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Avaliação de alternativas na tomada de decisão

COMENTÁRIOS

Avaliação de alternativas na tomada de decisão

Rogério A. Machado

Professor na Escola de Administração de Empresas da Bahia; mestrando em Management, Classe de 1976, na Sloan School of Management do Massachusetts Institute of Technology (MIT)

1. INTRODUÇÃO

Tomar decisões é a própria essência da administração e é o encargo mais característico das atividades de um executivo. Decisões são tomadas para resolver problemas. Um problema de decisão existe quando:

a) um ou mais objetivos precisam ser alcançados;

b) existem várias alternativas que podem ser seguidas;

c) existe incerteza sobre qual alternativa irá otimizar os objetivos estabelecidos.

De outra forma não há decisão envolvida.

Este artigo introduz sumariamente a metodologia desenvolvida pela moderna teoria da decisão. Um caso é apresentado, sua matriz de retornos é construída e através do critério de decisão bayesiano uma alternativa é selecionada. Posteriormente, uma análise de sensitívidade é desenvolvida para o problema.

2. A ABORDAGEM DA TEORIA DA DECISÃO

O objetivo da análise de decisão é: a) decompor sistematicamente o problema em suas partes constituintes; b) quantificar as incertezas e conseqüências associadas aos vários elementos do problema; c) avaliar, separadamente, de maneira lógica e consistente, as implicações de cada conjunto de fatores.

Os elementos constituintes de um problema de decisão podem ser convenientemente apresentados na matriz de retornos. Na preparação da matriz de retornos de um problema o administrador deve ser capaz de identificar:

a) as alternativas (ou cursos de ação ou decisões) disponíveis. Alternativas são seqüências de comportamento mutuamente exclusivas, tais como: construção de um novo armazém ou aluguel de um armazém;

b) os estados da natureza relevantes ao problema. Ao enfrentar um problema de decisão, o administrador deve utilizar a informação disponível para selecionar uma alternativa dentre as várias relacionadas. O administrador, ao fazer esta escolha, deve levar em consideração não apenas os fatores sob seu controle mas, concomitantemente, avaliar aqueles sobre os quais não exerce qualquer controle. Os diversos conjuntos possíveis de fatores incontroláveis, tais como perspectivas econômicas ou situação financeira dos clientes, são referidos por estados da natureza;

c) os resultados esperados. Um resultado é definido em função da alternativa escolhida pelo administrador e do estado da natureza no momento em que a decisão se torna operacional e existe um resultado associado a cada par alternativaestado da natureza. Estes resultados devem medir o(s) objetivo(s) que se deseja alcançar e, na maioria dos problemas empresariais, são valores monetários, tais como: custos ou lucros.

3. CASO AGROPEC - UM PROBLEMA DE DECISÃO MERCADOLÓGICA

Consideremos, para efeito de ilustração, a situação simplificada, porém realista, confrontada pelos executivos da Agropec, Comércio & Indústria S.A., empresa que monta e comercializa equipamentos agrícolas no sul da Bahia.1 1 Nome e empresa fictícios.

A empresa está planejando o lançamento de um novo modelo de pulverizador para a próxima safra de cacau. A firma deseja manter sua política tradicional de adquirir partes componentes sob contrato aos seus fornecedores e fazer a montagem final do produto. Desta maneira, terá que fazer um pequeno investimento de Cr$ 500.000,00 em equipamento e pessoal e terá um custo total variável de Cr$ 3.000,00 por unidade produzida. O preço de venda unitário ficou definido em Cr$ 5.000,00. O ponto de equilíbrio (break-even point) pode ser rapidamente determinado como segue:2 2 Valores monetários passam a ser referidos em Cr$ 1.000,00.

Custos: C = 500 + 3.Qe

Vendas: V = 5.Qe

e, para C = V, temos Qe = 250 unidades.

Desde que seja possível produzir e vender uma quantidade Q > Qe, a Agropec terá lucro sempre e cada vez maior, à medida que Q aumentar.

Na realidade as coisas não funcionam bem assim. Os executivos da Agropec estimam que se o produto tiver boa aceitação (e isto deve ser definido cuidadosamente) poderão vender cerca de 1.000 unidades do novo pulverizador. Caso contrário, ou seja, se não houver boa aceitação no mercado, deverão vender cerca de 600 unidades apenas.3 3 O problema, apesar de discreto, envolve na realidade o uso de conceitos meis avançados como análise incremental.

Por motivos técnicos e contratuais, a Agropec deve decidir entre produzir 500, 750 ou 1.000 unidades e as unidades que não forem vendidas serão consideradas como perda de investimento.4 4 Situações semelhantes são encontradas nas decisões que envolvem número de cópias de um jornal, compra de produtos perecíveis ou de temporada, etc.

4. ANÁLISE DO PROBLEMA

As condições de aceitação do produto pelo mercado representam os relevantes estados da natureza, e as quantidades que podem ser produzidas as alternativas disponíveis. Estas decisões e estados da natureza pertinentes ao problema da Agropec podem ser esquematicamente representados em um diagrama conhecido como arvore de decisão. Em uma árvore de decisão são apresentadas as diversas seqüências de decisões e eventos de modo a permitir uma visualização rápida dos resultados possíveis.5 5 O leitor interessado em árvores de decisão deve consultar o artigo, que é um clássico no assunto, Magee, John F. Arvores de decisões para tomada de decisões, Harvard Business Review, July/Aug. 1964 e recentemente traduzido para o português pela Editora Expansão, São Paulo.

Os resultados esperados (ou valores terminais) foram calculados levando em consideração o número de unidades produzidas e o número de unidades que se espera vender na ocorrência de cada um dos estados da natureza relacionados.

VTij= valor terminal esperado dado que se escolheu a i-gésima decisão e ocorreu o j-gésimo estado da natureza;

VTij= -Custos + Vendas = -(500 + 3.Qi) + + 5.Qj

onde:

Qj = demanda esperada na ocorrência do estado da natureza θj;

Qj = produção contratada na escolha da decisão dj.

Desta maneira temos, por exemplo,

VT11 = -(500 +3 x 1.000)+ 5 x 1.000= 1.500

e os demais valores são calculados de maneira análoga. Podemos, então, construir a matriz de retornos para o problema da Agropec conforme apresentada na figura 2.


Podemos observar que se houver boa aceitação e, conseqüentemente, vendas altas, a decisão d1 produzirá o mais alto retorno possível neste mercado. Se a aceitação for pequena, contudo, d1 irá resultar em perdas líquidas da ordem de Cr$ 500.000,00, devido aos compromissos assumidos para aquisição de componentes. A decisão d2produz um bom resultado no caso de vendas altas e um pequeno retorno no caso de vendas baixas. Observamos, ainda, que d3, por produzir uma quantidade inferior às demandas esperadas, resultará num lucro razoável através da venda total da produção da Agropec na ocorrência de qualquer dos estados da natureza.

Notemos que, mesmo na falta desta estruturação formal do problema, qualquer executivo prudente, confrontado com este problema de decisão, teria que considerar todos estes mesmos elementos, isto é, custos, chances de sucesso e retornos prováveis.

Não existem regras rígidas que estabeleçam de maneira única a decisão a ser tomada pelo executivo. O leitor certamente conhece o modelo de decisão adotado pela maioria dos especuladores da bolsa de ações: "comprar na baixa e vender na alta". Um modelo de decisão representa uma abstração de como a pessoa deve agir quando aceita as suposições do modelo como intuitivamente atraentes. Não se está afirmando que ela realmente age assim ou que o modelo é utilizado sempre.

Cientistas do comportamento, interessados na teoria da decisão, desenvolveram diversos modelos ou critérios de decisão. A seguir, apresentamos alguns dos critérios mais freqüentemente discutidos.

O critério maximin - é um dos critérios mais conservadores. Utilizando este critério, o administrador assume que o pior resultado acontecerá independentemente da decisão escolhida. Desta forma, deverá selecionar a alternativa que resultará no máximo lucro dentre os mínimos esperados. Com esta visão pessimista do mercado, os executivos da Agropec deveriam escolher a alternativa d3.

O critério maximax - é uma outra regra de decisão que a companhia pode seguir e que se encontra diretamente oposta em relação ao critério maximin. Neste caso, a companhia aceita que o melhor dos resultados deverá acontecer e se prepara para esta situação favorável. Com esta visão otimista do mercado, os executivos da Agropec deveriam escolher a alternativa d1.

O critério bayesiano - Os critérios anteriores pressupunham ignorância total acerca das possibilidades de ocorrência dos estados da natureza relacionados no problema. Na prática, no entanto, raramente o administrador não dispõe de informação que permita avaliar estas possibilidades. O critério bayesiano utiliza ao máximo as informações disponíveis; leva em consideração todos os resultados possíveis associados a cada decisão e pondera estes resultados com a melhor estimativa das suas possibilidades de ocorrência. Desta forma, o critério bayesiano apresenta nítidas vantagens sobre os demais por ser o mais racional.

Para utilizar o critério bayesiano, também conhecido como critério do valor esperado, o administrador deve ser capaz de definir pesos que incorporem seus sentimentos quanto às possibilidades de ocorrência de cada estado da natureza.

Os executivos da Agropec poderiam imaginar uma caixa com 10 bolas. Em algumas destas bolas está escrito "vendas altas" e, nas restantes, "vendas baixas". Podemos ainda imaginar que os executivos da Agropec "apostariam" em "vendas altas" se acreditassem haver mais bolas com tal inscrição.

O fato de "apostar" em alguma coisa indica nossa confiança nas chances do fato acontecer. Porém, precisamos de uma medida para esta confiança e poderíamos perguntar aos executivos do nosso problema: "Quantas bolas vocês acreditam que estão com o título "vendas altas"? A resposta poderia ser 7!

Ou seja, eles acreditam que "vendas altas" deve ocorrer com cerca de duas vezes mais chances que "vendas baixas". Traduzindo estes resultados em termos de probabilidades, podemos dizer que os executivos da Agropec acreditam que θ1, tem probabilidade igual a 0,7 e θ2 igual a 0,3.

De maneira geral, a soma das probabilidades de eventos mutuamente exclusivos é igual à unidade. Simbolicamente:

P(θ1) = 0,7;

P(θ2) = 0,3 e,

P(θ1) + P(θ2) = 1;

A idéia de numericamente estimar as chances de ocorrência (probabilidade) de eventos incertos deixa o administrador em situação um pouco desconfortável. Porém, o administrador deve ter alguma base racional para estimar os riscos associados com cada uma das alternativas que ele porventura decida tomar.

A idéia de "apostar no futuro" e tentar imaginar uma caixa com bolas que representam possíveis estados da natureza relevantes ao problema torna, geralmente, esta tarefa mais fácil.

Finalmente, o critério bayesiano estabelece que a melhor alternativa a ser seguida é aquela que produz o mais alto retorno esperado.

O retorno ou valor esperado de uma alternativa é a média ponderada dos resultados esperados, dado que aquela alternativa foi escolhida. Os pesos utilizados são as probabilidades de ocorrência dos diversos estados da natureza. Usando VTijcomo resultado esperado (ou valor terminal) da i-gésima decisão dado o j-ésimo estado da natureza, P(θj) como a probabilidade de θj, o valor esperado E(di) da i-gésima decisão pode ser calculado como:

E(di) = VTij P(θj)

De posse das estimativas das probabilidades P(θ1) e P(θ2) e dos valores terminais apresentados na matriz de retornos da figura 2, substituindo na expressão anterior, temos:

E (d1) = 1 500 (0,7) + (- 500) (0,3) = 900

E (d2) = 1 000 (0,7) + 250 (0,3) = 775

E (d3) = 500 (0,7) + 500 (0,3) = 500

Se os executivos da Agropec aceitam as suposições definidas no critério bayesiano de decisão, a alternativa d1 deve ser escolhida por apresentar o maior retorno esperado.

Existem, ainda, na realidade, diversos outros modelos que propõem explicar a maneira como certas pessoas decidem. Para situações como esta, no entanto, o critério bayesiano é considerado p mais adequado. Evidentemente, voltamos a lembrar que, como qualquer modelo de decisão, o modelo bayesiano pode não ser seguido em determinadas circunstâncias, mesmo por administradores que aceitam totalmente as condições do mesmo. Suponhamos que os executivos da Agropec, apesar de bastante otimistas quanto ao sucesso do novo pulverizador, não estivessem em condições de assumir qualquer prejuízo. Nestas condições, a decisão d1 não poderia mais ser considerada a melhor. Uma vez que não existe qualquer garantia de que a decisão escolhida irá produzir o retorno esperado, este valor deve ser utilizado apenas como uma medida útil na comparação das diversas alternativas. O leitor deve concordar que se esta nossa suposição fosse verdadeira e a confiança dos executivos da Agropec mantida, a melhor decisão seria então d2.

Em suma, para aplicação do critério bayesiano, quando não há oportunidade de coletar informações adicionais, o administrador deve:

a) preparar a matriz de retornos do problema com: as alternativas disponíveis; os estados da natureza relevantes; os resultados esperados;

b) estabelecer pesos numéricos (probabilidades) para as ocorrências dos estados da natureza relacionados;

c) calcular os valores esperados;

d) escolher a alternativa possível que apresentar o valor esperado ótimo.

5. ANÁLISE DE SENSITIVIDADE

Devemos observar que a alternativa a ser seguida depende das probabilidades estabelecidas para os estados da natureza. Se variamos a distribuição de probabilidades, se nossa confiança varia com relação a alguma das ocorrências possíveis, outro curso de ação pode vir a ser o mais recomendado.

Podemos substituir nas expressões dos valores esperados das diversas alternativas a probabilidade de θ2 (vendas baixas) por: 1 - P(θ1), uma vez que:

P(θ1) - P(θ2) = 1,

e temos:

E (d1) = 1 500. P(θ1) - 500. (1 - P (θ1)) = 2 000. P(θ1) - 500

E (d2) = 1 000. P(θ1) + 250. (1 - P (θ1)) = 750. P(θ1) + 250

E (d3) = 500. P(θ1) + 500. (1 - P (θ1)) = 500

Estas equações estão graficamente representadas na figura 5.


Os executivos da Agropec podem não estar muito seguros acerca do valor a ser dado a P (θ1). Esta dificuldade é comum e natural no estabelecimento de probabilidades a priori.

Para que valores de P (θ1), poderiam perguntar, a decisão d1 pode ainda ser considerada a melhor?

Na figura 5 está evidenciado que, dependendo do valor dado a P (θ1), qualquer das alternativas pode apresentar o maior retorno esperado.

Podemos obter, a partir das equações anteriores, os valores críticos de P (θ1) nos pontos A e B fazendo:

E (d1) = E (d2)

2 000. P (θ1) -500 = 750. P (θ1)

P (θ1) = 0.60 (ponto B); e,

E (d2) = E (d3)

750. P (θ1) + 250 = 500

P (θ1) = 0,33 (ponto A)

Os executivos da Agropec dispõem agora de faixas dentro das quais determinada decisão produzirá um maior retorno esperado. Podem estabelecer, para o problema em questão, o seguinte critério de decisão que responde à pergunta feita acima:

selecionar d1 se: P (θ1) > 0,60

selecionar d2 se: 0,33 > P (θ1) > 0,60

selecionar d3 se: P (θ1) < 0,33

6. CONCLUSÃO

A teoria da decisão representa uma tentativa de ampliar o alcance dos procedimentos estatísticos tradicionais. Incorpora à análise do problema resultados ou valores que representam medidas do(s) objetivo(s) que se deseja alcançar. Além do mais, leva em consideração todos os fatos relevantes disponíveis sobre um parâmetro populacional e, explicitamente, provê a inclusão de julgamentos pessoais (probabilidades subjetivas) acerca das chances de ocorrência de eventos aleatórios fora do controle do administrador.

Desta forma, a teoria da decisão associa a critérios objetivos para tomada de decisão a flexibilidade de julgamentos subjetivos e outras informações não-experi menta is na definição e análise das chances de ocorrência de eventos incertos.

BIBLIOGRAFIA

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  • Schlaifer, R. O. Analysis of decisions under uncertainty McGraw-Hill, 1967.
  • 1
    Nome e empresa fictícios.
  • 2
    Valores monetários passam a ser referidos em Cr$ 1.000,00.
  • 3
    O problema, apesar de discreto, envolve na realidade o uso de conceitos meis avançados como análise incremental.
  • 4
    Situações semelhantes são encontradas nas decisões que envolvem número de cópias de um jornal, compra de produtos perecíveis ou de temporada, etc.
  • 5
    O leitor interessado em árvores de decisão deve consultar o artigo, que é um clássico no assunto, Magee, John F. Arvores de decisões para tomada de decisões, Harvard Business Review, July/Aug. 1964 e recentemente traduzido para o português pela Editora Expansão, São Paulo.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Ago 2013
    • Data do Fascículo
      Abr 1976
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