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A administração pública para a democracia: alguns aspectos estratégicos - II

COLABORAÇAO INTERNACIONAL

A administração pública para a democracia: alguns aspectos estratégicos - II* * Artigo publicado originalmente sob o título La Administración Pública para la Democracia - alguns aspectos estratégicos, pelo Centro Latinoamerícano de Administracián para el Desarrollo (CLAD), Caracas, Venezuela. Tradução de José Roberto Felicíssimo, Sociológo, Doutor em Ciências Sociais, Professor Assistente-Mestre da FEA-PUC/SP, Consultor. 1. Uma segunda leitura - e sugestões de bons amigos! - obrigam-me a suavizar as afirmações deste parágrafo, principalmente, com o relacionado a seguir. Em primeiro lugar, evitar qualquer sensação, ou tensão, entre etapas: uma, perversa e, a outra, cheia de possibilidades. Nada é assim e, sobre isto, mais uma vez, pode-se encontrar uma prova de que o processo passa por sucessivos estágios intermediários de não equilíbrio, nos quais se auto-organizam os distintos componentes. Neste dinamismo, a Administração também jogou seu papel: às vezes, como elemento de rigidez e, outras - muitas, se considerarmos os últimos tempos da ditadura espanhola - produzindo as condições de profissionalização que favoreciam a dinâmica renovadora. 2. Na Espanha, aproximadamente 45% do valor bruto agregado é gerido pelo conjunto das Administrações públicas; e, desse total, 60% é destinado a beneficiários e agentes privados. 3. A respeito de todas essas questões convém consultar os trabalhos de pensadores como Peter Drucker. R. Muller ou K. Bleicher. Eles entendem que, no futuro, o elemento humano será o fator decisivo para permitir a descoberta das oportunidades e evitar os riscos. 4. Algum leitor crítico. dos rascunhos iniciais, apresentou-me algumas questões que, entendo, não são apenas pertinentes, como requerem maior atenção. Em sintese, a pergunta poderia ser: no modelo em que estão superpostos os planos de cidadão e cliente, como é considerada a dimensão política do cidadão, enquanto participante, pelo voto, da definição dos projetos políticos? Poderia pensar-se numa visão tecnocrata que rechaça a vontade política, expressa através da concordância ou desacordo das ofertas programáticas dos partidos políticos, através do recurso da indução ou interpretação das preferências dos clientes, pelos encarregados do rnarketing público. Esta situação deve ser descartada. Mas, para isso, é peremptório que os líderes e responsáveis pelos partidos políticos entendam, também, qual possa ser o seu lugar em uma sociedade aberta e pluralista, com múltiplos caminhos e mecanismos de interação e afastada dos princípios deterministas que sustentaram sua formação no século XIX. Para que cumpram com os objetivos de intermediação social que lhes correspondem, e sejam capazes de formular, propor e dirigir projetos políticos que agreguem amodernizapios interesses cidadãos e coletivos, devem dispor dos mecanismos de análise, comunicação e avaliação que, conforme detectamos, existem em outras corporações industriais e de serviços, e que propusemos para a Administração. Somente assim serão capazes de oferecer alternativas que dentro de cada projeto definidor no qual estejam contemplados os valores fundamentais de liberdade, justiça, eqüidade e solidariedade - congreguem os apoios necessários. Isto, como conseqüência de uma confluência preferencial entre os interesses individ uais e coletivos - mas, egoístas - com aqueles propostos pelo partido político, com o louvável propósito, da mais ampla extensão que pode tender, em certas situações, à universalidade. O novo panorama consistiria em parlamentos eleitos, representando as vontades políticas dos cidadãos, configuradas pelo conhecimento das alternativas aos seus problemas mutáveis, que lhes são oferecidas por Partidos Políticos que ajustam suas propostas a um marco definido de valores. Sua tarefa, então, seria a de planejamento superior das políticas públicas, a partir da realidade social plural e o controle sobre o exercício destas políticas, com a dupla missão de acompanhar a realização do que foi projetado e de comunicar-se com o cidadão, para perceber a satisfação, ou não, de suas aspirações, tendo em vista o prosseguimento ou a correção das políticas planejadas. Neste esquema, como instrumento de execução, a Administração na elaboração dos planos e projetos; aconselharia sobre as normas que, no seu entender, são mais adequadas para alcançar os fins propostos; prestaria, com diligência e eficácia, os atendimentos esperados pelos cidadãos-clientes, deduzidas da concretização em políticas públicas da planificação política; comunicaria os sucessos e fracassos e carências observados na aplicação das diversas políticas; e estaria submetida ao controle, associado com a avaliação de suas atividades, tanto em relação às suas competências executivas, como em relação à materialização, através de sua ação, dos planos e projetos políticos aprovados pelo Parlamento, como expressão dos interesses e da vontade dos cidadãos. 5. É este o caso de algumas das reformas empreendidas recentemente, na França, Japão e Suécia. Em nossa opinião, afastam- se dessa perspectiva, por sua origem ou por seus fins, as citadas por outros comentaristas, referentes à Grã-Bretanha ou aos Estados Unidos; se bem que é verdade que nestes países, produziu-se uma mudança notável na orientação original após as últimas mudanças políticas. 6. Alguns acadêmicos viram e denunciaram os perigos de tal sistema, contribuindo com idéias que, posteriormente, foram acolhidas. 7. Para isso, é preciso que, na Administração, as "carreiras" de seus empregados sejam formuladas e programadas, não tanto como reduto de garantia de direitos individuais e, sim, mais em acorde com as necessidades e orientações da organização. 8. Além disso, é preciso - e de acordo com o mencionado na nota 11 - que o princípio de legalidade seja reformulado para que, nessas circunstâncias, não se contemple como espada de Damocles de forma a manter os dirigentes em tal grau de temor que lhes dificulta a tomada de decisão e a responsabilidade conseqüente. 9. Poderíamos acrescentar, expressamente, um espírito de eficiência que combine análises econômicas de custo-benefício com a inegável sensibilidade para os problemas sociais; em particular, aqueles originários dos âmbitos mais desassistidos da cidadania.

José Constantino Nalda García

Presidente do INAP - Instituto Nacional de Administración Pública, Espanha

RESUMO

Este artigo é o segundo de uma série de três sobre as bases que sustentam a modernização administrativa no setor público espanhol. Está estruturado de forma modular, sem remeter o leitor necessariamente ao primeiro artigo da série. Em particular, nesta segunda parte, o autor focaliza sua atenção na resposta às questões: para que a Administração Pública? Como torná-la realidade? Utiliza o referencial teórico apresentado na Parte I e intraduz o conceito de "espaço de qualidade" para superar as dimensões custo-benefício. Delimita este espaço com três eixos: limitação de recursos, novas tecnologias e informação, com os quais analisa o papel central do capital humano na nova organização prestacional e de garantias, com base no caso espanhol, apontando dificuldades e possíveis ações futuras.

Palavras-chave: Administração Pública, democracia, espaço de qualidade, capital humano, organização.

ABSTRACT

This article is the second of a three serie about the base that support the administrative modernization in the Spanish public sector. It is structured in a modular way, without send the reader to the first article. Especially, in the second part, the autor focus his attention on some questions as: what for public administration? How to make it reality? He uses the theoretical frame of reference presented in Part I and introduces the "space of quality" concept to surpass the dimensions of cost-benefit analysis. Such space is framed by three axes: limíted resources, new technologies and information. Based on Spanish case the autor analises the central role of human capital in the new organization which offers services and guarantees. He points out difficulties and possible future actions.

Key words: Public administration, democracy, space of quality, human capital, organization.

Texto completo disponível apenas em PDF.

Full text available only in PDF format.

Artigo recebido pela Redacão da RAE e aprovado para publicação em junho/93

  • *
    Artigo publicado originalmente sob o título La Administración Pública para la Democracia - alguns aspectos estratégicos, pelo Centro Latinoamerícano de Administracián para el Desarrollo (CLAD), Caracas, Venezuela.
    Tradução de
    José Roberto Felicíssimo, Sociológo, Doutor em Ciências Sociais, Professor Assistente-Mestre da FEA-PUC/SP, Consultor.
    1. Uma segunda leitura - e sugestões de bons amigos! - obrigam-me a suavizar as afirmações deste parágrafo, principalmente, com o relacionado a seguir. Em primeiro lugar, evitar qualquer sensação, ou tensão, entre etapas: uma, perversa e, a outra, cheia de possibilidades. Nada é assim e, sobre isto, mais uma vez, pode-se encontrar uma prova de que o processo passa por sucessivos estágios intermediários de não equilíbrio, nos quais se auto-organizam os distintos componentes. Neste dinamismo, a Administração também jogou seu papel: às vezes, como elemento de rigidez e, outras - muitas, se considerarmos os últimos tempos da ditadura espanhola - produzindo as condições de profissionalização que favoreciam a dinâmica renovadora.
    2. Na Espanha, aproximadamente 45% do valor bruto agregado é gerido pelo conjunto das Administrações públicas; e, desse total, 60% é destinado a beneficiários e agentes privados.
    3. A respeito de todas essas questões convém consultar os trabalhos de pensadores como Peter Drucker. R. Muller ou K. Bleicher. Eles entendem que, no futuro, o elemento humano será o fator decisivo para permitir a descoberta das oportunidades e evitar os riscos.
    4. Algum leitor crítico. dos rascunhos iniciais, apresentou-me algumas questões que, entendo, não são apenas pertinentes, como requerem maior atenção. Em sintese, a pergunta poderia ser: no modelo em que estão superpostos os planos de cidadão e cliente, como é considerada a dimensão política do cidadão, enquanto participante, pelo voto, da definição dos projetos políticos?
    Poderia pensar-se numa visão tecnocrata que rechaça a vontade política, expressa através da concordância ou desacordo das ofertas programáticas dos partidos políticos, através do recurso da indução ou interpretação das preferências dos clientes, pelos encarregados do rnarketing público. Esta situação deve ser descartada. Mas, para isso, é peremptório que os líderes e responsáveis pelos partidos políticos entendam, também, qual possa ser o seu lugar em uma sociedade aberta e pluralista, com múltiplos caminhos e mecanismos de interação e afastada dos princípios deterministas que sustentaram sua formação no século XIX. Para que cumpram com os objetivos de intermediação social que lhes correspondem, e sejam capazes de formular, propor e dirigir projetos políticos que agreguem amodernizapios interesses cidadãos e coletivos, devem dispor dos mecanismos de análise, comunicação e avaliação que, conforme detectamos, existem em outras corporações industriais e de serviços, e que propusemos para a Administração. Somente assim serão capazes de oferecer alternativas que dentro de cada projeto definidor no qual estejam contemplados os valores fundamentais de liberdade, justiça, eqüidade e solidariedade - congreguem os apoios necessários. Isto, como conseqüência de uma confluência preferencial entre os interesses individ uais e coletivos - mas, egoístas - com aqueles propostos pelo partido político, com o louvável propósito, da mais ampla extensão que pode tender, em certas situações, à universalidade.
    O novo panorama consistiria em parlamentos eleitos, representando as vontades políticas dos cidadãos, configuradas pelo conhecimento das alternativas aos seus problemas mutáveis, que lhes são oferecidas por Partidos Políticos que ajustam suas propostas a um marco definido de valores. Sua tarefa, então, seria a de planejamento superior das políticas públicas, a partir da realidade social plural e o controle sobre o exercício destas políticas, com a dupla missão de acompanhar a realização do que foi projetado e de comunicar-se com o cidadão, para perceber a satisfação, ou não, de suas aspirações, tendo em vista o prosseguimento ou a correção das políticas planejadas.
    Neste esquema, como instrumento de execução, a Administração na elaboração dos planos e projetos; aconselharia sobre as normas que, no seu entender, são mais adequadas para alcançar os fins propostos; prestaria, com diligência e eficácia, os atendimentos esperados pelos cidadãos-clientes, deduzidas da concretização em políticas públicas da planificação política; comunicaria os sucessos e fracassos e carências observados na aplicação das diversas políticas; e estaria submetida ao controle, associado com a avaliação de suas atividades, tanto em relação às suas competências executivas, como em relação à materialização, através de sua ação, dos planos e projetos políticos aprovados pelo Parlamento, como expressão dos interesses e da vontade dos cidadãos.
    5. É este o caso de algumas das reformas empreendidas recentemente, na França, Japão e Suécia. Em nossa opinião, afastam- se dessa perspectiva, por sua origem ou por seus fins, as citadas por outros comentaristas, referentes à Grã-Bretanha ou aos Estados Unidos; se bem que é verdade que nestes países, produziu-se uma mudança notável na orientação original após as últimas mudanças políticas.
    6. Alguns acadêmicos viram e denunciaram os perigos de tal sistema, contribuindo com idéias que, posteriormente, foram acolhidas.
    7. Para isso, é preciso que, na Administração, as "carreiras" de seus empregados sejam formuladas e programadas, não tanto como reduto de garantia de direitos individuais e, sim, mais em acorde com as necessidades e orientações da organização.
    8. Além disso, é preciso - e de acordo com o mencionado na nota 11 - que o princípio de legalidade seja reformulado para que, nessas circunstâncias, não se contemple como espada de Damocles de forma a manter os dirigentes em tal grau de temor que lhes dificulta a tomada de decisão e a responsabilidade conseqüente.
    9. Poderíamos acrescentar, expressamente, um espírito de eficiência que combine análises econômicas de custo-benefício com a inegável sensibilidade para os problemas sociais; em particular, aqueles originários dos âmbitos mais desassistidos da cidadania.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      12 Jun 2013
    • Data do Fascículo
      Out 1993
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