Realizaram-se cinco experimentos em campo, em Portugal. O primeiro experimento foi conduzido no ano de 1991, em Gasparões, concelho de Ferreira do Alentejo, e o segundo levado a efeito em 1994, em Beringel, concelho de Beja. Esses dois primeiros experimentos foram conduzidos em unidades experimentais inseridas em propriedades de agricultores. Os três últimos experimentos foram conduzidos entre 1998 e 2001, no Centro Horto-Frutícola da Quinta da Saúde, pertencente à Escola Superior Agrária de Beja, concelho de Beja.

O solo foi amostrado nos 20-25 cm da camada superficial e os resultados das análises de suas características físicas e químicas nos cinco experimentos de competição entre ervamoira e tomateiro estão sintetizados na Tabela 1.

Delineamento experimental

Os experimentos seguiram o método aditivo, mantendo-se constante a densidade da cultura, enquanto variou o número de ervas-moiras, conforme determinado no delineamento experimental. As densidades da infestante foram obtidas a partir das infestações naturais, tendo-se alcançado as densidades desejadas através de monda manual e condicionado à distribuição de modo uniforme nas subparcelas. Durante a implantação do ensaio e o ciclo da cultura, foram eliminadas, ainda no estado de plântula, todas as espécies estranhas ao ensaio. Terminados os períodos de competição definidos, as ervas-moiras foram cortadas junto ao colo, com uma tesoura de poda.

As principais especificações dos delineamentos experimentais efetivados nos cinco experimentos estão sumarizadas na Tabela 2. O delineamento experimental adotado nos primeiros quatro ensaios foi do tipo blocos casualizados com parcelas subdivididas, sendo os períodos de competição as parcelas principais e as densidades as parcelas secundárias (unidade experimental). No primeiro ensaio montaram-se cinco repetições, sendo quatro nos restantes. O número de períodos de competição variou nos diferentes ensaios, tendo-se optado por quatro períodos no primeiro, quarto e quinto ensaios, cinco períodos no segundo e apenas três no terceiro.

A largura dos talhões no primeiro e segundo ensaios foi de 1,4 m (largura da cama), e nos restantes quatro ensaios, de 1,0 m, uma vez que não se montaram camas e Torner & González-Andujar (1993) consideram que Solanum nigrum exerce a sua ação competitiva em aproximadamente um metro quadrado.

A emergência da infestante ocorreu, normalmente, dez dias depois da instalação da cultura. Considerou-se início da floração quando ±10% das flores abriram; floração, quando ±50% estavam abertas; início da frutificação, no aparecimento dos primeiros frutos vermelhos; maturação, quando mais de 50% apresentavam coloração vermelha; e colheita, quando mais de 70% dos frutos se encontravam vermelhos.

Instalação e condução dos ensaios

A preparação do terreno fez-se de acordo com a seguinte sequência: primeiro lavoura, seguida de gradagem e posterior fresagem. O modo de instalação variou, tendo-se realizado três ensaios em sementeira direta (primeiro, quarto e quinto ensaios), um por transplantação de plantas de raiz nua (segundo) e um (terceiro) através de transplantação de plantas de raiz protegida, vulgarmente designados por "motes". Dessa forma, abrangeram-se as três formas usadas na implantação da cultura. As variedades usadas, de ciclo médio, foram as seguintes: Cannery Row (primeiro, quarto e quinto ensaios), Rio Grande (segundo ensaio) e Dart (terceiro ensaio).

A implantação do primeiro e segundo ensaios fez-se em linhas pareadas, com 16-17 cm de distância na linha e 40 cm na entrelinha. Nos outros ensaios adotou-se a linha simples, com ± 20 cm de distância na linha. As linhas encontravam-se separadas entre si de 1,6 m no terceiro ensaio e 1,5 m nos seguintes.

O sistema de rega usado foi do tipo gota-a-gota, com os gotejadores autocompensantes. A periodicidade e as dotações de rega variaram nos dois primeiros ensaios, tendo sido idênticas nos outros. No primeiro, a rega teve início logo após a sementeira, efetuando-se regas diárias de aproximadamente uma hora (± 1 litro/ hora/gotejador). No ensaio seguinte houve periodicidade semanal, com duração média de oito horas (± 1 litro/hora/gotejador). Nos três últimos ensaios as regas foram diárias, com duas horas de duração (± 1 litro/hora/gotejador). Em todos os ensaios, a última rega ocorreu dez dias antes da colheita. A fertilização no primeiro ensaio foi iniciada com adubação de base equivalente a 200 kg ha-1 de NPK 14:7:7, e foi distribuído por fertirrigação o equivalente a 100 kg ha-1 de NPK 14:7:7 e 100 kg ha-1 de 8:8:10. No segundo ensaio aplicou-se o equivalente a 250 kg ha-1 de 7:21:21 e, na rega, 100 kg ha-1 de ureia (46%). Nos demais ensaios apenas se aplicaram adubos por meio da rega. No terceiro, foram aplicados 200 kg ha-1 de ureia (33,5%), 100 kg ha-1 de 13:40:13, 100 kg ha-1 de 17:6:18 e 100 kg ha-1 de 15:5:30. No quarto ensaio adotou-se o mesmo que no terceiro, excluindo-se 17:6:18. No quinto ensaio, aplicaram-se 100 kg ha-1 de ureia (33,5%), 100 kg ha-1 de 13:40:13, mais 100 kg ha-1 de 17:5:17 e de 4:0:40. Os tratamentos fitossanitários foram realizados no início de ataques de lagarta-do-tomate (Heliothis armigera) no primeiro e quinto ensaios; de afídeos, no segundo, terceiro e quarto ensaios; de ácaros, em todos os ensaios, exceto no segundo; e as doenças de origem micótica, com cariz preventivo, no segundo e quarto ensaios.

Observações e análise estatística

Quando mais de 70% de frutos estavam maduros, eles foram colhidos manualmente e pesados. Os modelos aplicados aos dados foram o linear simples Y =a+bdi e o modelo não linear hiperbólico , em que a densidade (di) é a variável independente e a perda de produção (Y) a variável dependente, sendo a e b parâmetros do modelo linear e I e A do modelo hiperbólico.

Para os modelos serem comparados, o ajuste fez-se separadamente para as perdas obtidas em cada período de competição e para as perdas de produção de todo o ensaio. As equações dos modelos de competição foram obtidas utilizando os valores médios das perdas de produção. A comparação das equações e dos modelos foi feita com base nos valores do coeficiente de determinação (r2), mas também foram aplicados o teste de t (Student) aos parâmetros das equações e o teste F às equações estimadas - o primeiro com a intenção de conhecer o grau de associação entre os parâmetros das equações e as variáveis estudadas, e o segundo, de saber qual a probabilidade de esses parâmetros serem todos simultaneamente zero e assim, saber se se as equações devem, ou não, ser usadas no cálculo de prejuízos. Quando os parâmetros e as equações dos modelos apresentaram níveis de significância superiores a 5%, os efeitos das variáveis e dos modelos foram considerados não significativos, o que significa que acima desse valor, no caso do teste F, as equações não foram consideradas suscetíveis de serem usadas em cálculos para determinação de níveis de prejuízos. O tratamento estatístico foi feito com recurso ao programa SPSS (Statistical Package for Social Sciences) versão 11.0, em que as equações lineares simples são ajustadas pelo método dos mínimos quadrados e as não lineares (hiperbólico) por um processo interativo, em que o algoritmo, após várias interações, tende para os valores dos parâmetros (Sequencial Quadratic Programing). Os gráficos dos modelos foram feitos através do programa Excel 2000.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A produção média das parcelas sem infestantes do primeiro ensaio foi de 9,27 kg m2; no segundo, de 6,71 kg m2; no terceiro, de 10,46 kg m2; no quarto, de 7,62 kg m2; e no quinto, de 10,55 kg m2. Os valores encontrados são da mesma ordem de grandeza das produções reais, dos respectivos anos, dos melhores agricultores da região onde foram efetuados os ensaios.

A fim de que os modelos fossem comparados, o ajuste dos dados foi feito separadamente para as perdas obtidas em cada período de competição e para as perdas de produção de todo o ensaio, denominando-se no primeiro caso de resultados parciais e, no segundo, de resultados totais.

Ajuste ao Modelo linear

Resultados parciais

Os níveis de significância dos valores de t, relativos ao parâmetro associado à variável densidade, foram significativos (P<0,05) ou muito significativos (P<0,01) num grande número de períodos de competição nos três ensaios com sementeira direta: períodos I, II e III no primeiro ensaio, III e IV no segundo e II, III e IV no quinto (Tabela 3). A constante mostrou-se apenas significativa no período I do primeiro ensaio. Esses resultados mostram que a densidade está significativamente relacionada com as perdas de produção.

Os valores dos coeficientes de determinação (r2 ) indicam, na generalidade dos períodos, uma boa explicação da variação das perdas de produção pelas equações estimadas, relativamente a cada um desses períodos. Atendendo à probabilidade do teste F, a maioria das equações é passível de ser usada no cálculo de prejuízos (Tabela 3).

No segundo e terceiro ensaios, respectivamente com raiz nua e raiz protegida, os períodos com significância foram bem menores. Assim, o nível de significância dos valores de t, relativos ao parâmetro associado à variável densidade, foi significativo nos períodos II e III no segundo ensaio e apenas no período IV no terceiro ensaio, podendo, portanto, as equações estimadas ser usadas no cálculo de prejuízos. Esses resultados mostram que a densidade esteve significativamente relacionada com as perdas de produção, nesses períodos (Tabela 3).

Os valores dos coeficientes de determinação (r2) obtidos foram altos mesmo nas equações não utilizáveis, ainda que mais baixos que nos outros períodos, como seria de esperar (Tabela 3).

Resultados totais

O nível de significância do teste t para o parâmetro da variável densidade foi muito significativo (P<0,01) nos ensaios feitos em sementeira direta e altamente significativo (P<0,001) nos transplantados. Desse modo, pode-se afirmar que a densidade está altamente relacionada com as perdas de produção, particularmente quando a cultura é transplantada. Assim, como foi hipotetizado, as equações determinadas podem ser utilizadas, o que é confirmado pelo valor da probabilidade de F (Tabela 3).

Os coeficientes de determinação (r2), com exceção do terceiro ensaio, foram relativamente baixos, ou seja, a variação das perdas de produção é explicada pelo modelo calculado em porcentagens da ordem de 50 a 60%. Só no terceiro ensaio esse valor se elevou aos 83%. Esses resultados refletem, pois, a dispersão dos valores dos ensaios pelo fato de serem incluídos os diferentes períodos de competição (Tabela 3).

As perdas de produção expressas em porcentagem e a densidade em ervas-moiras por metro quadrado, quando representadas pelo modelo linear, evidenciam o efeito do tempo de competição nas perdas de produção (Figura 1). Verificou-se no primeiro ensaio grande aumento das perdas entre o período I e II e entre II e III, mas os valores se estabilizaram a partir do terceiro período. O "total" reflete o conjunto dos valores do ensaio na sua totalidade, razão pela qual se encontra situado numa posição intermediária em relação aos períodos de competição. Essa observação repetiu-se nos outros ensaios (Figura 1).


Outro aspecto que merece referência é o fato de que no período I, para densidades muito baixas, houve sinal de aumento de produção. Essa situação foi verificada também no segundo, terceiro e quarto ensaios; no terceiro, esse aspecto foi observado em todos os períodos (Figura 1).

No segundo ensaio, merece destaque o fato de o segundo período ter apresentado maiores perdas de produção que o terceiro, sendo paralelos entre si. No terceiro ensaio as diferenças entre os períodos de competição foram pequenas. No quarto ensaio, entre os períodos III e IV verifica-se que a distância foi relativamente pequena, indicando desse modo a existência de estabilização das perdas entre eles (Figura 1).

Modelo Hiperbólico

Resultados parciais

Quando os dados foram ajustados ao modelo hiperbólico, os coeficientes de determinação (r2) da maioria dos períodos foram altos, em razão de a porcentagem das perdas explicada pelas equações estimadas ser também bastante elevada, com exceção das relativas ao primeiro período (Tabela 4). Os valores foram muito próximos dos observados no modelo linear (Tabela 3).

No primeiro, segundo e quinto ensaios, todas as equações determinadas foram passíveis de utilização no cálculo de prejuízos, exceto para o período I, em face das probabilidades apresentadas pelo teste F. Todavia, no terceiro e quarto ensaios, apenas a equação estimada para o período IV deve ser utilizada no cálculo de prejuízos, uma vez que os valores de significância de F se situaram acima do valor estipulado. Ainda assim, os valores dos coeficientes de determinação foram altos, verificando-se que a porcentagem de perdas explicada pelos modelos estimados nos períodos II e III foi bastante superior a 80% e 90%, respectivamente (Tabela 4).

Todos os experimentos também confirmaram a hipótese de que a magnitude da queda do rendimento do tomateiro foi dependente do período de convivência entre ervas e a cultura (Tabelas 3 e 4). Assim, maiores perdas foram observadas quando a cultura conviveu com erva-moira durante todo o ciclo; e as quedas do rendimento foram menos pronunciadas para intervalos curtos de convivência - por exemplo, entre o transplante e o florescimento (Figuras 1 e 2). Outros trabalhos da literatura (Brânthome et al., 1987; Jacquard & Abd Elfatah, 1988) constataram que podem permanecer até o início da floração seis plantas de erva-moira por metro quadrado, fase a partir da qual a cultura deve estar isenta de infestantes. Contrariamente, outros resultados (Maillet & Abd Elfatah, 1983; Domato & Montemurro, 1986; Weaver et al., 1987; Caussanel, 1989; Brânthome, 1994) indicam que o período crítico decorre a partir do início da floração do tomateiro, independentemente do nível de infestação.


Resultados totais

O coeficiente de determinação em todos os ensaios, exceto no terceiro, indica que 50-60% da variação das perdas é explicada pelas equações calculadas - valores baixos, mas ainda assim mais altos que o calculado no modelo linear. Contudo, as equações apresentam todas as condições para poderem ser usadas, atendendo ao valor da significância de F (Tabela 4).

Já no terceiro ensaio 79,5% da variação das perdas é explicada pela equação estimada; ainda que alto, esse valor é inferior ao observado no modelo linear. A probabilidade apresentada pelo teste F indica que a equação pode ser utilizada nos cálculos de prejuízos (Tabela 4).

As representações gráficas do modelo hiperbólico têm sempre origem em zero (0) (Figura 2). Como já foi apontado, esse fato não se verifica no modelo linear (Figura 1). Essa discrepância entre os modelos poderia ser devido a alguma interação positiva entre plantas infestantes e cultivadas sob baixíssimas densidades. No que se refere aos aspectos benéficos, Fernandes (1994) afirmou que a espécie S. nigrum é hospedeira do afídeo Aphis solanella e de dois auxiliares, Coccinella septempuntacta e Crysoperla cárnea, considerados predadores de afídeos e de ovos de lepidópteros, respectivamente, razão pela qual essas plantas poderiam ser usadas na cultura como "foco de inimigos naturais". Ilharco (1992) acredita que a presença desse afídeo que não ataca o tomateiro é altamente favorável, uma vez que os seus inimigos naturais são os mesmos que atacam alguns dos afídeos mais temidos na cultura do tomate, nomeadamente o Aphis fabae. Desse modo, dependendo do número de predadores e de afídeos presentes, pode-se avaliar a necessidade, ou não, de fazer intervenções com inseticidas.

Como a densidade de plantas de ervamoira foi reduzida, esperava-se que o modelo linear fosse o mais apropriado para relacionar densidade de infestantes e queda do rendimento de tomateiro (Vidal et al., 2004; Adati et al., 2006). Essa expectativa se confirmou em todas as avaliações, exceto em poucas épocas (Figuras 1 e 2). Especula-se que esse fato se deva à elevada capacidade competitiva de S. nigrum com o tomateiro. De fato, ambas as espécies pertencem à família das Solanaceae e devem ocupar o mesmo nicho biológico, além de provavelmente apresentarem os mesmos requerimentos dos recursos do meio.

Em conjunto, todos esses fatos permitem especular que no modelo linear o coeficiente de determinação seja maior no período I, uma vez que, como se viu anteriormente, durante esse período os valores do ensaio mostraram que baixas densidades de erva-moira conduzem a um pequeno aumento de produção - aspecto a que o modelo hiperbólico não é sensível (Figura 2).

Da mesma forma que no modelo linear, no modelo hiperbólico pode-se observar que as perdas de produção foram maiores à medida que aumentou o período de competição (Figura 2). As diferenças das perdas entre os vários períodos foram sensivelmente semelhantes às verificadas com o modelo linear, como era de esperar (Figuras 1 e 2).

Merece especial referência o fato de nos últimos três ensaios o comportamento das perdas de produção ser linear, em todos os períodos de tempo considerados. Assim, constatou-se que a perda de produção nas densidades mais baixas de erva-moira é do tipo linear, como era esperado (Figura 2).

Uma das hipóteses confirmadas por este trabalho (Figuras 1 e 2 e equações 3 e 4) foi a de que a queda do rendimento de tomate é diretamente proporcional à densidade de ervamoira. Resultados semelhantes também foram constatados para diversas espécies infestantes nas culturas de arroz (Agostineto et al., 2005; Galon et al., 2007), milho (Vidal et al., 1999, 2004), soja (Fleck, 1996; Theisen et al., 2000; Fleck et al., 2002; Rizzardi et al., 2003, 2004; Bianchi et al., 2006), trigo (Godinho & Costa, 1980; Aguiar, 1992) e tomate (Bento et al., 1987; Fernandes, 1994, 2003).

Tendo em vista o exposto, pode-se dizer que erva-moira é uma espécie muito competitiva em relação ao tomateiro quer quando a cultura é semeada, quer quando é transplantada. As perdas de produção foram maiores quando a cultura foi semeada do que quando transplantada. A expressão dos resultados depende da densidade e do período de competição - nesse caso, sobretudo quando a cultura é transplantada. As perdas de produção sobem com o aumento desses fatores.

A diferença de perdas de produção verificada nos dois modos de implantação da cultura deve-se ao distinto estado de desenvolvimento da cultura quando ocorre a emergência da infestante nas duas situações, sendo a competitividade desta maior quando a emergência das duas espécies acontece simultaneamente ou com pouca diferença de dias.

Os modelos linear e hiperbólico apresentam ajustamentos muito semelhantes aos resultados dos ensaios, ainda que o último mostra resultados melhores quando as densidades são mais altas, em virtude de se verificar uma estabilização das perdas - aspecto a que este modelo atende. Por sua vez, quando o período de competição é pequeno, por vezes, verifica-se aumento de produção para baixas densidades, e, nesta circunstância, o modelo linear é o que melhor se ajusta aos dados.

Os testes aplicados a ambos os modelos indicam que a quase totalidade dos parâmetros das equações determinadas, tanto do modelo linear quanto do hiperbólico, pode ser usada no cálculo dos níveis de prejuízo.

Atendendo à agressividade da espécie estudada, é de esperar que os níveis de infestação admissíveis sejam sempre baixos, sobretudo quando o tempo de competição é maior, uma vez que, à medida que o tempo de competição aumenta, as perdas de produção aumentam e, consequentemente, o nível de infestação admissível deve baixar. Por outro lado, o nível também será menor quando a cultura é semeada diretamente no terreno do que quando ela é transplantada, visto que as perdas são maiores.

AGRADECIMENTO

Ao Prof. Ribas Antonio Vidal, pelas sugestões numa versão preliminar deste texto.

LITERATURA CITADA

Recebido para publicação em 29.9.2009 e na forma revisada em 11.12.2009.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Fev 2010
  • Data do Fascículo
    Dez 2009

Histórico

  • Revisado
    11 Dez 2009
  • Recebido
    29 Set 2009
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