Acessibilidade / Reportar erro

O uso do poder público de compra em políticas industriais: uma comparação entre Brasil e Japão

El uso del poder público de compra en políticas industriales: una comparación entre Brasil y Japón

Resumo

Este artigo examina a iniciativa implementada a partir de 2010 pelo governo brasileiro de concessão de margens de preferência em licitações para empresas que manufaturam seus produtos no Brasil ou realizam atividades de P&D em território nacional. Discute-se também como o governo japonês, antes de seu ingresso na OMC em 1995, utilizou-se de processos licitatórios como forma de promover o crescimento de empresas locais. O presente estudo argumenta que, enquanto a abordagem japonesa adotada antes de 1995 foi eficiente em criar parcerias entre o governo e firmas nacionais focadas no alcance de objetivos de políticas industriais em setores de impacto na economia, a política recentemente adotada pelo governo brasileiro apresenta a vantagem de possuir procedimentos mais transparentes e isonômicos.

Palavras-chave:
administração pública; política industrial; licitação

Resumen

Este artículo examina la iniciativa implementada por el gobierno brasileño a partir de 2010 de concesión de márgenes de preferencia en licitaciones para empresas que fabrican sus productos en Brasil o realizan actividades de I&D en el territorio nacional. Se discute también cómo el gobierno japonés, antes de su ingreso en la OMC en 1995, se utilizó de procesos licitatorios como forma de promover el crecimiento de empresas locales. El presente estudio argumenta que, mientras que el enfoque japonés adoptado antes de 1995 fue eficiente en crear alianzas entre el gobierno y las empresas nacionales enfocadas en el logro de objetivos de políticas industriales en sectores de impacto en la economía, la política recientemente adoptada por el gobierno brasileño presenta la ventaja de poseer procedimientos más transparentes e isonómicos.

Palabras clave:
administración pública; política industrial; licitación

Abstract

This article examines the policy implemented in 2010 by the Brazilian government that offers margins of preference in public bids to firms manufacturing their products or engaged in R&D activities in the country. It discusses how the Japanese government used public procurement as a tool to promote the growth of domestic firms before the country became a member of the WTO in 1995. This study argues that, while the Japanese approach adopted before 1995 was efficient for creating more significant partnerships between the government and key domestic firms to achieve industrial policy objectives in strategic sectors, the recently implemented Brazilian policy has the advantage of being more accountable and transparent.

Keywords:
public administration; industrial policy; public procurement

1. INTRODUÇÃO

Este artigo examina a política implementada pelo governo brasileiro a partir de 2010, voltada à concessão de margens de preferência para empresas que realizam atividades manufatureiras ou de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) no país. Discute-se também como o governo japonês utilizou-se de processos licitatórios como instrumentos para promover o crescimento de empresas nacionais antes de seu ingresso no Acordo de Compras Governamentais (GPA) da Organização Mundial do Comércio (OMC) em 1995. Ao final, realiza-se uma breve comparação entre a atual política brasileira de concessão de margens de preferência e a abordagem utilizada pelo governo japonês no período anterior à sua adesão ao GPA.

Para o exame da experiência japonesa de fomento à indústria nacional no período pós-guerra, o presente estudo baseia-se em uma extensa revisão bibliográfica. Já no que tange à experiência brasileira, além da análise da literatura, são apresentados dados quantitativos disponibilizados pelo governo federal sobre a política de concessão de margens de preferência. Apesar da diferença temporal entre os dois casos, tal esforço comparativo é relevante por contrastar duas abordagens adotadas por países distintos em épocas em que não eram vinculados ao GPA - o Brasil ainda não é signatário desse acordo, enquanto o Japão o assinou em 1995 - e, portanto, sofriam menor pressão para abrir seus processos internos de compra à competição internacional e possuíam maior flexibilidade para utilizar de forma plena seu poder público de compra para fomentar a indústria local.

Licitações podem ser definidas como o processo por intermédio do qual o governo cria, administra e consolida contratos relacionados com a aquisição de bens, realização de obras públicas, fornecimento de serviços ou prestação de consultorias. Como as licitações envolvem uma quantidade significativa de recursos financeiros - estimados em 15% do produto interno bruto de países desenvolvidos e 20% para países emergentes (Padhi e Mohapatra, 2011PADHI, Sidhartha S.; MOHAPATRA, Pratap K. J. Detection of collusion in government procurement auctions. Journal of Purchasing & Supply Management, v. 17, n. 4, p. 207-221, 2011.:207) -, elas podem ser usadas como estratégias baseadas na demanda, ou pull strategy, para fomentar a produção local e o investimento em P&D (Chaudhuri, 2010CHAUDHURI, Sudip. R&D for development of new drugs for neglected diseases in India. International Journal of Technology and Globalisation, v. 5, n. 1/2, p. 61-75, 2010.:62).

No âmbito internacional, o GPA se destina a promover a ampla concorrência em licitações em nível global, incentivando as nações signatárias a abrirem seus processos licitatórios à competição internacional (The National Board of Trade, 2004THE NATIONAL BOARD OF TRADE. Consequences of the WTO-agreements for developing countries. Estocolmo: Kommerskollegium, 2004.:107). Antes de seu ingresso ao GPA, o Japão fez uso de medidas protecionistas em licitações para incentivar o desenvolvimento de empresas domésticas. Por não ser signatário do referido acordo, o Brasil ainda possui flexibilidade para conceder tratamento diferenciado a tipos selecionados de empresas em seus processos de compras governamentais. Tendo em vista o volume expressivo de recursos mobilizados em licitações e a necessidade de se promover maior dinamismo na indústria nacional de países em desenvolvimento, é relevante a análise comparativa de diferentes abordagens de priorização de empresas locais em compras públicas.

2. O SISTEMA DE COMPRAS PÚBLICAS NO JAPÃO E O RELACIONAMENTO ENTRE O ESTADO E AS EMPRESAS LOCAIS

O Japão possui uma longa história de relacionamento colaborativo entre os setores público e privado visando ao alcance do desenvolvimento econômico. Os altos índices de crescimento observados no país nas décadas de 1970 e 1980 foram o resultado de políticas industriais focadas no estímulo de setores industriais considerados estratégicos para promover o dinamismo industrial (Johnson, 1982JOHNSON, Chalmers A. Miti and the Japanese miracle: the growth of industrial policy, 1925-1975. Stanford: Stanford University Press, 1982.; Evans, 1995EVANS, Peter. Embedded autonomy: States and industrial transformation. Princeton: Princeton University Press, 1995.). Dore (2000DORE, Ronald. Stock Market Capitalism: Welfare capitalism - Japan and Germany versus the Anglo-Saxons. Nova York: Oxford University Press, 2000.:44) assevera que a burocracia estatal japonesa desempenhou um forte papel regulatório no mercado, por intermédio da extensa utilização de recomendações governamentais (gyōsei shidō 行政指導). Esse mecanismo foi amplamente usado pela administração pública japonesa como um tipo de recomendação ou aconselhamento que, apesar de informal, era rapidamente obedecido pelo setor privado (Haley, 1991HALEY, John O. Authority without power: law and the Japanese paradox. Nova York: Oxford University Press, 1991.). Na verdade, estudos do período Meiji (1868-1912) já mostram o forte intervencionismo do Estado japonês, revelando que o capitalismo no país desenvolveu-se sob a proteção e subsídio do Estado (Norman, 2000NORMAN, Herbert E. Japan’s emergence as a modern State - political and economic problems of the Meiji period. Edição comemorativa de 60 anos. Vancouver: University of British Columbia Press, 2000.:111). No período pós-guerra, o governo japonês utilizou diversos mecanismos para estimular o crescimento de empresas nacionais, tais como barreiras tarifárias e políticas de promoção à exportação.

No caso da indústria automotiva, por exemplo, o governo japonês adotou uma política de promoção à exportação visando aprimorar o padrão de qualidade dos carros japoneses e criar demanda para os produtos produzidos no mercado doméstico. Em outros setores, entretanto, o governo optou por diferentes mecanismos para estimular o crescimento de empresas domésticas, incluindo o poder público de compra (Lember, Kattel e Kalvet, 2014bLEMBER, Veiko; KATTEL, Rainer; KALVET, Tarmo. Introduction. In: LEMBER, Veiko; KATTEL, Rainer; KALVET, Tarmo (Ed.). Public procurement, innovation and policy: international perspectives. Heidelberg: Springer, 2014b. p. 1-11.:2). Woodall (1996WOODALL, Brian. Japan under construction: corruption, politics, and public works. Berkeley: University of California Press, 1996.:34-35) assevera que várias grandes empresas japonesas na área de construção civil prosperaram em função de contratos firmados com o governo para a construção de prédios públicos, rodovias etc. Além disso, nos setores de alta tecnologia, o governo japonês utilizou-se do poder público de compras para gerar uma demanda estável para produtos domésticos. Conforme ressalta Patrick (1986PATRICK, Hugh. Japanese high technology industrial policy in comparative context. Working Paper n. 1, Center on Japanese Economy and Business, Graduate School of Business. Columbia: Columbia University, 1986.:24-25), as compras governamentais, incluindo de empresas públicas como a NTT, proporcionaram um mercado imenso protegido por uma ampla quantidade de regulações e incentivos fiscais, estimulando a compra de produtos japoneses. Assim, o padrão de relacionamento próximo entre os setores público e privado no Japão também pode ser observado em processos licitatórios, nos quais o governo priorizou contratações de firmas domésticas, a fim de estimular empreendedores locais.

As principais legislações japonesas que regem o processo de compras públicas foram promulgadas na década de 1940, durante o período Shōwa (1926-1989), e ainda se encontram vigentes, apesar de terem sofrido uma série de alterações ao longo do tempo. Tais normativos são os seguintes: (i) Lei de Contabilidade Pública (Lei no 35, de 31 de março de 1947), que regulamenta licitações no âmbito do governo central; e (ii) Lei de Autonomia Regional (Lei no 67, de 17 de abril de 1947), que regula licitações no âmbito dos governos regionais (Kusunoki, 2007KUSUNOKI, Shigeki. Japan’s government procurement regimes for public works: a comparative introduction. Brooklyn Journal of International Law, v. 32, n. 2, p. 523-552, 2007.:525-526).

Existem três modalidades principais de seleção de fornecedores no sistema japonês de compras públicas: (1) licitações de concorrência aberta; (2) licitações de concorrência restrita; e (3) licitações sem concorrência ou contratações diretas (Kusunoki, 2007KUSUNOKI, Shigeki. Japan’s government procurement regimes for public works: a comparative introduction. Brooklyn Journal of International Law, v. 32, n. 2, p. 523-552, 2007.:526; Griek, 2014GRIEK, Lyckle. Government procurement in Japan: obstacles and opportunities for European SMEs. EU-Japan Centre for Industrial Cooperation, 2014. Disponível em: <Disponível em: htp://www.eu-japan.eu/sites/default/files/publications/docs/public-procurement-japan-report_2014.pdf >. Acesso em:20 mar. 2018.
htp://www.eu-japan.eu/sites/default/file...
:25).

Nas licitações de concorrência aberta, qualquer empresa registrada que atenda aos requisitos e pré-qualificações pode participar. Essa modalidade de licitação é a regra geral para aquisições governamentais, conforme previsto no art. 29-3 da Lei de Contabilidade Pública.

Ao contrário, nas licitações de concorrência restrita, apenas empresas convidadas pelos órgãos públicos podem dar lances. Essa modalidade é utilizada prioritariamente em casos nos quais se espera que somente um número restrito de empresas poderá participar do certame em função da natureza especializada do objeto da licitação. Cumpre destacar, entretanto, que o art. 29-3, seções 3 e 5, da Lei de Contabilidade Pública faculta também o uso desse tipo de licitação para outros casos previstos em leis específicas (Kusunoki, 2007KUSUNOKI, Shigeki. Japan’s government procurement regimes for public works: a comparative introduction. Brooklyn Journal of International Law, v. 32, n. 2, p. 523-552, 2007.:527; Griek, 2014GRIEK, Lyckle. Government procurement in Japan: obstacles and opportunities for European SMEs. EU-Japan Centre for Industrial Cooperation, 2014. Disponível em: <Disponível em: htp://www.eu-japan.eu/sites/default/files/publications/docs/public-procurement-japan-report_2014.pdf >. Acesso em:20 mar. 2018.
htp://www.eu-japan.eu/sites/default/file...
:28).

Finalmente, nas licitações sem concorrência ou contratações diretas, o órgão público contata fornecedores específicos e realiza diretamente a negociação. Esse tipo de procedimento é usado nos casos descritos no art. 29-3, seções 4 e 5, da Lei de Contabilidade Pública, em especial quando há urgência na contratação ou na ocorrência de uma licitação deserta (Kusunoki, 2007KUSUNOKI, Shigeki. Japan’s government procurement regimes for public works: a comparative introduction. Brooklyn Journal of International Law, v. 32, n. 2, p. 523-552, 2007.:527; Griek, 2014GRIEK, Lyckle. Government procurement in Japan: obstacles and opportunities for European SMEs. EU-Japan Centre for Industrial Cooperation, 2014. Disponível em: <Disponível em: htp://www.eu-japan.eu/sites/default/files/publications/docs/public-procurement-japan-report_2014.pdf >. Acesso em:20 mar. 2018.
htp://www.eu-japan.eu/sites/default/file...
:29). Essa modalidade também é utilizada quando a natureza do objeto se mostra incompatível com a competição, como nos casos em que a troca de um fornecedor pode trazer prejuízos relacionados com a interoperabilidade de equipamentos (Griek, 2014:29).

O Japão iniciou um processo de adaptação de seu sistema licitatório interno às exigências da OMC em dezembro de 1995, a partir de sua adesão ao GPA (Kusunoki, 2007KUSUNOKI, Shigeki. Japan’s government procurement regimes for public works: a comparative introduction. Brooklyn Journal of International Law, v. 32, n. 2, p. 523-552, 2007.:523). O GPA destina-se a abrir o processo licitatório das nações signatárias à competição internacional (The National Board of Trade, 2004:107) e traz uma série de restrições a práticas discriminatórias, tais como a vedação de tratamento privilegiado com base na nacionalidade do capital de empresas ou no local de origem da produção do bem ou serviço ofertado. O resultado da adesão do Japão a esse tratado foi uma pressão para que alterasse sua legislação de modo a ampliar a possibilidade de participação de empresas estrangeiras nos seus processos licitatórios (Gier, 1996GIER, Jean H. Japan’s implementation of the WTO agreement on government procurement. Journal of International Economic Law, v. 17, n. 2, p. 605-657, 1996.:639). A pressão por reformas na legislação licitatória japonesa foi intensificada na década de 1990 em função de críticas generalizadas contra práticas de conluio (dangō 談合) em licitações de obras públicas, envolvendo políticos, servidores públicos e empresas locais (Woodall, 1996WOODALL, Brian. Japan under construction: corruption, politics, and public works. Berkeley: University of California Press, 1996.:2; Ohashi, 2009OHASHI, Hiroshi. Effects of transparency in procurement practices on government expenditure: a case study of municipal public works. Review of Industrial Organization, v. 34, n. 3, p. 267-285, 2009.:268; Ohno e Harada, 2006OHNO, Taishi; HARADA, Yuhei. A comparison of tendering and contracting systems for public works between Japan, the United States and EU countries. Government Auditing Review, v. 13, p. 49-71, 2006.:54; Arai, 2013ARAI, Koki. Effect of Institutions: Analysis of Japanese municipal public procurement. International Journal of Public Administration, v. 36, n. 9, p. 638-648, 2013.).

Em resposta a essa pressão, foi introduzida uma série de mudanças normativas que incluiu a ampliação da esfera de alcance da legislação de compras públicas aos governos regionais, bem como a adoção de critérios licitatórios internacionais, de modo a permitir uma maior participação de empresas estrangeiras em licitações japonesas (Gier, 1996GIER, Jean H. Japan’s implementation of the WTO agreement on government procurement. Journal of International Economic Law, v. 17, n. 2, p. 605-657, 1996.:656).

Uma das consequências de tais mudanças foi a intensificação do uso de licitações de concorrência aberta pelo governo central. Na verdade, antes da entrada em vigor do Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (Gatt) no Japão em 1981, o país fez parca utilização de licitações de concorrência aberta em suas compras públicas e a segunda modalidade, licitações de concorrência restrita, foi mais amplamente empregada (Gier, 1996GIER, Jean H. Japan’s implementation of the WTO agreement on government procurement. Journal of International Economic Law, v. 17, n. 2, p. 605-657, 1996.:620). De fato, era comum que os governos regionais fizessem extenso uso dos mecanismos e dispositivos legais disponíveis para beneficiar firmas locais em seus processos licitatórios. Gier (1996:639-640) afirma que a priorização de firmas locais pelos governos regionais no Japão constituía uma verdadeira “lei não escrita” em licitações. Isso era feito por intermédio da exigência de requisitos que firmas localizadas em outras províncias não conseguiriam preencher, como possuir uma filial ou escritório sede em seu território para participar do certame. Embora atualmente a utilização das licitações de concorrência restrita ainda seja bastante frequente pelos governos locais, o governo central japonês já realiza aproximadamente 80% de suas compras públicas por meio de licitações de concorrência aberta (Griek, 2014GRIEK, Lyckle. Government procurement in Japan: obstacles and opportunities for European SMEs. EU-Japan Centre for Industrial Cooperation, 2014. Disponível em: <Disponível em: htp://www.eu-japan.eu/sites/default/files/publications/docs/public-procurement-japan-report_2014.pdf >. Acesso em:20 mar. 2018.
htp://www.eu-japan.eu/sites/default/file...
:27-28)

Dessa forma, observa-se que, no período anterior ao seu ingresso no GPA, o governo japonês fez amplo uso das licitações de concorrência restrita como forma de escolher fornecedores específicos ao invés de promover processos licitatórios mais abertos e competitivos. Isso permitiu um relacionamento mais próximo entre o governo e seus fornecedores, o que facilitou a construção de projetos conjuntos de uso do poder público de compras para estimular empreendedores locais. Argumenta-se que essa maior proximidade no relacionamento entre governo e empresas privadas em setores estratégicos é fundamental para o planejamento e implementação de políticas voltadas ao fomento da indústria doméstica.

Como comentário final, cumpre assinalar que tal relacionamento próximo entre representantes dos setores público e privado resultou em inúmeros casos de fraudes em licitações. Não obstante, conforme assinala Woodall (1996WOODALL, Brian. Japan under construction: corruption, politics, and public works. Berkeley: University of California Press, 1996.:50), apesar da existência, no Japão da década de 1990, de uma rede de cartéis na área de obras públicas de engenharia, o nível de qualidade da infraestrutura japonesa manteve-se elevado. Enquanto em outros países obras públicas são pagas e nunca concluídas, é extremamente rara a constatação de estradas, túneis ou outras estruturas públicas de má qualidade no Japão. Em suma, mesmo quando o processo licitatório era fraudulento, as empresas contratadas mantinham elevados níveis de responsabilidade no cumprimento exato das especificações do governo.

3. O USO DE MARGENS DE PREFERÊNCIA EM LICITAÇÕES PARA ESTIMULAR A INDÚSTRIA DOMÉSTICA NO BRASIL

Entre 2013 e 2017, o governo federal brasileiro despendeu um montante significativo de recursos financeiros em compras públicas, que perfazem uma média aproximada de R$ 95 bilhões (Painel de Compras do Governo Federal, 2018PAINEL DE COMPRAS DO GOVERNO FEDERAL. Painel de compras do governo federal. Disponível em: <Disponível em: http://www.comprasgovernamentais.gov.br/index.php/painel-de-compras-de-governo >. Acesso em: 15 fev. 2018.
http://www.comprasgovernamentais.gov.br/...
). Há, portanto, justificativas econômicas para que se procure utilizar parte desse montante para promover o dinamismo industrial no país.

O sistema licitatório brasileiro é regulado precipuamente pela Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993. Existe, entretanto, uma série de leis esparsas prevendo a concessão de tratamento diferenciado a determinados tipos de firmas, tais como microempresas (ME) e empresas de pequeno porte (EPP), ou a empreendimentos que atendam a determinadas condições. Uma das formas concebidas pelo governo de usar o poder público de compras para alavancar empresas locais foi implementada pela Lei no 12.349, de 15 de dezembro de 2010. O referido instrumento normativo promoveu relevante alteração na Lei no 8.666, de 21 de junho de 1993, comandando que as licitações passem a adotar como objetivo não só a igualdade de oportunidades entre os participantes e a busca da proposta mais vantajosa para a administração pública, mas também a promoção do desenvolvimento sustentável do país. Assim, o princípio da promoção do desenvolvimento nacional deve ser harmonizado aos princípios da eficiência e isonomia nas compras públicas.

Na verdade, esforços para utilizar o poder público de compras para fomentar a indústria nacional já foram implementados pelo governo brasileiro no passado. Por exemplo, há um rol significativo de instrumentos normativos destinados a priorizar ME e EPP, bem como empresas locais e que investem em P&D no país em licitações brasileiras, tais como a Lei no 8.248, de 23 de outubro de 1991, a Lei no 11.196, de 21 de novembro de 2005, e a Lei Complementar no 123, de 14 de dezembro de 2006. Além disso, a política industrial adotada em 2008, intitulada Política de Desenvolvimento Produtivo, prevê explicitamente o uso do poder de compra do governo para fomentar a indústria brasileira em vários setores. Não obstante, a Lei no 12.349/2010 é peculiar por conceder uma margem de preferência em um percentual significativo para empresas locais, e por prever de forma objetiva que as licitações brasileiras agora também são norteadas pelo princípio da promoção do desenvolvimento sustentável do país.

A lei em apreço prevê a concessão de margens de preferência normal e adicional para empresas que produzam ou estejam engajadas em atividades de P&D no país. A margem de preferência normal é concedida a empresas que manufaturem seus produtos em solo brasileiro e é calculada a partir do lance de menor preço ofertado por uma empresa detentora de produto estrangeiro. A margem de preferência adicional é concedida de modo complementar à margem de preferência normal para empresas que, além de produzirem no país, estejam engajadas em atividades de P&D no território nacional. O percentual de cada uma dessas margens é definido por decreto específico para cada setor industrial, cuja promulgação constitui pré-requisito para que tais margens sejam efetivamente utilizadas em licitações. O somatório das duas margens não pode ultrapassar 25%.

Dados apresentados na tabela 1demonstram que o valor despendido em licitações que concederam as referidas margens de preferência de 2013 a 2017 perfaz um montante expressivo, ultrapassando em média a cifra de R$ 1,8 bilhão.

Tabela 1
Utilização das margens de preferência em licitações realizadas pelo governo federal (R$ bilhões)

Constata-se, entretanto, pela análise da tabela, que na maioria das licitações elegíveis para a aplicação das margens de preferência tal benefício não foi utilizado. Além disso, observa-se que as margens de preferência constituem um benefício genérico e não há possibilidade de concessão para empresas específicas com quem o governo eventualmente tenha interesse em construir um plano conjunto de desenvolvimento e expansão industrial. Da forma como essa política está sendo implementada, torna-se difícil o processo de monitoramento e avaliação se os recursos financeiros alocados para a concessão do benefício estão de fato agindo em prol do desenvolvimento nacional.

Para estimular o crescimento de empresas locais estratégicas, não parece ser suficiente a simples criação de um potencial mercado comprador para seus produtos. É necessário estabelecer um padrão de relacionamento mais próximo entre o governo e essas empresas para um processo de fomento mais eficaz. Dessa forma, o governo será capaz de responder de forma efetiva às necessidades das empresas locais e fazer com que invistam em atividades de manufatura e P&D alinhadas às expectativas governamentais. Portanto, apesar de ser uma importante estratégia baseada na demanda, o mecanismo de concessão de margens de preferência deve ser complementado com outras iniciativas de forma a garantir que os objetivos de políticas industriais sejam de fato alcançados.

4. O USO DO PODER PÚBLICO DE COMPRA NO FOMENTO DA INDÚSTRIA NACIONAL: UMA COMPARAÇÃO ENTRE BRASIL E JAPÃO

Observa-se a existência de diferenças substanciais nas abordagens apresentadas nas seções anteriores de uso do poder público de compras para estimular o crescimento da indústria local. No período anterior ao seu ingresso no GPA, embora a legislação japonesa compelisse os órgãos públicos a utilizarem as licitações de concorrência aberta como a modalidade primordial em compras públicas, o Japão fez maior uso de licitações de concorrência restrita, como forma de beneficiar empresas domésticas em suas contratações. Essa postura encontra-se em sintonia com a abordagem adotada pelo governo japonês de promover parcerias entre os setores público e privado visando ao alcance de altos níveis de desenvolvimento industrial, especialmente no período pós-guerra, em setores considerados estratégicos (Johnson, 1982JOHNSON, Chalmers A. Miti and the Japanese miracle: the growth of industrial policy, 1925-1975. Stanford: Stanford University Press, 1982.; Evans, 1995EVANS, Peter. Embedded autonomy: States and industrial transformation. Princeton: Princeton University Press, 1995.; Dore, 2000DORE, Ronald. Stock Market Capitalism: Welfare capitalism - Japan and Germany versus the Anglo-Saxons. Nova York: Oxford University Press, 2000.). É certo que a tendência de priorizar firmas domésticas no Japão resultou em forte tensão entre o país e outras nações desenvolvidas, em especial os Estados Unidos, e houve pressão para ampliar a participação de empresas estrangeiras em contratações públicas japonesas (Woodall, 1996WOODALL, Brian. Japan under construction: corruption, politics, and public works. Berkeley: University of California Press, 1996.). Não obstante, esse relacionamento próximo entre governo e fornecedores funcionou como importante auxílio no estímulo de empresas locais e garantiu a entrega de obras públicas de acordo com as especificações.

O mecanismo criado pelo governo brasileiro para beneficiar firmas locais, por outro lado, possui a vantagem de ser mais transparente. A lei de licitações brasileira foi alterada de forma a definir as situações nas quais as margens de preferência poderão ser utilizadas e os requisitos que as empresas deverão preencher para se tornarem elegíveis ao benefício. Constitui, dessa forma, um mecanismo previsto na legislação e cuja aplicação deve ser formalizada mediante os procedimentos técnicos previstos. É passível de maior controle, uma vez que qualquer cidadão pode acompanhar e questionar sua aplicação em determinado processo licitatório. Como desvantagem, todavia, as autoridades públicas brasileiras possuem menor autonomia para escolher empresas que pretendem fomentar e não há meios de se conceder o benefício a um produtor específico em determinado nicho industrial considerado estratégico para o crescimento do país. Dessa forma, tais autoridades não poderão criar parcerias de longo prazo com fornecedores locais detentores de alto potencial de crescimento em setores industriais estratégicos. Não há nada que se possa fazer, por exemplo, se um contrato que poderia ser utilizado para estimular o crescimento de uma empresa doméstica envolvida em atividades relevantes de P&D acabe sendo adjudicado a uma multinacional que não realize nenhum investimento em áreas produtivas ou de pesquisa no país. Além disso, há o risco de que as margens de preferência possam beneficiar empresas locais que não estejam promovendo atividades que possam de fato gerar dinamismo industrial em setores estratégicos. Empresários oportunistas, por exemplo, podem iniciar temporariamente a manufatura de bens no país, importando componentes ou módulos pré-montados (completely Knocked-down parts ou CKD), tornando-se elegíveis ao recebimento das margens, mas sem realizar atividades manufatureiras agregadoras de valor. Assim, o governo brasileiro pode acabar adquirindo bens por um preço substancialmente acima de seu valor no mercado, sem a garantia de que tais recursos financeiros estejam confluindo para empresas locais com real potencial de crescimento e capacidade de gerar desenvolvimento industrial.

Outra diferença relevante entre as duas abordagens é que o Japão, no período anterior ao seu ingresso no GPA, atribuiu grande ênfase ao desenvolvimento de empresas japonesas, enquanto a política brasileira de concessão de margens de preferência tem como objetivo incentivar a realização de atividades de manufatura e P&D no país, independentemente da origem do capital das empresas beneficiárias.

5. CONCLUSÃO

O presente artigo dedicou-se à análise comparativa de duas abordagens de uso do poder público de compras para fomentar a indústria nacional: a utilizada pelo Japão antes de seu ingresso no GPA em 1995 e a usada pelo Brasil a partir do advento da Lei no 12.349/2010.

A abordagem brasileira apresenta a vantagem de se mostrar como um mecanismo mais transparente e com maior possibilidade de monitoramento e controle, por estar previsto em instrumentos legais. Os principais impactos positivos dessa abordagem são os seguintes: (i) disponibilização de informações objetivas sobre o benefício, permitindo que empresas interessadas possam adaptar suas estruturas manufatureiras para o recebimento das margens; (ii) estímulo à competitividade entre empresas locais elegíveis ao recebimento das margens; (iii) clareza na comunicação com empresas não elegíveis ao benefício, permitindo que compreendam por que não estão sendo beneficiadas e como devem agir se quiserem se tornar elegíveis. Como desvantagem, essa iniciativa brasileira tende a ser menos eficaz na construção de um relacionamento de longo prazo com fornecedores locais com potencial de crescimento em setores industriais estratégicos.

Já a abordagem japonesa apresenta-se mais eficaz na construção de um relacionamento duradouro com fornecedores nacionais, permitindo que as autoridades públicas consigam fomentar de forma plena as empresas japonesas que consideram relevantes para promover o dinamismo industrial em áreas estratégicas. A deficiência dessa abordagem, entretanto, é que se mostra menos comprometida com a transparência, resultando em um forte sentimento de injustiça por parte das empresas não beneficiadas, sobretudo as firmas estrangeiras interessadas em participar de processos licitatórios, e causando possíveis tensões com outras nações, como já ocorrido entre Japão e EUA (Woodall, 1996WOODALL, Brian. Japan under construction: corruption, politics, and public works. Berkeley: University of California Press, 1996.).

Uma abordagem ideal seria uma combinação dos dois sistemas. O uso de compras públicas para estimular a indústria nacional deve ser transparente, mas também deve estar focado no fomento de empresas relevantes em setores industriais estratégicos, de forma a promover uma parceria de longo prazo entre setores público e privado, visando ao alcance do desenvolvimento industrial.

Por fim, cumpre identificar algumas limitações do presente trabalho. Em primeiro lugar, observa-se que o mundo de hoje apresenta um mercado mundial mais dinâmico que no período pós-guerra. Atualmente, é mais difícil para os Estados exercerem controle sobre seus mercados internos e resistirem a influências externas, sobretudo no que diz respeito à pressão pela promoção do livre comércio. Isso ocorre em função de uma série de fatores, tais como: a maior mobilidade e fluxo de recursos financeiros entre fronteiras nacionais; a facilidade e maior velocidade na troca de informações; a maior interdependência entre os países; e a atuação de empresas privadas em nível regional e global ao invés de meramente no âmbito do mercado nacional como no passado. Portanto, existem limitações intrínsecas à proposta de se comparar uma política recentemente implementada pelo Brasil e iniciativas desenvolvidas pelo Japão anteriores a 1995. Em segundo lugar, destaca-se que este estudo realizou uma análise qualitativa e quantitativa da experiência brasileira de concessão de margens de preferência em licitações, mas restringiu-se ao exame de dados qualitativos no que se refere ao estudo da abordagem japonesa. Na verdade, um estudo comparativo entre países exige a adoção de um método semelhante para a análise de diferentes nações (Lember, Kattel e Kalvet, 2014aLEMBER, Veiko; KATTEL, Rainer; KALVET, Tarmo. How governments support innovation through public procurement: comparing evidence from 11 countries. In: LEMBER, Veiko; KATTEL, Rainer; KALVET, Tarmo (Ed.). Public procurement, innovation and policy: international perspectives. Heidelberg: Springer, 2014a. p. 287-309.: 288). Os problemas relacionados com a ausência de um método comum de pesquisa, entretanto, foram minimizados pela existência de uma vasta literatura que examina o papel desempenhado pelo governo japonês na promoção de altos índices de crescimento econômico e industrial no período pós-guerra. Em terceiro lugar, cumpre enfatizar que o Brasil atualmente não é signatário do GPA, mas é possível que venha a aderir ao referido acordo no futuro. Os impactos dessa possível adesão do Brasil, bem como uma análise detalhada das mudanças ocorridas no Japão após a assinatura do GPA, não foram assuntos abordados no presente estudo. Tendo em vista que autores como Kattel e Lember (2010KATTEL, Rainer; LEMBER, Veiko. Public procurement as an industrial policy tool: an option for developing countries? Journal of Public Procurement, v. 10, n. 3, p. 368-404, 2010.:371) recomendam às economias emergentes fazerem pleno uso do poder de compra de seus governos para estimular o crescimento de suas indústrias, ao invés de aderirem ao referido acordo, futuros artigos que se dediquem a essas questões seriam de grande relevância para a área de políticas públicas.

REFERÊNCIAS

  • ARAI, Koki. Effect of Institutions: Analysis of Japanese municipal public procurement. International Journal of Public Administration, v. 36, n. 9, p. 638-648, 2013.
  • CHAUDHURI, Sudip. R&D for development of new drugs for neglected diseases in India. International Journal of Technology and Globalisation, v. 5, n. 1/2, p. 61-75, 2010.
  • DORE, Ronald. Stock Market Capitalism: Welfare capitalism - Japan and Germany versus the Anglo-Saxons. Nova York: Oxford University Press, 2000.
  • EVANS, Peter. Embedded autonomy: States and industrial transformation. Princeton: Princeton University Press, 1995.
  • GIER, Jean H. Japan’s implementation of the WTO agreement on government procurement. Journal of International Economic Law, v. 17, n. 2, p. 605-657, 1996.
  • GRIEK, Lyckle. Government procurement in Japan: obstacles and opportunities for European SMEs. EU-Japan Centre for Industrial Cooperation, 2014. Disponível em: <Disponível em: htp://www.eu-japan.eu/sites/default/files/publications/docs/public-procurement-japan-report_2014.pdf >. Acesso em:20 mar. 2018.
    » htp://www.eu-japan.eu/sites/default/files/publications/docs/public-procurement-japan-report_2014.pdf
  • HALEY, John O. Authority without power: law and the Japanese paradox. Nova York: Oxford University Press, 1991.
  • JOHNSON, Chalmers A. Miti and the Japanese miracle: the growth of industrial policy, 1925-1975. Stanford: Stanford University Press, 1982.
  • KATTEL, Rainer; LEMBER, Veiko. Public procurement as an industrial policy tool: an option for developing countries? Journal of Public Procurement, v. 10, n. 3, p. 368-404, 2010.
  • KUSUNOKI, Shigeki. Japan’s government procurement regimes for public works: a comparative introduction. Brooklyn Journal of International Law, v. 32, n. 2, p. 523-552, 2007.
  • LEMBER, Veiko; KATTEL, Rainer; KALVET, Tarmo. How governments support innovation through public procurement: comparing evidence from 11 countries. In: LEMBER, Veiko; KATTEL, Rainer; KALVET, Tarmo (Ed.). Public procurement, innovation and policy: international perspectives. Heidelberg: Springer, 2014a. p. 287-309.
  • LEMBER, Veiko; KATTEL, Rainer; KALVET, Tarmo. Introduction. In: LEMBER, Veiko; KATTEL, Rainer; KALVET, Tarmo (Ed.). Public procurement, innovation and policy: international perspectives. Heidelberg: Springer, 2014b. p. 1-11.
  • NORMAN, Herbert E. Japan’s emergence as a modern State - political and economic problems of the Meiji period. Edição comemorativa de 60 anos. Vancouver: University of British Columbia Press, 2000.
  • OHASHI, Hiroshi. Effects of transparency in procurement practices on government expenditure: a case study of municipal public works. Review of Industrial Organization, v. 34, n. 3, p. 267-285, 2009.
  • OHNO, Taishi; HARADA, Yuhei. A comparison of tendering and contracting systems for public works between Japan, the United States and EU countries. Government Auditing Review, v. 13, p. 49-71, 2006.
  • PADHI, Sidhartha S.; MOHAPATRA, Pratap K. J. Detection of collusion in government procurement auctions. Journal of Purchasing & Supply Management, v. 17, n. 4, p. 207-221, 2011.
  • PAINEL DE COMPRAS DO GOVERNO FEDERAL. Painel de compras do governo federal Disponível em: <Disponível em: http://www.comprasgovernamentais.gov.br/index.php/painel-de-compras-de-governo >. Acesso em: 15 fev. 2018.
    » http://www.comprasgovernamentais.gov.br/index.php/painel-de-compras-de-governo
  • PATRICK, Hugh. Japanese high technology industrial policy in comparative context Working Paper n. 1, Center on Japanese Economy and Business, Graduate School of Business. Columbia: Columbia University, 1986.
  • THE NATIONAL BOARD OF TRADE. Consequences of the WTO-agreements for developing countries Estocolmo: Kommerskollegium, 2004.
  • WOODALL, Brian. Japan under construction: corruption, politics, and public works. Berkeley: University of California Press, 1996.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Oct 2018

Histórico

  • Recebido
    13 Ago 2017
  • Aceito
    04 Maio 2018
Fundação Getulio Vargas Fundaçãoo Getulio Vargas, Rua Jornalista Orlando Dantas, 30, CEP: 22231-010 / Rio de Janeiro-RJ Brasil, Tel.: +55 (21) 3083-2731 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: rap@fgv.br