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Programação linear ou programação matemática (uma exposição não-matemática)

ARTIGOS

Programação linear ou programação matemática (uma exposição não-matemática)

Robert Dorfman

Professor de Economia na Universidade da Califórnia, Berkeley, EUA

"O pressuposto de uniformidade na natureza - a crença na reprodutibilidade dos fenômenos - é básico em todas as ciências." - JAMES B. CONANT

O objetivo dêste artigo é apresentar as idéias fundamentais da programação matemática, despidas de todo o aparato algébrico que, a nosso ver, é o grande responsável pela sua falta de aceitação por parte de um público maior. Conseguiremos nosso intento recorrendo exclusivamente a representações gráficas. Embora não seja possível representar os problemas mais gerais de programação matemática em gráficos bidimensionais, as conclusões obtidas por meio dêstes últimos são válidas para os casos multidimensionais.

A terminologia das técnicas aqui discutidas não se encontra ainda fixada de maneira totalmente feliz. São chamadas freqüentemente de "programação linear", ainda que as relações entre grandezas nem sempre sejam lineares. Há quem as chame de "análise de atividades", mas essa designação nada tem de sugestivo. O traço predominante dessas técnicas é sua aplicação em programação; elas pouco têm de análise; de qualquer maneira, a expressão "análise de atividades" não vingou. Vamos lançar aqui a expressão "programação matemática": quem sabe venha a vingar.

O problema central da Economia é a distribuição dos recursos disponíveis com a finalidade de tornar máxima a consecução do objetivo em vista. A formulação clássica dêsse problema - a chamada "análise marginal" - permitiu chegar a conclusões da maior importância na compreensão de muitas questões social-econômicas. Entretantanto, sabe-se muito bem que a análise marginal não é recomendada aos empresários para a solução prática dos seus problemas. A programação matemática é baseada na reformulação dos problemas empresários econômicos de maneira apropriada à tomada de decisões práticas.

Nossa tese central é que a programação matemática é precisamente a reformulação e a solução do problema básico da Economia. A idéia-estímulo da programação matemática é a de "processo" ou "atividade". Processo é um método especificamente elaborado para desempenhar uma função econômica. Por exemplo, a fabricação de sabão por meio de uma fórmula específica é um processo. Outro exemplo seria a tecelagem de um tipo específico de pano de algodão em determinado tear. A função convencional de produção pode ser encarada como a fórmula matemática que relaciona os consumos e as produções de todos os processos através dos quais determinada tarefa pode ser cumprida.

Para algumas tarefas - manufatura de sabão, por exemplo - há um número infinito de processos viáveis. Para outras - como tecelagem - só existe um número finito de processos. Em certos casos uma fábrica pode dispor de um único processo apenas.

Em têrmos de processos, escolhas na esfera produtiva são simplesmente decisões sobre os processos que devem ser usados e o grau de utilização de cada processo. Os economistas estão habituados a pensar em têrmos de decisão sôbre as quantidades de diversos fatores produtivos a serem usados. Mas, uma emprêsa não pode substituir o fator A pelo fator B sem mudar algo em seus métodos de trabalho, isto é, sem substituir um processo que use A em proporções relativamente altas por outro que use B. Os insumos, portanto, não podem ser mudados sem que se mudem, muitas vêzes radicalmente, os processos de trabalho.

A programação matemática focaliza êsse aspecto da escolha econômica. O objetivo da programação matemática é determinar os níveis ótimos dos processos produtivos em circunstâncias fixadas. Isso requer reformulação das relações produtivas, em têrmos de processos, e reconsideração do efeito das carências de certos fatores sôbre as escolhas feitas. Como preâmbulo dessa discussão teórica, entretanto, será vantajoso considerar, simplificadamente, um problema elementar de produção.

I. EXEMPLO DE PROGRAMAÇÃO MATEMÁTICA

Consideremos o caso fictício de uma fábrica de veículos equipada para a produção de automóveis e caminhões. Essa emprêsa pode executar duas tarefas econômicas e suporemos que ela possui um único processo para executar cada tarefa. Ambas tarefas competem no uso das instalações da emprêsa. Suponhamos que a fábrica esteja dividida em quatro departamentos: (1) estamparia, (2) montagem do motor, (3) montagem final do automóvel e (4) montagem final do caminhão. As matérias-primas, a mão-de-obra e todos os demais componentes são disponíveis na praça em quantidades praticamente ilimitadas e a preços constantes.

A capacidade de cada departamento é limitada. Admitiremos que a estamparia pode produzir peças em número suficiente para 25.000 automóveis ou 35.000 caminhões. Poderemos, então, calcular as diversas combinações de peças estampadas de automóveis e de caminhões que êsse departamento pode produzir. Já que êsse setor pode equipar 25.000 automóveis por mês, cada automóvel requer 1/25.000 ou 0,004% da capacidade mensal. Da mesma forma, cada caminhão requer 0,00286% da capacidade mensal. Se, por exemplo, 15.000 autos fossem fabricados, êles mobilizariam 60% da capacidade da estamparia e os demais 40% dariam peças estampadas para 14.000 caminhões. Então, 15.000 automóveis e 14.000 caminhões poderiam ser produzidos por êsse departamento desde que operasse com capacidade total. Essa combinação não é, obviamente, a única possível de ser produzida pela estamparia a plena capacidade. No GRÁFICO 1 a reta marcada "estamparia" representa todas as combinações possíveis.


Da mesma forma, presumiremos que a seção de montagem dos motores tenha capacidade mensal para 33.333 motores de automóveis ou 16.667 motores de caminhões, ou para combinações dêsses dois tipos de motores. As combinações que absorveriam a capacidade dêsse departamento são representadas pela reta intitulada "montagem de motores" no GRÁFICO 1. Suporemos também que o departamento de montagem de automóveis tenha capacidade para montar 25.000 automóveis por mês e que a capacidade do departamento de montagem de caminhões seja para 15.000 unidades mensais. Essas limitações são também indicadas no GRÁFICO 1.

As hipóteses levantadas definem dois processos: a produção de automóveis e a produção de caminhões. O primeiro requer, para a produção de um automóvel, 0,004% da capacidade de estamparia, 0,003% da capacidade de montagem de motores e 0,00444% da capacidade de montagem de carros. O processo de produção de caminhões requer, para a saída de uma unidade, 0,00286% da capacidade da estamparia, 0,006% da capacidade de montagem de motores e 0,00667% da capacidade de montagem de caminhões.

A escolha que a emprêsa enfrenta é a decisão quanto à quantidade de automóveis e caminhões que deve produzir por mês, com a restrição de não utilizar mais do que 100% da capacidade de qualquer departamento. Ou, para usar a fraseologia técnica, a escolha consiste em decidir qual será o nível de utilização dos processos disponíveis. Obviamente, caso se produzam apenas automóveis, no máximo 22.500 unidade imensais poderãp ser manufaturadas, sendo que a limitação provirá da seção de montagem de carros. Se forem produzidos somente caminhões, o teto será de 15.000 unidades por mês, devido à limitação da seção de montagem de caminhões. Que determinará qual dessas alternativas ou que combinação dessas alternativas deverá ser adotada? Será o lucro que se obtém através da fabricação de veículos de passageiros e de carga.

Imaginemos que o preço de um carro seja US$ 300 maior do que o custo total dos materiais comprados, mão-de-obra e outros custos diretos de fabricação; e que o valor de venda de um caminhão ultrapasse em US$ 250 o seu custo fabril direto. A margem bruta da fábrica será, pois, igual a 300 vêzes o número de carros produzidos mais 250 vêzes o número de caminhões. Por exemplo, 15.000 automóveis e 6.000 caminhões renderiam:

300 x 15.000 + 250 x 6.000 = US$ 6.000.000.

Muitas outras combinações de automóveis e caminhões dariam a mesma margem de lucro; por exemplo, 10.000 automóveis e 12.000 caminhões. No GRÁFICO 1 tôdas as combinações que dão o retorno de US$ 6.000.000 figuram na mesma reta, a linha tracejada indicada com uma seta.

Tôdas as retas análogas à que acabamos de descrever correspondem às diversas margens possíveis. Elas são paralelas entre si, pois sua inclinação depende somente da relativa lucratividade entre os dbis processos. Quanto maior o retorno total, tanto mais alta será a reta. Algumas retas de retorno igual são indicadas no gráfico por linhas tracejadas paralelas.

Todo o número concebível de automóveis e caminhões que se poderia produzir corresponde a um ponto no diagrama. Através de cada ponto passa um membro da família de linhas de igual retorno. O retorno torna-se máximo quando o ponto correspondente ao número de automóveis e caminhões produzidos se encontra sôbre a linha de retorno mais alta. Entretanto, as restrições de capacidade limitam a amplitude da escolha às produções correspondentes aos pontos situados na área limitada pelos eixos e pela linha poligonal ABCDE. O retorno aumenta à medida que nos afastamos da origem; portanto, somente os pontos situados na linha quebrada precisam ser considerados. Começando no ponto A e deslocando-nos ao longo da linha poligonal, vemos que o contorno da região acessível intercepta linhas de igual retorno sempre mais altas, até que o ponto C é atingido. O ponto C corresponde, pois, ao mais alto retorno possível. No ponto C a produção é de 20.370 automóveis e 6.481 caminhões com um retorno de US$ 7.731.481 por mês.

Os economistas já devem ter observado que o diagrama não constiui novidade. A linha poligonal ABCDE indica o número máximo de automóveis que podem ser produzidos em conjunção com qualquer número dado de utilitários. É, portanto, exceto pela sua angularidade, uma curva de "oportunidade de produção" ou "curva de transformação", do tipo tornado familiar por IRVING FISHER. O coeficiente angular da curva, quando existe, é a razão de substituição entre automóveis e caminhões. A novidade é que a curva de oportunidade de produção mostrada não tem coeficiente angular em cinco pontos e que um dêsses pontos é o ponto crítico. As linhas tracejadas no diagrama são equivalentes às linhas convencionais de preço.

A teoria clássica da produção ensina que os lucros são máximos num ponto em que uma linha de preços é tangente a uma curva de oportunidade de produção. Mas, conforme já dissemos, há cinco pontos nos quais a curva de oportunidade de produção não tem tangente. Pontanto, o critério de tangência é falho. Vale aqui o critério de que os lucros são máximos num ponto onde a inclinação da linha de preço não é menor do que a inclinação da curva de oportunidade, à esquerda dêsse ponto, nem maior do que a inclinação da curva de oportunidade, à direita dêsse ponto.

A programação matemática usa, pois, linhas poligonais onde a Economia clássica usa linhas curvas. Qual é a conseqüência, em têrmos econômicos? Em análise econômica clássica encaramos relações de produção nas quais, quando há dois produtos, um pode substituir o outro com dificuldade gradualmente crescente. Em programação matemática, pressupomos um regime de produção no qual, para qualquer quantidade produzida, certos fatores serão realmente limitativos, mas outros serão abundantes. Assim, no GRÁFICO 1 os fatores que efetivamente limitam a produção em cada ponto podem ser identificados observando-se sôbre quais linhas de limitação o ponto se encontra. A relação de substituição entre produtos é determinada somente pelos fatores de limitação e só muda quando muda a designação dos fatores de limitação. No diagrama uma alteração na designação dos fatores de limitação é representada por uma permutação circular na curva de oportunidade de produção.

Voltaremos a êsse exemplo mais tarde, pois ainda não exaurimos todo o seu significado. Mas, agora estamos aptos a desenvolver com maior generalidade alguns conceitos usados em programação matemática.

II. O MODÊLO DE PRODUÇÃO NA PROGRAMAÇÃO MATEMÁTICA

Problema clássico da Economia é encontrar a melhor utilização possível de dois fatores de produção, chamados, por conveniência, capital e mão-de-obra. Na análise habitual supõe-se que êsses dois fatores operem conjuntamente, de acordo com uma função de produção que estabelece a quantidade máxima de um produto suscetível de ser obtida com o uso de quantidades definidas dos dois fatores. O diagrama das "isoquantas", ilustrado pelo GRÁFICO 2, é conveniente para representar a função de produção. Nesse gráfico, familiar aos economistas, as unidades de trabalho são representadas no eixo horizontal e as unidades de capital no eixo vertical. Cada curva corresponde a uma produção definida; os arcos mais afastados da origem correspondem a produções maiores.


Se os custos unitários de capital e mão-de-obra forem conhecidos, a combinação dêsses fatôres que puder ser obtida por um dispêndio total dado será representada por uma reta como CC'. A inclinação da reta depende somente dos custos relativos. Duas interpretações são imediatamente obtidas. Primeiro, o custo unitário mínimo necessário para produzir o volume representado por qualquer isoquanta pode ser obtido usando-se a combinação de capital e mão-de-obra que corresponda ao ponto de tangência da isoquanta com uma linha de preço. Em segundo lugar, a produção máxima que se pode obter com determinada despesa é representada pela isoquanta tangente à linha de preços correspondente a essa despesa.

Essas considerações se baseiam na hipótese de que os dois fatores sejam continuamente intercambiáveis, de modo que um pequeno aumento de capital compense um pequeno decréscimo de mão-de-obra. Supõe-se, ainda, que cada decréscimo sucessivo de mão-de-obra exija um aumento sempre maior de capital para manter uma produção constante. De outra maneira as isoquantas não teriam a forma de hipérboles.

Tudo isso é familiar. Só o relembramos porque vamos apresentar um diagrama análogo ao anterior, que é fundamental para a programação matemática. Antes, porém, vejamos porque um nôvo diagrama e outra conceituação se fazem necessários.

O modêlo de produção que delineamos acima é indubitàvelmente válido para alguns tipos de indústrias. Mas, para muitas fabricações, especialmente para as que usam máquinas complexas, êsse modêlo é sujeito a sérias objeções. A maioria das máquinas modernas só opera eficientemente numa limitada gama de velocidades, e as unidades de mão-de-obra, fôrça, materiais e outros fatores de produção são determinadas com certa inflexibilidade pelas caraterísticas inerentes à máquina. Além disso, são poucas as máquinas capazes de realizar uma tarefa específica.

Alguns exemplos tornarão essas considerações mais concretas. A remoção de terra pode ser feita manualmente, com pás mecânicas, ou com tratores do tipo bulldozer. As pás mecânicas e os bulldozers existem em número restrito de modelos, cada um com caraterísticas técnicas, tais como consumo de combustível e capacidade, bem estabelecidas. A composição de tipo faz-se manualmente, com linotipos ou monotipos, e aqui também cada máquina só existe em poucos modelos, de caraterísticas inalteráveis. Poderíamos citar muitos outros exemplos: equipamento de impressão, teares, transportes ferroviários e rodoviários, máquinas de calcular e de contabilidade, fornos de redução de minérios, máquinas-ferramentas etc.. Em muitos setores econômicos o número de procedimentos é finito e cada processo é rígido no que toca às proporções possíveis entre fatores de produção. Os fatores não são intercambiáveis, a menos que se modifiquem os próprios processos tecnológicos usados, porque cada processo usa fatores em proporções prefixadas. Em programação matemática a substituição de processos desempenha papel análogo ao da substituição de fatores na análise econômica convencional.

Apresentaremos agora um método de análise de substituição de processos. Limitaremos nossa discussão aos processos que consomem dois fatores, capital e mão-de-obra, e produzem um único produto. O GRÁFICO 3 representa um processo dêsse tipo. O eixo horizontal é uma escala de unidades de mão-de-obra e o vertical uma escala de unidades de capital. O processo é representado pela semi-reta OA, graduada em unidades de produção. A cada produção corresponde uma quantidade de mão-de-obra obtida pela projeção da produção sôbre o eixo das abcissas. A necessidade de capital é a projeção da produção sôbre o eixo das ordenadas.


Da mesma maneira, para cada quantidade de trabalho existe um volume de produção que é obtido levantando-se uma linha vertical, e uma quantidade de capital, que é obtida traçando-se uma linha horizontal, a partir da produção em foco.

Notemos que a quantidade de capital nesse contexto é a quantidade realmente usada no processo, e não a quantidade investida na instalação; é o serviço prestado pelo capital, mais do que o próprio capital. A relação entre quantidades de capital e de trabalho é fixada pela tecnologia inerente ao processo: se usarmos a máquina o dôbro de horas, consumiremos o dòbr. de homens-horas, pois a semi-reta OA indica que a relação entre essas grandezas é linear.

Mais precisamente, diríamos que a relação quantidade de capital/quantidade de mão-de-obra é igual ao coeficiente angular da reta OA, ou seja à tangente do ângulo que OA faz com o eixo das abcissas. Outro fato importante, além da constância da relação acima, é que não há economias de escala nesse processo: é o significado dos traços igualmente espaçados que se observam sôbre a semi-reta OA; êles nos dizem que para produzir o dôbro necessitamos exatamente o dôbro de mão-de-obra e o dôbro de capital. Duas máquinas de linotipo com operadores igualmente hábeis podem produzir exatamente o dôbro de uma só. Dois fusos idênticos podem produzir exatamente o dôbro de fio do que um só fuso no mesmo período. Desde que os fatores sejam disponíveis, um processo pode ser duplicado. Se essa duplicação é econômica ou não, isso é outro problema.

Quando só existe um processo aceitável para a produção de determinado bem não há terreno para escolha econômica. Freqüentemente, entretanto, haverá diversos processos.

O GRÁFICO 4 representa uma situação em que dois processos são disponíveis, o processo A indicado pela linha OA, e o processo B, indicado por OB. Já sabemos o significado dos pontos situados sôbre as linhas OA e OB, A escala nas quais a produção é medida nas duas linhas não é necessariamente a mesma. A escala de cada semi-reta do tipo OA ou OB reflete a produtividade dos fatores de produção na medida em que são usados no processo representado pela semi-reta em questão; a escala não tem relação com a escala de outra semi-reta, correspondente a outro processo.


Imaginemos agora que os pontos L e M representem a mesma produção física obtida por dois processos distintos. Então, o segmento LM representará uma isoquanta, e cada ponto situado sôbre êsse segmento corresponderá a uma combinação dos processos A e B que resultará na mesma produção que OL unidades do processo A ou que OM unidades do processo B.

Para entender essa assertiva considere-se qualquer ponto P situado sôbre o segmento LM e construa-se a reta que passe por P e seja paralela a OB. Seja L' o ponto de interseção dessa linha com OA. Marquemos sôbre OB o ponto AT tal que OM' seja igual a L'P. Consideremos o plano de produção que consiste em usar o processo A ao nível OL' e o processo B ao nível OM'. É fácil mostrar que êsse plano de produção usa OU unidades de mão-deobra e OV unidades de capital, sendo U e V, respectivamente, as coordenadas de trabalho e capital do ponto P.

De fato, o processo A ao nível OL' usa OQ' unidades de mão-de-obra e o processo B, ao nível OM', usa OS' unidades de mão-de-obra. Juntos, usam OQ' + OS' unidades de mão-de-obra. Mas, por construção, L'P é igual e paralelo a OM' Isto é, Q'U = OS'. Portanto OQ' + OS' = OQ' + Q'U = OU unidades de trabalho. O mesmo raciocínio vale para o eixo do capital.

O mesmo resultado seria obtido construindo-se pelo ponto P a linha paralela a OA. Ela interceptaria OB em M'. Então marcaríamos sôbre OA o ponto L' tal que OL' = M'P. Recairíamos no mesmo resultado anterior. A situação é análoga à construção do "paralelograma de forças" em Física.

Desde que as coordenadas do ponto P correspondem às quantidades dos fatores consumidos por OL' unidades do processo A e OM' unidades do processo B, interpretamos P como representativo do plano de produção obtido pela combinação dos níveis especificados dos dois processos. Essa interpretação repousa sôbre importante hipótese econômica, a de que, se dois processos foram usados simultaneamente, êles não interferem um no outro; em conseqüência, os fatores de produção e as unidades produzidas como resultado do uso simultâneo de dois processos a qualquer nível podem ser achados somando-se os fatores de produção e as unidades produzidas dos processos individuais.

Para provar que P está situado sôbre a isoquanta que passa pelos pontos L e M, resta mostrar apenas que a soma das unidades produzidas correspondentes aos pontos L' e M' é igual à produção correspondente ao ponto L ou ao ponto M. Esta propriedade decorre imediatamente dos seguintes fatos: a produção correspondente a qualquer ponto situado sôbre a semi-reta do processo é diretamente proporcional ao comprimento da semi-reta até o ponto considerado; e os triângulos LL'P e LOM são semelhantes. Usamos o símbolo Produção (M) para denotar a produção correspondente ao ponto M do diagrama. Então:

Então, se tivermos duas linhas de processo, como OA e OB, e encontrarmos dois pontos L e M situados sôbre elas e que correspondam à igual produção através dos dois processos, o segmento LM que unir os dois pontos de igual produção será uma isoquanta.

Podemos traçar agora o análogo, em programação matemática, do diagrama de isoquantas. O GRÁFICO 5 é um diagrama dêsse tipo, que mostra quatro linhas de processo. O ponto M representa uma produção realizada pelo uso do processo A; os pontos L, K e J representam a mesma produção obtida pelo uso dos processos B, C e D, respectivamente. A linha poligonal que une êsses quatro pontos é a isoquanta correspondente a essa produção. É fácil ver que qualquer outra poligonal cujos segmentos sejam paralelos aos de MLKJ será também uma isoquanta. Três isoquantas paralelas a MLKJ estão representadas no gráfico. É instrutivo comparar o GRÁFICO 5 com o GRÁFICO 2 e notar a grande semelhança entre ambos, tanto na aparência quanto na interpretação.


Podemos traçar linhas de preço no GRÁFICO 5, exatamente como no diagrama habitual de isoquantas. As linhas tracejadas XX' e YY' representam duas linhas de preço. Consideremos XX' primeiro. Pelo traçado dessa linha, vê-se que a produção máxima para dada despesa pode ser obtida pela utilização do processo C sòzinho e, inversamente, que o custo mínimo para dada produção é também obtido pelo uso do processo C sòzinho. Portanto, para o regime de preço relativo representado por XX' o processo C é ideal. A linha de preço YY' é traçada paralelamente ao segmento isoquântico JK. Neste caso, o processo C é ainda ideal, mas também o é o processo D, como aliás, qualquer combinação de ambos.

A inspeção dessas duas linhas de preços e de tantas outras quantas o leitor quiser traçar mostra que a otimização de um programa de produção pede ser sempre conseguida recorrendo-se a um único processo, processo êsse que depende, obviamente, da inclinação da linha de preços. Deve-se observar, entretanto, que o critério clássico de tangência não é mais aplicável.

Deduzimos do GRÁFICO 5 que um plano econômico ótimo nunca precisa valer-se de mais de um processo para cada tipo de produção. Mas não consideramos a produção conjunta de dois produtos nem estudamos a influência da demanda. A conclusão obtida é válida para a situação descrita, que partiu do pressuposto de que os dois fatores de produção eram acessíveis, em qualquer quantidade, a preços relativos constantes. Essa hipótese não é aplicável a muitos problemas e não tem largo uso em programação matemática. Portanto, devemos agora levar em consideração as condições de oferta dos fatores de produção.

III. OFERTAS E CUSTOS DOS FATÔRES DE PRODUÇÃO

Em programação matemática é habitual dividir todos os fatores de produção em duas classes: fatores ilimitados acessíveis, em qualquer quantidade, a um custo unitário constante, e fatores limitados ou escassos, acessíveis a um custo unitário constante até uma quantidade máxima fixada, e inacessíveis além dêsse teto. O exemplo da indústria automobilística dado acima ilustra essa classificação. Os quatro tipos de capacidade foram tratados naquele exemplo como fatores fixos acessíveis a custo constante; todos os demais fatores foram agrupados como custos diretos, que consideramos constantes por unidade produzida.

O exemplo da indústria automobilística mostrou que essa classificação de fatores é adequada para exprimir o problema de maximização de uma emprêsa que esteja operando em mercado competitivo. Na Parte II vimos que quando todos os fatores são ilimitados essa formulação serve para encontrar um ponto de custo médio mínimo.

Ambas essas aplicações partiram de pressupostos restritivos que entram em conflito com os que se tornaram convencionais no estudo da apropriação de recursos. Na análise convencional concebe-se que, à medida que aumenta o nível de produção de uma emprêsa, indústria ou economia, os custos médios unitários também aumentam a partir de certo ponto. O aumento dos custos médios pode ser atribuído, em parte, ao efeito da lei de proporções variáveis(1 1 ) J. M. CASSELS, " On the Law of Variable Proportions", em W. FELLNER e B. F. HALEY, editores, Readings in the Theory of Income Distribution, Filadélfia, 1946, págs. 103 a 118. ), que age quando as quantidades de alguns fatores de produção, mas não de todos, aumentam. Quanto às conseqüências disso, o contraste entre a programação matemática e a análise marginal é mais verbal do que substantivo. O GRÁFICO 4 mostra como essas mudanças são tratadas em programação matemática. O ponto J representa a produção de certa quantidade pelo uso do processo A somente. Se desejarmos aumentar a quantidade sem aumentar o uso do capital, isso poderá ser conseguido deslocando-nos à direita, ao longo da linha tracejada JK, que corta isoquantas sucessivamente mais elevadas. Êsse movimento corresponde ao uso progressivamente maior do processo B e ao uso progressivamente menor do processo A, e assim, indiretamente, à substituição de capital por mão-de-obra. Se, além disso, ocorrer que o custo unitário de produção do processo A seja menor do que o do processso B, êsse deslocamento corresponderá também ao aumento do custo médio de produção. Destarte, a análise marginal e a programação matemática levam-nos à mesma conclusão quando as proporções dos fatores são mudadas: se a mudança partir de um ponto de custo mínimo, a substituição resultará em custos unitários gradualmente maiores.

Mas a mudança das proporções dos fatores de produção é somente uma parte da história, de acordo com o tipo convencional de análise. Se a produção dever ser aumentada, três coisas poderão acontecer:

• Em primeiro lugar, pede ser possível aumentar o consumo de todos os fatores sem que ocorra mudança em seus preços unitários. Nesse caso, tanto pela programação matemática quanto pela análise marginal, a produção aumenta, sem que mudem as proporções entre as quantidades dos fatores, e o custo médio de produção não aumenta.(2 (2 ) F. H. KNIGHT, Risk, Uncertainty and Profit, Bóston, 1921, pág. 98. )

• Em segundo lugar, pode não ser possível aumentar o grau de utilização de alguns fatores. É o caso que acabamos de analisar. De acordo com ambos métodos de análise, as proporções dos fatores mudam nesse caso e os custos médios unitários aumentam. A única diferença entre os métodos é que, se o custo médio fôr lançado num gráfico em função da produção, a análise marginal revelará uma curva ascendente, ao passo que a programação matemática redundará numa linha quebrada constituída de segmentos de inclinação progressivamente maior.

• Em terceiro lugar, pode ser possível aumentar as quantidades de todos os fatores, mas somente com a condição de os preços unitários aumentarem ou, então, com "deseconomia" de escala. Êsse terceiro caso ocorre em análise marginal; aliás, é a situação que provoca, nas curvas de custo a longo prazo, sua forma familiar, mas a programação matemática não tem forma equivalente para essa situação.

Enfim, a diferença essencial é que a análise marginal lida com deseconomias pecuniárias e técnicas associadas com mudanças na escala de produção, ao contrário da programação matemática.(3 (3 ) Mesmo no arcabouço da análise marginal já foi questionado o conceito de deseconomia de escala, por razões teóricas e práticas. Veja-se, por exemplo, a crítica empírica do Commitee on Price Determination, Conference on Price Research, Cost Behavior and Price Policy (Nova Iorque, 1943). O mais penetrante ensaio teórico é o de PLERO SRAFFA, The Laws of Returns under Competitive Conditions", Economic Journal, dezembro de 1926, n.º XXVI, págs. 535 a 550. ) Existem muitos problemas econômicos de grande importância nos quais os preços dos fatores e as produtividades não mudam em conseqüência de mudanças de escala ou, então, são tão ínfimas essas variações que podem ser desprezadas. Muitas investigações de capacidade industrial, por exemplo, são dessa natureza. Nesses estudos pesquisamos a produção máxima de uma indústria, considerando fixo o seu equipamento e admitindo que os fatores auxiliares podem ser obtidos nas quantidades ditadas pelas caraterísticas do equipamento. Os estudos de necessidades de mão-de-obra são dá mesma natureza; nêles consideramos fixos a produção e o equipamento, e calculamos a mão-de-obra necessária para operar o equipamento ao nível que resulte na produção desejada. Os estudos de produção de pleno emprêgo são do mesmo estilo. Nêles determinamos de antemão a quantidade de cada fator que deve sor considerada como correspondente ao pleno emprêgo dêsse fator. Calculamos, então, o nível ótimo de produção atingível pela utilização dos fatores nessas quantidades.

Èsses exemplos são suficientes para mostrar que as hipóteses feitas em programação matemática abraçam grande variedade de problemas econômicos relevantes. As mais importantes aplicações da programação matemática são provavelmente problemas do tipo descrito acima, onde se procura otimizar planos de produção com a utilização dos recursos disponíveis.

IV. ANÁLISE DA PRODUÇÃO COM FATÔRES LIMITADOS

Os diagramas apresentados são fácilmente adaptáveis à análise das conseqüências provocadas pela existência de limitações nos fatores de suprimento. Essas limitações são, obviamente, a essência do GRÁFICO 1, onde as quatro linhas principais representam limitações nos níveis de processos, que resultam das limitações nas quantidades disponíveis dos quatro fatores. Mas o GRÁFICO 1 não pede ser usado quando mais de dois processos devam ser considerados; nesse caso usam-se diagramas como os dos GRÁFICOS 3, 4 e 5.

O GRÁFICO 6 reproduz a situação representada no GRÁFICO 5 com alguns dados adicionais que explicaremos adiante.


Seja OF o maior volume de capital que possa ser usado; OF representa o limite de um fator. A linha horizontal que passa por F divide o diagrama em duas seções: todos os pontos situados acima da linha correspondem a programas que exigem mais capital do que o disponível; os pontos situados abaixo da linha ou sôbre a linha representam programas viáveis, quanto à disponibilidade de capital. Essa reta horizontal nós a chamaremos "linha de limitação de capital"; os pontos situados abaixo da linha ou sôbre ela são denominados "viáveis"; os pontos acima, "inviáveis".

A entidade econômica em foco pode operar em qualquer ponto viável. Se o objetivo fôr maximizar a produção, escolheremos um ponto situado na mais alta isoquanta possível, isto é, a mais alta isoquanta que intercepte a linha de limitação de capital. Será a isoquanta J'K'L'M': a maior produção possível é obtida pelo processo A.

Evidentemente, a maximização da produção pode não ser o objetivo. Êste poderia ser, por exemplo, tornar máxima a diferença entre o valor da produção e os custos de mãode-obra; chamamos essa diferença de "valor líquido". O mesmo tipo de gráfico permite-nos resolver êsse nôvo problema, desde que o valor unitário da produção seja independente do número de unidades produzidas e que o custo de cada unidade de mão-de-obra também seja constante. Com essas premissas, cada ponto num semieixo de processo corresponderá a certa produção física e também a certo valor de produção, certo custo de mãode-obra e certo valor líquido. Ainda, ao longo de todo o semi-eixo de processo, o valor líquido será igual à produção vêzes o valor líquido unitário; será, portanto, proporcional à produção. Podemos então valer-nos de um diagrama semelhante ao GRÁFICO 6, exceto pelo fato de que são os valores líquidos - e não mais as produções físicas - que estariam representados nos semi-eixos de processo; teríamos linhas de igual valor no lugar das isoquantas. Foi o que se fêz no GRÁFICO 7; o máximo valor atingível é o que corresponde à linha de igual valor que passa em P, e é obtido pelo processo C.


Note-se nos GRÁFICOS 6 e 7 que o programa ótimo consiste num simples processo; que mudanças no volume de capital disponível não afetariam a designação do processo ótimo, embora mudem seu nível; e que as linhas de preço, cruciais no GRÁFICO 5, não desempenham aqui nenhum papel.

A próxima complicação - e é a última que examinaremos - consiste em admitir que ambos fatores estão em disponibilidade limitada. Essa situação é representada no GRÁFICO 6, acrescentando-se a linha vertical que passa pelo ponto G para representar a limitação da mão-de-obra. A quantidade disponível de mão-de-obra é representada, claro, pelo segmento OG. Os pontos situados dentro do retângulo OFHG representam programas viáveis, pois não requerem mais do que os suprimentos disponíveis de cada fator. Êsse é o retângulo dos programas viáveis. A produção máxima atingível é a que corresponde à mais alta isoquanta que toca o retângulo dos programas viáveis. É a isoquanta J"K"L"M". O ponto H, ponto de contato entre a isoquanta e o retângulo mencionado, representa o programa através do qual se pode obter a produção máxima.

Essa solução difere das precedentes pelo fato de que o ponto-solução não está situado sôbre nenhum eixo de processo, mas entre os eixos dos processos A e B. Já vimos que um ponto como H representa a utilização do processo A no nível ON e do processo B no nível NH.

Duas observações são relevantes:

• Primeira: com as linhas de limitação de fatores traçadas a produção máxima requér dois processos. Se as linhas de limitação de fatores tivessem sido traçadas de maneira a se cortarem exatamente sôbre um dos eixos de processo, somente um processo teria sido necessário.

Se as linhas e limitação de fatores se tivessem cortado à esquerda do processo D ou à direita do processo A, o plano de maximização de produção requereria somente um processo. Mas, seja qual fôr a maneira de traçar as linhas de limitação, no máximo dois processos serão necessários para maximizar a produção. Generalizando: a produção máxima sempre pede ser obtida pelo uso de um número de processos que não exceda o número de fatores de suprimento limitado, se êsse número não fôr zero. As conclusões obtidas dos GRÁFICOS 6 e 7 estão conformes a essa regra e êsse é um teorema básico da programação matemática.

• Em segundo lugar: já vimos que, no máximo, dois processos são necessários para obter a produção máxima; sua determinação depende da localização dos limites dos fatores. No exemplo dado os processos usados para a maximização da produção eram A e B. Se um maior volume de capital, representado pela quantidade OF', fôsse disponível, os processos que resultariam na maximização teriam sido C e D. Se dois fatores são limitados, é a proporção entre seus suprimentos - mais do que os valores absolutos dos suprimentos - que determina os processos correspondentes ao programa ótimo. Isso contrasta com o caso em que somente um fator é limitado. Assim como as considerações que determinam o conjunto ótimo de processos são mais complicadas quando dois fatores - e não um só - são limitados, assim também com três ou mais fatores de limitação, as condições ótimas tornam-se mais complicadas ainda e transcendem rapidamente nossa capacidade intuitiva. É êsse o fato que dá à formidável aparelhagem da programação matemática a sua razãode-ser.

Apliquemos essas considerações ao nosso exemplo dos automóveis. O GRÁFICO 1 mostra que C - o ponto ótimo de produção - se encontra sôbre as linhas de limitação da montagem do carro e da estamparia, mas bem abaixo dos limites de montagem dos carros e caminhões. Essas duas últimas limitações não precisam, pois, ser levadas em conta. Em tèrmos das duas capacidades limitadoras, representamos a situação no Gráfico 8.


No GRÁFICO 8 o eixo P representa o processo de produção de automóveis, e Pt o processo de produção de caminhões. Esses processos podem ser operados em qualquer combinação de níveis que não requeira a utilização de mais do que 100% de capacidade da estamparia ou da montagem de motores. O retângulo no diagrama é a região dos programas de produção realizáveis. O programa ótimo de produção é o que corresponde ao mais alto retorno líquido possível, dentro da região realizável. Será, pois, conveniente construir linhas de igual retorno, semelhantes às do Gráfico 7. Observemos que o objetivo da emprêsa é, por definição, tornar máximo o retorno, e não o volume físico de produção; podemos considerar a produção de automóveis e caminhões como dois processos alternativos, sendo aue ambos produzem retorno, isto é, renda financeira, embora suas produções físicas sejam heterogêneas. Para construir linhas de igual retorno consideremos, primeiro, a produção de automóveis. Cada ponto de PA corresponde à produção de certo número de carros por mês. Seja a escala escolhida tal que o ponto L represente a produção de 3.333 automóveis por mês. Lembremos que cada automóvel propicia um retorno de US$ 300. Logo, 3.333 carros dão um retorno de US$ 1.000.000. O ponto L, portanto, corresponde a um retorno de US$ 1.000.000 e uma produção de 3.333 veículos de passeio por mês. Como 3.333 automóveis ocupam 13 1/3% da capacidade da estamparia e 10% da capacidade da seção de montagem de motores, as coordenadas do ponto situado sôbre PA - que produz um retorno de US$ 1.000.000 - estão imediatamente estabelecidas. Do mesmo modo, o ponto cujas coordenadas são de 26 2/3% da capacidade da estamparia e 20% da capacidade de motores é o ponto situado sôbre PA cujo retorno é de US$ 2.000.000. Dessa maneira, todo o eixo PA pode ser graduado por uma escala de retorno; o eixo PT - eixo de processo para a produção de caminhões - também pode ser graduado. O diagrama é completo quando se ligam os pontos cujo retôrno é de US$ 4.000.000 sôbre os eixos PA e PT; os segmentos obtidos indicam as direções das linhas de igual retorno ou igual valor.

O programa ótimo corresponde ao ponto C de interseção das retas que limitam as capacidades; C está situado na linha de mais alto retorno que tangencia a região viável. Tracemos pelo ponto C uma paralela ao eixo de produção de caminhões; essa paralela corta o eixo OPA de produção de automóveis em D. Já foi provado que o comprimento OD representa, dentro do programa ótimo, a parcela proveniente da produção de automóveis; e que o comprimento DC representa a contribuição dos caminhões.

V. A ATRIBUIÇÃO DE VALORES AOS FATORES

Já dissemos que o maior campo de aplicação da programação matemática se encontra nos problemas em que £ disponibilidade de um ou mais fatores de produção é absolutamente limitada. A escassez é que gera o valor dos bens, tanto na programação matemática quanto na análise econômica clássica. Nesta, de fato, a determinação das quantidades produzidas e a dos preços são dois aspectos do mesmo problema, isto é, da repartição ideal dos escassos recursos existentes. O mesmo se dá na programação matemática.

Até aqui os preços somente intervieram como elementos de determinação dos custos diretos e do retorno. Mas, evidentemente, os fatores limitativos da produção também têm valores, embora não lhes tenhamos atribuído preços até agora. Nesta parte do artigo veremos que a solução de problemas de programação matemática atribui implicitamente valores aos fatores limitativos da produção; e, além disso, que o problema implícito de atribuição de preços pode ser solucionado diretamente e, quando resolvido, constitui solução do problema de repartição de recursos.

Voltemos ao exemplo dos automóveis e perguntemo-nos: quanto vale uma unidade (1 %) de cada tipo de capacidade para a emprêsa? Essa pergunta assemelha-se, em espírito, à análise marginal clássica. Calculemos, em relação a cada tipo de capacidade, em quanto o retorno máximo aumentaria se uma unidade fôsse acrescentada ou em quanto o retorno diminuiria se uma unidade fôsse retirada. Como há excesso de capacidade de montagem de automóveis, nem a adição nem a subtração de uma unidade dêsse tipo afetariam o programa ótimo ou o retorno máximo. Portanto, o valor dêsse tipo de capacidade é nulo. O resultado é o mesmo para a montagem de caminhões.

Deduzimos daí que êsses dois tipos de capacidade são bens econômicos gratuitos. Isso não significa que uma linha de montagem de carros não seja valiosa, assim como - para citar um exemplo clássico - o fato de o ar ser gratuito não significa que êle seja dispensável. O que se quer dizer é que não é economicamente compensador aumentar esses tipos de capacidade a qualquer preço positivo e que algumas unidades dêsses tipos podem ser suprimidas sem perda.

A valorização dos outros tipos de capacidade não é tão trivial. No GRÁFICO 9 o eixo horizontal está graduado em valores (US$) por percentagem da capacidade de montagem de motores; o eixo vertical está graduado em valores por percentagem de capacidade da estamparia. Consideremos agora qualquer par possível de valores, digamos, a capacidade de valor US$ 20.000 por unidade (para a montagem de motores) e a capacidade de valor US$ 40.000 (para a estamparia). Êsse par de valores corresponde ao ponto A do GRÁFICO 9. Aplicando esses valores aos dados da Parte I dêste artigo, encontramos o custo da capacidade necessária para produzir um automóvel:

(0,004 X US$ 40.000) + (0,003 X US$ 20.000) = US$ 220,


importância muito menor do que o valor de produção de um automóvel, que é de US$ 300. Nesse exemplo os valores unitários são iguais aos valores marginais, ja que os custos de produção são constantes. Análogamente, se a capacidade da montagem de motores valer US$ 60.000 por unidade percentual de capacidade e se a capacidade da estamparia fôr estimada em USS 30.000 por unidade (ponto B), o custo dos recursos necessários à produção de um automóvel será exatamente igual ao valor do produto.

Essa não é, obviamente, a única combinação de valores dos recursos que absorvem exatamente o valor da produção quando a fábrica só produz automóveis. A linha de produção de carros, no GRÁFICO 9, que passa pelo ponto B, é o lugar geométrico de tôdas essas combinações de valores. Uma linha semelhante foi traçada para a produção de caminhões a fim de representar as combinações dos valores dos recursos para os quais o valor total dos recursos consumidos na produção de caminhões é igual ao valor da produção. A interseção dessas duas linhas é, obviamente, o único par de valores dos recursos para os quais o custo marginal do recurso correspondente ã produção de um carro adicional é igual ao retorno proporcionado por um carro; o mesmo é verdade em relação aos caminhões. O ponto pode ser achado gráficamente, ou, com maior precisão, algébricamente. Encontra-se, então, que 1% da capacidade de montagem de motores vale US$ 9.259 e 7% da capacidade da estamparia valem US$ 68.056.

A cada par de valores para os dois tipos de capacidade corresponde um valor para a fábrica inteira. Assim, ao par de valores representado pelo ponto A corresponde o valor de fábrica de:

(100 X US$ 20.000) 4- (100 X US$ 40.000) = US$ 6.000.000.

Êsse não é o único par de valores dos recursos que dá um valor combinado total de US$ 6.000.000 para a fábrica. De fato, qualquer par de valores dos recursos situado sôbre a linha tracejada que passa por A corresponde ao mesmo valor combinado total para a fábrica. A essa altura, o GRÁFICO 9 lembra muito o GRÁFICO 1. Foram desenhadas algumas linhas tracejadas paralelas à que acabamos de descrever, cada uma das quais corresponde a um valor específico agregado, total da fábrica. A linha tracejada que passa pelo ponto P de interseção das duas linhas de produção é particularmente interessante. Essa linha corresponde, como se pode ver por simples inspeção do gráfico, a um valor total de fábrica de US$ 7.731.500, precisamente o valor que encontramos para o retorno máximo atingível.

Consideremos as conseqüências da atribuição de valores aos dois fatores limitativos sob um ângulo ligeiramente diferente. Vimos que a atribuição de valores unitários aos fatores resulta num valor total combinado para a fábrica. Podemos fazer com que o valor total para a fábrica seja tão baixo quanto desejemos, simplesmente atribuindo valôres suficientemente baixos aos diversos fatores. Mas, se os valores atribuídos forem excessivamente baixos, teremos a conseqüência desagradável de que alguns prcçessos darão origem a excedentes não valorizados. Podemos, portanto, procurar o valor agregado total mais baixo possível para a fábrica, desde que nenhum processo de um excedente não valorizado. No caso dos automóveis esse valor é de US$ 7.731.500. Na ocasião de procurar o menor valor agregado total para a fábrica acharemos os valores unitários específicos que devem ser atribuidos a cada recurso.

Nesse exemplo há dois processos e quatro recursos limitativos. Na verdade, somente dois recursos eram efetivamente limitativos, sendo os dois outros disponíveis com relativa abundância. Em geral, as caraterísticas da solução de um problema de programação matematica dependem da relação entre o número de recursos limitativos e o número de processos considerados. Se, como nesse exemplo, o número de recursos limitativos exceder o numero de processos, alguns recursos terão valores atribuídos nulos e o número de recursos com valores positivos será igual ao número de processos. Notemos que, em algumas circunstâncias, o número de recursos com valores atribuídos positivos pode ultrapassar o número de processos Se o número de recursos limitativos for igual ao número de processos, todos os recursos terão valores atribuídos positivos. E se, finalmente, o número de processos ultrapassar o número de recursos limitativos, alguns processos não chegarão a ser usados no programa ótimo. Essa situação, que é a mais comum, é ilustrada no GRAFICO 6 , Nesse caso o valor total atribuído aos recursos absorvidos será igual ao retorno, segundo certos processos, e o excederá, segundo outros.

O número de processos para os quais o valor atribuído dos recursos absorvidos fôr igual ao retorno será exatamente equivalente ao número de recursos limitados. Os processos para os quais vale essa igualdade são os que constam do programa ótimo com níveis positivos. Em resumo, a determinação do valor mínimo aceitável para a fábrica vem a ser o rnesmo que a determinação do programa ótimo de produção O problema de programação e o problema de valonzação são, essencialmente, um só.

A identidade entre êsses problemas é visível pela comparação entre os GRÁFICOS 1 e 9. Cada gráfico contei dois eixos e duas linhas diagonais de limitação. Mas essa" lmhas limitativas referem-se, no GRÁFICO 9, aos mesmo processos que os eixos, no GRÁFICO 1; reciprocamente, os eixos do GRÁFICO 9 referem-se aos mesmos recursos que as linhas limitativas diagonais do GRÁFICO 1. Além disso no GRAFICO 1 procurávamos o retorno correspondeu e à mais baixa linha tracejada que tenha pontos sôbre as linhas fronteiriças ou fora delas; e os resultados dos dois métodos coincidiram. Em linguagem matemática formal, os problemas representam uma dualidade.

A dualidade é uma propriedade muito útil para a solução de problema de programação matemática, pois temos por ela a escolha entre resolver o problema ou seu dual conforme seja mais fácil, obtendo sempre o mesmo resultado.

Utilizemos êsse conceito para generalizar nossa discussão. Até aqui tínhamos de usar diagramas relativamente complexos, como o GRÁFICO 6, quando tratávamos com mais de dois processos, já que diagramas simples, como o GRÁFICO 1, não continham eixos em número suficiente para representar os níveis dos processos. Agora podemos usar diagramas calcados no GRÁFICO 9 para visualizar prohlsmas que envolvem qualquer número de processos, desde que não haja mais do que dois fatôres escassos.

O GRÁFICO 10 ilustra um diagrama para quatro processos e deriva realmente do GRÁFICO 6. No GRÁFICO 10 a linha A representa todos os pares de valôres dos fatôres produtivos em que o processo A não fornece nem lucro nem perda. As linhas B, C e D são interpretadas da mesma forma. A linha tracejada T é o lugar geométrico para o qual o valor combinado do capital e da mão-de-obra disponível é constante. Sua inclinação, que reflete a relação entre as quantidades disponíveis de mao-de-obra de canital importa mais do que sua posição. A poligonal JKLMN divide o gráfico em duas regiões. Todos os pontos situados nela ou acima dela representam pares de valores dos recursos, em que nenhum processo da origem a um excedente não valorizado. Chamemos ess a zona região de aceitacáo. Para todo o ponto situado abaxo da poligonal há pelo menos um processo com excedente nao valorizado. É a região da não aceitação. Procuremos o ponto situado na região de aceitação correspondente ao menor valor combinado para a fabrica. Êsse ponto corresponde ao conjunto de valôres dos recursos que tornaará o lucro contábil da empresa o maior possível, sem gerar qualquer retôrno não valoriado. O ponto em questão é K; a linha tracejada que passa por K paralelamente a T foi desenhada para indicar o mínimo valor agregado satisfatório para a fábrica.


No ponto K os processos A e B dão lucro nulo e os processos C e D dão perda. Portanto, os processos A e B são os que convém usar, exatamente como achamos GRÁFICO 6. Na verdade, êsse diagrama não nos diz os níveis nos quais A e B devam ser usados, assim como o GRÁFICO 6 não nos revela os valores que devam ser atribuídos aos dois recursos. Mas é relativamente fácil achar os níveis após a seleção dos processos. É só achar os níveis que utilizarão integralmente os recursos escassos, o que se pode fazer algébrica ou gràficamente, como no GRÁFICO 8.

VI. APLICAÇÕES

Na primeira parte dêste trabalho afirmamos que a principal motivação para usar programação matemática era a necessidade de um método de análise que se prestasse à solução prática dos problemas diários de administração e economia. Imediatamente apos têrmos dito isso, apresentamos um problema altamente artificial, seguido por extensa discussão de relações abstratas e formais. Chegou agora o momento de provarmos que a programação matemática é um método prático de análise.

A simplificação essencial conseguida em programação matemática é a substituição da noção de função de produção pela de processo. O processo é uma unidade bem diferenciada de atividade e as constantes empíricas que o caraterizam podem ser estimadas sem análise elaborada. Em muitas indústrias a estrutura da produção corresponde a operação de uma sucessão de processos. Muitas decisões industriais, como parar uma linha de máquinas ou operar um turno suplementar, correspondem fielmente ao nosso conceito de escolha do nível de operação de um processo. Em suma, a programação matemática é um modelo da estrutura real da produção, concebido com a esperança de que esta contenha somente constantes observáveis e variáveis diretamente controladas.

Tem sido justificada essa esperança? Na literatura especializada já foi publicado um exemplo de aplicação bem sucedida de programação matemática no campo da refinação de petróleo.(4 (4 ) A. CHARNES, W. W. COOPER e B. MELLON, " Blending Aviation Gasolimes", Econométrica, abril de 1952, n.º XX, págs. 135 a 159. ) Tenho tido experiência semelhante numa refinaria de porte médio que produz gasolinas comum e especial. Na operação de mistura dez tipos diferentes de componentes, que são frações provenientes de destilação são misturados. O resultado é gasolina comercial, cujas caraterísticas correspondem à média ponderada das caraterísticas dessas frações. Por exemplo: se 500 galões de uma fração que contenha um teor de octana de 80 pontos forem misturados com 1.000 galões de outra fração com teor de octana de 86 pontos, o resultado sera 1.500 galões de um produto final com teor de octana igual a (1/3 X 80) + (2/3 X 86) = 84 pontos.

O que é importante aqui é que as caraterísticas essenciais da mistura - seu ponto de detonação, sua pressão de vapor, seu teor de enxofre etc. - podem ser expressas como funções lineares das diversas frações usadas; assim também o custo da mistura, se se atribuir um preço definido a cada fração. Portanto, achar a mistura de custo mínimo que satisfaça especificações técnicas determinadas é um problema de programação matemática.

Na refinaria as quantidades disponíveis de algumas frações são limitadas por contratos e pelas caraterísticas do equipamento. Surge então o problema seguinte: quais as quantidades mais lucrativas de gasolinas comum e especial que se deve produzir e quanto se deve usar de cada fração nos produtos acabados? O problema lembra o dos automóveis, com a complicação suplementar das especificações técnicas. Complexo demais para análise gráfica, êsse problema é resolvido fácilmente por processos aritméticos. Tanto quanto eu saiba, a programação matemática é o único meio de solução dêsses problemas. CHARNES e COOPER publicaram, há pouco, a solução de um problema semelhante que se colocou numa emprêsa metalúrgica.(5 (5 ) A. CHARNES, W. W. COOPER, DONALD FARR e outros, " Linear Programming and Profit Preference Scheduling for a Manufaturing Firm", Journal of the Operations Research Society of America, maio de 1953 n.ºI págs. 114 a 129. )

Um problema de espécie totalmente diferente, também suscetível de tratamento pela programação matemática surge na indústria de papel. O frete é um dos maiores componentes do custo do papel. Uma emprêsa dêsse ramo tem seis fábricas espalhadas pelo Canadá e cêrca de duzentos clientes dispersos pelos Estados Unidos da América. A questão é decidir quantas bobinas devem ser mandadas de cada fábrica a cada cliente, a fim de: primeiro, satisfazer os pedidos; segundo, obedecer as limitações de capacidade de cada fábrica; terceiro, conseguir o menor custo total possível de transporte. A situação envolve 1.200 variáveis (6 fábricas vêzes 200 clientes), em contraste com os casos anteriores, que continham duas ou quatro variáveis. Na solução final a maior parte das variáveis serão acumuladas; a questão é saber quais serão essas variáveis. Êsse é mais um caso para a programação matemática e, embora formidável, não o é tanto quanto o número de variáveis parece indicar.

Essas poucas amostras bastam para indicar que a programação matemática é uma arma prática no planejamento das emprêsas. Elas mostram também que se trata de instrumento flexível, pois a diversidade dos exemplos foi grande. No caso da refinaria havia a exigência suplementar das especificações técnicas; no caso do papel existiam limites na quantidade da produção e na quantidade dos fatores de produção. Entretanto, a nova técnica soluciona perfeitamente ambos os problemas.

Por outro lado, é digno de nota o fato de que se tratava de aplicações em pequena escala, relacionadas apenas com uma operação simples de uma única emprêsa. Creio que essa constatação deve ocorrer em tôdas as implantações bem sucedidas. Os programadores matemáticos estão ainda muito longe de resolver a problematicidade mais ampla do planejamento global das emprêsas ou da economia. Aliás, esses problemas maiores são apenas versões ampliadas de problemas já solucionados no contexto de uma única emprêsa. Já não é prematuro afirmar que a programação matemática tem provado seu valor como instrumento prático para encontrar programas econômicos ótimos.

VII. CONCLUSÕES

Nosso objetivo neste trabalho foi tão sòmente apresentar as noções básicas de programação matemática, dando-lhes substrato concreto e prático. O leitor desejoso de resolver um problema de programação - mesmo que dos mais simples - terá de procurar outra fonte, embora êste artigo lhe possa servir de referência.(6 (6 ) O texto considerado padrão é: T. C. KOOPMANS, ed., Activity Analysis of Production and Allocation (Nova Iorque, 1951). Tratamentos menos avançados são: A. CHARNES, W. W. COOPPER e A. HENDERSON, An Introduction to Linear Programming (Nova Iorque, 1953); e o de minha autoria: " Application of Linear Programming to the Theory of the Firm" (Berkeley, 1951). ) Se bem que os métodos de solução dos problemas tenham sido omitidos na presente exposição, devemos sublinhar que êsses métodos são fundamentais para tôda a conceituação da programação matemática.

Há cêrca de oitenta anos atrás WALRAS conceituou a produção de maneira sensivelmente igual à dos programadores matemáticos; em época mais recente A. WALD e J. VON NEUMANN valeram-se dessa perspectiva e de métodos estreitamente afins aos da programação matemática para analisar as condições de equilíbrio macro-econômico.(7 7 A formulação de WALRAS encontra-se em: " Éléments d'économic politique pure ou théorie de la richesse sociale", 2.ª edição (Lausana, 1889), Lição 20. ª. As contribuições de A. WALD e J. VON NEUMANN, apareceram primeiro em: " Erhgebnisse eines Mathematischen Kolloquiums" n.ºs 6, 7 e 8. O trabalho menos técnico de WALD encontra-se no Zeitschrift für Nationalekonomie, n.º VII (1936) e foi traduzido sob o título "On Seme Systems of Equations of Mathematical Economios", Econometrica, outubro de 1951, n.º XIX, págs. 369 a 403. O trabalho fundamental de VON NEWMANN foi publicado (traduzido) em "A Model of General Economio Equlibrium", Rev. Econ. Stud., 1945 a 1946, n.º XIII, págs. 1 a 9. )

Essas contribuições, entretanto, devem ser encaradas como simples precursoras da programação matemática, que não teve existência independente como modalidade de análise econômica até 1947, quando G. B. DANTZIG introduziu o "método simplex", que tornou possível a solução dos problemas práticos.(8 (8 ) G. B. DANTZIG, " Maximization of a Linear Function of Variables Subject to Linear Inequalities", T. C. KOOPMANS, ed., op. cit., págs. 339 a 347. ) A existência de um método que permitia calcular explicitamente pontos econômicos ótimos estimulou pesquisas no setor e propiciou a descoberta de novos métodos de solução. O fato de os problemas econômicos e empresários poderem ser resolvidos numéricamente na linguagem da programação matemática constitui a base da importância do método.

A omissão dos métodos de solução neste artigo não deve ser, pois, interpretada como indicação de que êles sejam de importância secundária. Tratamos apenas de alguns dos conceitos usados em programação matemática e discutimos apenas um tipo de problema. As poucas noções apresentadas são, entretanto, as essenciais; todo o resto, no campo, é elaboração e extensão delas.

É conveniente mencionar duas extensões, que removem duas severas restrições que nos impusemos:

• A primeira é a introdução do fator tempo. Trabalhamos até aqui com um único período de produção. Mas, em muitas situações períodos sucessivos de produção são relacionados entre si. É o caso, por exemplo, de uma emprêsa integrada verticalmente, na qual a operação de alguns processos num período é limitada pelos níveis de operação, no período anterior, dos processos que supriram as matérias-primas. Métodos eficazes para analisar êsses problemas "dinâmicos" estão sendo investigados, em particular, por DANTZIG.(9 (9 ) " A Note on a Dynamic Leontief Model with Substitution" (resumo), Econométrica, janeiro de 1953, n.º XXI, pág. 179. ) Nossa apresentação, embora tendo sido estática, expôs metodologia aplicável a problemas que contenham dimensão temporal.

• A segunda extensão consiste em permitir alterações nos preços dos fatores e dos produtos acabados. Em nossa discussão consideramos todos os preços inalteráveis e independentes da ação da unidade econômica em pauta. A constância de preços é, sem dúvida, muito conveniente para o analista, mas o método pode transcender essa hipótese quando fôr necessário. A teoria matemática geral para tratar com preços variáveis já foi criada(10 (10 ) H. W. KUHN e A. W. TUCKER, " Non-Linear Programming", in J. NEWMANN, ed., Proceedings of fhe Second Berkeley Symposium on Mathematícal Statistics and Probability (Berkeley, 1951), págs. 481 a 492. ) e métodos práticos de solução foram inventados para os problemas nos quais as curvas de demanda e oferta são lineares.(11 (11 ) Apresentei uma solução para esse problema num seminário do " Massachusetts Institute of Technology" realizado em setembro de 1952. Talvez haja cutras soluções. ) A hipótese de constância de preços - talvez, a restrição mais severa que fizemos - foi adotada, pois, mais por conveniência do que por necessidade.

A programação matemática foi criada como instrumento para o planejamento econômico e empresário, e não pará as finalidades descritivas - e, portanto, de previsão - que deram origem à análise marginal. Entretanto, ela tem poderes de previsão. Desde que as emprêsas operem em condições postuladas em programação matemática, não sera razoavel admitir que elas ajam como se operassem nas condições postuladas pela análise marginal. Consideremos, por exemplo, a emprêsa automobilística representada no GRÁFICO 1. Como reagiria se os preços dos automóveis caíssem, digamos, US$ 50 por unidade? Nesse caso o retorno por carro seria de US$ 250, igual ao de um caminhão. Gràficamente, o resultado corresponderia a girar as linhas de igual retorno até que sua inclinação fôsse de 45 graus. Após essa rotação, o ponto C continuaria a ser otimo e essa mudança de preços não causaria alteração na produção ótima. A programação matemática origina, assim, uma curva torcida de oferta.

Por outro lado, suponhamos que o preço dos carros suba US$ 50. Gràficamente, essa mudança de preço diminui a inclinação das linhas de igual retorno até que se tornem exatamente paralelas à linha da estamparia. A emprêsa estaria, então, numa posição como a mostrada pela linha YY' no GRÀFICO 5. Os planos de produção que correspondem aos pontos do segmento CD no GRÁFICO 1 dariam todos o mesmo retorno e seriam todos ótimos. Se os pre, ços dos automóveis subissem mais de US$ 50, ou se um aumento de preço nos carros fôsse acompanhado de qualquer baixa no preço dos caminhões, o ponto de produção preferencial saltaria do ponto C ao ponto D.

Assim, a programação matemática indica que as emprêsas com alternativas de escolha limitadas a processos distintos reagirão de modo descontínuo a variações de preços: nao serão sensíveis a mudanças de preços em certo domínio de variação e mudarão bruscamente seus níveis de produção quando êsse domínio fôr ultrapassado. Essa dedução teórica certamente deve ter contrapartes reais.

A relação entre a programação matematica e a economia de abundância (welfare economios) é particularmente estreita A economia de abundância estuda a organização ideal do esforço econômico, o mesmo ocorrendo com a programação matemática. Essa relação foi estudada por KOOPMANS e SAMUELSON.12 (12 ) T. C. KOOPMANS, " Analysis of Production as an Efficient Combination of Activities", in T. C. KOOPMANS, ed., op. cit., págs. 33 a 97; P. A. SAMUELSON, " Market Mechanisms and Maximization" (artigo preparado para a Rand Corp; 1949). A conclusão geral e que a posição de equilíbrio de uma economia perfeitamente competitiva é igual à solução ótima do problema correspondente de programação matematica.

A programação matemática é muito afim, matemáticamente, aos métodos de análise do tipo consumo-produção ou análise inter-industrial, aperfeiçoados principalmente por W. W. LEONTIEF.13 (13 ) W. W. LEONTIEF, " The Structure of American Economy 1919-1939", 2.ª edição, Nova Iorque, 1951. Ambos os métodos foram, porem, desenvolvidos independentemente, e é importante distingui-los conceitualmente.

A análise do tipo consumo-produção encontra aplicação quase exclusiva no estudo do equilíbrio macro-economico. Concebe a economia como sendo dividida em setores industriais, cada um dos quais é análogo a um processo (no sentido que damos a êsse têrmo em programação matemática). A análise segue então dois caminhos possíveis. Nos "modelos abertos" a análise começa com uma demanda final para os produtos de cada setor bem especificado e calcula o nível no qual cada setor-processo deva operar para satisfazer essas demandas. Nos "mcdelos fechados a demanda final não aparece, mas a atenção e focalizada sôbre o fato de que os fatores de produção exigidos para cada setor-processo devem ser supridos como produtos finais por outros setores-processos. O analista calcula, então um conjunto de níveis de produção compatíveis para os diversos setores. Em contraste com a programação matemática, as condições impostas na análise do tipo consumo-produção são suficientes para determinar os níveis dos processos e não há campo para encontrar uma solução preferencial ou um conjunto de "melhores" níveis. Na verdade, a análise do tipo consumo-produção pode ser encarada como um caso especial de programação matemática na qual o número de produtos é igual ao número de processos. Por outro lado, as limitações no suprimento dos recursos, que desempenham papel de tamanha importância em programação matemática, não aparecem explicitamente na análise do tipo consumo-produção. Em suma, parece preferível considerar essas duas técnicas como métodos semelhantes mas distintos de análise, destinados a resolver problemas diferentes.

A programação matemática, em conclusão, é importante na teoria econômica e no planejamento econômico das emprêsas. Somente pudemos, nestas páginas, mencionar de passagem essa relevância. De fato, excluindo-se as deduções obtidas no tocante à economia de abundância, poucos estudofe foram dedicados às conseqüências da programação matemática na economia em geral; isso porque os autores concentraram seus esforços na solução de inúmeros problemas práticos suscitados nessa área. O panorama que se descortina é de pesquisas frutíferas, tanto nas implicações, quanto nas aplicações da programação matemática.

Nota da Redação: Artigo reproduzido com autorização do autor e da American Economic Review, onde foi publicado em dezembro de 1953, volume XLIII, n.º 5, parte I. Traduzido do inglês por CLAUDE MACHLINE.

  • (2) F. H. KNIGHT, Risk, Uncertainty and Profit, Bóston, 1921, pág. 98.
  • (3) Mesmo no arcabouço da análise marginal já foi questionado o conceito de deseconomia de escala, por razões teóricas e práticas. Veja-se, por exemplo, a crítica empírica do Commitee on Price Determination, Conference on Price Research, Cost Behavior and Price Policy (Nova Iorque, 1943). O mais penetrante ensaio teórico é o de PLERO SRAFFA, The Laws of Returns under Competitive Conditions", Economic Journal, dezembro de 1926, n.ş XXVI, págs. 535 a 550.
  • (4) A. CHARNES, W. W. COOPER e B. MELLON, "Blending Aviation Gasolimes", Econométrica, abril de 1952, n.ş XX, págs. 135 a 159.
  • (5) A. CHARNES, W. W. COOPER, DONALD FARR e outros, "Linear Programming and Profit Preference Scheduling for a Manufaturing Firm", Journal of the Operations Research Society of America, maio de 1953 n.şI págs. 114 a 129.
  • (6) O texto considerado padrão é: T. C. KOOPMANS, ed., Activity Analysis of Production and Allocation (Nova Iorque, 1951).
  • Tratamentos menos avançados são: A. CHARNES, W. W. COOPPER e A. HENDERSON, An Introduction to Linear Programming (Nova Iorque, 1953);
  • e o de minha autoria: "Application of Linear Programming to the Theory of the Firm" (Berkeley, 1951).
  • 7 A formulação de WALRAS encontra-se em: " Éléments d'économic politique pure ou théorie de la richesse sociale", 2.Ş edição (Lausana, 1889), Lição 20.
  • Ş. As contribuições de A. WALD e J. VON NEUMANN, apareceram primeiro em: "Erhgebnisse eines Mathematischen Kolloquiums" n.şs 6, 7 e 8. O trabalho menos técnico de WALD encontra-se no Zeitschrift für Nationalekonomie, n.ş VII (1936) e foi traduzido sob o título "On Seme Systems of Equations of Mathematical Economios", Econometrica, outubro de 1951, n.ş XIX, págs. 369 a 403.
  • O trabalho fundamental de VON NEWMANN foi publicado (traduzido) em "A Model of General Economio Equlibrium", Rev. Econ. Stud., 1945 a 1946, n.ş XIII, págs. 1 a 9.
  • (9) "A Note on a Dynamic Leontief Model with Substitution" (resumo), Econométrica, janeiro de 1953, n.ş XXI, pág. 179.
  • (13) W. W. LEONTIEF, "The Structure of American Economy 1919-1939", 2.Ş edição, Nova Iorque, 1951.
  • 1
    ) J. M. CASSELS, "
    On the Law of Variable Proportions", em W. FELLNER e B. F. HALEY, editores,
    Readings in the Theory of Income Distribution, Filadélfia, 1946, págs. 103 a 118.
  • (2
    ) F. H. KNIGHT,
    Risk, Uncertainty and Profit, Bóston, 1921, pág. 98.
  • (3
    ) Mesmo no arcabouço da análise marginal já foi questionado o conceito de deseconomia de escala, por razões teóricas e práticas. Veja-se, por exemplo, a crítica empírica do
    Commitee on Price Determination, Conference on Price Research, Cost Behavior and Price Policy (Nova Iorque, 1943). O mais penetrante ensaio teórico é o de PLERO SRAFFA,
    The Laws of Returns under Competitive Conditions",
    Economic Journal, dezembro de 1926, n.º XXVI, págs. 535 a 550.
  • (4
    ) A. CHARNES, W. W. COOPER e B. MELLON, "
    Blending Aviation Gasolimes",
    Econométrica, abril de 1952, n.º XX, págs. 135 a 159.
  • (5
    ) A. CHARNES, W. W. COOPER, DONALD FARR e outros, "
    Linear Programming and Profit Preference Scheduling for a Manufaturing Firm", Journal of the Operations Research Society of America, maio de 1953 n.ºI págs. 114 a 129.
  • (6
    ) O texto considerado padrão é: T. C. KOOPMANS, ed.,
    Activity Analysis of Production and Allocation (Nova Iorque, 1951). Tratamentos menos avançados são: A. CHARNES, W. W. COOPPER e A. HENDERSON,
    An Introduction to Linear Programming (Nova Iorque, 1953); e o de minha autoria: "
    Application of Linear Programming to the Theory of the Firm" (Berkeley, 1951).
  • 7
    A formulação de WALRAS encontra-se em: "
    Éléments d'économic politique pure ou théorie de la richesse sociale", 2.ª edição (Lausana, 1889), Lição 20. ª. As contribuições de A. WALD e J. VON NEUMANN, apareceram primeiro em: "
    Erhgebnisse eines Mathematischen Kolloquiums" n.ºs 6, 7 e 8. O trabalho menos técnico de WALD encontra-se no
    Zeitschrift für Nationalekonomie, n.º VII (1936) e foi traduzido sob o título
    "On Seme Systems of Equations of Mathematical Economios", Econometrica, outubro de 1951, n.º XIX, págs. 369 a 403. O trabalho fundamental de VON NEWMANN foi publicado (traduzido) em
    "A Model of General Economio Equlibrium", Rev. Econ. Stud., 1945 a 1946, n.º XIII, págs. 1 a 9.
  • (8
    ) G. B. DANTZIG, "
    Maximization of a Linear Function of Variables Subject to Linear Inequalities", T. C. KOOPMANS, ed.,
    op. cit., págs. 339 a 347.
  • (9
    ) "
    A Note on a Dynamic Leontief Model with Substitution" (resumo),
    Econométrica, janeiro de 1953, n.º XXI, pág. 179.
  • (10
    ) H. W. KUHN e A. W. TUCKER, "
    Non-Linear Programming", in J. NEWMANN, ed.,
    Proceedings of fhe Second Berkeley Symposium on Mathematícal Statistics and Probability (Berkeley, 1951), págs. 481 a 492.
  • (11
    ) Apresentei uma solução para esse problema num seminário do "
    Massachusetts Institute of Technology" realizado em setembro de 1952. Talvez haja cutras soluções.
  • (12
    ) T. C. KOOPMANS, "
    Analysis of Production as an Efficient Combination of Activities", in T. C. KOOPMANS, ed., op. cit., págs. 33 a 97; P. A. SAMUELSON, "
    Market Mechanisms and Maximization" (artigo preparado para a Rand Corp; 1949).
  • (13
    ) W. W. LEONTIEF, "
    The Structure of American Economy 1919-1939", 2.ª edição, Nova Iorque, 1951.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Jul 2015
    • Data do Fascículo
      Jun 1966
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