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Estabilidade de compostos bioativos em polpa congelada de amora-preta (Rubus fruticosus) cv. Tupy

Stability of bioactive compounds in frozen pulp of blackberry (Rubus fruticosus) cv. Tupy

Resumo

Rubus fruticosus (Rosaceae), popularly known as Blackberry, is a highly nutritious fruit, rich in bioactive compounds. Their stability during processing has been the focus of several studies. This work describes the evaluation of the stability of the main phytochemicals of pulp from blackberry cv. Tupy, stored under different temperature conditions for six months. The storage at -10 °C was not sufficient to cause significant changes in total phenolics content, anthocyanins content and antioxidant capacity during two months of storage. Likewise, at -18 °C, total phenolics content and antioxidant capacity were kept for four months, but total anthocyanins and β-carotene content were kept for two and six months of storage, respectively.

Rubus; pulp; stability


Rubus; pulp; stability

ARTIGO

Estabilidade de compostos bioativos em polpa congelada de amora-preta (Rubus fruticosus) cv. Tupy

Stability of bioactive compounds in frozen pulp of blackberry (Rubus fruticosus) cv. Tupy

Andresa Carolina Jacques* * e-mail: andressa.jacques@yahoo.com.br ; Paula Becker Pertuzatti; Milene Teixeira Barcia; Rui Carlos Zambiazi; Josiane Freitas Chim

Departamento de Ciências e Tecnologia de Alimentos, Universidade Federal de Pelotas, CP 354, 96010-900 Pelotas - RS, Brasil

ABSTRACT

Rubus fruticosus (Rosaceae), popularly known as Blackberry, is a highly nutritious fruit, rich in bioactive compounds. Their stability during processing has been the focus of several studies. This work describes the evaluation of the stability of the main phytochemicals of pulp from blackberry cv. Tupy, stored under different temperature conditions for six months. The storage at -10 °C was not sufficient to cause significant changes in total phenolics content, anthocyanins content and antioxidant capacity during two months of storage. Likewise, at -18 °C, total phenolics content and antioxidant capacity were kept for four months, but total anthocyanins and β-carotene content were kept for two and six months of storage, respectively.

Keywords:Rubus; pulp; stability.

INTRODUÇÃO

Dentre as opções de espécies frutíferas com perspectivas de comercialização, a amoreira-preta se apresenta como uma das mais promissoras. Esta é uma das espécies que tem apresentado um crescimento de área cultivada nos últimos anos no Rio Grande do Sul (principal produtor brasileiro), mas apresenta alto potencial de cultivo em regiões de clima temperado e sub-tropical, como Santa Catarina, Paraná, São Paulo e sul de Minas Gerais. A amoreira-preta, assim como a framboeseira, faz parte de um grande grupo de plantas do gênero Rubus. Este gênero pertence à família Rosaceae, na qual existem outros gêneros de importância (Malus, Prunus, Pyrus entre outros) para a fruticultura brasileira.

Além dos nutrientes essenciais e dos micronutrientes, as frutas contribuem com diversos componentes oriundos do metabolismo secundário, principalmente os de natureza fenólica. O consumo de frutas e hortaliças é associado com baixo risco de incidência e mortalidade por câncer e doenças cardíacas, devido à presença destes compostos oriundos do metabolismo secundário, especialmente flavonoides e antocianinas, os quais revelam grande capacidade de reagir com radicais livres e, portanto, contribuem na prevenção de doenças cardiovasculares, circulatórias, neurológicas e cancerígenas. Estes compostos apresentam ainda atividade anti-inflamatória, antialérgica, antitrombótica, antimicrobiana e antineoplásica.1

Além do fator nutricional, a conveniência é um fator limitante para os consumidores, principalmente quando relacionada à facilidade de estocagem e de preparo para o consumo doméstico.2 A utilização da polpa de frutas congeladas está em expansão em indústrias processadoras de alimentos, como de produtos lácteos, sorvetes e de doces, o que tem aumentado o interesse de produtores e de consumidores.3 A amora-preta possui alta taxa respiratória e com isso sua vida de prateleira para consumo in natura é muito reduzida; portanto, a utilização desta fruta na forma de polpa congelada é uma alternativa para seu consumo.

Em face disto, este trabalho teve por objetivo elaborar uma polpa de amora-preta da cultivar Tupy e armazená-la sob diferentes temperaturas (-10, -18 e -80 ºC) durante 6 meses, e avaliar a estabilidade de seus principais fitoquímicos durante o período de armazenamento.

PARTE EXPERIMENTAL

Materiais

Utilizaram-se frutas de amora-preta (Rubus fruticosus), da cultivar Tupy, cultivadas por um pesquisador da Embrapa na cidade de Morro Redondo - RS. Esta espécie foi identificada pela Embrapa Clima Temperado localizada na cidade de Pelotas. As frutas foram colhidas em janeiro de 2008. As amoras foram colhidas no período da manhã, em seu estádio apropriado de maturação (determinado pelo aspecto visual de coloração e em torno de 10 ºBrix), colocadas em sacos plásticos que foram acondicionados em caixas de isopor contendo gelo e transportadas ao laboratório de cromatografia do DCTA/UFPel.

Os padrões cromatográficos para a determinação de compostos fenólicos (quercetina, epicatequina e os ácidos cafeico, ferúlico, hidróxibenzoico e gálico) foram obtidos da Sigma (St. Louis, MO) e Fluka (Milwaukee, WI). Os padrões utilizados para a determinação de tocoferóis foram: α-, δ- e γ-tocoferol, obtidos da Sigma Aldrich (Steinheim, Germany) com 90-99% de pureza. Para a determinação de carotenoides utilizaram-se padrões de β-cryptoxantina, licopeno, luteína e zeaxantina, obtidos da Chromadex (Irvine, USA), e β-caroteno obtido da Fluka (Saint Louse, USA), todos com 97% de pureza. O padrão cromatográfico para a determinação de ácido ascórbico foi: ácido L-(+)-ascórbico da Synth (Diadema, Brasil), 99% de pureza.

Métodos

Preparo da polpa

Após o recebimento, as frutas foram selecionadas de acordo com o grau de sanidade visual (presença de podridão) e imersas por 15 min em solução com água clorada a 4 ppm, preparada a partir de solução de hipoclorito a 10% (de acordo com a rotina das indústrias produtoras de polpas da região).

A polpa foi obtida pela trituração integral da fruta em liquidificador, não sendo separadas as sementes e nem adicionada de água, sendo o teor de umidade da polpa em torno de 85%. Após, a polpa foi embalada em sacos de polietileno de alta densidade (0,45 micra), em porções com as quantidades necessárias (em torno de 500 g) para as amostragens e, então, armazenados nas temperaturas de -10 (T1), -18 (T2) e -80 ºC (T3), pelo período de 6 meses. Amostras foram analisadas logo após o processamento (tempo zero), aos 2 (t1), 4 (t2) e 6 meses (t3) de armazenamento.

Determinação de fenóis totais

A determinação de compostos fenólicos totais foi realizada com metanol de acordo com método proposto.4 Procedeu-se à elaboração de uma curva padrão de ácido gálico para a quantificação dos fenóis. Os resultados foram expressos em mg de ácido gálico por 100 g-1 de amostra.

Identificação e quantificação de compostos fenólicos individuais

Os compostos fenólicos foram extraídos da polpa das frutas utilizando metanol acidificado, conforme método. Teve-se ainda o cuidado de realizar a preparação sempre em ausência de luz. As amostras foram centrifugadas para posterior injeção no CLAE.5

A identificação e quantificação foi feita através de CLAE. O cromatógrafo consistiu no sistema CLAE-Shimadzu, com injetor automático, detector UV-visível a 280 nm, coluna de fase reversa RP-18 CLC-ODS (5 μm x 4,6 mm x 150 mm) com fase estacionária octadecil e uma coluna de guarda CLC-GODS com fase estacionária de superfície octadecil, ambas acondicionadas em forno a 25 ºC. A fase móvel consistiu no gradiente de eluição utilizando solução aquosa de ácido acético (99:1, v/v) e metanol, com vazão de 0,8 mL/ min, com um tempo total de corrida de 45 min.5

Os compostos fenólicos foram identificados e quantificados com base em curvas analíticas de padrões externos. Os valores dos pontos analíticos foram estipulados com base em estudos prévios de quantificação de compostos fenólicos em pequenas frutas.5 Os resultados foram expressos em mg do composto fenólico por 100 g-1 de amostra.

Determinação de antocianinas totais

A determinação de antocianinas totais foi feita utilizando-se etanol acidificado, seguindo método original.7 O cálculo do conteúdo total de antocianinas foi baseado na Lei de Beer e os resultados foram expressos em mg de cianidina 3-glicosídio por 100 g-1 de amostra.

Identificação e quantificação do ácido L-ascórbico

As amostras foram extraídas com solução de ácido metafosfórico 4,5%, seguindo artigo original,8 seguindo o mesmo cuidado para todas as avaliações, realizando-as no escuro, sendo também centrifugadas para posterior injeção no CLAE. A determinação de ácido L-ascórbico foi feita através de CLAE. A análise de cromatografia líquida de alta eficiência consistiu no mesmo sistema descrito para a análise de compostos fenólicos individuais, utilizando o detector UV-visível a 254 nm. A separação foi desenvolvida utilizando um sistema de gradiente com as fases móveis contendo água ultrapura:ácido acético (99,9:0,1, v/v) e metanol, com vazão de 0,8 mL min-1.9 Para a identificação e quantificação de vitamina C utilizou-se a curva de padrão externo preparada com o ácido L-ascórbico. Os resultados foram expressos em mg de ácido ascórbico por 100 g-1 de amostra.

Identificação e quantificação de tocoferóis

Os tocoferóis foram extraídos utilizando mesma metodologia para extração de carotenoides.6 A análise por cromatografia líquida de alta eficiência consistiu no mesmo sistema descrito para a análise de compostos fenólicos, equipado com detector de fluorescência, utilizando o comprimento de onda de 290 nm para excitação e de 330 nm para a emissão. A separação foi efetuada utilizando um sistema de eluição por gradiente, utilizando como fases móveis metanol, acetonitrila e isopropanol.10

Para a identificação e quantificação de α-, δ- e γ-tocoferol curvas analíticas foram preparadas com os padrões cromatográficos correspondentes. A quantificação de β-tocoferol foi realizada baseada na curva analitica do δ-tocoferol, porque estes dois compostos não são separados no processo cromatográfico e, portanto, são quantificados conjuntamente. O conteúdo total de tocoferóis na amora, expresso em mg tocoferol por 100 g-1 de amostra, foi determinado pela soma dos tocoferóis identificados.

Quantificação de carotenoides totais

Os carotenoides foram extraídos e quantificados conforme método proposto pelo autor e seguindo equação a seguir:6

C= ABS x 50 mL x 106 / 2.500 x 100 x g amostra

onde, C= concentração da amostra e ABS= absorbância.

Os resultados foram expresos em mg de β-caroteno por 100 g-1 de amostra.

Identificação e quantificação de carotenoides individuais

O processo de extração dos carotenoides foi realizado utilizando a metodologia empregada na extração para a determinação de carotenoides totais.6 Após a etapa de extração foi realizada a saponificação a frio.10

A análise por cromatografia líquida de alta eficiência consistiu no sistema descrito para a análise de compostos fenólicos individuais, equipado com detector UV, utilizando o comprimento de onda de 450 nm. A separação foi efetuada utilizando um sistema de eluição por gradiente de metanol, acetonitrila e acetato de etila, com vazão de 1 mL/min. Para a identificação e quantificação utilizou-se uma curva padrão preparada com os padrões cromatográficos correspondentes. O conteúdo total de carotenoides foi expresso em mg carotenóide por 100 g-1 de amostra, sendo determinado pela soma dos carotenoides identificados.

Análise estatística

Todas as determinações foram realizadas em triplicata e os resultados foram submetidos à analise de variância (ANOVA) e pelo teste de Tukey, ambos ao nível de 5% de significância, utilizando-se do Programa Statistic 7.0.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Conteúdo total de compostos fenólicos e antociânicos

A polpa recém-processada de amora-preta apresentou teor de fenóis totais de 1938,70 mg ác. gálico por 100 g-1 de polpa (Tabela 1), valor bem superior ao citado na literatura (569,89 mg ác. gálico por 100 g-1 de fruta) para fruta da mesma cultivar.9 Estas variações no conteúdo de compostos fenólicos podem estar relacionadas às diferenças de metodologias empregadas na extração da amostra. Comparando com outras pequenas frutas, as chamadas berries, o conteúdo de compostos fenólicos totais na polpa de amora-preta avaliada neste estudo foi superior quando comparado com o mirtilo cv. Bluegem (952 mg ác. gálico por 100 g-1 de fruta),11 porém foi inferior quando comparado com a acerola (2372 mg catequina por 100 g-1 de fruta ).12

Com relação ao conteúdo de antocianinas totais na polpa de amora-preta recém-processada (tempo zero), foi observado um teor de 140,73 mg cianidina-3-glicosídio por 100 g-1 de polpa, que praticamente coincide com os valores da literatura,9 na qual é citado conteúdo de 137,59 mg cianidina-3-glicosídio por 100 g-1 de amora-preta da cultivar Tupy. As diferenças observadas quanto ao conteúdo de antocianinas totais podem também estar relacionadas com as variações genéticas, condições ambientais durante a colheita e devido à ação enzimática na pós-colheita, principalmente devido a processos oxidativos das polifenoloxidases, cujo principal substrato é a cianidina-3-glicosídio.13,14

Durante o armazenamento sob congelamento observa-se apenas uma pequena redução no conteúdo de compostos fenólicos até o quarto mês de armazenamento (t2), sem haver diferença significativa ao nível de 5% de significância. Observa-se que em todas as temperaturas de armazenamento somente ocorreram perdas significativas de compostos fenólicos ao final do período de estocagem (t3).

Com relação às antocianinas, observou-se que as polpas armazenandas durante 2 meses nas temperaturas de -10, -18 e -80 ºC não apresentaram diferenças significativas. Porém, no quarto (t2) mês de armazenamento as temperaturas de -10 e -18 ºC não foram suficientes para evitar as perdas de antocianinas. Com isso, observa-se que para manter os compostos antociânicos inalterados num período de 4 meses de armazenamento de amora-preta na forma de polpa é necessária uma temperatura abaixo de -18 ºC. Durante o congelamento, as reações metabólicas são reduzidas, porém não são totalmente inibidas.15 As variações nos teores de antocianinas e flavonoides totais observadas durante o período de armazenamento podem ser justificadas pela interconversão das quatro formas estruturais de antocianinas (base quinoidal, cátion flavilium, pseudobase ou carbinol e chalcona) que, em solução aquosa ácida, se encontram em equilíbrio.16 Por outro lado, a degradação desses pigmentos pode também ser favorecida por ação enzimática, tendo em vista que a polpa não foi submetida a tratamento térmico algum para provocar a inativação das enzimas presentes.

Conteúdo de compostos fenólicos individuais

A quercetina, epicatequina e os ácidos cafeico, ferúlico, hidróxibenzoico e gálico foram os compostos fenólicos identificados por cromatografia líquida de alta eficiência, onde ambos apresentaram alta reprodutibilidade na análise (Figura 1).


O ácido gálico foi o ácido fenólico predominante (Tabela 2) dentre os compostos fenólicos analisados. Estes resultados confirmam dados da literatura que reportam o ácido gálico como sendo o ácido fenólico de maior expressão dentre os compostos fenólicos identificados em amora-preta.9,17

De acordo com a literatura,18 alem de ácido gálico, foram identificados na amora-preta ácido elágico, quercetina e kampferol. No presente estudo não foram identificados o ácido elágico e o kampferol. No entanto, estas discrepâncias podem estar associadas às diferenças de espécies e cultivares, já que esses autores utilizaram amora Marion (Rubus sp. hyb) e Evergreen (Rubus laciniatus), e a amora-preta avaliada neste estudo foi da espécie Rubus fruticosus.

Os dados de quantificação de compostos fenólicos individuais em cultivares nacionais de amora-preta são ainda pouco explorados. Estudos analisando cultivares de amora-preta Choctaw e Kiowa reportaram o ácido gálico e o ácido cafeico como os ácidos majoritários, com 6,42 a 4,12 mg por 100 g-1 e 1,38 a 3,64 mg por 100 g-1, respectivamente, porém, as amostras não passaram por uma hidrólise durante o processo de extração,19 sendo estes conteúdos bem inferiores aos encontrados no presente trabalho.

Durante o armazenamento das polpas nas diferentes temperaturas e tempos, pode-se observar que houve uma degradação já nos dois primeiros meses de armazenamento nas temperaturas de -10 e -18 °C dos ácidos hidroxibenzoico, gálico e ferúlico e da epicatequina. Observa-se que o ácido gálico apresentou uma das maiores degradações dentre os compostos fenólicos individuais, o qual apresenta uma estrutura altamente hidroxilada, o que pode ter causando maior disponibilidade para reações de oxi-redução.

Conteúdo de tocoferóis

O delta (δ-) e o alfa (α-) tocoferol apresentaram separação bem definida em coluna de fase reversa- C18, porém, utilizando-se destas condições cromatográficas, não ocorreu separação do beta (β-) e do gama (γ-) tocoferol, portanto, estes compostos foram quantificados conjuntamente (Figura 2). Os dados de quantificação de tocofeóis em amora-preta são escassos, sendo encontrados principalmente em produtos que apresentam alto teor em gordura, como amêndoas, óleos vegetais e algumas frutas e vegetais.20 A amora-preta apresentou uma quantidade muito pequena de tocoferóis (Tabela 3), o que está associado com o baixo conteúdo de gordura presente nesta fruta (cerca de 0,15% de extrato etéreo).9


O teor de tocoferóis totais na polpa de amora-preta reduziu sensivelmente durante o período de armazenamento, mesmo quando a polpa de amora-preta foi submetida a -80 ºC.

Autores relatam conteúdos de 3,74 mg por 100 g-1 de tocoferóis totais em amora-preta,21 resultados bem superiores ao encontrado neste estudo. No entanto, ressalta-se que estes autores quantificaram o δ, β, γ e α-tocoferol, e no presente estudo quantificou-se conjuntamente o β+γ tocoferóis, o que pode ser, pelo menos parcialmente, um dos motivos desta diferença.

Conteúdo de ácido ascórbico

A Figura 3 apresenta o cromatograma típico para a determinação de ácido L- ascórbico para a polpa de amora-preta cv. Tupy. Observa-se que o conteúdo de ácido ascórbico presente na amora-preta (Tabela 4) é baixo quando comparado com outras frutas estudadas como o mamão papaya (86,0 mg por 100 g-1), manga (89,0 mg por 100 g-1) e acerola (183 mg por 100 g-1).22,23 Estudos anteriores relatam teores de 2,4 mg por 100 g-1 de ácido L-ascórbico na amora-preta cv. Tupy,9 resultado superior ao encontrado neste estudo (0,9 mg por 100 g-1). Mesmo com um elevado conteúdo de ácido ascórbico, alguns autores concluíram que ocorre apenas uma pequena contribuição deste ácido com a atividade antioxidante e sugerem que devem existir outros compostos, incluindo os fenólicos, que contribuem mais efetivamente que o ácido ascórbico na atividade antioxidante apresentada por frutas.24


Durante o período de armazenamento observou-se que após 6 meses ocorreu a degradação total dessa vitamina nas temperaturas, confirmando que esta vitamina é altamente afetada pela ação da temperatura. O ácido ascórbico apenas não foi totalmente degradado nas polpas após 6 meses de armazenamento na temperatura de -80 °C, na qual se observaram perdas de 57%. Estes dados suportam afirmações que citam que, embora a estabilidade da vitamina C aumente com a redução da temperatura e a maior perda ocorra durante o aquecimento dos alimentos, também ocorrem perdas durante o congelamento ou armazenamento a baixas temperaturas.25

Em polpas de acerola foram observadas perdas de 2,77 a 17,88% quando armazenadas à temperatura de congelamento comercial (-12 e -18 °C) durante um período de 12 meses.26

Conteúdo de carotenoides totais

Na amora-preta, devido ao elevado conteúdo de antocianinas totais, a coloração amarelada característica dos caroteoides não é representativa como em outras frutas. O conteúdo inicial de carotenoides totais na polpa de amora-preta (0,877 mg de β-caroteno por 100 g-1 de polpa fresca, Tabela 5) foi superior ao citado para acerola (0,53 mg de β-caroteno por 100 g-1 de fruta) que, assim como a amora-preta, tem uma predominância de antocianinas.23

Foram relatadas perdas de 21,45 até 35,54% no conteúdo de carotenoides em polpa de acerola armazenada por 12 meses à -18 °C.23 A maior preservação destes compostos no estudo realizado por estes autores pode ser devida à utilização do processo de congelamento rápido das polpas de acerola em congelador de placas, o que permite a formação de cristais de gelo de menor tamanho e, portanto, causa menor dano celular à fruta, reduzindo a exposição do pigmento aos fatores externos. Com estes estudos, pode-se observar que os carotenoides presentes na acerola levaram 12 meses para se degradar, enquanto que na amora-preta levaram apenas 2 meses, quando armazenadas a -18 °CAlguns estudos apontam a necessidade da inativação das enzimas responsáveis pelo processo oxidativo antes de realizar o congelamento. No presente estudo, as polpas de amora-preta não passaram por um tratamento térmico para a inativação das enzimas antes do congelamento, e isto pode ter sido outro fator para a grande degradação dos carotenoides.27

Conteúdo de carotenoides individuais

Na polpa de amora-preta recém-processada foram identificados os carotenoides β-criptoxantina, luteína, zeaxantina, β-caroteno e licopeno. Verificou-se que, nas condições deste estudo, a zeaxantina e a luteína não foram separadas e, portanto, foram quantificadas conjuntamente (Figura 4).


Estes dados concordam com estudos recentes,28 que citam que colunas de fase reversa C18 e C30 vêm sendo amplamente utilizadas para separação de carotenoides, porém, em coluna C18 monomérica não ocorre a separação de isômeros geométricos (cis-trans) de carotenoides apolares e entre a luteína e a zeaxantina, o que é conseguido em colunas C30.

Observaram-se perdas de até 80% no conteúdo de carotenoides individuais, assim como no conteúdo de carotenoides totais, durante o período de armazenamento, na polpa armazenada por 6 meses nas temperaturas de -10 e -18 °C, demonstrando a alta sensibilidade destes pigmentos ao armazenamento congelado. A estabilidade dos carotenoides difere bastante nos alimentos, mesmo quando submetidos a processamento e condições de estocagem idênticas. A principal causa de destruição dos carotenoides é devida a sua oxidação, tanto via enzimática quanto não enzimática (Tabela 6).10

Estudos anteriores relatam maior instabilidade de β-criptoxantina em relação ao β-caroteno em polpa de acerola armazenada à -20 °C,28 o que também foi observado no presente estudo com a amora-preta, onde o conteúdo de β-caroteno, diferentemente dos demais, permaneceu praticamente estável durante todo o período de armazenamento sob congelamento.

O teor de β-caroteno apresentou decréscimo em torno de 33% durante o período de armazenamento, nas três temperaturas avaliadas (-10, -18 e -80 °C). Estas perdas são bem inferiores às descritas em outros estudos, nos quais se avaliou a estabilidade dos carotenoides na polpa de pitanga laranja após o congelamento lento à -10 °C com posterior estocagem por 90 dias, os quais relatam perdas de 63% de β-caroteno após estocagem por 30 dias.30 Essa diferença pode ser porque esse pigmento se encontra em pequena quantidade na amora-preta, mas em grande quantidade na pitanga ou, ainda, pela proteção de outros compostos presentes na amora-preta, que atuariam como antioxidantes protegendo os carotenoides da oxidação.

O teor de luteína mais zeaxantina encontrado na amora-preta (0,519 mg por 100 g-1) logo após ser processada na forma de polpa é superior ao encontrado por outros estudos para acerola (0,100 mg por 100 g-1),31 porém estes autores quantificaram a luteína isoladamente.

Com relação ao licopeno, pode-se observar que nenhuma temperatura de armazenamento foi suficiente para evitar as perdas deste composto. A estrutura do licopeno contém onze ligações conjugadas e duas ligações duplas não conjugadas e, por isso, é considerado como o carotenoide que possui uma das maiores capacidades sequestrantes do oxigênio singlete,32 podendo assim explicar sua grande degradação logo nos 2 primeiros meses de armazenamento em todas as temperaturas.

CONCLUSÃO

O conteúdo dos compostos fenólicos totais permaneceu inalterado na polpa de amora-preta cv.Tupy durante 4 meses de armazenamento a -10, -18 e -80 °C.

O conteúdo de compostos antociânicos totais permaneceu inalterado até 6 meses de armazenamento à -80 °C; no entanto, à -10 e -18 °C apresentou decréscimo após 4 meses de estocagem.

Os compostos fenólicos individuais demonstraram-se instáveis em todas as temperaturas de armazenamento, sendo o ácido ferúlico o mais instável.

Os tocoferóis foram degradados em 2 meses de armazenamento nas temperaturas de -10 e -18 °C. Apenas na temperatura de -80 °C o conteúdo de tocoferóis ficou inalterado nos 2 primeiros meses de congelamento.

O ácido ascórbico apresentou degradação em todas as temperaturas, atingindo perdas totais nas temperaturas de -10 e -18 °C aos 6 meses de estocagem.

Os carotenoides apresentaram alterações em todas temperaturas e tempos de armazenamento das polpas de amora-preta.

Temperaturas de -80 °C foram mais eficientes para manter a estabilidade dos principais fitoquímicos em amora-preta por um período mais longo, mas mesmo assim não evitaram a degradação parcial destes compostos.

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Recebido em 5/1/10; aceito em 28/4/10; publicado na web em 9/8/10

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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      25 Out 2010
    • Data do Fascículo
      2010

    Histórico

    • Recebido
      05 Jan 2010
    • Aceito
      28 Abr 2010
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