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Índice de analgesia/nocicepção para monitorização da analgesia perioperatória na cirurgia da coluna vertebral

Resumo

Justificativa e objetivos:

O índice de analgesia/nocicepção (ANI) é usado para medir os níveis de dor, a atividade do sistema simpático e a variabilidade da frequência cardíaca durante a anestesia geral. Em nosso estudo, a monitoração do ANI em dois grupos que foram submetidos à cirurgia de estabilização da coluna vertebral e receberam propofol-remifentanil (Total Intravenous Anesthesia - TIVA) e sevoflurano-remifentanil foram comparados para identificar sua importância na previsão precoce de dor no pós-operatório.

Métodos:

Os pacientes foram monitorados com o uso de BIS e ANI juntamente com a monitoração padrão. Durante a indução, fentanil (2 µg.kg-1), propofol (2,5 mg.kg-1) e rocurônio (0,6 mg.kg-1) foram administrados. Durante a manutenção, 1 CAM de sevoflurano + remifentanil (0,05-0,3 µg.kg-1.min-1) e propofol (50-150 µg.kg-1.min-1) + remifentanil (0,05-0,3 µg.kg-1.min-1) foram administrados aos grupos S e T, respectivamente. Parâmetros hemodinâmicos, valores de BIS e ANI foram registrados durante a cirurgia e aos 30 minutos de pós-operatório. Os valores escala visual analógica (EVA) aos 30 minutos de pós-operatório foram registrados.

Resultados:

Enquanto não observamos diferença entre as médias do ANI em todos os tempos de mensuração de ambos os grupos, as mensurações do ANI após a administração do analgésico no perioperatório foram significativamente maiores do que os valores basais de ambos os grupos. Houve correlação entre as médias dos valores de ANI e EVA após a anestesia.

Conclusão:

ANI é um parâmetro importante para o monitoração de analgesia nos períodos perioperatório e pós-operatório. Na cirurgia da coluna vertebral, analgesia semelhante pode ser obtida com anestesia intravenosa total com remifentanil e com a administração de sevoflurano. O ANI é eficiente para prever a necessidade de analgesia durante o período pós-operatório imediato e, portanto, para proporcionar conforto ao paciente.

PALAVRAS-CHAVE
Índice de analgesia/nocicepção; Sevoflurano; TIVA; Cirurgia de coluna vertebral

Abstract

Background and objectives:

The Analgesia Nociception Index is an index used to measure the levels of pain, sympathetic system activity and heart rate variability during general anesthesia. In our study, Analgesia Nociception Index monitoring in two groups who had undergone spinal stabilization surgery and were administered propofol-remifentanil (Total Intravenous Anesthesia) and sevoflurane-remifentanyl anesthesia was compared regarding its significance for prediction of postoperative early pain.

Methods:

BIS and Analgesia Nociception Index monitoring were conducted in the patients together with standard monitoring. During induction, fentanyl 2 µg.kg-1, propofol 2.5 mg.kg-1 and rocuronium 0.6 mg.kg-1 were administered. During maintenance, 1.0 MAC sevoflurane + remifentanil 0.05-0.3 µg.kg-1.min-1 and propofol 50-150 µg.kg-1.min-1 + remifentanil 0.05-0.3 µg.kg-1.min-1 were administered in Group S and Group T, respectively. Hemodynamic parameters, BIS and Analgesia Nociception Index values were recorded during surgery and 30 min postoperatively. Postoperative visual analog scale (VAS) values at 30 minutes were recorded.

Results:

While no difference was found between mean Analgesia Nociception Index at all times of measurement in both groups, Analgesia Nociception Index measurements after administration of perioperative analgesic drug were recorded to be significantly higher compared to baseline values in both groups. There was correlation between mean values of Analgesia Nociception Index and VAS after anesthesia.

Conclusion:

Analgesia Nociception Index is a valuable parameter for monitoring of perioperative and postoperative analgesia. In spine surgery, similar analgesia can be provided in both Total Intravenous Anesthesia with remifentanil and sevoflurane administration. Analgesia Nociception Index is efficient for prediction of the need for analgesia during the early postoperative period, and therefore is the provision of patient comfort.

KEYWORDS
Analgesia Nociceptive Index; Sevoflurane; TIVA; Spinal surgery

Introdução

A estabilização da coluna vertebral é uma das cirurgias que mais causam estímulos dolorosos. A percepção de dor pelo paciente durante a monitoração da anestesia pode ser observada mediante o aumento da pressão arterial e/ou da frequência cardíaca. O índice de analgesia/nocicepção é calculado pela mensuração da alteração no equilíbrio nocicepção-antinocicepção e se reflete na frequência cardíaca simultaneamente.11 Logier R, Jeanne M, De Jonckheere J, et al. PhysioDoloris: a monitoring device for analgesia/nociception balance evaluation using heart rate variability analysis. Conf Proc IEEE Eng Med Biol Soc. 2010;2010:1194-1197, http://dx.doi.org/10.1109/IEMBS.2010.5625971
http://dx.doi.org/10.1109/IEMBS.2010.562...
,22 De Jonckheere J, Delecroix M, Jeanne M, et al. Automated analgesic drugs delivery guided by vagal tone evaluation: interest of the Analgesia Nociception Index (ANI). Conf Proc IEEE Eng Med Biol Soc. 2013;:1952-5. Um paciente sem dor apresentará um tônus parassimpático dominante. Normalmente, o índice de analgesia/nocicepção (ANI) varia de zero a 100, mas quando a atividade parassimpática é dominante, o ANI mostra valores acima de 50 ou mais. Quando a dor é percebida, o sistema simpático será dominante e o valor do ANI cairá abaixo de 50. Sob anestesia geral, a variação do ANI entre 50-70 mostra o nível adequado de analgesia. Em um paciente consciente, enquanto os valores mais altos são indicativos de analgesia, nos valores mais baixos o fator de estresse psicológico pode entrar em jogo e o ANI pode perder a sua confiabilidade.33 De Jonckheere J, Rommel D, Nandrino JL, et al. Heart rate variability analysis as an index of emotion regulation processes: interest of the Analgesia Nociception Index (ANI). Conf Proc IEEE Eng Med Biol Soc. 2012;:3432-5.,44 Jeanne M, Logier R, De Jonckheere J, et al. Heart rate variability during total intravenous anesthesia: effects of nociception and analgesia. Auton Neurosci. 2009;147:91-6.

Como o ANI produz um valor numérico único e contínuo, pode ser um parâmetro importante durante a monitoração do nível de analgesia. Além disso, o ANI pode desempenhar um papel na previsão do nível de dor no pós-operatório imediato. Assim, o conforto do paciente pode ser proporcionado porque a administração de medicamento analgésico adicional pode ser feita no fim da cirurgia.

Em nosso estudo, garantimos a monitoração do ANI durante a cirurgia e no período pós-operatório imediato nos dois grupos de pacientes submetidos à cirurgia de estabilização da coluna vertebral, uma cirurgia dolorosa. O primeiro grupo recebeu TIVA com propofol e remifentanil e o segundo grupo recebeu anestesia com sevoflurano e remifentanil. O objetivo do estudo foi investigar se haveria ou não diferença entre os dois métodos de anestesia quanto à predição do nível de analgesia perioperatória e do nível de dor no pós-operatório imediato.

Material e métodos

Obtivemos a aprovação para o estudo do Comitê de Ética Hospitalar (FSMEAH KAEK n° 2015/59) e a assinatura em termo de consentimento informado de cada paciente.

Foram incluídos 30 pacientes, entre 18 e 70 anos, estado físico ASA I-II (classificação da American Society of Anesthesiologists - ASA), submetidos à cirurgia de estabilização da coluna vertebral. Os pacientes com arritmia, que recebiam betabloqueadores, com doenças neuromusculares ou neurológicas, diabete melito e mulheres grávidas foram excluídos. Os pacientes nos quais a monitoração do ANI foi interrompida no período perioperatório ou pós-operatório, a infusão de betabloqueador foi iniciada no período perioperatório e aqueles que precisaram ser transferidos para a unidade de terapia intensiva sem despertar no pós-operatório foram excluídos do estudo. Os pacientes que não receberam pré-medicação foram alocados aleatoriamente em dois grupos de igual tamanho no período pré-operatório, mediante o uso de um programa simples de computador.

O paciente foi colocado sobre a mesa de operação e o acesso venoso realizado no dorso da mão. Após a administração do anestésico local, o teste de Allen foi feito e, em seguida, a pressão arterial invasiva foi feita com canulação arterial, de preferência através da artéria radial direita. A monitoração de frequência cardíaca e saturação periférica de oxigênio foram feitas (Mindray, China). A monitoração do BIS (Covidien, Dublin, Irlanda) foi feita com quatro eletrodos devidamente colocados sobre a fronte do paciente. Dois sensores do monitor ANI (MetroDoloris, Lille, França) foram devidamente posicionados. De acordo com a recomendação do fabricante, nossa primeira escolha foi colocar o eletrodo frontal dos sensores ANI no meio do esterno. Como os pacientes estariam em pronação devido às características da cirurgia, a nossa segunda escolha foi colocar o sensor atrás do meio do esterno e a mensuração foi feita. O segundo sensor do ANI foi colocado na região correspondente ao 8°-9° arco costal ao nível da linha axilar média.

Os valores do ANI foram considerados como a seguir: 0-30 dor intensa, 30-50 dor moderada, 50-70 confortável e 70-100 nenhuma dor e sem necessidade de analgésico.

Após as avaliações basais, durante a indução fentanil (2 µg.kg-1), propofol (2,5 mg.kg-1) e rocurônio (0,6 mg.kg-1) foram administrados aos dois grupos. Durante a manutenção, de acordo com os valores do BIS entre 40 e 60, 1,0 CAM de sevoflurano + remifentanil (0,05-0,3 µg.kg-1.min-1) e propofol (50-150 µg.kg-1.min-1) + remifentanil (0,05-0,3 µg.kg-1.min-1) foram administrados aos grupos S e T, respectivamente. Os valores foram registrados nos seguintes tempo: pós-indução, pós-intubação, pós-incisão cirúrgica, em intervalos de 5-10 minutos (min) no período perioperatório, no fim da anestesia, pós-extubação e nos minutos cinco, 15 e 30 de pós-operatório. Para efeito analgésico, infusão IV de paracetamol (1 g.100 mL-1), diclofenaco de sódio (20 mg) e tramadol (100 mg) foi administrada a todos os pacientes aproximadamente 30 min antes do término da cirurgia. Cinco minutos após o término de 10 minutos de infusão dos analgésicos, as mensurações foram registradas separadamente como mensurações no fim do fármaco analgésico. Os valores VAS nos minutos cinco, 15 e 30 de pós-operatório foram registrados em números de 0-10 (0: sem dor, 1-3: dor leve, 4-7: dor moderada, 8-9: dor intensa e 10: dor muito intensa). A administração de atropina e efedrina, que pode influenciar a variabilidade da frequência cardíaca, foi registrada.

Análise estatística

Quando consideramos Δ = 26 e DP = 16 no fim da análise de poder feita por meio de um programa que determina o poder e o tamanho da amostra, o tamanho da amostra foi determinado em um n mínimo de nove pacientes para cada grupo detectado para um poder = 0,80 e α = 0,05.

Durante a avaliação dos dados obtidos do estudo, o programa da IBM SPSS Statistics 22.0 foi usado para fazer a análise estatística. A conformidade dos parâmetros para a distribuição normal foi avaliada com o teste de Kolmogorov-Smirnov. Quanto às comparações dos métodos de estatística descritiva (média, desvio padrão), bem como dos dados quantitativos, o teste t de Student foi usado para as comparações entre os grupos dos parâmetros com distribuição normal e o teste de Mann-Whitney para as comparações intergrupo dos parâmetros sem distribuição normal. O teste t de amostras pareadas foi usado para as comparações intragrupo dos parâmetros com distribuição normal. O teste de sinais de Wilcoxon foi usado para as comparações intragrupo dos parâmetros sem distribuição normal. Durante a avaliação da correlação entre os parâmetros conforme a distribuição normal, a análise de correlação de Pearson foi usada. O teste do qui-quadrado foi usado para avaliar os dados qualitativos. A significância foi avaliada em um valor de p < 0,05.

Resultados

Não houve diferença entre as características demográficas e as durações de anestesia e cirurgia dos pacientes (tabela 1).

Tabela 1
Características demográficas e durações da anestesia e cirurgia

Enquanto hemodinamicamente não houve diferença em todos os tempos de mensuração da pressão arterial média entre os grupos, as mensurações da frequência cardíaca nos minutos 20 e 30 de perioperatório apresentaram valores maiores no grupo TIVA comparado com o grupo sevoflurano (p = 0,038, p = 0,031).

Não houve diferença entre os dois grupos em relação aos valores médios do ANI em todos os tempos de mensuração. Embora os valores médios do ANI nas mensurações após a intubação tenham ficado abaixo de 50 em ambos os grupos (Grupo T: 44,3 ± 10,9; Grupo S: 39 ± 11,2), o valor do ANI medido após a incisão no Grupo S foi de 43,7 ± 9,2 e no Grupo T de 51,33 ± 16,14. Os valores médios do ANI no 5° minuto após a incisão ficaram abaixo de 50 em ambos os grupos (Grupo T: 44,7 ± 8,7; Grupo S: 48,8 ± 14). Os valores médios do ANI em todos os outros tempos de mensuração foram superiores a 50. Os valores médios do ANI após a administração do medicamento analgésico no perioperatório foram registrados nos níveis ideais em ambos os grupos (Grupo T: 67,6 ± 13,1; Grupo S: 68,1 ± 18,3) (fig. 1).

Figura 1
Valores ANI para os períodos perioperatório e pós-operatório.

Não houve diferença entre os grupos em relação aos valores médios da EVA no pós-operatório. Houve correlação entre valores médios de ANI e EVA no fim da anestesia (tabela 2).

Tabela 2
Escores da Escala Visual Analógica (EVA) de acordo com o ANI

Não houve diferença entre os grupos quanto aos valores médios do BIS.

Como uma diminuição da frequência cardíaca inferior a 50 batimentos por minuto foi observada em dois pacientes em ambos os grupos, uma dose única de atropina (0,5 mg) foi administrada por via intravenosa.

Discussão

Como o ANI produz um valor numérico único e contínuo, especialmente nos procedimentos cirúrgicos mais dolorosos, pode ser um parâmetro importante durante a monitoração do nível de analgesia. Além disso, pode desempenhar um papel na previsão do nível de dor no pós-operatório imediato. Assim, o conforto do paciente pode ser proporcionado porque a administração de medicamento analgésico adicional pode ser feita no fim da cirurgia.

Jeanne et al.55 Jeanne M, Clément C, De Jonckheere J, et al. Variations of the analgesia nociception index during general anaesthesia for laparoscopic abdominal surgery. J Clin Monit Comput. 2012;26:289-94. monitoraram o ANI em 15 pacientes adultos submetidos à apendicectomia ou colecistectomia laparoscópica. Nesse estudo, uma infusão de propofol e remifentanil foi usada durante a manutenção da anestesia e enquanto valores mais elevados (ANI de 88 ou mais) foram observados com a indução da anestesia, os valores ANI diminuíram para 60-50 com o início da cirurgia. Após o término da cirurgia, ANI de 90 foi observado. Os autores descobriram que o ANI é um indicador da dor mais sensível do que a variabilidade da frequência cardíaca e da pressão arterial sistólica.

Em 30 pacientes submetidos à anestesia com sevoflurano, Ledowski et al.66 Ledowski T, Averhoff L, Tiong WS, et al. Analgesia Nociception Index (ANI) to predict intraoperative haemodynamic changes: results of a pilot investigation. Acta Anaesthesiol Scand. 2014;58:74-9. observaram uma diminuição no valor ANI com a intubação e depois da incisão na pele e um aumento no valor ANI com a administração de fentanil. Além disso, em nosso estudo, semelhante ao grupo sevoflurano, uma diminuição no valor ANI foi observada com a incisão na pele.

Szental et al.77 Szental JA, Webb A, Weeraratne C, et al. Postoperative pain after laparoscopic cholecystectomy is not reduced by intraoperative analgesia guided by analgesia nociception index (ANI®) monitoring: a randomized clinical trial. Br J Anaesth. 2015;114:640-5. alocaram 120 pacientes submetidos à colecistectomia laparoscópica em dois grupos iguais e executaram o protocolo de analgesia com monitoração do ANI. No fim do estudo, quando avaliaram os escores VAS e a necessidade de morfina no pós-operatório, os autores relataram que a monitoração do ANI não apresentou vantagem na previsão de dor no pós-operatório.

Jeanne et al.88 Jeanne M, Delecroix M, De Jonckheere J, et al. Variations of the analgesia nociception index during propofol anesthesia for total knee replacement. Clin J Pain. 2014;30:1084-8. monitoraram os valores ANI em pacientes submetidos à artroplastia total do joelho sob anestesia com propofol e relataram que embora os dados tenham sido confiáveis em pacientes sob anestesia geral, eles podem não ser confiáveis em pacientes acordados.

Logier et al.99 Logier R, De Jonckheere J, Delecroix M, et al. Heart rate variability analysis for arterial hypertension etiological diagnosis during surgical procedures under tourniquet. Conf Proc IEEE Eng Med Biol Soc. 2011;2011:3776-3779, http://dx.doi.org/10.1109/IEMBS.2011.6090645.
http://dx.doi.org/10.1109/IEMBS.2011.609...
relataram que um aumento pode ser observado na variabilidade da frequência cardíaca e da pressão arterial sistêmica devido à dor causada pelo torniquete em pacientes que usaram torniquetes por tempo prolongado, mas que esse aumento pode ter ocorrido por outras razões. Relataram ainda que o uso de monitoração do ANI poderia ser eficiente apara fazer essa discriminação.

Boselli et al.1010 Boselli E, Bouvet L, Begou G, et al. Prediction of immediate postoperative pain using the analgesia/nociception index: a prospective observational study. Br J Anaesth. 2014;112:715-21. investigaram a correlação entre os valores ANI imediatamente antes da extubação e os escores VAS no pós-operatório em 100 pacientes e determinaram uma correlação entre os valores: ANI < 50 e VAS > 3. Os autores relataram que o valor ANI imediatamente antes da extubação teve como base outros fatores - com exceção da dor normalmente observada em Sala de Recuperação Pós-Anestesia (SRPA) conhecida por afetar a atividade simpática -, como o estresse e a ansiedade, que podem influenciar o valor do ANI em pacientes acordados. Relataram também que os valores ANI podem ser afetados a depender do método anestésico selecionado (inalação ou TIVA) e que os anestésicos inalatórios podem resultar em uma redução mais acentuada da variabilidade da frequência cardíaca.

Os mesmos autores relataram ainda que a limitação de seu estudo foi o uso de atropina e neostigmina para evitar a paralisia residual após a reversão do bloqueio neuromuscular, caso o uso de cisatracúrio e atropina afetasse a variabilidade da frequência cardíaca. Em nosso estudo, também administramos atropina e neostigmina para evitar a paralisia residual após a reversão do bloqueio neuromuscular. Considerando que procedimentos de rotina seriam feitos em todos os pacientes e que os medicamentos contrabalançariam suas influências sobre a variabilidade da frequência cardíaca, acreditamos que os procedimentos de rotina não causariam problema. Porém, para uma monitoração segura da reversão, a estimulação habitual com a sequência de quatro estímulos e/ou a escolha de sugamadex para proporcionar condições mais ideais pode ser recomendada. Além disso, como os valores ANI foram comparados com os escores VAS no pós-operatório no fim da anestesia em nosso estudo, a influência da administração de atropina/neostigmina não foi observada nas mensurações.

Os pesquisadores do estudo citado anteriormente afirmaram que a influência do efeito de curta duração de remifentanil, também usado em nosso estudo para a variabilidade da frequência cardíaca, pode ser diferente daquela de fentanil ou sulfentanil de ação prolongada e se apresentar como outra limitação do estudo. Embora os opioides de longa duração possam ser os preferidos, acreditamos que suas influências sobre a recuperação da anestesia também devem ser consideradas.

No estudo feito por Ledowski et al.,1111 Ledowski T, Tiong WS, Lee C, et al. Analgesia nociception index: evaluation as a new parameter for acute postoperative pain. Br J Anaesth. 2013;111:627-9. a correlação entre os valores ANI e escores VAS foi avaliada em 120 pacientes na UTI e uma correlação entre os valores ANI e dor intensa foi observada em um número limitado de pacientes. Como interpretado por Borelli et al.,1010 Boselli E, Bouvet L, Begou G, et al. Prediction of immediate postoperative pain using the analgesia/nociception index: a prospective observational study. Br J Anaesth. 2014;112:715-21. essa correlação pode resultar de outros fatores que influenciaram os valores ANI na UTI. Portanto, usamos o valor ANI no fim da anestesia como base em nosso estudo.

Gruenewald et al.1212 Gruenewald M, Ilies C, Herz J, et al. Influence of nociception stimulation on analgesia nociception index (ANI) during propofol-remifentanyl anaesthesia. Br J Anaesth. 2013;110:1024-30.,1313 Gruenewald M, Ilies C, Herz J, et al. Measurement of the nociceptive balance by analgesia nociception index (ani) and surgical pleth index (spi) during sevoflurane-remifentanyl anaesthesia. Minerva Anestesiol. 2015;81:480-9. publicaram dois estudos diferentes sobre esse tema. Os autores compararam o valor ANI e o Índice Pletismográfico Cirúrgico (SPI) para medir o balanço nocicepção-antinocicepção em ambos os estudos. O SPI é um valor derivado da mensuração do sinal emitido por fotoplestimografia digital. Foram incluídos em ambos os estudos 25 pacientes; o valor da monitoração do BIS ficou entre 30 e 60 e os autores usaram sevoflurano e remifentanil em um estudo e propofol e remifentanil no outro. Relataram ainda que ambos os métodos em ambos os estudos feitos com ambos os métodos de anestesia foram significativos como indicadores de analgesia e enfatizaram a necessidade de estudos adicionais do ANI em diferentes grupos de pacientes com grande número. Além disso, afirmaram que o maior número de pacientes do sexo feminino em seu estudo feito com sevoflurano pode ter afetado os resultados do estudo devido à maior incidência de doenças crônicas que envolvem os mecanismos de regulação do sistema nervoso autônomo no sexo masculino.

Bollag et al.1414 Bollag L, Ortner CM, Jelacic S, et al. The effects of low-dose ketamine on the analgesia nociception index (ANI) measured with the novel PhysioDoloris™ analgesia monitor: a pilot study. J Clin Monit Comput. 2015;29:291-5. fizeram um estudo com 20 pacientes submetidos à histerectomia para demonstrar a simpatomimética e também o efeito analgésico da cetamina em mensurações do ANI. Os autores administraram uma dose de 0,5 µg.kg-1 de cetamina IV em bolus único 5 min após a intubação e relataram que os valores ANI não alteraram a analgesia com a administração de cetamina. Nesse caso, os efeitos simpaticomiméticos de cetamina podem afetar as mensurações do ANI.

Sabourdin et al.1515 Sabourdin N, Arnaout M, Louvet N, et al. Pain monitoring in anesthetized children: first assessment of skin conductance and analgesia-nociception index at different infusion rates of remifentanyl. Pediatr Anesth. 2013;23:149-55. administraram desflurano e remifentanil a 12 pacientes pediátricos, média de oito anos, e enfatizaram que as mensurações do ANI foram mais sensíveis como um indicador de dor no período perioperatório e que estudos adicionais com um grande número de pacientes pediátricos eram necessários.

Ao avaliar as limitações de nosso estudo, identificamos a administração de atropina e neostigmina para evitar a paralisia residual após a reversão do bloqueio neuromuscular como um fator que pode influenciar a variabilidade da frequência cardíaca. Para essa finalidade, a administração de sugamadex pode ser recomendada. Porém, como comparamos os valores ANI com os escores VAS no pós-operatório no fim da anestesia, não observamos influência da administração de atropina/neostigmina nas mensurações. Além disso, a administração perioperatória de medicamentos que influenciam a variabilidade da frequência cardíaca (como atropina e efedrina) pode influenciar os valores ANI. Não observamos diferença entre os grupos em relação à administração perioperatória de atropina. Portanto, presumimos que os valores médios não foram afetados. Contudo, durante a avaliação dos valores ANI, acreditamos que os efeitos da administração de medicamentos que influenciam a variabilidade da frequência cardíaca devem ser levados em consideração.

A segunda limitação de nosso estudo foi a impossibilidade de colocar a face frontal do eletrodo das sondas ANI no meio do esterno nas cirurgias feitas em decúbito ventral. Como o posicionamento do nosso grupo de pacientes foi em decúbito ventral, colocamos a face frontal do eletrodo das sondas ANI na região costal do paciente, de acordo com a recomendação do fabricante em condições necessárias. Portanto, não tivemos problemas técnicos relacionados com a mensuração em nossos pacientes. Além disso, encontramos uma solução ao cobrir a superfície do eletrodo com campos cirúrgicos transparentes para evitar que se desprendessem da pele caso fossem molhados com a solução de esterilização e, por conseguinte, não executassem a mensuração como evidenciamos em nosso estudo prévio com pacientes durante a prática clínica.

Em conclusão, em condições que levem em conta os fatores que podem influenciar a avaliação da monitoração da analgesia nos períodos perioperatório e pós-operatório (anestesia superficial, administração de medicamentos que influenciam a variabilidade da frequência cardíaca etc.), o ANI é um parâmetro valioso. Em cirurgias de estabilização da coluna vertebral, analgesia semelhante pode ser fornecida com a administração tanto de TIVA quanto de remifentanil e sevoflurano. O ANI é eficiente para prever a necessidade de analgesia no período pós-operatório imediato e, portanto, para o conforto do paciente.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Aug 2017

Histórico

  • Recebido
    29 Jan 2016
  • Aceito
    26 Jul 2016
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