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Frequência de fatores de risco cardiovascular antes e 6 e 12 meses após gastroplastia

Resumos

OBJETIVO: Comparar a frequência dos fatores de risco cardiovascular (FRCV) em obesos com indicação de gastroplastia no pré-operatório e após o sexto mês e o primeiro ano do procedimento, em usuários do Sistema Único de Saúde. MÉTODOS: Foi realizado estudo observacional, longitudinal, prospectivo e analítico, com seleção consecutiva de obesos com indicação cirúrgica, encaminhados para avaliação cardiológica pré-operatória. O protocolo foi constituído de: história clínica, exame físico, eletrocardiograma, ecocardiograma e dosagens bioquímicas. No presente estudo, foram analisadas as seguintes variáveis: peso, índice de massa corporal (IMC), circunferência abdominal (CA), hipertensão arterial Sistêmica (HAS), diabetes mellitus-tipo 2 (DM), dislipidemia (colesterol LDL elevado; colesterol HDL baixo; hipertrigliceridemia) e síndrome metabólica (SM). Para análise estatística foram utilizados os métodos do Qui-quadrado e Tukey-Kramer. RESULTADOS: A amostra foi constituída de 96 obesos. Desses, 86 eram mulheres com idades entre 18 e 58 anos (mediana de 35 anos). Ao final de seis meses, foi observada redução significante de 88%, 95%, 71%, 89% e 80% na frequência de HAS, colesterol LDL elevado, hipertrigliceridemia, DM e SM. Apenas ao final de 12 meses houve significante e modesta redução na frequência de colesterol HDL baixo (24%) e CA anormal (31%). Em seis meses e um ano ,o peso e o IMC sofreram reduções respectivas de 33,4 e 44,3 kg e de 13,1 e 17,2 kg/m². CONCLUSÃO: O impacto positivo na perda de peso, na redução do IMC, da CA e da frequência dos FRCM mostrou-se extremamente significante após seis meses, e se manteve após um ano da gastroplastia.

Obesidade; Hipertensão; Dislipidemia; Diabetes mellitus tipo 2; Fatores de risco; Gastroplastia


OBJECTIVE: To compare the frequency of cardiovascular risk factors (CVRFs) in obese patients Obesity of the Brazilian Unified Health System (Sistema Único de Saúde - SUS) with indication of bariatric surgery during the preoperative period and after the sixth month and the first year of the procedure. METHODS: An observational, longitudinal, prospective, and analytical study was performed, with consecutive selection of obese patients with indication for surgery referred to preoperative cardiac evaluation. The protocol consisted of: medical history, physical examination, electrocardiogram, echocardiogram, and biochemical analysis. This study analyzed the following variables:weight, body mass index (BMI),waist circumference (WC), systemic arterial hypertension (SAH), diabetes mellitus type 2(DM), dyslipidemia (high LDL cholesterol; low HDL cholesterol; hypertriglyceridemia), and metabolic syndrome (MS). The chi-squared test and the Tukey-Kramer method were used for statistical analysis. RESULTS: The sample was composed of 96 obese people, among which 86 were women, aged between 18 and 58 years old (median 35 years old). At the end of six months, significant reductions of 88%, 95%, 71%, 89%, and 80% in the frequency of SAH, high LDL cholesterol, hypertriglyceridemia, DM, and MS could already be observed. A significant and small reduction in the frequency of low HDL cholesterol (24%) and abnormal WC (31%) was observed only at the end of 12 months. After six months and one year, weight and BMI experienced reductions of 33.4 kg and 44.3 kg, and 13.1 kg/m2 and 17.2 kg/m2, respectively. CONCLUSION: The positive impact on weight loss and the reduction in BMI, WC, and in the frequency of CVRFs are already extremely significant after six months and remain so one year after bariatric surgery.

Obesity; Hypertension; Dyslipidemia; Diabetes mellitus type 2; Risk factors; Bariatric surgery


ARTIGO ORIGINAL

Frequência de fatores de risco cardiovascular antes e 6 e 12 meses após gastroplastia* * Trabalho realizado na Universidade Federal de Alagoas, Maceió, AL, Brasil.

Maria Alayde Mendonça da Silva** ** Autor para correspondência. E-mail: malayde1@uol.com.br (M.A.M. Silva). ; Ivan R. Rivera; Emília Maria W. Barbosa; Maria Angélica C. Crispim; Guilherme C. Farias; Alberto Jorge A. Fontan; Rodrigo A. Bezerra; Larissa Gabriella S. Sá

Hospital Universitário Professor Alberto Antunes, Universidade Federal de Alagoas, Maceió, AL, Brasil

RESUMO

OBJETIVO: Comparar a frequência dos fatores de risco cardiovascular (FRCV) em obesos com indicação de gastroplastia no pré-operatório e após o sexto mês e o primeiro ano do procedimento, em usuários do Sistema Único de Saúde.

MÉTODOS: Foi realizado estudo observacional, longitudinal, prospectivo e analítico, com seleção consecutiva de obesos com indicação cirúrgica, encaminhados para avaliação cardiológica pré-operatória. O protocolo foi constituído de: história clínica, exame físico, eletrocardiograma, ecocardiograma e dosagens bioquímicas. No presente estudo, foram analisadas as seguintes variáveis: peso, índice de massa corporal (IMC), circunferência abdominal (CA), hipertensão arterial Sistêmica (HAS), diabetes mellitus-tipo 2 (DM), dislipidemia (colesterol LDL elevado; colesterol HDL baixo; hipertrigliceridemia) e síndrome metabólica (SM). Para análise estatística foram utilizados os métodos do Qui-quadrado e Tukey-Kramer.

RESULTADOS: A amostra foi constituída de 96 obesos. Desses, 86 eram mulheres com idades entre 18 e 58 anos (mediana de 35 anos). Ao final de seis meses, foi observada redução significante de 88%, 95%, 71%, 89% e 80% na frequência de HAS, colesterol LDL elevado, hipertrigliceridemia, DM e SM. Apenas ao final de 12 meses houve significante e modesta redução na frequência de colesterol HDL baixo (24%) e CA anormal (31%). Em seis meses e um ano ,o peso e o IMC sofreram reduções respectivas de 33,4 e 44,3 kg e de 13,1 e 17,2 kg/m2.

CONCLUSÃO: O impacto positivo na perda de peso, na redução do IMC, da CA e da frequência dos FRCM mostrou-se extremamente significante após seis meses, e se manteve após um ano da gastroplastia.

Palavras-chave: Obesidade; Hipertensão; Dislipidemia; Diabetes mellitus tipo 2; Fatores de risco; Gastroplastia

Introdução

A obesidade é, atualmente, um problema de saúde pública graças a sua crescente prevalência, à elevada taxa de mortalidade que determina e por aumentar a frequência de outras doenças1 quecontribuemparaelevaraindamaisamorbimortalidade nesse grupo de indivíduos2. Dentre essas doenças, estão incluídos os fatores de risco cardiovascular (FRCV) representados pela hipertensão arterial sistêmica (HAS), pelo diabetes mellitus tipo 2 (DM) e pela dislipidemia3-5.

Dentre os métodos antropométricos utilizados para avaliar o excesso de gordura corporal, o índice de massa corporal (IMC), que divide o peso pela altura ao quadrado, tem sido o mais frequentemente utilizado em adultos2,3,6. A obesidade está presente quando o IMC é igual ou acima de 30 kg/m2 2,3,6.

De forma complementar, a circunferência abdominal (CA) tem servido como medida antropométrica da presença de gordura intra-abdominal e foi incorporada como um dos critérios usados no diagnóstico da síndrome metabólica (SM), que é caracterizada por um conjunto de FRCV e pela resistência à insulina, que aumenta a mortalidade cardiovascular em seus portadores3. A SM se encontra presente em mais de 70% dos obesos candidatos à gastroplastia7,8.

No Brasil,a obesidade atinge 13,9% da população,que também apresenta 46,6% de sobrepeso (identificado pelo IMC entre 25 e 29,9kg/m2); em 2006, essas prevalências eram, respectivamente, 11,4 e 42,7%9.

Apesar do impacto positivo do tratamento clínico sobre a obesidade1, há indicação de gastroplastia quando o IMC é superior a 40 kg/m2 ou superior a 35 kg/m2 se associado a doenças crônicas agravadas pela obesidade1,3,10.A gastroplastia passou a constituir, assim, importante estratégia terapêutica da obesidade, sendo o bypass gástrico e a banda gástrica ajustável as mais utilizadas atualmente10,11.

O Ministério da Saúde brasileiro aprovou, em 2000, as indicações para a gastroplastia no SUS12. Calcula-se que, em 2008, foram realizadas, no mundo, 344.221 gastroplastias, sendo 25.000 no Brasil11. Atualmente, são realizadas, no Brasil, em torno de 65.000 ao ano.

Uma metanálise de 134 estudos, envolvendo em torno de 22.000 obesos, demonstrou que a gastroplastia determina, em média, redução de 61% do excesso de peso corporal, 39,7kg do peso corporal, 13,2 kg/m2 no IMC, e melhora importante ou resolução das comorbidades13. A maior perda do excesso de peso e o efeito benéfico sobre as comorbidades ocorrem cerca de um ano após a cirurgia, mantendo-se na maioria dos pacientes14,15. Grande parte desse efeito, entretanto, já pode ser observado nos primeiros seis meses14.

O objetivo do presente trabalho é comparar a frequência dos FRCV em obesos com indicação de gastroplastia (bypass gástrico, de Fobi e Capella16,17) no pré-operatório e após o sexto mês e o primeiro ano do procedimento, em usuários do Sistema Único de Saúde.

Métodos

Foi realizado estudo observacional, longitudinal, prospectivo e analítico de uma amostra de pacientes com diagnóstico de obesidade e indicação de cirurgia bariátrica (gastroplastia)10, inseridos no Programa de Cirurgia Bariátrica do Hospital Universitário Professor Alberto Antunes (HUPAA), da Universidade Federal de Alagoas.

Os pacientes foram consecutivamente encaminhados para avaliação cardiológica pré-operatória e submetidos a um mesmo protocolo de avaliação, que incluiu: história clínica (incluindo o uso regular de medicamentos), exame físico (incluindo medida da pressão arterial, peso, altura, circunferência abdominal), eletrocardiograma de 12 derivações, ecocardiograma e dosagens bioquímicas (glicemia de jejum, colesterol total, colesterol LDL, colesterol HDL, triglicerídeos).

Outros exames cardiológicos foram solicitados segundo a indicação clínica individualizada (Holter de 24 horas, cintilografia miocárdica, cinenagiocoronariografia, entre outros).

Para o diagnóstico de hipertensão arterial sistêmica, dislipidemias, diabetes mellitus tipo 2 e síndrome metabólica foram utilizados os parâmetros constantes nas respectivas diretrizes da Sociedade Brasileira de Cardiologia, atualmente descritos na I Diretriz Brasileira de Diagnóstico e Tratamento da Síndrome Metabólica2.

Para o diagnóstico de obesidade segundo o IMC foram utilizados os critérios da Organização Mundial de Saúde6, também adotados no Brasil: baixo peso (IMC < 18,5 kg/m2), peso normal (IMC entre 18,5 e 24,9 kg/m2), sobrepeso (IMC entre 25 e 29,9 kg/m2), obesidade grau I (IMC = 30,0 a 34,9 kg/m2), II (IMC = 35,0 a 39,9 kg/m2) e III (IMC > 40 kg/m2).2,3 Os obesos graves foram ainda classificados em superobesos (IMC = 50 a 59,9kg/m2) e super-superobesos (IMC > 60kg/m2)2,3,5,6. A circunferência abdominal, medida na distância entre o rebordo costal e a crista ilíaca, foi considerada normal quando abaixo de 88 cm em mulheres, e abaixo de 102 cm em homens2.

Para o presente trabalho, foram analisadas as seguintes variáveis: graus de obesidade segundo o IMC, obesidade central segundo a circunferência abdominal, hipertensão arterial sistêmica, colesterol LDL elevado, colesterol HDL baixo, hipertrigliceridemia, diabetes mellitus tipo 2 e síndrome metabólica2.

O teste do Qui-quadrado foi utilizado para comparação de proporções das variáveis categóricas, e o de Tukey-Kramer para comparações múltiplas das médias das variáveis contínuas, antes e depois da cirurgia bariátrica (no sexto mês e após um ano). Foi adotado o nível de significância de 5% (p < 0,05).

O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFAL (processo 011407/2010-93 de 30/08/2010).

Resultados

No período de janeiro de 2005 a junho de 2010 foram avaliados, do ponto de vista cardiovascular, 155 pacientes obesos com indicação de cirurgia bariátrica de acordo com os critérios estabelecidos pelo Ministério da Saúde do Brasil10. Desses pacientes, 101 foram submetidos à gastroplastia segundo a técnica de Fobi e Capella (tendo ocorrido um óbito nos primeiros dias de pós-operatório, não havendo complicações com os demais), e 96 completaram pelo menos um ano de seguimento clínico pós-operatório, constituindo assim, a amostra do presente estudo. Quanto aos demais 54 pacientes, 32 abandonaram o programa e 22 aguardavam a cirurgia.

No presente estudo, a amostra foi constituída de 10 homens (10%) e 86 mulheres (90%), com idades entre 18 e 58 anos, mediana de 35 anos e média de 37,2 ± 8,4 anos.

Os valores de média e desvio-padrão das variáveis contínuas na avaliação pré-operatória foram, respectivamente: a) peso -124,1 ± 23,3 kg; b) IMC (kg/m2) -48,1 ± 7,0; c) circunferência abdominal -129,7 ± 14,0 cm; d) glicemia de jejum -96,5 ± 26,6 mg/dL; e) colesterol total -200,0 ± 32,7 mg/dL; f) colesterol LDL -125,4 ± 29,0 mg/dL; g) colesterol HDL 41,5 ± 8,6 mg/dL; e g) triglicerídeos 159,2 ± 80,0 mg/dL.

A tabela 1 apresenta a distribuição da amostra segundo os valores de IMC, antes da gastroplastia e seis e doze meses após a intervenção. Nela, pode-se observar que um ano apósa gastroplastia houve redução de 99% na frequência de obesos grau III (permanecendo apenas um indivíduo superobeso), aparecimento de indivíduos com sobrepeso (que passou a constituir 38,5% da amostra), com normalização do IMC em apenas quatro indivíduos (4,2%). Observa-se, também, que, ao final de um ano, 56,3% da amostra apresentou obesidade graus I ou II.

A tabela 2 mostra que o impacto da gastroplastia no controle da pressão arterial, do colesterol LDL, do diabetes e da hipertrigliceridemia e, por conseguinte, da síndrome metabólica atingiu um maior número de pacientes já após seis meses da cirurgia, sem elevação significante nessa proporção de indivíduos nos seis meses seguintes. A redução da circunferência abdominal e a elevação do colesterol HDL abrangeram significantemente um número maior de pacientes um pouco mais tardiamente - apenas após um ano do procedimento. Os resultados metabólicos acima observados foram obtidos mesmo que apenas um pequeno número de pacientes tenha normalizado a concentração de colesterol HDL (24%), a circunferência abdominal (31%) e o IMC (4%) em seis meses ou em um ano após a gastroplastia.

A tabela 3 mostra a média das diferenças dos valores das variáveis contínuas acima mencionadas, do ponto de vista numérico, entre A - o pré-operatório e o sexto mêsde pós operatório; B - o pré-operatório e o décimo segundo mês de pós-operatório;e C- entre o sexto e o décimo segundo meses de pós-operatório, bem como o nível de significância dessas diferenças.

Nela também é possível observar que houve uma redução significante do peso corporal, da circunferência abdominal e do IMC já entre o pré-operatórioeosextomês(*p < 0,001), que persistiu também de forma significante entre o sexto e o décimo segundo meses (*p < 0,001).

Em relação à glicemia de jejum, do colesterol total, do colesterol LDL e dos triglicerídeos observou-se redução significante em suas concentrações já ao final do sexto mês de pós-operatório (*p<0,001), com redução sem significância estatística a partir desse momento até o final do primeiro ano pós-cirurgia (p > 0,05).

De forma particular, o efeito da gastroplastia sobre a elevação d aconcentração do colesterol HDL se fez significante apenas a partir do sexto mês (*p < 0,001).

Os valores de média e mediana das variáveis contínuas seis meses após a gastroplastia foram, respectivamente: a) peso: 90,7 e 89,0 kg; b) IMC: 35,0 e 34,4 kg/m2; c) circunferência abdominal: 106,4 e 107,0 cm; d) glicemia de jejum: 81,6 e 80,0 mg/dL; e) colesterol total: 169,0 e 170 mg/dL; f) colesterol LDL: 106,0 e 107,5 mg/dL; g) colesterol HDL: 43,0 e 43,0 mg/dL; h) triglicerídeos: 96,8 e 87,5mg/dL. Após um ano da realização do procedimento, esses valores foram, respectivamente: a) peso: 80,2 e 78,0 kg; b) IMC: 31,0 e 31,0 kg/m2; c) circunferência abdominal: 95,9 e 95,0 cm; d) glicemia de jejum: 79,0 e 79,0 mg/dL; e) colesterol total: 163,0 e 162,0 mg/dL; f) colesterol LDL: 99,5 e 97,6 mg/dL; g) colesterol HDL: 46,8 e 46,0 mg/dL; h) triglicerídeos: 81,7 e 77,5 mg/dL.

Discussão

Há estimativas de que exista no mundo, atualmente, um bilhão de adultos com sobrepeso e 500 milhões obesos18.Em obesos, o tratamento clínico (mudanças comportamentais e tratamento farmacológico) resulta na redução de apenas 5 a 10% do peso corporal (raramente mantida), enquanto a gastroplastia (geralmente indicada para obesos com IMC > 40 kg/m2) determina redução do peso em torno de 30%, com resultados mantidos em longo prazo19.

Em função dessa importante redução do peso corporal e da gordura visceral, a gastroplastia determina, já em curto prazo,impacto positivo sobre ocontrole/resolução das comorbidades associadas à obesidade, incluindo DM, dislipidemia, HAS, doença hepática, síndrome da apneia/hipopneia obstrutiva do sono e disfunção cardiovascular20. Esse efeito benéfico se mantém em longo prazo, como observado em pacientes seguidos por dez anos após o procedimento10,13,15,20,21,e se traduz na redução de eventos e da mortalidade cardiovascular22, determinando a cirurgia bariátrica como sendo, na atualidade, o tratamento de escolha para obesos graves nos quais a terapia medicamentosa-comportamental falhou no controle do peso e das comorbidades2,10,20.

Uma metanálise de 89 estudos realizados em outros países sobre o impacto da gastroplastia no tratamento da obesidade1 demonstrou que a média de idade dos pacientes é de 38 anos, e que mais de um terço deles é do sexo feminino. Outra metanálise envolvendo 134 estudos e um total de 22.094 pacientes13 demonstrou que 73% são do sexo feminino, com média de idade de 39 anos. Em amostra de 35 obesos submetidos à gastroplastia em hospital universitário brasileiro, Monteiro Junior et al.7 identificaram 88,5% do sexo feminino, com média de idade 38 anos. Como no presente estudo, os dados acima mencionados demonstram que a população que se submete ao tratamento cirúrgico da obesidade é predominantemente do sexo feminino e se encontra na quarta década de vida, provavelmente quando as complicações do excesso de peso corporal se fazem presentes do ponto de vista clínico. Além disso, parece haver maior motivação das mulheres obesas do que dos homens obesos em perder peso, em consequência das pressões sociais a respeito da estética23.

A maior parte dos autores7,13,20,21 relata o impacto da gastroplastia na redução do peso corporal e no controle dos fatores de risco cardiovascular após um a três anos da cirurgia, por considerar esse período clinicamente de maior relevância. Nesse prazo, espera-se redução de 20 a 30kg no peso corporal, em torno de 35% no IMC e resolução da HAS, do DM e da dislipidemia em, respectivamente, 62%, 76% e 70% dos indivíduos7,13,20,21, com um menor impacto sobre a elevação do colesterol HDL e a redução da circunferência abdominal7,13,20,21. No presente trabalho, observa-se que, ao final do sexto mês após a gastroplastia, os resultados esperados e acima descritos já são observados, mantendo-se ao final do primeiro ano.

Quanto aos dados de antropometria, os resultados aqui apresentados demonstram redução média de 33,4kg no peso corporal, de 13,1kg/m2 no IMC (redução de 27%) e de 23,3cm na circunferência abdominal seis meses após a gastroplastia. Santos24, avaliando 15 obesos seis meses após a gastroplastia, observou redução média de 41kg no peso corporal e 15,4kg/m2 no IMC (redução de 28%). Em ambos os trabalhos foi identificada uma antecipação dos resultados positivos da gastroplastia sobre o peso corporal e o IMC, mencionados em outros grupos como relevantes apenas ao final do primeiro ano7,13,20,21.

Na análise da frequência dos diversos fatores de risco cardiovascular, observou-se no presente estudo, já no sexto mês, uma drástica redução na prevalência da HAS (53% X *6% X 8%), do colesterol LDL elevado (21% X *1% X 3%), do DM (28% X *3% X 2%) e da síndrome metabólica (69% X *14% X 5%), sem diferença significante nessas frequências entre o sexto mês e oprimeiro anopós-procedimento. Essa redução, situada entre 71 e 95%, excede aquela mencionada (entre 60 e 70%) em metanálises envolvendo mais de 30 mil pacientes submetidos à gastroplastia13,21, o que demonstra a importância da avaliação mais precoce desses pacientes para os ajustes nutricionais que se fizerem necessários em função da acelerada perda de peso e, por conseguinte, de nutrientes essenciais25.

As concentrações de colesterol HDL se elevaram tardiamente, de modo que apenas ao final de um ano foi observada redução significante da frequência de indivíduos com melhora nessa variável (81% X 76% X *61%), um comportamento semelhante ao observado com a redução da circunferência abdominal, que normalizou, significantemente, em 31% da amostra apenas ao final do primeiro ano pós-cirurgia (100% X 93% X *69%). Monteiro et al. observaram redução de 45,8% na circunferência abdominal de obesos três anos após a cirurgia bariátrica7, de forma que a redução observada de 31% na presente série parece seguir o curso natural esperado após a intervenção cirúrgica20. A lenta elevação das concentrações de colesterol HDL tem sido observada após a redução do peso corporal em todos os indivíduos submetidos à cirurgia bariátrica, com maior impacto naqueles submetidos à cirurgia de bypass20 .

A redução das concentrações de triglicerídeos ocorreu de forma significativa ao longo do primeiro ano de pósoperatório, com redução significante da prevalência da hipertrigliceridemia tanto ao final do sexto mês quanto ao final do primeiro ano de seguimento (44% X *12,5% X *1%). É sabido que as concentrações de triglicerídeos são reduzidas de forma consistente imediatamente após a cirurgia e são mantidas em longo prazo, mesmo que o paciente volte a ganhar peso20. Reduções de maior magnitude são observadas após a realização da cirurgia de bypass gástrico, quando comparada à cirurgia restritiva13,15.

A melhora do perfil lipídico de obesos determinada pela gastroplastia, como também observado na presente investigação, parece estar relacionada à redução do peso e à consequente melhora da sensibilidade hepática à insulina; entretanto, o mecanismo exato para esses benefícios ainda não está totalmente esclarecido20.

Os achados acima demonstram, de forma inquestionável, a eficácia da gastroplastia no tratamento da obesidade em pacientes selecionados2,10,20, sendo interessante pontuar que o efeito benéfico observado no perfil metabólico e cardiovascular da população estudada ocorreu após seis meses ou um ano de seguimento, mesmo com a normalização do IMC, nesse momento, tendo sido obtida por apenas 4% da amostra. Em conjunto, os resultados apresentados demonstram a importância, para esses pacientes, da manutenção das ações nutricionais e comportamentais que contribuirão para a obtenção do peso ideal2 e para que não ocorram ganhos de peso que os façam retornar às situações de risco nas quais se encontravam antes da gastroplastia20.

Além disso, considerando que pacientes submetidos à cirurgia bariátrica evoluem com maior risco de desenvolver deficiências nutricionais, causadas pela consequente limitação na ingestão e na absorção de diferentes nutrientes que eles passam a apresentar26, o presente trabalho também demonstra a necessidade de que a avaliação nutricional que norteará, de forma ininterrupta, essa suplementação, deva ser realizada de forma precoce após a gastroplastia. Assim, será possível identificar rapidamente o essencial para a reposição adequada dos nutrientes que se vão fazendo necessários26.

Em 1998, foram realizadas 40.000 cirurgias bariátricas no mundo, em 2003 foram 146.301, em 2008, 344.221, de forma que, entre 1998 e 2003, ocorreu um incremento de 266% nas cirurgias realizadas; entre 2003 e 2008 o incremento foi de 125% e, considerando o intervalo entre 1998 e 2008, o incremento foi de 761%11. A segurança na realização desse procedimento, representada por baixas taxas (4,3%) de complicações precoces e tardias (tromboembolismo venoso, reintervenções cirúrgicas, internações prolongadas) e uma mortalidade de 0,3% no primeiro mês de pós-operatório em amostras com milhares de pacientes27, aliada aos bons resultados acima mencionados, justificam a sua inserção como importante estratégia no tratamento da obesidade2,10,12,20 grave. No presente trabalho foi identificada mortalidade no primeiro mês de pós-operatório de 0,9% (1/101 pacientes), causada por tromboembolismo pulmonar fatal, não tendo sido identificadas outras complicações.

Em função dos resultados aqui apresentados, concluímos que o impacto positivo determinado pela gastroplastia na perda de peso, na redução do IMC, da circunferência abdominal e da frequência dos fatores de risco cardiovascular já é extremamente significante após seis meses, e se mantém após um ano da realização do procedimento.

Conflitos de interesse

Os autores declaram não haver conflitos de interesse.

Agradecimentos

Os autores agradecem ao Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica CNPq/UFAL pela concessão de bolsas a alunos que participaram da realização do presente trabalho.

Recebido em 30 de outubro de 2012

Aceito em 21 de fevereiro de 2013

On-line em 16 de julho de 2013

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    Trabalho realizado na Universidade Federal de Alagoas, Maceió, AL, Brasil.
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    Autor para correspondência. E-mail:
    malayde1@uol.com.br (M.A.M. Silva).
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      09 Set 2013
    • Data do Fascículo
      Ago 2013

    Histórico

    • Recebido
      30 Out 2012
    • Aceito
      21 Fev 2013
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