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Entrevista com o Dr. Luiz Simões Lopes

Entrevista com o Dr. Luiz Simões Lopes

A Fundação Getúlio Vargas, criada em 1944, muito cresceu ao longo dos seus 40 anos de existência.

Como se vê no organograma a seguir, ela mantém: o Instituto Brasileiro de Economia (IBRE), que se desmembra em dois grandes setores: A Escola de Pós-Graduação em Economia (EPGE) e o Setor de Pesquisas Econômicas; o Instituto de Estudos Avançados em Educação (IESAE); o Instituto de Direito Público e Ciência Politica (INDIPO); o Instituto de Documentação (INDOC); o Instituto de Recursos Humanos (IRH); o Instituto Superior de Estudos Contábeis (ISEC); e o Instituto Superior de Estudos e Pesquisas Psicossociais (ISOP). No setor de ensino da administração, mantém três principais estabelecimentos: a Escola de Administração de Empresas de São Paulo (EAESP); a Escola Brasileira de Administração Pública (EBAP); a Escola Interamericana de Administração Pública (EIAP), esta em regime de convênio com o BID; mantém, ainda, o Centro Interamericano de Comercialização (CICOM), em regime de acordo com a Organização dos Estados Americanos e o Ministério das Relações Exteriores, e os cursos, de curta duração: de administração de empresas (CADEMP) e os ministrados sobre diversas disciplinas no IRH, no ISOP, no IESAE, no INDOC e no INDIPO.

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A Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas completa, em 1984, 30 anos de existência. Gozamos do raro privilégio de poder fixar as bases de nossa história institucional pela palavra daquele que criou a Fundação há 40 anos e, desde então, como seu presidente, tem-se dedicado à sua expansão em diferentes unidades, entre as quais esta Escola. Representando a memória viva não só da trajetória da Fundação e da Escola, mas de meio século da história da administração no contexto mais amplo da evolução do País e da sociedade brasileira, o Dr. Luiz Simões Lopes concedeu à RAE a presente entrevista.

A redação da RAE sente-se muito honrada em poder transmitir aos seus leitores, através dessa entrevista, a forte impressão que experimentam todos os que têm oportunidade de conhecer este homem, sua força, sua coragem e sua visão de vanguarda.

1. RAE - Como surgiu a ideia de criar uma instituição do tipo da FGV, tão original em relação à mentalidade e às práticas de gestão da época?

LSL - A Resolução de 1930 encontrou a administração federal cheia de vícios, resultantes do regime do "pistolão" até então adotado para o provimento dos cargos públicos. As nomeações eram reservadas à clientela política e, na maioria dos casos, não recaía em pessoas devidamente habilitadas ao eficiente exercido das funções do Estado. E sem um serviço público eficiente e insuspeito não é possível administrar e conseqüentemente, bem governar o país. Em 1936, tive a honra de presidir uma Comissão de Reforma Administrativa, que concluiu seus estudos apresentando ao presidente de República um projeto que, encaminhado ao Congresso, foi convertido na Lei nº 284, daquele ano. A Lei nº 284 classificou os cargos públicos com os respectivos padrões de vencimentos, estabeleceu o sistema do mérito para o seu preenchimento e criou o Conselho Federal do Serviço Público Civil, do qual fui nomeado presidente. A Constituição de 1937 criou um órgão na Presidência da

A Constituição de 1937 criou um órgão na Presidência da República, que substituiu o citado Conselho: o Departamento Administrativo do Serviço Público (DASP). Este órgão, incumbido de proceder à reforma da administração federal, consolidou a aplicação do sistema do mérito, através da generalização dos concursos para o ingresso no Serviço Público e da promoção do aperfeiçoamento técnico dos funcionários em cursos especializados no país e no exterior.

O Dasp, com a atribuição constitucional de determinar do ponto de vista da eficiência as modificações a serem feitas na organização do serviço público, de elaborar o Orçamento Geral da República e, de conformidade com as instruções do presidente da República, fiscalizar a execução orçamentária, teve no período de recesso parlamentar de 1937 a 1945 oportunidade de enfrentar tremendas deficiências dos serviços governamentais, que tentou corrigir ou eliminar por uma série de medidas saneadoras, fundadas, principalmente, na racionalização do trabalho.

Presidente do Dasp desde sua criação em 1938 até 1945, quando terminou o primeiro governo do Presidente Getúlio Vargas, tive ocasião de verificar que pôde ser aproveitada apenas uma parcela correspondente a 10% dos 200 mil candidatos então submetidos à concurso. Este fato demonstrava tanto a falta de preparo básico da maioria dos candidatos como, ao mesmo tempo, as falhas do sistema educacional na formação de pessoal especializado.

Para algumas funções técnicas não havia formação de profissionais habilitados, como, por exemplo, economistas e administradores.

Despendemos imensos esforços para reorganizar o serviço público. Mas perdurava a falta de pessoal qualificado, isto é, de especialistas em várias profissões indispensáveis a uma administração moderna, tanto no setor público como no setor privado.

Para assegurar o êxito das reformas em marcha, e das que seriam naturalmente intensificadas com o pós-guerra, que se avizinhava, tornou-se necessário, lá pelos idos de 1944, criar uma entidade pioneira, de ensino e pesquisa, capaz de preparar o pessoal destinado ao desenvolvimento econômico e social do país.

Imaginou-se, então, a criação de uma entidade independente, de direito privado, porém subvencionada pelo Governo, dadas as suas finalidades de interesse público. A forma que nos pareceu mais adequada à personalidade jurídica dessa entidade foi a Fundação prevista no art. 24 do Código Civil.

O Presidente Getúlio Vargas, a quem tive a honra de propor tal iniciativa, aprovou-a generosamente e fixou os encargos governamentais relativos à sua concretização e manutenção.

Surgiu, assim, a Fundação, que, por deliberação unânime de seus 305 doadores iniciais, em escritura pública, recebeu o nome de seu patrono.

Os membros de sua Administração Superior, isto é, o seu presidente e os componentes da Assembléia Geral, do Conselho Diretor e do Conselho Curador não são remunerados; trabalham gratuitamente, com o único objetivo de prestar serviços à instituição e, através dela, ao Brasil.

Cabe perguntar: E os resultados? Não nos compete julgar a obra realizada pela FGV em seus 40 anos de esforços inauditos para atingir seus objetivos estatutários. Mas, podemos afirmar que ela goza de credibilidade e procura corresponder à confiança do País, sem o que não poderia ter sobrevivido às graves crises políticas que atravessamos. Os Governos e o público em geral acreditam em nossos bons propósitos e nos têm dado seu indispensável apoio durante esse longo tempo.

2. RAE - No Brasil, não é comum a sobrevivência de uma instituição privada de ensino e pesquisa durante 40 anos. Quais as dificuldades e apoios que acompanharam essa história?

LSL - De fato, não é comum a sobrevivência durante tão largo tempo de uma instituição como a Fundação Getúlio Vargas. A conclusão lógica é que ela tem servido bem ao país.

As maiores dificuldades que ela tem enfrentado são as originárias ds crise financeira mundial, que também afeta o Brasil. Temos tido, porém, como foi dito, o apoio do Governo e de particulares, o que tem assegurado a continuidade das nossos esforços até agora.

3. RAE - Qual a conjuntura atual da Fundação Getúlio Vargas e que perspectivas futuras o Sr. vislumbra para ela?

LSL - Tudo é difícil em um país submetido a uma inflação tão alta. Temos porém esperança de melhores dias e, por conseguinte, de melhores condições para que a Fundação possa continuar a desenvolver seus trabalhos.

4. RAE - Mais especificamente em relação à Escola de São Paulo, qual foi o plano inicial, o relacionamento com os diversos níveis governamentais e instituições privadas, o intercâmbio com os EUA, etc.?

LSL - Se um dos objetivos principais da Fundação era a formação de administradores públicos e privados, a criação de uma grande escola de administração de empresas se impunha. Naturalmente, São Paulo, o maior centro empresarial do Brasil e da América Latina, foi escolhido para a sede ideal de uma escola desse gênero. No Rio já funcionava a Escola Brasileira de Administração Pública e, em São Paulo, o Governo e o povo acolheram e têm apoiado a nossa EAESP, de que tanto nos orgulhamos, como um grande centro de excelência, pela qualidade do ensino, pela competência do professorado, pelo largo renome adquirido no país e no estrangeiro. Devemos reconhecer que para isso concorreram principalmente dois fatores; o aperfeiçoamento dos seus professores no estrangeiro (particularmente nos EVA) e a excelente colaboração do Governo americano, que manteve uma grande e ótima equipe de professores durante longos anos em nossa Escola. A EAESP, evidentemente, muito lucrou com essas duas medidas. Como não somos ingratos com aqueles que nos ajudam, fizemos questão de testemunhar nossa gratidão, publicamente, colocando na entrada do edifício da Escola o busto do Presidente Kennedy. Foi ele quem concebeu e executou o Plano da Aliança para o Progresso, do qual muito se beneficiaram a Fundação Getúlio Vargas e outras instituições culturais dos países latino-americanos.

5. RAE - Como se coloca hoje a sobrevivência da Escola de Administração de Empresas de São Paulo, nos níveis de excelência que sempre a caracterizaram, e quais as condições necessárias para um aprimoramento num futuro próximo?

LSL - A sobrevivência da EAESP posso dizer que está assegurada, pelo renome que adquiriu, pelo grande número de seus ex-alunos que ocupam funções de relevo na vida pública e empresarial de São Paulo, pela boa gestão dos seus dirigentes e porque, até do ponto de vista financeiro, pode considerar-se uma Escola auto-suficiente. Aprimorá-la é dever de todos nós: dirigentes da FGV e da Escola; dos membros do seu Conselho da Administração; dos seus professores, alunos e ex-alunos; dos empresários, que te beneficiam do concurso da notável equipe de administradoras que ela constituiu em São Paulo. Não faltarão, estou certo, forças positivas que hão de aprimorá-la cada vez mais.

6. RAE - A biografia do Sr, praticamente se confunde com a história da Fundação Getúlio Vargas, Como o Sr, se sente em relação a isso?

LSL - Quando nasceu a Fundação Getúlio Vargas eu já tinha uma longa vida de trabalho em outros setores, também absorventes. A imensa tarefa concluída, até hoje, pela Fundação não é obra minha, mas sim do conjunto de pessoas altamente dedicadas à causa pública que consegui reunir para organizá-la, conduzi-la e aperfeiçoá-la.

De fato, grande porte da minha vida tem sido dedicada a este empreendimento. Entre concebê-la, instituí-la, vencer as inúmeras dificuldades que se antepuseram ao nosso projeto, passaram mais de 40 anos. Mas a Fundação está de pé; Deus me permitiu realizar este sonho magnífico; se muito lutei por esta Casa e nesta Casa envelheci, tenho tido, também, grandes satisfações pessoais por todas as nossas realizações, como a EAESP, por exemplo.

Espero que Deus me dê forças para continuar a ver a Fundação Getúlio Vargas em franco progresso, pois muito há que fazer ainda. Como seu presidente ou simples soldado desta cruzada, quero servi-la até o fim dos meus dias.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Jun 2013
  • Data do Fascículo
    Set 1984
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