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Perspectivas de emprego nos próximos anos

NOTAS E COMENTÁRIOS

Perspectivas de emprego nos próximos anos* * Palestra proferida pelo Dr. Jan Wiegerinck durante o III Congresso Paulista de Administração de Pessoal (Copap), no Centro Empresarial de São Paulo, no dia 2 de dezembro de 1982.

Jan Wiegerinck

Formado em direito pela Universidade de Nimega (Holanda) e pós-graduado em Administração de empresas pela EASP/FGV; presidente da Gelre Trabalho Temporário S.A. e da Associação Profissional das Empresas de Prestação de Serviços Temporários do Estado de São Paulo (Assertem); vice-presidente da Confederação Internacional das Associações de Empresas de Trabalho Temporário (CIETT), com sede em Bruxelas

Uma pesquisa realizada recentemente por uma agência de publicidade mostrou que a população de São Paulo tem três medos principais: o desemprego, a inflação e a criminalidade. Alguns afirmam que o medo do desemprego é maior do que sua real dimensão. Mas o fato é que o número de pessoas de nossa população economicamente ativa aumenta em torno de 1,5 milhão por ano. Quanto ao número de postos de trabalho abertos pela economia como um todo, não sabemos quantos são, mas sabemos, pelos dados disponíveis, que são menos do que o desejado. Daí nosso problema.

Yona Friedman, um arquiteto francês, afirma num relatório para a UNESCO que os pobres deste mundo não desejam necessariamente empregos, mas alimentação e um teto. Embora o objetivo do emprego seja ganhar a vida, prover as necessidades, muitos atendem a estas necessidades sem emprego. Mas o emprego, isto é, o trabalho assalariado, é a forma dominante de atividade econômica.

Alvin Toffler, no seu livro A Terceira onda, prevê que a humanidade e, em todo o caso, a sociedade americana pós-industrial está caminhando para uma época em que muito trabalho economicamente significativo será realizado pelo próprio consumidor do bem ou serviço produzido. Ele é de opinião que de certa maneira a sociedade voltará, em parte, a um tipo de organização em que cada um produzirá o que ele próprio usará. Portanto, o próprio produtor será também consumidor. Ele chama isto de prosumer - uma espécie de homem auto-suficiente. É, de certa maneira, uma velha utopia.

Mas, independentemente disso, parece-me que nós vivemos um período em que cada vez mais pessoas procuram ser empregadas. Recentemente participei de uma reunião onde uma senhora, dirigente de uma empresa familiar do ramo têxtil, se queixava porque o filho, que terminara recentemente um curso de administração de empresas, saíra da escola com o que ela chamava de mentalidade de empregado. O filho não estava em condições nem desejava participar da direção da empresa familiar. Parece-me que o que surpreendia esta senhora é um fenômeno normal. As escolas não podem formar empresários, escolas não existem para isto. Elas podem transmitir conhecimentos para se exercer uma profissão adequadamente, mas exercê-la dentro do contexto de uma empresa como assalariado, como parte de uma equipe.

Por outro lado, o relacionamento dos homens entre si no trabalho está sempre em lenta mas constante evolução. E também a maneira de o homem honrar o seu trabalho e o produto do seu trabalho. Alguns séculos atrás, a pessoa que desejava ter um par de sapatos ia a um sapateiro, que lhe tirava as medidas e fazia os sapatos. Havia um relacionamento direto entre estas duas pessoas. E havia um relacionamento muito íntimo entre o sapateiro e o sapato que ele produzia. Hoje, quem deseja comprar um par de sapatos vai a uma loja, fala com o vendedor que é empregado da loja. Este lhe vende um par de sapatos fabricado provavelmente numa outra cidade por empregados de uma fábrica e transportados até a cidade, armazenados, faturados, embalados por pessoas trabalhando em empresas diferentes. Para não falar nos empregados das fábricas de caixas de embalagens, nos empregados da agência de propaganda cujo anúncio despertou sua atenção etc. Não há mais um relacionamento pessoal entre os muitos elos na corrente da produção, nem o relacionamento dos empregados das diversas fases de produção com o produto do seu trabalho. Este fenômeno já não se restringe mais ao trabalho de linha de produção, mas está acontecendo até com profissionais como médicos, advogados etc. O cliente é atendido pelo médico, advogado ou juiz de plantão, que prefere ser empregado de uma organização ou do Estado e esquecer-se deles fora do seu "horário de trabalho".

1. A EVOLUÇÃO DA FORÇA DE TRABALHO

Como já mencionei, o nosso problema resulta da não coincidência entre o número de pessoas que procuram empregos e o número de empregos oferecidos. No entanto, alguns fatores contribuem para tornar essa relação desigual, na medida em que significam maior demanda de empregos. Os principais fatores que determinam um aumento na procura de empregos são:

1. Evolução demográfica Em 1940, a população economicamente ativa era de 14.700 mil; em 1980, esta havia crescido para 43.790 mil. Um estudo americano prevê um crescimento da população economicamente ativa nos últimos 20 anos deste século de: 10% nos países da Organização de Cooperação para o Desenvolvimento Econômico; 14% na Europa Oriental; 55% na Ásia; 80% na América Latina e África.

Por seu lado, o Banco Mundial, em relatório de 1979, prevê que o número de pessoas em idade de trabalhar nos países menos desenvolvidos, que em 1979 estava em 800 milhões, no ano 2000 alcançará o número de 1,3 bilhão. Portanto, um aumento de 500 milhões, ou 38%, em 20 anos.

2. Deslocamento para a área urbana. Em 1940, um terço da população brasileira trabalhava na área urbana e dois terços no campo. Em 1980, ocorria o inverso, dois terços na área urbana e um terço na zona rural. Podemos ter certeza de que esta tendência não se esgotou, pois em sociedades mais avançadas a população urbana já chegou a ultrapassar os 80% da população total. Portanto, é na área urbana que crescerá mais a procura de empregos.

3. Crescimento da participação feminina na força de trabalho. Segundo dados da FIBGE, a população feminina no Brasil se desenvolveu da maneira como se observa no quadro 1.


Este quadro nos mostra que, enquanto a população feminina neste período praticamente triplicou, o número de mulheres que trabalham fora aumentou em 380%. Isto quer dizer que, se em 1950, de cada 100 mulheres 12,S trabalhavam fora, em 1980 estas aumentaram para 20 em cada 100.

Esta evolução se verifica em escala mundial. Em 1950, 37% das mulheres americanas trabalhavam fora. Em 1978, esta percentagem havia aumentado para 57%. Na Espanha, neste mesmo período, estas cifras evoluíram de 17% para 33%. Portanto, nós, com 20% em 1980, podemos prever que persistirá a mesma tendência de evolução que tivemos nos últimos 30 anos.

Alguns acreditam que o aumento da participação feminina na força de trabalho se dá porque as mulheres são menos promovidas e menos bem remuneradas. Mas, se fosse esta a causa, elas já teriam "conquistado" os postos de trabalho há muito tempo. É somente agora que estamos assistindo, simultaneamente, a um aumento do trabalho assalariado da mulher e a uma luta pela equiparação de suas condições de trabalho.

Por outro lado, algumas tendências que se verificam há algum tempo permitem fazer algumas previsões sobre as características que apresentará a força de trabalho no futuro. Vejamos algumas delas.

1.1 Maior nível de instrução da força de trabalho

Em 1900, só 34% da população brasileira com mais de 15 anos era alfabetizada. Em 1944, esta percentagem havia aumentado somente para 44%. Mas, 36 anos mais tarde, em 1980, estava em 74%. Se, portanto, hoje, a força de trabalho está bem mais instruída do que meio século atrás, a tendência continua sendo a de melhora.

A mesma tendência se reflete no número de pessoas que completaram o curso superior. Em 1972, 86.470 pessoas concluíram o curso superior. Em 1979, este número havia aumentado para 222.896. Um aumento de 131%. Muitos são de opinião de que o nível de ensino superior baixou. É possível, mas isto não impede que as cifras sejam impressionantes e este envolvimento com estudos superiores terá, certamente, um reflexo positivo.

1.2 Idade dos que procurarão trabalho

Aqui devemos contar com várias evoluções paralelas.

Primeiro, parece que a tendência é e continuará sendo no sentido de que cada vez menos os menores de idade trabalhem, em parte porque a legislação evolui para uma maior limitação do trabalho deste contingente, mas também pela maior procura de instrução escolar. Mas não é seguro que estas circunstâncias não sejam, em parte, neutralizadas por outras, pois com o aumento das possibilidades de estudar à noite e em cursos de duração reduzida, os jovens têm mais oportunidade de misturar trabalho com estudo. Além disso, a mecanização e a automatização permitem que o trabalho se torne mais leve, podendo ser executado por pessoas mais jovens, sem os inconvenientes que estavam ligados ao trabalho infantil no início da industrialização. Aliás, neste aspecto, Toffler, no seu já mencionado livro, afirma que a proibição do trabalho infantil está evoluindo de uma proteção do menor para uma reserva de mercado para os maiores. Talvez o que está contecendo no processamento de dados, onde muitas atividades de programação são executadas com muita habilidade por pessoas extremamente jovens, como tenho lido em revistas americanas, é um indício de que a opinião de Toffler, neste ponto, não é de todo infundada.

Por outro lado, na faixa etária mais alta, há, sem dúvida, a expectativa de uma vida mais longa. Portanto, muitos poderão trabalhar mais anos. Mas também há a tendência de uma aposentadoria mais cedo para dar lugar aos mais jovens. Como isto evoluirá ainda é difícil de se prever, já que, se de um lado a aposentadoria antecipada deixa um posto de trabalho aberto para uma pessoa mais jovem, também é fato que os que trabalham devem pagar a aposentadoria dos que deixaram de trabalhar. E, com a expectativa de vida mais longa, isto poderá vir a ser um ônus muito pesado para a sociedade como um todo. É o que já está acontecendo em vários países.

1.3 Maior proporção de trabalhadores que não são pais de família

Quando falamos da pessoa que trabalha, a imagem que temos em mente é normalmente a do homem adulto, casado e com filhos menores, dependentes. Esta imagem provavelmente era valida no tempo de nossos avós e pais. Hoje ela não mais corresponde à realidade. Tive recentemente contato com uma indústria de cimento estabelecida em Minas Gerais, que me parece ser, do ponto de vista da força de trabalho, uma empresa típica. Nela trabalhavam naquele momento 716 pessoas, sendo 82 no escritório, 61 nas filiais e os restantes 573 na produção.

Destas pessoas, 675 são homens e 41 mulheres. Dos homens, 277 são casados e, portanto, 398 solteiros. Do total dos trabalhadores (716) só 277, ou 39%, correspondem ao modelo clássico do trabalhador: 61% não são os homens adultos casados com filhos menores. Este dado é importante porque as necessidades a serem atendidas pelo trabalho de um homem jovem solteiro, de uma mulher solteira, de uma mulher casada, de um homem (ou mulher) viúvo(a) ou divorciado(a) são diferentes da de um homem casado com filhos menores.

1.4 Maior procura de trabalho para horários limitados

Pela evolução dos costumes e pela diversidade de situações sociais das pessoas, muito maior número do que no passado .procurará trabalhar em tempo reduzido ou por alguns meses por ano, principalmente estudantes, aposentados, mulheres casadas, pessoas temporariamente desempregadas.

1.5 Maior mobilidade da força de trabalho

Esta mobilidade é tanto geográfica como profissional. Geográfica porque o candidato, graças aos modernos meios de transporte, irá concorrer a empregos numa área muito maior. Mas é também profissional. Para evidenciar esta mobilidade profissional, cito dois dados interessantes. Entre 1945 e 1960, nos EUA, 130 milhões de pessoas mudaram de profissão, ou seja, uma média de 8,5 milhões por ano. Na Alemanha, no ano de 1964, 50% dos trabalhadores estavam trabalhando numa profissão diferente daquela para qual se tinham preparado inicialmente. Em termos de Brasil, seria interessante saber quantas pessoas que se formaram em medicina, direito ou engenharia, para só citar três profissões universitárias, realmente as exercem.

Mas a maior mobilidade geográfica que citei será, provavelmente, neutralizada em parte pela maior imobilização imposta pelas legislações. As legislações têm tendência para dificultar as migrações, sobretudo entre países. Os legisladores em geral vêem o conjunto de empregos como uma coisa estática: uma certa quantidade de trabalho que deve ser feito e que querem reservar para os grupos de pressão a que estão sujeitos.

Entre os anos de 1821 e 1915, 44 milhões de pessoas migraram da Europa para as Américas. Este tipo de migração parece ter acabado definitivamente. Mas a II Guerra Mundial e suas conseqüências provocaram também deslocamentos substanciais de populações.

Assim, em 1979, havia 14 milhões de trabalhadores migrantes no mundo. Nestes se incluem os coreanos que trabalham na Arábia, os mexicanos nos EUA e muitos milhões de turcos, argelinos, portugueses etc, que trabalham nos países europeus. Contrariamente à situação dos que emigraram antes da II Guerra Mundial, a maioria destes trabalhadores migrantes não terão o direito de ficar permanentemente nos países onde encontraram trabalho.

2. A OFERTA DE EMPREGOS

Qual é a provável evolução da oferta de empregos? É perigoso falar de perspectiva de emprego. Um dos pontos em que concordo com Galbraith é quando ele diz que é sempre arriscado fazer previsões.

A questão é que a oferta de empregos também está sujeita a uma série de influências, aparentemente contraditórias entre si. Tomemos como exemplo o telefone. Uma central telefônica instalada numa empresa hoje é bem mais simples por fora e mais complexa por dentro do que a mesa telefônica de 20 anos atrás. Uma mesma telefonista pode atender a um maior número de chamadas. Mas o próprio aparelho é muito mais complexo .-para sua fabricação foram necessárias muito mais horas de trabalho de profissionais, e sua manutenção pede mais trabalho e cuidados de profissionais.

Assim, se a organização racional das tarefas faz com que trabalhos antes feitos por profissionais altamente qualificados possam ser feitos no futuro por pessoal menos qualificado, e a automação torna o trabalho mais mecânico, facilitando a substituição do trabalho humano pela máquina, por sua vez a tecnologia mais avançada necessita, no entanto, de técnicos e cientistas para manter e desenvolver esta tecnologia e para operar com os aparelhos.

Há, no entanto, algumas nítidas tendências que indicam alterações, a longo prazo, na oferta de empregos e que vale a pena analisar melhor.

Enquanto algumas atividades demonstram clara tendência para redução do número de empregos, outras apontam perspectivas de crescimento no futuro. Entre as atividades que apresentam um quadro de estagnação ou de declínio, do ponto de vista do número de empregos, a indústria automobilística é um exemplo. Calcula-se que atualmente, no mundo inteiro, 4 milhões de pessoas trabalham na indústria automobilítica e mais de 6 milhões na indústria de autopeças. Além disso, há 25 milhões de pessoas que trabalham em serviços relacionados com a indústria automobilística - postos de gasolina, oficinas mecânicas, motoristas etc. No entanto, há indícios de que a indústria automobilística esteja em vias de estagnação.

No momento, nos EUA, há um carro para cada dois habitantes. Na Europa Ocidental, um para cada três. Há, portanto, nestes maiores mercados, um quadro de saturação. O número total de carros no mundo não deverá aumentar rapidamente daqui para a frente, apesar de outros mercados estarem longe deste ponto de saturação.

Além desta relativa saturação, há mais dois motivos principais para a indústria automobilística, em termos mundiais, não poder absorver mais pessoal:

a) a tendência para se produzirem carros menores e mais leves, que necessitam, portanto, menos trabalho para sua fabricação;

b) o aumento de produtividade resultante da utilização de robôs.

É claro que esta estagnação ou mesmo redução do número de empregos na indústria automobilística não deve atingir muito o Brasil no que se refere ao seu mercado interno, mas, sem dúvida, reduzirá nossas possibilidades de exportação, o que limitará, de certa forma, a possibilidade de crescimento.

Uma segunda indústria onde há uma tendência para redução de empregos é na dos estaleiros. Em 1975, havia 920 mil trabalhadores em estaleiros; já em 1980, este número havia baixado para 825 mil. Esta redução, em termos globais, no entanto, não afetou todos os países na mesma proporção.

Em 1970, 40% destes empregos estavam na Europa Ocidental e 42% no Japão. Em 1980, já reduzido o número de trabalhadores no setor, a Europa só tinha 20% do número de empregos, o Japão 40%, enquanto que Brasil, Coréia do Sul e Formosa juntos haviam conquistado 30% do número de empregos da atividade, ou seja, 247 mil empregos. Apesar dessas disparidades, os profissionais da área prevêem uma queda continuada do número de empregos nesta atividade, em termos gerais.

Uma terceira indústria que mostra ligeira tendência para decréscimo em termos mundiais é a têxtil. Mas esta tendência está acoplada a um deslocamento de empregos, pois o fenômeno da redução de empregos na indústria têxtil está relacionado com um certo estágio de desenvolvimento industrial. Os europeus têm a tendência de acusar a redução de empregos na sua indústria têxtil à concorrência dos países menos desenvolvidos. Isto não corresponde à verdade. Afirma a revista The Economist que entre as duas guerras mundiais o número de empregos na indústria têxtil européia caiu em 290 mil. No entanto, não houve importações do resto do mundo. Durante o mesmo período, Japão e índia duplicaram seus empregos no ramo, sem iniciar exportações. A perspectiva é de queda de empregos nos países atualmente plenamente desenvolvidos, de um crescimento pequeno nos países em desenvolvimento, inclusive o Brasil, e de um crescimento grande na China, índia e África. A indústria têxtil sempre se identificou com baixos níveis salariais.

Se algumas atividades, como as três mencionadas, estão estagnadas ou em declínio do ponto de vista do número de empregos, outras têm boas perspectivas de crescimento. Vejamos algumas.

2.1 Mineração

Segundo dados da OIT, havia no mundo, em 1968, 9,5 milhões de pessoas trabalhando em mineração e, em 1978, 9,7 milhões. Para o período até o ano 2000, a OIT prevê um crescimento de 185 mil empregos por ano em mineração. Isto ocorrerá devido não só a um aumento de demanda de produtos minerais, mas também como resultado de novas exigências de segurança e de preservação do meio ambiente. Tais exigências quanto à segurança e meio ambiente, bem como a automação de muitas explorações, sobretudo nas minas de carvão, farão com que a maioria dos novos empregos sejam para técnicos, e poucos para trabalhadores sem preparação profissional. Além disso, calcula-se um aumento de produtividade no setor da ordem de 3% ao no até 1990, e 1% depois.

2.2 Engenharia

Provavelmente haverá muitas grandes obras de engenharia a serem executadas no mundo nos próximos anos, que serão objeto de concorrências internacionais, nas quais os países com mão-de-obra barata têm melhores chances. Só em 1979, as 200 maiores companhias de engenharia do mundo fecharam contratos de US$ 125 bilhões. Constata-se a tendência para a criação de empregos diretos nesta atividade, pois os países onde as obras são executadas exigem treinamento e contratação de pessoal local.

No Brasil, tivemos durante anos as obras de ltaipu e temos agora o projeto Carajás, para mencionar apenas dois dos maiores projetos que nos tocam de perto. Mas também há grandes obras no exterior sendo executadas por empresas brasileiras.

2.3 Produção de energia

Haverá muita demanda de trabalho em produção de energia. A prospecção e extração de petróleo em lugares cada vez mais trabalhosos implicará não só trabalho no local mas também a construção e manutenção de plataformas etc. Além disto, há as centrais nucleares.

No Brasil, de acordo com a revista Senhor, o Proálcool já é hoje responsável por 400 mil empregos diretos.

2.4 Produção de robôs

A produção de robôs reduzirá os empregos na indústria automobilística propriamente dita, mas estará criando empregos em outras empresas, para sua produção, e implicará novos empregos para sua manutenção. Além disso os robôs não trabalharão só na indústria automobilística, mas provavelmente até nas residências. A evolução que nos trouxeram as máquinas de lavar roupa e louças não terminou. Os americanos Cetran e OToole prevêem que, em 1990, haverá 1,5 milhão de técnicos em robôs e 2,5 milhões de técnicos em laser.

2.5 A indústria eletrônica

Um relatório da Organização de Cooperação para o Desenvolvimento Econômico, de 1979, prevê que este último quarto de século a eletrônica será o pólo em torno do qual as estruturas produtivas de sociedades industriais avançadas estarão organizadas.

A OIT calculou que, entre 1970 e 1978, quando a firma Burroughs fez a transição de produção de equipamentos eletromecânicos para equipamentos totalmente eletrônicos, o seu pessoal de produção caiu de 44% para 31% do total de seus empregados. Outras empresas do ramo tiveram evolução similar. Mesmo assim, a indústria eletrônica criou grande demanda de programadores e engenheiros eletrônicos. Alguns estudos indicam que neste momento há falta de 50 mil programadores nos EUA.

Um co-inventor do microchip, Bob Noyce, afirma que a invenção da imprensa por Gutemberg era de significação reduzida quando apenas os monges sabiam ler. Só quando a alfabetização aumentou, aumentaram os empregos de impressores e gráficos. Um fenômeno equivalente em relação ao computador estaria se iniciando agora, com todas as condições para a criação de novos empregos no ramo.

2.6 Serviços

Assim como o aumento da produtividade na agricultura foi a causa da liberação de capacidade de trabalho que permitiu a industrialização, o aumento de produtividade na indústria permite que mais pessoas se dediquem a serviços. No entanto, não podemos perder de vista que muitos empregos na área de serviços são, na realidade, um complemento da área industrial. Muitos serviços são assistência a equipamentos fabricados e todo o comércio trabalha com venda da produção do setor primário e secundário.

Mas há ainda um aspecto da área de serviços que me parece merecer atenção. Muitos postos de trabalho de serviços desapareceram. Em abril de 1900, mais da metade dos empregados procurados no New York Times, um jornal de Nova Iorque, era de pessoal de serviço doméstico - arrumadeiras, copeiras, mordomos, cocheiros etc. Hoje, a seção de empregos deste jornal e de muitos outros é muito maior, mas os empregos domésticos praticamente desapareceram. Os netos das pessoas que na época trabalhavam como empregadas domésticas hoje estão trabalhando em serviços de hotéis, restaurantes, lanchonetes, transportes públicos ou como aeromoças, por exemplo. Esse fenômeno é um exemplo de que as mudanças na vida social e as conseqüentes mudanças na organização do trabalho têm como resultado, conforme já observamos no início, a redução ou eliminação do envolvimento pessoal do trabalhador com seu trabalho e com as pessoas atingidas pelo seu trabalho.

No entanto, a noção de que o setor de serviços é o de maior crescimento, apesar de verdadeira, é incompleta. Há profissões na área de serviços cujo número de postos de trabalho diminui, e outras onde aumenta. Cito alguns exemplos mencionados numa pesquisa alemã, que abrange o período de 1967 a 1976. Mas, provavelmente, esta tendência é válida para outras sociedades, e também para a nossa.

É importante ressaltar também que a área de serviços é aquela onde é mais difícil aumentar a produtividade. Num cabeleireiro dificilmente poderá reduzir o tempo necessário para cortar o cabelo. É talvez por isso que certa autoridade há pouco tempo externou a opinião de que os barbeiros, no Rio, eram a causa da inflação.

São inúmeras as áreas de serviços. Menciono algumas:

1. Serviços médicos. Estes crescem regularmente; à medida que melhoram o bem-estar e a renda per capita, o cuidado com a saúde torna-se mais importante e recebe maior atenção.

2. Serviços financeiros. De um lado, há uma demanda cada vez maior para serviços financeiros. De outro, há a tendência de um aumento da automação nestes serviços. Mas podemos prever que haverá grandes evoluções no setor, pois, com o aumento do poder econômico, mais pessoas necessitarão de ajuda na administração de seu patrimônio, suas rendas, embora os serviços mais rotineiros tendam a ser, cada vez mais, executados por computadores. Talvez aqui venha a ocorrer o mesmo tipo de evolução que observamos na mineração: menor necessidade de pessoal sem qualificação prévia e maior necessidade de pessoal altamente qualificado.

O que sabemos é que nos últimos anos, em termos mundiais, o volume do setor financeiro cresceu 8% ao ano e o pessoal empregado aumentou 3%. Em 1979, havia uma agência bancária para cada 10.790 habitantes no Brasil. Se compararmos este número com os números correspondentes no Japão (6.820), nos EUA (6.025), na França (2.785) e na Suíça (1.300), podemos prever, em termos de Brasil, um crescimento do número de empregos no setor financeiro à medida que a população tiver maior renda per capita. Mas serão empregos para pessoal qualificado, que realmente dê assistência ao cliente, e não para a execução de tarefas simplesmente administrativas - este trabalho será feito por máquinas.

3. Turismo. Os serviços de turismo estão principalmente representados por hotéis e transporte. No momento, há 7,5 milhões de quartos de hotel no mundo e todas as grandes cadeias estão-se expandindo. A previsão é de que, em 30 anos, haverá o dobro de quartos. Mas isto não quer dizer que o número de empregos dobrará neste período. Há também aqui uma tendência para se procurarem meios de automatizar o serviço e aumentar a produtivide. A título de comparação: na Ásia, há nos hotéis quase dois empregados para cada quarto; nos EUA, 1,73 quarto para cada empregado. Portanto, com o crescimento do turismo, deve crescer o emprego, mas não na mesma proporção.

4. Lazer. O crescimento da renda per capita, a gradativa redução das horas de trabalho, o melhor estado de saúde, farão com que mais tempo seja dedicado, no futuro, ao lazer, o que implicará a utilização de serviços. O lazer, neste contexto, deve ser entendido em sentido amplo. Em primeiro lugar, o serviço de lazer criará empregos no setor de TV, vídeo-cassete etc. Mas criará também no setor de esportes. A firma Adidas, por exemplo, que se dedica a este ramo de atividade, tinha 2 mil empregados em 1955 e 15 mil em 1981. Já na Inglaterra, em 1970, havia 50 centros esportivos, com uma média de 40 empregados cada. Em 1981, havia 600 centros. Portanto, em 11 anos, 12 vezes mais.

Um fenômeno paralelo ocorre na área de ferramentas para trabalhos caseiros. Consertar seu próprio carro, pintar sua casa, consertar móveis, etc. é cada vez mais uma atividade considerada de lazer. A firma Black and Decker, que produz ferramentas para este fim, tinha, em 1970, 12 mil empregados; e, em 1981, 23 mil. Esta tendência está na linha do que Toffler chama proswner (produtor-consumidor), que já mencionamos antes.

5. Comércio. Os empregos no comércio varejista tendem a aumentar, apesar da introdução do auto-serviço. Hoje, nos EUA, há 12 milhões de trabalhadores nesta atividade e a estimativa é de que até 1990 haverá 15 milhões. Portanto, um crescimento de 25%. Este é um setor que emprega muitas pessoas que procuram trabalhos em horários reduzidos. Na Inglaterra, 30% dos trabalhadores no varejo trabalham meio período. Isto é conseqüência dos longos horários de abertura das lojas e dos nítidos picos no movimento do comércio em certos horários.

6. Governo. Já em 1890, o economista alemão Adolf Wagner afirmava: o crescimento da renda tem como uma de suas conseqüências o crescimento da atividade do Estado e, portanto, do número de funcionários públicos. A história demonstrou que ele tinha razão. E tudo indica que essa evolução não terminou.

O quadro 2 mostra a evolução nos últimos 30 anos em alguns países. A cifra corresponde à percentagem de funcionários públicos em relação ao total da força de trabalho, de acordo com dados das Nações Unidas.


É verdade que estes empregos no governo não são totalmente uma criação de novos empregos mais, em parte dos casos, um deslocamento de serviços da área particular para a governamental, como ocorre nos serviços de ensino, saúde, limpeza pública etc.

Como exemplo desta evolução, posso mencionar que, na Grã-Bretanha, enquanto o número de ministros religiosos caiu de 61 mil em 1961 para 41 mil em 1971, no mesmo período o número de assistentes sociais (funcionários públicos) aumentou em idêntica quantidade.

3. CONCLUSÃO

Em 1895, o Prof. J. A. Holson afirmou que a palavra "desemprego" é, provavelmente, o termo mais ilusório na moderna sociedade industrial. "Desemprego" pode significar muitas coisas, conforme a maneira como é medido.

Há muitas maneiras de medir desemprego e há um número variável de fatores que influem no que se deseja medir. Temos, por exemplo, o fenômeno das mulheres casadas que entram na população economicamente ativa; por outro lado, há o fenômeno dos subempregados, e a própria definição do que é subemprego das faixas etárias abaixo e acima da idade normal para participar da força de trabalho é um ponto de dificuldade.

Mas, apesar de toda a dificuldade de se medir o desemprego, de se conhecer sua verdadeira extensão e, sobretudo, de compará-lo com o desemprego de outros tempos ou outros países, o fenômeno existe e preocupa.

Tradicionalmente, os profissionais aconselham alguns remédios contra os males do desemprego, tais como: seguro desemprego; volta ao campo; redução de salários; redução do horário de trabalho e horas extras; apoio ao setor informal; aumento dos gastos públicos (fontes de trabalho).

Mas, todos estes remédios têm seus efeitos colaterais, e vai depender do gosto de cada sociedade determinar quais os efeitos colaterais que prefere suportar.

Outras medidas que são regularmente adotadas pelas sociedades para combater o desemprego são: resistir à nova tecnologia; proibir a imigração; proibir importações; incentivar exportações; incentivar a emigração de trabalhadores.

No entanto, tais remédios e medidas não atacam as verdadeiras causas do desemprego, somente amenizam-lhe os efeitos. A adoção dessas medidas, embora justificável pelo seu objetivo, não é. suficiente para garantir a solução do problema.

Se quisermos tratar o problema do desemprego por suas causas e não somente por efeitos, há alguns pontos que devem ser considerados:

1. Uma economia dinâmica necessita que a força de trabalho tenha mobilidade suficiente para abandonar atividades que não têm mais possibilidade de crescimento, ou outras onde o progresso tecnológico reduz a necessidade de recursos humanos, para se dedicar a atividades em expansão, mesmo que esta transferência implique dificuldades, como o treinamento. Foi o que aconteceu há algum tempo nas minas de carvão da Holanda, onde dezenas de milhares de pessoas que lá trabalhavam foram retreinadas para outras atividades, principalmente na indústria química.

2. O governo deve prover uma infra-estrutura de serviços públicos que torne possível a implantação de novos empreendimentos. Isto inclui estradas, comunicações, transporte, saneamento etc.

3. Deve-se garantir aos que se preparam para entrar no mercado de empregos a possibilidade de aprender as técnicas necessárias às novas atividades. Isto implica uma constante modernização do ensino público e privado.

4. Deve haver uma boa rede de serviços de intermediação para facilitar a colocação dos que procuram trabalho. Este serviço deve ser público e privado, sem reservas de mercado ou monopólio, e deve abranger tanto a colocação em empregos permanentes como em trabalho temporário, para se ter o maior número de pessoas ocupadas.

5. Não há criação de empregos sem investimento. Portanto, deve ser incentivada a formação de capital novo e a capitalização das empresas. Entre outros recursos, deve ser usado para isto um sistema fiscal adequado.

6. Mas, talvez, o principal objetivo deva ser a criação de um ambiente favorável ao surgimento de novos empresários. Como já observei anteriormente, a esmagadora maioria dos jovens querem ser empregados. Por outro lado, cada vez menos pessoas querem ter empregados. Mas, sem empregadores - empresários - não existem empregos!

Ter empregados, oferecer empregos torna-se cada vez menos interessante, menos atraente. Muitos preferem colocar dinheiro em cadernetas de poupança a assumir os riscos de uma empresa, que incluem os muitos problemas econômicos, fiscais, securitários e outros inerentes, hoje em dia, à contratação de pessoal. Por isso, é necessário que se tomem medidas que, sem colocar em risco direitos adquiridos do trabalhador e sem reduzir a sua proteção como a parte mais fraca no contrato de trabalho, não desinteressem aquele que cria o emprego, a ponto de que ele desista de criar estes empregos de que toda a sociedade tanto necessita.

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    Palestra proferida pelo Dr. Jan Wiegerinck durante o III Congresso Paulista de Administração de Pessoal (Copap), no Centro Empresarial de São Paulo, no dia 2 de dezembro de 1982.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Jun 2013
    • Data do Fascículo
      Jun 1984
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