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O exemplo de um pioneiro

EDITORIAL

O exemplo de um pioneiro

"José Longo era um mestre de oficina numa pequena indústria metalúrgica. Homem competente e dedicado, José se orgulhava de três coisas na sua vida: sua filha única, urna criação de perus e o espírito de cooperação que reinava entre os seus subordinados. Certo dia a direção da emprêsa resolveu introduzir algumas modificações no processo de fabricação, que obrigava o velho mestre a separar-se de sua equipe de trabalho. José Longo, porém, não se conformava com a decisão."

Era êsse, em resumo, o "caso" de relações humanas com que se deparava um grupo de alunos ao qual cabia analisar o problema e discuti-lo "à vontade". O professor não interferia; até aparentava certa indiferença durante os debates, muito embora êstes se tornassem cada vez mais calorosos e agitados. Ao terminar a reunião, muitos deixaram a sala de aula profundamente decepcionados. Indagavam: - "Afinal, qual a solução do caso? Que teria acontecido a José Longo?" Aparentemente, o professor ou não tinha respostas a essas perguntas, ou escondia a solução. E muitos chegaram a concluir: - "Êsse professor não vale nada!"

Foi êsse o frustrante resultado da primeira aula na Escola de Administração de Emprêsas de São Paulo, da Fundação Getúlio Vargas! Estávamos em 1954. Local: Rua Martins Fontes. Nome do professor: Dr. KARL A. BOEDECKER, convidado a criar, como primeiro chefe da Missão Universitária Norte-Americana, uma escola-pilôto para administraidores do Brasil. Hoje, dez anos mais tarde, desejamos, ao relembrar êsse incidente, prestar homenagem ao insigne educador.

Não, não é paradoxal. É que naquela ocasião tivemos dificuldade para compreender a mensagem do Prof. BOEDECKER. Sua atitude, contudo, fôra propositada. Desejava provocar nossa revolta a fim de preparar-nos para uma inesquecível lição, a de que Administração de Empresas não se ensina ex-cathedra, como o Evangelho ou a Física Nuclear. Para formar administradores é preciso submetê-los a testes que desenvolvam sua capacidade de julgamento, análise e decisão. Por conseguinte, para a compreensão de um problema o diagnóstico é mais significativo do que o enunciado de sua solução. Esta deve resultar do estudo ponderado das alternativas de ação, e não de uma tomada de posição, freqüentemente preconcebida. Finalmente, o conhecimento de princípios e técnicas facilita o julgamento, mas não deve ser aplicado sem que antes seja adaptado às condições particulares do momento, que nunca se repetem com a mesma conjuntura.

Partindo dessas premissas, BOEDECKER nos demonstrou como os métodos de debate e participação se adaptam ao ensino da Administração, cuja finalidade não consiste em formar especialistas padronizados, mas generalistas informados. Achava êle que dessa maneira poderíamos contribuir melhor para a formação de uma nova classe de empresários, capaz de enfrentar e resolver os problemas que inevitavelmente surgem com o progresso industrial de uma nação em desenvolvimento.

O tempo veio a confirmar o acêrto das teses do saudoso professor. Cremos que isso explica porque, após um decênio de existência e evolução, a EAESP pràticamente não mudou suas diretrizes de ensino, nem sua estrutura departamental.

O que nesse período procuramos fazer foi enriquecer e renovar nosso acervo e ampliar nosso campo de atividade, estendendo-o para outros estados brasileiros e outros países da América do Sul. Também a Revista de Administração de Emprêsas, iniciada em 1961 e cujo volume IV ora se encerra, resultou do esforço de integração das áreas admir nistrativas, que teve como idealizador e primeiro mensageiro o Prof. KARL A. BOEDECKER. de quem mais uma vez nos lembramos por ensejo dêste X.º Aniversário da Escola de Administração de Empresas.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Jul 2015
  • Data do Fascículo
    Dez 1964
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