Acessibilidade / Reportar erro

Obtenção de compósitos de resíduos de ardósia e polipropileno

Composites obtained by the combination of slate powder and polypropylene

Resumos

O uso de ardósia em construções tem frequentemente resultado na produção de uma grande quantidade de resíduos particulados que tem pequeno valor mercadológico e grande potencial de danificação do meio ambiente. Neste trabalho, partículas de ardósia foram testadas como agente de reforço em polipropileno. Polipropileno e partículas de ardósia foram misturados em um misturador em diferentes frações. Anidrido maleico foi também usado durante a mistura para induzir modificações no polipropileno que levassem a um aumento na interação entre os componentes. As amostras foram caracterizadas por espectroscopia no infravermelho (FTIR) e microscopia eletrônica de varredura. Materiais contendo 5 e 10% de ardósia produziram amostras com características ópticas semelhantes à rocha original. As análises por FTIR e microscopia eletrônica de varredura sugeriram que as modificações químicas no polipropileno levaram a uma melhoria parcial das interações interfaciais entre as partículas de ardósia e o polímero. Propriedades mecânicas, avaliadas por meio de ensaios de resistência à tração, mostraram que a adição das partículas de ardósia não alterou significativamente a resistência mecânica do polipropileno. Assim sendo, a incorporação de partículas de ardósia em polipropileno surge como uma tecnologia potencial para a produção de sistemas com algumas propriedades mecânicas comparáveis ao polipropileno puro, baixo custo, propriedades ópticas próximas às da ardósia e habilidade de minimizar problemas ambientais decorrentes da presença de resíduos derivados de atividades industriais.

Ardósia; aproveitamento de resíduos; compósitos; polipropileno


The use of slate rock in constructions often results in the production of large amount of residual powder that has very low economical value and can also damage the environment. In this work, slate powder was tested as a reinforcing agent for polypropylene. Polypropylene and slate powder were mixed in different ratios in a mixer. Maleic anhydride was also used during the mixing to induce chemical modification of polypropylene in order to improve interactions between the polymer and the inorganic powder. Samples were characterized by infrared spectroscopy and scanning electron microscopy. Samples obtained by adding 5 and 10 wt. % of slate powder in polypropylene had optical properties close to those of commercial slate. FTIR and electron microscopy results suggested that chemical modification of polypropylene led to a partial improvement on the interfacial interactions between slate powder and the polymer. Mechanical properties evaluated by using tensile tests showed that the slate powder did not affect substantially the mechanical strength of polypropylene. Therefore, the incorporation of slate powder in polypropylene emerges as a potential technology for production of systems with some mechanical properties comparable to pure polypropylene, low cost, optical properties close to pure slate and ability to minimize environment problems caused by the presence of residual powder derived from industrial activities.

Slate; industrial waste; composites; polypropylene


ARTIGO TÉCNICO CIENTÍFICO

Obtenção de compósitos de resíduos de ardósia e polipropileno

Composites obtained by the combination of slate powder and polypropylene

Giovanna M. X. de Carvalho; Herman S. Mansur; Wander L. Vasconcelos; Rodrigo L. Oréfice

Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais, UFMG

Autor para correspondência Autor para correspondência: Rodrigo L. Oréfice Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais, UFMG Rua Espírito Santo 35/206 CEP 30160-030, Belo Horizonte, MG, Brasil E-mail: rorefice@demet.ufmg.br

RESUMO

O uso de ardósia em construções tem frequentemente resultado na produção de uma grande quantidade de resíduos particulados que tem pequeno valor mercadológico e grande potencial de danificação do meio ambiente. Neste trabalho, partículas de ardósia foram testadas como agente de reforço em polipropileno. Polipropileno e partículas de ardósia foram misturados em um misturador em diferentes frações. Anidrido maleico foi também usado durante a mistura para induzir modificações no polipropileno que levassem a um aumento na interação entre os componentes. As amostras foram caracterizadas por espectroscopia no infravermelho (FTIR) e microscopia eletrônica de varredura. Materiais contendo 5 e 10% de ardósia produziram amostras com características ópticas semelhantes à rocha original. As análises por FTIR e microscopia eletrônica de varredura sugeriram que as modificações químicas no polipropileno levaram a uma melhoria parcial das interações interfaciais entre as partículas de ardósia e o polímero. Propriedades mecânicas, avaliadas por meio de ensaios de resistência à tração, mostraram que a adição das partículas de ardósia não alterou significativamente a resistência mecânica do polipropileno. Assim sendo, a incorporação de partículas de ardósia em polipropileno surge como uma tecnologia potencial para a produção de sistemas com algumas propriedades mecânicas comparáveis ao polipropileno puro, baixo custo, propriedades ópticas próximas às da ardósia e habilidade de minimizar problemas ambientais decorrentes da presença de resíduos derivados de atividades industriais.

Palavras-chave: Ardósia, aproveitamento de resíduos, compósitos, polipropileno.

ABSTRACT

The use of slate rock in constructions often results in the production of large amount of residual powder that has very low economical value and can also damage the environment. In this work, slate powder was tested as a reinforcing agent for polypropylene. Polypropylene and slate powder were mixed in different ratios in a mixer. Maleic anhydride was also used during the mixing to induce chemical modification of polypropylene in order to improve interactions between the polymer and the inorganic powder. Samples were characterized by infrared spectroscopy and scanning electron microscopy. Samples obtained by adding 5 and 10 wt. % of slate powder in polypropylene had optical properties close to those of commercial slate. FTIR and electron microscopy results suggested that chemical modification of polypropylene led to a partial improvement on the interfacial interactions between slate powder and the polymer. Mechanical properties evaluated by using tensile tests showed that the slate powder did not affect substantially the mechanical strength of polypropylene. Therefore, the incorporation of slate powder in polypropylene emerges as a potential technology for production of systems with some mechanical properties comparable to pure polypropylene, low cost, optical properties close to pure slate and ability to minimize environment problems caused by the presence of residual powder derived from industrial activities.

Keywords: Slate, industrial waste, composites, polypropylene.

Introdução

O acúmulo de resíduos provenientes de processos industriais, da extração e tratamento de minérios e da construção civil causa extensos prejuízos econômicos, já que envolve etapas onerosas de remanejo, transporte e descarte que, associadas à perda de produtividade, reduzem margem de lucro dos empreendimentos. Além disso, boa parte dos resíduos acumulados acaba por provocar desequilíbrios ambientais, exigindo locais e métodos especiais de descarte, além de significar a utilização excessiva e pouco eficiente dos recursos naturais. Visto este problema, vários programas ligados à preservação do meio ambiente em todo mundo definem metas de redução da parcela de resíduos descartados provindos de processos industriais[1]. Uma das possibilidades de utilização de resíduos sólidos está na incorporação destes na forma de carga em polímeros[1-3]. Neste caso, a matriz polimérica tem a função de revestir os resíduos, mantendo-os consolidados em uma peça de interesse mercadológico. Para viabilizar a maioria das aplicações envolvendo tais polímeros contendo resíduos, é importante que a inserção dos resíduos não cause uma redução significativa nas propriedades dos polímeros.

Dentre os resíduos derivados de processos industriais, destacam-se aqueles provenientes da extração e corte da ardósia. Ardósia é uma das pedras mais usadas na construção civil, principalmente no Brasil. Tanto os processos de extração e corte da rocha quanto aqueles ligados à sua aplicação levam a produção de grandes quantidades de resíduos na forma de pó. Este pó apresenta pequeno valor tecnológico agregado e, freqüentemente, acaba resultando em problemas de remanejamento de lixo e assoreamento de leitos fluviais[4].

A combinação de partículas e fibras com matrizes poliméricas vem sendo usada rotineiramente como forma de se alterar propriedades mecânicas, ópticas, térmicas e na redução de custo. Fibras são notoriamente capazes de reforçar matrizes poliméricas, enquanto partículas podem não contribuir substancialmente como reforço[5,6]. No entanto, partículas são mais abundantes e menos onerosas do que fibras, o que tem motivado a busca por sistemas de reforço de plásticos à base de material particulado[7,8].

Desde a sua introdução em 1954, o polipropileno se tornou uma das mais importantes resinas termoplásticas da atualidade, continuando ainda como a resina de maior crescimento[9]. As principais características do polipropileno no tocante a sua alta aceitação e significativo crescimento são: alta rigidez, baixo peso específico, boa transparência, facilidade de reciclagem e elevada processabilidade, podendo ser estirado e orientado, (fundamental para produção de fibras e filmes orientados). A introdução de fibras e partículas no polipropileno pode gerar sistemas com propriedades mecânicas elevadas o suficiente que permitam a sua utilização na substituição de plásticos de engenharia, normalmente mais onerosos[10,11]. A adição de cargas/fibras também permite ampliar a faixa de temperatura de uso do polipropileno, o que acaba favorecendo uma expansão na aplicação deste polímero. As principais aplicações associadas ao polipropileno são: indústria automobilística, utilidades domésticas, carpetes, embalagens e tecidos.

Neste trabalho pretendeu-se avaliar a potencialidade de uso dos resíduos de ardósia como reforço em matrizes poliméricas. Para tal, resíduos de ardósia na forma de pó foram misturados a polipropileno. Com o objetivo de favorecer interações interfaciais entre as partículas inorgânicas de ardósia e a matriz polimérica (polipropileno), foi também utilizado o anidrido maleico como reagente capaz de aumentar a afinidade química entre as partículas inorgânicas e polímero. O anidrido maleico vem sendo usado e testado em diferentes situações na chamada extrusão reativa, a qual utiliza uma extrusora padrão como reator químico[12,13]. Grupos derivados do anidrido maleico enxertados nas cadeias poliméricas têm potencialmente capacidade de evoluir para a formação de ácidos carboxílicos que, devido ao seu caráter hidrófilo, podem interagir mais efetivamente com superfícies inorgânicas normalmente hidratadas. O enxerto de cadeias poliméricas em superfícies de agentes de reforço tem sistematicamente levado a melhorias nas propriedades mecânicas de compósitos.

Tal sistema composto de polipropileno e resíduos de ardósia poderia ser usado na própria construção civil ou mesmo substituindo sistemas baseados em polipropileno e outras cargas (como carbonato de cálcio e talco) em aplicações voltadas para a indústria automobilística e utilidades domésticas.

Experimental

Os seguintes materiais foram usados na confecção das amostras: polipropileno homopolímero (origem: Braskem, H605, índice de fluidez = 2,1 g.10 min-1); pó de ardósia (obtido da mineradora Parapuam, tamanho médio de partícula = 20 µm); anidrido maleico (Vetec); peróxido de dicumila (Aldrich). Para o processamento dos compósitos foi utilizado um misturador (Therno Haake - Polydrive mixer). O polímero (polipropileno, PP), na forma de pellets, foi pesado e misturado ao pó de ardósia em um recipiente fechado. Determinadas amostras foram produzidas usando ainda anidrido maleico (Vetec) e peróxido de dicumila (Aldrich). A Tabela 1 mostra a composição dos diversos materiais. As misturas mecânicas foram, em seguida, alimentadas no misturador Thermo Haake a uma temperatura de 200 °C e 30 rpm. Os materiais processados foram removidos do misturador e encaminhados para a moldagem via compressão. Placas de 50 x 50 x 1 mm foram processadas por compressão à uma temperatura de 190 °C por cinco minutos e pressão de 20 MPa. Das placas produzidas foram retirados corpos de prova para os ensaios de tração e de caracterização física e morfológica.

As amostras foram caracterizadas por espectroscopia na região do infravermelho (FTIR) e microscopia eletrônica de varredura. Espectros de FTIR foram coletados num espectrômetro Perkim-Elmer Paragon 1000, utilizando-se um acessório para reflexão total atenuada (ATR). Durante as análises, as amostras foram pressionadas contra a superfície de um cristal ATR KRS-5. No caso das partículas de ardósia, estas foram depositadas num cristal de seleneto de zinco para permitir a análise com o acessório ATR. Espectros foram obtidos após um número médio de 32 varreduras com uma resolução de 4 cm-1.

A superfície de fratura dos materiais produzidos foi investigada através de microscopia eletrônica de varredura, utilizando-se um Microscópio Eletrônico de Varredura, marca JEOL, modelo 6360LV. As superfícies de fratura foram geradas através da imersão dos materiais em nitrogênio líquido por cinco minutos e fratura imediatamente realizada após a remoção. As superfícies de fratura foram recobertas com ouro para viabilizar a observação no microscópio eletrônico de varredura.

Ensaios de tração foram realizados numa máquina EMIC DL3000, dotada de célula de carga de 2kN, seguindo a norma ASTM 638-D.

Resultados e Discussão

A Figura 1 apresenta os espectros de infravermelho (FTIR) das diferentes amostras. O espectro de FTIR na Figura 1a revela as bandas de absorção típicas de ligações C-H presentes no polipropileno, ou seja, estiramento de grupos CH/CH2/CH3 entre 2850 e 2980 cm-1, deformação angular de grupos CH3 em 1354 e 1460 cm-1, estiramento de ligações C-C em 1167 cm-1 e deformação angular dos grupos C-H em 890 cm-1. Nos espectros dos compósitos contendo ardósia (Figura 1b e 1c), observa-se claramente a presença de uma ampla banda de absorção entre os números de onda 980 e 1200 cm-1 e 860 cm-1, associados à ligações Si-O e Al-O da ardósia. A ardósia é constituída de uma série de minerais cujos mais importantes são quartzo (55% em massa), muscovita (30%), hematita (8%)[14]. A magnitude desta banda é também proporcional ao conteúdo de particulado, sendo mais proeminente para a amostra contendo 10% de ardósia. O espectro da Figura 1d diz respeito ao pó de ardósia puro e revela claramente as bandas de absorção nas regiões entre 980 e 1200 cm-1 e 860 cm-1. A semelhança entre a banda de absorção característica da ardósia e aquelas presentes nos espectros dos compósitos com polipropileno comprova a incorporação da ardósia durante o processo de mistura.


A Figura 2 exibe os espectros de FTIR de amostras de PP com ardósia, onde foi adicionado, durante a mistura, anidrido maleico. O espectro da Figura 2a é uma reprodução daquele exibido na Figura 1c e corresponde ao polipropileno contendo 10% de ardósia sem anidrido maleico. Os outros espectros da Figura 2 estão relacionados às amostras de polipropileno contendo ardósia e anidrido maleico (Figura 2b) e de anidrido maleico puro (Figura 2c). Bandas de absorção em 1784 e 1860 cm-1, como as exibidas no espectro da Figura 2c (anidrido maleico), podem ser associadas ao estiramento simétrico e assimétrico respectivamente da carbonila do anidrido[15]. Já a banda de absorção à 1710 cm-1 é normalmente associada à carbonila do ácido maleico. A presença desta banda de absorção no espectro da Figura 2b, correspondente ao polipropileno contendo ardósia e anidrido maleico, mostra que, concomitante com a incorporação do anidrido maleico, ocorreu também uma conversão de anidrido para ácido. Tal conversão foi obtida, provavelmente, quando da interação da funcionalidade anidrido com a superfície polar das partículas de ardósia, já que os anidridos são naturalmente instáveis e são convertidos para ácido na presença de espécies polares. A presença das carboxilas é importante para favorecer interações entre a superfície polar das partículas de ardósia e o polímero modificado, através, por exemplo, da formação de ligações de hidrogênio ou reações de esterificação[16]. Dessa forma, os resultados de FTIR sugerem a interação entre anidrido maleico e a superfície das partículas de ardósia, induzindo a conversão de anidrido para ácido. A banda de absorção em 1640 cm-1 no espectro 2b, e que não está presente no espectro do sistema sem anidrido maleico (Figura 2a), pode ser associada às ligações duplas entre carbonos C=C criadas durante a clivagem das cadeias de polipropileno na presença de peróxido[17].


A Tabela 2 exibe valores obtidos pelo ensaio de resistência à tração para cada tipo de material. Nesta tabela são reportados os valores de resistência mecânica, definida como sendo a tensão máxima suportada pelo material (que, no caso dos materiais estudados, esteve relacionada com a tensão de ruptura), e o módulo de elasticidade. Pode-se notar que a incorporação das partículas de ardósia em polipropileno praticamente não resultou em alteração da resistência mecânica do material quando comparado com o polipropileno puro. A introdução de particulados inorgânicos rígidos em matrizes poliméricas é muito comumente acompanhada de uma redução na resistência mecânica do polímero, levando à produção de compósitos mecanicamente mais pobres que o polímero puro. Este fato é frequentemente observado, por exemplo, quando particulados, como o carbonato de cálcio e talco, são incorporados em polímeros como o polipropileno[18-20]. O fato da presença da ardósia não ter influenciado na resistência do polímero, apesar de não caracterizar a sua capacidade de reforço, realça a sua capacidade de não deteriorar as propriedades em relação ao polímero puro. As interações entre as partículas de ardósia e polipropileno, que foram reforçadas pela adição de anidrido maleico (como indicado pelas análises de FTIR e visualizado também por microscopia eletrônica – Figura 4), não foram suficientemente elevadas para permitir um aumento da resistência mecânica do polímero, mas foram suficientes para impedir uma deterioração acentuada das propriedades do material. Essa deterioração de propriedades (não observada) estaria vinculada à atuação das partículas de ardósia como defeitos no material. Além disso, deve-se ressaltar que a combinação da presença das partículas de ardósia e do anidrido maleico pode ter restringido alguma provável deterioração das propriedades do polipropileno devido ao processo de mistura reativa baseada no uso do peróxido de dicumila. Como mostrado nos resultados de FTIR, o processo de degradação do polipropileno derivado da mistura reativa deste polímero com ardósia, anidrido maleico e peróxido de dicumila resultou na produção de um número elevado de ligações duplas que é uma indicativa clara de clivagem macromolecular e redução de massa molar. Tal redução de massa molar, e conseqüente possível redução de propriedades mecânicas, foi minimizada pelo uso da ardósia e anidrido maleico. Assim sendo, anidrido maleico, apesar de ter se mostrado incapaz de auxiliar no incremento das propriedades mecânicas dos compósitos, pode ter sido importante na manutenção das propriedades básicas de polipropileno submetido a um processo de degradação pela ação do peróxido de dicumila.





A Tabela 2 também mostra que a adição das partículas de ardósia ao polipropileno leva à um aumento do módulo de elasticidade, observado principalmente para os materiais contendo 10% de ardósia. Os resultados obtidos a partir dos ensaios mecânicos permitem sugerir que a adição de resíduos de ardósia na forma de um particulado fino alteram a rigidez dos materiais em relação ao polímero puro, mas não reduzem a resistência mecânica. Assim sendo, a incorporação de resíduos de ardósia a polímeros, ao mesmo tempo em que não deteriora as propriedades do polímero-base, se mostra interessante como forma de minimizar o efeito danoso destes resíduos no meio ambiente, além de permitir a produção de sistemas que apresentam coloração próxima daquela exibida pela rocha original (ardósia) e baixo custo.

A Figura 3 mostra fotografias de amostras dos compósitos contendo polipropileno e ardósia (5 e 10% de ardósia) que apresentam tonalidades escuras próximas às observadas na ardósia usada em construção civil e ornamentos.

Na Figura 4 são exibidas micrografias, obtidas por meio de microscopia eletrônica de varredura, da superfície de fratura criogênica dos materiais. Também na Figura 4 é mostrada uma micrografia das partículas de ardósia antes de sua incorporação ao polímero (Figura 4c), a qual pode ser usada para identificar a morfologia das partículas. A partir da observação da superfície de fratura dos compósitos, pode-se obter informações qualitativas importantes sobre a resistência interfacial dos materiais (análise fraturográfica). Classicamente, resistências interfaciais baixas são geralmente identificadas em superfícies de fratura pela presença de vazios, associados ao arrancamento das partículas, originado da propagação das trincas pela região interfacial. Já, a análise fraturográfica tende a associar resistências interfaciais elevadas à superfícies de fratura caracterizadas pela presença de filmes poliméricos sobre partículas[21]. No caso das superfícies de fratura do polipropileno contendo partículas de ardósia sem anidrido maleico (Figura 4a), a presença das partículas com superfícies claramente reveladas e, ao mesmo tempo, a existência de partículas de ardósia arrancadas (vazios na superfície) caracterizam a existência de níveis de resistência intermediários a baixos para este compósito. Já, no caso de compósitos de polipropileno com ardósia e anidrido maleico (Figura 4b), há a presença de um numero menor de partículas arrancadas da superfície do compósito, sugerindo uma maior adesão entre as partículas de ardósia com o polímero, o que corrobora com os resultados de FTIR que sinalizaram para uma interação entre a superfície das partículas e anidrido maleico. No entanto, não se observa, nestas superfícies de fratura, a presença de filmes poliméricos recobrindo as partículas, indicando assim a não obtenção de níveis elevados de adesão. Dessa forma, a análise fraturográfica forneceu indícios que o uso do anidrido maleico resultou em certo aumento na resistência interfacial dos sistemas estudados, no entanto (como demonstrado pelos resultados dos ensaios mecânicos) tal ganho em resistência interfacial não foi suficiente para produzir compósitos com resistências mecânicas substancialmente superiores às dos polímeros puros.

A análise reológica do sistema contendo o particulado de ardósia é útil para sugerir alterações na processabilidade do polímero contendo o aditivo inorgânico. Neste trabalho, algumas informações sobre a reologia do sistema foram obtidas por meio da avaliação da evolução do torque durante a mistura dos componentes realizado no misturador Thermo-Haake. A Figura 5 apresenta os valores de torque e tempo para as amostras processadas no misturador. Pode-se verificar que para todos os materiais estudados neste trabalho, há um aumento no torque nos momentos iniciais da mistura que se encontra relacionado com a fusão do polímero concomitante com processos de distribuição e dispersão das partículas de ardósia. Estes níveis iniciais de torque são mais elevados para o sistema contendo partículas de ardósia, indicando um gasto inicial de energia mais elevado destinado a desaglomerar e dispersar as partículas inorgânicas. Após fusão e mistura, o torque para todos os materiais diminui e se estabiliza, indicando a formação de uma mistura homogênea. Após a estabilização do torque, os valores deste são ligeiramente maiores para os sistemas contendo ardósia do que o polímero puro, sugerindo viscosidades um pouco mais elevadas para os sistemas contendo o aditivo inorgânico. A pequena alteração na reologia dos sistemas devido à presença das partículas de ardósia permite sugerir que a presença de partículas ardósia na concentração e tamanhos usados neste trabalho não deve modificar, significativamente, a processabilidade do polipropileno, além de não alterar extensivamente os níveis de atrito entre o polímero aditivado e as ferramentas de processamento.


Conclusão

Os resultados obtidos a partir deste trabalho mostraram a viabilidade de uso de partículas de ardósia em matrizes poliméricas como forma de reaproveitamento de resíduos oriundos de processos industriais e construção civil. As amostras produzidas apresentaram coloração comparável com aquela exibida pela rocha ardósia normalmente usada na construção civil e objetos ornamentais, mesmo quando usadas em pequenas quantidades como 5 e 10% em massa em polipropileno. Os resultados de espectroscopia no infravermelho comprovaram a incorporação das partículas de ardósia e ainda foram úteis na identificação da interação entre anidrido maleico e partículas inorgânicas que favoreceu a conversão de anidrido para ácido. Os ensaios de tração revelaram que as partículas de ardósia não alteraram significativamente a resistência mecânica do polipropileno, mas também não foram danosas no sentido de reduzir esta propriedade. A análise das superfícies de fratura dos compósitos, visualizadas por microscopia eletrônica de varredura, permitiu observar indícios de aumento da resistência interfacial ardósia-polipropileno quando da adição do anidrido maleico. No entanto tal ganho em resistência interfacial não foi capaz de promover significativas ampliações nas propriedades mecânicas dos compósitos (como avaliado pelos ensaios de tração). Assim sendo, a incorporação de resíduos de ardósia em polipropileno permitiu a produção de materiais com algumas propriedades mecânicas não muito diferentes do polipropileno puro e de baixo custo que ainda contribui para preservação do meio ambiente na medida em que favorece o reaproveitamento de resíduos.

Agradecimentos

Os autores agradecem ao CNPq e FAPEMIG pelo apoio financeiro para a realização do trabalho.

Enviado: 15/05/06

Reenviado: 26/10/06

Aceito: 08/12/06

  • 1.Robson, S. & Goodhead, T. C. - J. Mat. Proc. Techn., 139, p.327 (2003).
  • 2.Georgopoulos, S. Th.; Tarantili, P. A.; Avgerinos, E.; Andreopoulos, A. G. & Koukios, E. G. - Polym. Deg. Stability, 90, p.303 (2005).
  • 3.Selkea, S. E. & Wichman, I. - Composites: Part A, 35, p.321 (2004).
  • 4.Hoberg, H. I. - "Waste treatment techniques. Institute for Mineral Processing", Coking and Briquetting, (2000).
  • 5.Mallick, P. K. - Fiber-Reinforced Composites. Marcel Dekker, New York (1993).
  • 6.Oréfice, R. L.; Hench, L. L. & Brennan, A. B. - J. Braz. Soc. Mech. Sci., 23, p.1 (2001).
  • 7.DeArmitt, C. & Breese, K. D. - Plast Addit Comp, Sept, p.28 (2001).
  • 8.Bader, M. G. - Comp Part A App. Sci Manufac, 93, p.913 (2002).
  • 9.Busico, V. & Cipullo, R. - Prog. Polym. Sci., 26, p. 443 (2001).
  • 10.Thio, Y. S.; Argon, A. S.; Cohen, R. E. & Weinberg, M. - Polymer, 43, p.3661 (2002).
  • 11.Hartikainen, J.; Hine, P.; Szabó, J. S.; Lindner, M.; Harmia, T.; Duckett, R. A. & Friedrich, K. - Composites Sci. and Tech., 65, p.257 (2005).
  • 12.Shi, D.; Yang, J.; Yao, Z.; Wang, Y.; Huang, H.; Jing, W.; Yin, J. & Costa, G. - Polymer, 42, p.5549 (2001).
  • 13.Tjong, S. C.; Xu, S.; Li, R. K. & Mai, Y. - Composites Sci. and Tech., 62, p.831 (2002).
  • 14.Souza, L. P. F. & Mansur, H. S. - J. Mat. Proc. Techn., 145, p.14 (2004).
  • 15.Moad, G. - Prog. Polym. Sci., 24, p.81 (1999).
  • 16.Felix, J. M. & Gatenholm, P. - J. Appl. Polym. Sci., 42, p.609 (1991).
  • 17.Sclavons, M.; Laurent, M.; Devaux, J. & Carlier, V. - Polymer, 46, p.8062 (2005).
  • 18.Hattotuwa G.B.; Premalal, H. & Ismail, A. Baharin - Polymer Testing 21, p.833 (2002).
  • 19.Demjén, Z.; Pukánszki, B. & Nagy, J. - Composites: Part A, 29A, p.323 (1998).
  • 20.Mareri, P.; Bastide, S.; Binda, N. & Crespy, A. - Composites Sci. Tech., 58, p.747 (1998).
  • 21.Sinien, L.; Xiaoguang, Z. & Zongneng, Q. - J. Mat. Sci., 27, p.4633 (1992).
  • Autor para correspondência:
    Rodrigo L. Oréfice
    Departamento de Engenharia Metalúrgica e de Materiais, UFMG
    Rua Espírito Santo 35/206
    CEP 30160-030, Belo Horizonte, MG, Brasil
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Set 2007
    • Data do Fascículo
      Jun 2007

    Histórico

    • Aceito
      08 Dez 2006
    • Recebido
      15 Maio 2006
    Associação Brasileira de Polímeros Rua São Paulo, 994, Caixa postal 490, São Carlos-SP, Tel./Fax: +55 16 3374-3949 - São Carlos - SP - Brazil
    E-mail: revista@abpol.org.br