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Impacto do declínio cognitivo pós-operatório na qualidade de vida: estudo prospectivo

Resumo

Justificativa e objetivo

Independente do progresso do tratamento no período perioperatório, o declínio cognitivo no pós-operatório (DCPO) é inequivocamente aceito como uma complicação importante e frequente da cirurgia em pacientes mais velhos. O objetivo deste estudo foi avaliar a incidência de DCPO e sua influência na qualidade de vida três meses após a cirurgia.

Métodos

Estudo prospectivo observacional conduzido em Sala de Recuperação Pós-anestesia (SRPA) com pacientes de idade superior a 45 anos, após cirurgia eletiva de grande porte. A função cognitiva foi avaliada com o teste de Avaliação Cognitiva de Montreal (MOCA) e a qualidade de vida (QV) com o Questionário sobre Qualidade de Vida (SF-36). As avaliações foram realizadas no pré-operatório (T0) e três meses após a cirurgia (T3).

Resultados

Foram avaliados 41 pacientes. A incidência de DCPO três meses após a cirurgia foi de 24%. Em T3, os escores MOCA foram menores nos pacientes com DCPO (mediana 20 vs. 25, p = 0,009). Ao comparar as medianas dos escores para cada um dos domínios do SF-36, não observamos diferenças entre os pacientes com e sem DCPO. Ao comparar cada um dos domínios do SF-36 obtidos antes e após três meses de cirurgia, os pacientes com DCPO apresentaram resultados semelhantes para cada uma das oito áreas do SF-36, enquanto pacientes sem DCPO apresentaram resultados melhores em seis domínios. Em T3, os pacientes com DCPO apresentaram níveis mais elevados de dependência na realização de atividades cotidianas.

Conclusão

Três meses após a cirurgia, os pacientes sem DCPO apresentaram melhora significativa dos escores MOCA. Os pacientes com DCPO não apresentaram aumento dos escores SF-36, mas os pacientes sem DCPO apresentaram melhora em quase todos os domínios do SF-36. Os pacientes com DCPO apresentaram taxas mais elevadas de dependência na realização de atividades cotidianas após a cirurgia.

PALAVRAS-CHAVE
Cuidado pós-operatório; Declínio cognitivo pós-operatório; Qualidade de vida

Abstract

Background

Regardless the progress in perioperative care postoperative cognitive decline (PCD) has been accepted unequivocally as a significant and frequent complication of surgery in older patients. The aim of this study was to evaluate the incidence of postoperative cognitive decline and its influence on quality of life three months after surgery.

Methods

Observational, prospective study in a Post-Anesthesia Care Unit (PACU) in patients aged above 45 years, after elective major surgery. Cognitive function was assessed with Montreal Cognitive Assessment (MOCA); Quality of life (QoL) was assessed using SF-36 Health Survey (SF-36). Assessments were performed preoperatively (T0) and 3 months after surgery (T3).

Results

Forty-one patients were studied. The incidence of PCD 3 months after surgery was 24%. At T3 MOCA scores were lower in patients with PCD (median 20 vs. 25, p = 0.009). When comparing the median scores for each of SF-36 domains, there were no differences between patients with and without PCD. In patients with PCD, and comparing each of SF-36 domains obtained before and three months after surgery, had similar scores for every of the 8 SF-36 areas while patients without PCD had better scores for six domains. At T3 patients with PCD presented with higher levels of dependency in personal activities of daily living (ADL).

Conclusion

Three months after surgery patients without PCD had significant improvement in MOCA scores. Patients with PCD obtained no increase in SF-36 scores but patients without PCD improved in almost all SF-36 domains. Patients with PCD presented higher rates of dependency in personal ADL after surgery.

KEYWORDS
Postoperative care; Postoperativecognitive decline; Quality of life

Introdução

Independentemente do progresso do tratamento no período perioperatório, o declínio cognitivo no pós-operatório (DCPO) é inequivocamente aceito como uma complicação importante e frequente da cirurgia em pacientes mais velhos.11 Baracchini C, Mazzalai F, Gruppo M, et al. Carotid endarterectomy protects elderly patients from cognitive decline: a prospective study. Surgery. 2012;151:99-106.

2 Bekker AY, Weeks EJ. Cognitive function after anaesthesia in the elderly. Best Pract Res Clin Anaesthesiol. 2003;17:259-72.

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4 Funder KS, Steinmetz J, Rasmussen LS. Cognitive dysfunction after cardiovascular surgery. Minerva Anestesiol. 2009;75:329-32.

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11 Steinmetz J, Siersma V, Kessing LV, et al. Is postoperative cognitive dysfunction a risk factor for dementia? A cohort follow-up study. Br J Anaesth. 2013;110(Suppl. 1):i92-7.
-1212 van Harten AE, Scheeren TW, Absalom AR. A review of postoperative cognitive dysfunction and neuroinflammation associated with cardiac surgery and anaesthesia. Anaesthesia. 2012;67:280-93. Porém, ainda não há um consenso sobre a definição de DCPO na comunidade médica e, lato sensu, o DCPO é definido como um declínio temporário da cognição associado à cirurgia.1313 Deiner S, Silverstein JH. Postoperative delirium and cognitive dysfunction. Br J Anaesth. 2009;103(Suppl. 1):i41-6. Se durar mais de três meses é definido como declínio cognitivo prolongado no pós-operatório1313 Deiner S, Silverstein JH. Postoperative delirium and cognitive dysfunction. Br J Anaesth. 2009;103(Suppl. 1):i41-6.,1414 Selwood A, Orrell M. Long term cognitive dysfunction in older people after non-cardiac surgery. BMJ. 2004;328:120-1. e uma proporção considerável de pacientes não se recupera três meses após a cirurgia (7-69% em cirurgia cardíaca).1515 Xu T, Bo L, Wang J, et al. Risk factors for early postoperative cognitive dysfunction after non-coronary bypass surgery in Chinese population. J Cardiothorac Surg. 2013;8:204.

A etiologia exata do DCPO permanece incerta e provavelmente é multifactorial.1515 Xu T, Bo L, Wang J, et al. Risk factors for early postoperative cognitive dysfunction after non-coronary bypass surgery in Chinese population. J Cardiothorac Surg. 2013;8:204.,1616 Abildstrom H, Rasmussen LS, Rentowl P, et al. Cognitive dysfunction 1-2 years after non-cardiac surgery in the elderly. ISPOCD group. International study of post-operative cognitive dysfunction. Acta Anaesthesiol Scand. 2000;44:1246-51. Complicações no período perioperatório podem precipitar o DCPO precoce, mas demostrou-se que o avanço da idade é um fator de risco significativo e independente para DCPO. A incidência de DCPO deve aumentar à medida que a população de pacientes cirúrgicos idosos cresce.1111 Steinmetz J, Siersma V, Kessing LV, et al. Is postoperative cognitive dysfunction a risk factor for dementia? A cohort follow-up study. Br J Anaesth. 2013;110(Suppl. 1):i92-7.,1717 Tsai TL, Sands LP, Leung JM. An update on postoperative cognitive dysfunction. Adv Anesth. 2010;28:269-84.

Os pacientes submetidos à cirurgia cardíaca têm sido profusamente estudados, mas a incidência e a prevalência dessa complicação após outros tipos de cirurgia não são relatadas tão exaustivamente.1616 Abildstrom H, Rasmussen LS, Rentowl P, et al. Cognitive dysfunction 1-2 years after non-cardiac surgery in the elderly. ISPOCD group. International study of post-operative cognitive dysfunction. Acta Anaesthesiol Scand. 2000;44:1246-51.,1818 Monk TG, Weldon BC, Garvan CW, et al. Predictors of cognitive dysfunction after major noncardiac surgery. Anesthesiology. 2008;108:18-30. O grupo de estudo ISPOCD (International Study of Postoperative Cognitive Dysfunction) avaliou 1.218 pacientes de 60 anos ou mais submetidos à cirurgia geral de grande porte e relatou incidência de 25,8% de DCPO em uma semana de pós-operatório e de 9,9% em três meses após a cirurgia.66 Moller JT, Cluitmans P, Rasmussen LS, et al. International Study of Post-Operative Cognitive Dysfunction. Lancet. 1998;351:857-61. No entanto, a estimativa da frequência de DCPO ainda varia de 25% a 80%.44 Funder KS, Steinmetz J, Rasmussen LS. Cognitive dysfunction after cardiovascular surgery. Minerva Anestesiol. 2009;75:329-32.

O diagnóstico de DCPO requer testes neuropsicológicos precisos e válidos no pré- e pós-operatório e a determinação de um ponto de corte entre o DCPO e a variação normal no desempenho cognitivo. O diagnóstico de DCPO não é de fácil execução porque não há sintomas clínicos aparentes - os pacientes podem apresentar uma deficiência em uma ou várias habilidades cognitivas, como na memória, atenção, concentração, velocidade da resposta motora e mental, no processamento de informações e aprendizado após a cirurgia e a anestesia, que são diferentes de delírio.44 Funder KS, Steinmetz J, Rasmussen LS. Cognitive dysfunction after cardiovascular surgery. Minerva Anestesiol. 2009;75:329-32.,1313 Deiner S, Silverstein JH. Postoperative delirium and cognitive dysfunction. Br J Anaesth. 2009;103(Suppl. 1):i41-6.,1919 Jungwirth B, Zieglgänsberger W, Kochs E, et al. Anesthesia and postoperative cognitive dysfunction (POCD). Mini Rev Med Chem. 2009;9:1568-79. A manifestação é sutil, geralmente muitos dias ou semanas após a cirurgia.22 Bekker AY, Weeks EJ. Cognitive function after anaesthesia in the elderly. Best Pract Res Clin Anaesthesiol. 2003;17:259-72.,44 Funder KS, Steinmetz J, Rasmussen LS. Cognitive dysfunction after cardiovascular surgery. Minerva Anestesiol. 2009;75:329-32. Grande parte dos médicos não consegue reconhecer o declínio cognitivo do paciente logo após a cirurgia; os próprios pacientes podem não estar cientes de seu DCPO ou relutarem em relatar qualquer alteração devido à falta de atenção ou constrangimento.44 Funder KS, Steinmetz J, Rasmussen LS. Cognitive dysfunction after cardiovascular surgery. Minerva Anestesiol. 2009;75:329-32. Até o presente, não há uma abordagem padrão aceita para o diagnóstico e o uso de vários testes neuropsicológicos válidos e altamente sensíveis que permitem a avaliação de muitas áreas cognitivas é essencial.44 Funder KS, Steinmetz J, Rasmussen LS. Cognitive dysfunction after cardiovascular surgery. Minerva Anestesiol. 2009;75:329-32.,1919 Jungwirth B, Zieglgänsberger W, Kochs E, et al. Anesthesia and postoperative cognitive dysfunction (POCD). Mini Rev Med Chem. 2009;9:1568-79.

20 Rudolph JL, Schreiber KA, Culley DJ, et al. Measurement of post-operative cognitive dysfunction after cardiac surgery: a systematic review. Acta Anaesthesiol Scand. 2010;54:663-77.
-2121 Gornall BF, Myles PS, Smith CL, et al. Measurement of quality of recovery using the QoR-40: a quantitative systematic review. Br J Anaesth. 2013;111:161-9.

Embora as alterações cognitivas não se manifestem clinicamente em alguns pacientes, estudos recentes mostram que DCPO pode resultar em internação prolongada, despesas médicas elevadas, aumento da morbidade e readmissão hospitalar. DCPO tem consequências em longo prazo referentes ao aumento de todas as causas de mortalidade e diminuição da qualidade de vida (QV), juntamente com deficiências no desempenho cotidiano, saída prematura do mercado de trabalho e dependência econômica após a alta hospitalar.22 Bekker AY, Weeks EJ. Cognitive function after anaesthesia in the elderly. Best Pract Res Clin Anaesthesiol. 2003;17:259-72.,88 Rasmussen LS, Johnson T, Kuipers HM, et al. Investigators does anaesthesia cause postoperative cognitive dysfunction? A randomised study of regional versus general anaesthesia in 438 elderly patients. Acta Anaesthesiol Scand. 2003;47:260-6.,99 Rasmussen LS, O’Brien JT, Silverstein JH, et al. Is peri-operative cortisol secretion related to post-operative cognitive dysfunction?. Acta Anaesthesiol Scand. 2005;49:1225-31.

O objetivo deste estudo foi avaliar a incidência de DCPO e a recuperação cognitivas três meses após cirurgia não cardíaca e não neurológica e determinar o impacto do declínio cognitivo na QV e a dependência nas atividades cotidianas.

Métodos

Ética

A aprovação para este estudo (n° 127/12) foi fornecida pelo Comité de Ética Para a Saúde do Centro Hospitalar de São João, Porto, Portugal (Diretor: Professor Filipe Almeida) em 25 de maio de 2012. Assinatura em termo de consentimento foi obtida de todos os pacientes.

Coorte

Foram incluídos 221 pacientes submetidos a cirurgias eletivas de grande porte no estudo, feito de 18 de junho a 15 de julho de 2012, em Sala de Recuperação Pós-Anestesia (SRPA) multidisciplinar. Os critérios de inclusão foram pacientes adultos de língua portuguesa, submetidos à cirurgia eletiva de grande porte sob anestesia (definida como cirurgia que requer dois ou mais dias de internação) e com idade ≥ 45 anos. Os pacientes não puderam ser incluídos duas vezes, mesmo que fossem submetidos a um segundo procedimento não relacionado. Foram excluídos os pacientes com comprometimento cognitivo (escore inferior a 24) na avaliação inicial feita com o Miniexame do Estado Mental (MMSE),2222 Folstein MF, Folstein SE, McHugh PR. "Mini-mental state". A practical method for grading the cognitive state of patients for the clinician. J Psychiatr Res. 1975;12:189-98. que não entregaram ou não conseguiram entregar o termo de consentimento assinado, não entendiam a língua usada ou eram analfabetos, não estavam de acordo com o protocolo ou procedimento, foram submetidos à cirurgia de urgência ou emergência, tinham sido admitidos para cirurgia obstétrica, neurológica ou cardíaca e aqueles que foram admitidos em unidades de terapia intensiva para vigilância pós-operatória. Todos os pacientes foram entrevistados na véspera ou no dia da cirurgia (pelo menos três horas antes). Nessa entrevista, uma pequena consulta foi feita para obter o consentimento, fazer o teste MMSE e a anamnese. Os pacientes concluíram os testes neuropsicológicos no início do estudo (T0) e três meses após a cirurgia (T3). Essas avaliações neuropsicológicas incluíram o teste de Avaliação Cognitiva de Montreal (MOCA),2323 Nasreddine ZS, Phillips NA, Bédirian V, et al. The Montreal cognitive assessment, MoCA: a brief screening tool for mild cognitive impairment. J Am Geriatr Soc. 2005;53:695-9. a versão resumida dos 36 itens do Questionário sobre Qualidade de Vida (SF-36),2424 Ware JE, Sherbourne CD. The MOS 36-item short-form health survey (SF-36). I. Conceptual framework and item selection. Med Care. 1992;30:473-83. a escala de avaliação das atividades instrumentais da vida diária (escala de Lawton)2525 Lawton MP, Brody EM. Assessment of older people: self-maintaining and instrumental activities of daily living. Gerontologist. 1969;9:179-86. e o índice de independência para as atividades da vida diária (Índice de Katz).2626 Katz S. Assessing self-maintenance: activities of daily living, mobility, and instrumental activities of daily living. J Am Geriatr Soc. 1983;31:721-7. Os anestesiologistas eram cegados para a alocação dos pacientes no estudo. A conduta da anestesia, inclusive a escolha do tipo de anestesia, ficou a critério do anestesiologista.

Avaliação do paciente

As características registradas dos pacientes foram: idade, peso, estatura, índice de massa corporal (IMC) e estado físico de acordo com a classificação da Sociedade Americana de Anestesiologistas (ASA). O Índice de Risco Cardíaco Revisado (RCRI) também foi calculado, com o sistema de classificação relatado por Lee et al.,2727 Lee TH, Marcantonio ER, Mangione CM, et al. Derivation and prospective validation of a simple index for prediction of cardiac risk of major noncardiac surgery. Circulation. 1999;100:1043-9. que inclui cirurgia de alto risco (procedimento vascular intraperitoneal, intratorácico ou suprainguinal) e fatores de risco clínicos (história de doença cardíaca isquêmica, insuficiência cardíaca compensada ou anterior, doença cerebrovascular, diabete melito e insuficiência renal). Essas variáveis estão incluídas nas Diretrizes Práticas de Estratificação do Risco Cardíaco para Procedimentos Cirúrgicos não Cardíacos de 2007, na Avaliação Cardiovascular Perioperatória e no Tratamento para Cirurgia não Cardíaca do American College of Cardiology/American Heart Association Task Force.2828 Fleisher LA, Beckman JA, Brown KA, et al. ACC/AHA 2007 guidelines on perioperative cardiovascular evaluation and care for noncardiac surgery: a report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Practice Guidelines (Writing Committee to Revise the 2002 Guidelines on Perioperative Cardiovascular Evaluation for Noncardiac Surgery): developed in collaboration with the American Society of Echocardiography, American Society of Nuclear Cardiology, Heart Rhythm Society, Society of Cardiovascular Anesthesiologists, Society for Cardiovascular Angiography and Interventions, Society for Vascular Medicine and Biology, and Society for Vascular Surgery. Circulation. 2007;116:e418-99.

Os detalhes intraoperatórios, inclusive tipo e duração da anestesia e do procedimento cirúrgico, tempo de permanência na SRPA e quaisquer eventos cardiorrespiratórios ocorridos na SRPA, também foram documentados.

Avaliação do DCPO e da qualidade de vida

Cada participante foi submetido a testes neuropsicológicos em dois tempos de avaliação: no pré-operatório (T0) e três meses após a cirurgia (T3).

O funcionamento cognitivo global de todos os pacientes foi avaliado em T0 com o Miniexame do Estado Mental (MMSE), um teste válido e reconhecido que é feito em cinco a dez minutos (min). O MMSE avalia os aspectos gerais da função cognitiva executiva, mede a orientação, cálculo, memória, capacidade de leitura e escrita, linguagem e habilidade visuoespacial. Mesmo assim, os escores de pacientes com formas leves de declínio cognitivo frequentemente estão na faixa normal no MMSE.2222 Folstein MF, Folstein SE, McHugh PR. "Mini-mental state". A practical method for grading the cognitive state of patients for the clinician. J Psychiatr Res. 1975;12:189-98.

O teste de avaliação cognitiva de Montreal (MOCA) é um questionário de uma página que leva 10 min para ser aplicado e é adequado para avaliar a memória de curto prazo, as funções executivas, a memória de trabalho, concentração, as habilidades visuoespaciais, a atenção, linguagem e orientação temporal e espacial. As pontuações variam de zero a 30 e os escores mais altos indicam um melhor desempenho cognitivo. Para ajustar para efeitos educacionais, os indivíduos com 12 ou menos anos de educação recebem um ponto extra.2323 Nasreddine ZS, Phillips NA, Bédirian V, et al. The Montreal cognitive assessment, MoCA: a brief screening tool for mild cognitive impairment. J Am Geriatr Soc. 2005;53:695-9.,2929 Freitas S, Simões MR, Marôco J, et al. Construct validity of the Montreal cognitive assessment (MoCA). J Int Neuropsychol Soc. 2012;18:242-50.,3030 Duro D, Simões MR, Ponciano E, et al. Validation studies of the Portuguese experimental version of the Montreal cognitive assessment (MoCA): confirmatory factor analysis. J Neurol. 2010;257:728-34. Vários estudos foram feitos em Portugal com a versão experimental portuguesa do MOCA e as conclusões dos estudos parecem confirmar a validade e utilidade clínica dessa ferramenta.3030 Duro D, Simões MR, Ponciano E, et al. Validation studies of the Portuguese experimental version of the Montreal cognitive assessment (MoCA): confirmatory factor analysis. J Neurol. 2010;257:728-34. Com a adoção do critério usado por Baracchini et al.,11 Baracchini C, Mazzalai F, Gruppo M, et al. Carotid endarterectomy protects elderly patients from cognitive decline: a prospective study. Surgery. 2012;151:99-106. um declínio de pelo menos dois pontos no teste MOCA em T3 foi considerado clinicamente relevante e definido como DCPO.

O Medical Outcomes Study 36-Item Short Form Health Survey2424 Ware JE, Sherbourne CD. The MOS 36-item short-form health survey (SF-36). I. Conceptual framework and item selection. Med Care. 1992;30:473-83. (questionário SF-36) visa a quantificar o estado geral de saúde e é composto por oito seções ou domínios, que são as somas ponderadas das perguntas em suas seções. Os oito domínios são: vitalidade, função física, dor, saúde geral, capacidade funcional, função emocional, função social e saúde mental. Esse questionário também foi adaptado culturalmente para o português e validado em um estudo feito por Ferreira et al.3131 Ferreira PL. Development of the Portuguese version of MOS SF-36. Part I. Cultural and linguistic adaptation. Acta Med Port. 2000;13:55-66.,3232 Ferreira PL. Development of the Portuguese version of MOS SF-36. Part II - validation tests. Acta Med Port. 2000;13:119-27.

A avaliação da capacidade funcional baseou-se na capacidade do paciente de fazer as atividades instrumentais e pessoais do cotidiano. Para isso, dois questionários que avaliam a independência funcional do indivíduo para as atividades da vida diária (ADL) tanto instrumentais (I-ADL) quanto pessoais (P-ADL) foram usados: a escala I-ADL de Lawton2525 Lawton MP, Brody EM. Assessment of older people: self-maintaining and instrumental activities of daily living. Gerontologist. 1969;9:179-86. e o Índice de independência de Katz em ADL.2626 Katz S. Assessing self-maintenance: activities of daily living, mobility, and instrumental activities of daily living. J Am Geriatr Soc. 1983;31:721-7. A escala I-ADL de Lawton é fácil de aplicar e proporciona o autorrelato do conhecimento sobre as habilidades funcionais necessárias para viver em comunidade, como a capacidade de usar o telefone e lidar com as finanças, fazer compras, cuidar da casa, preparar alimentos, usar transporte público e ser responsável pelos próprios medicamentos.2525 Lawton MP, Brody EM. Assessment of older people: self-maintaining and instrumental activities of daily living. Gerontologist. 1969;9:179-86. A escala de Katz avalia as atividades básicas pessoais da vida diária e classifica a capacidade de desempenho em seis áreas: tomar banho, vestir-se, ir ao banheiro, transferir-se da cama para a cadeira, continência e alimentação.2525 Lawton MP, Brody EM. Assessment of older people: self-maintaining and instrumental activities of daily living. Gerontologist. 1969;9:179-86. As respostas dos pacientes foram categorizadas em duas classes: capaz ou incapaz de executar cada atividade ou grupo de atividades. Os pacientes foram considerados dependentes se não conseguissem executar pelo menos uma ADL, instrumental ou pessoal.

Análise estatística

A análise descritiva das variáveis foi usada para resumir os dados. Os dados ordinais e contínuos que não apresentaram distribuição normal, com base no teste de Kolmogorov-Smirnov para normalidade da população subjacente, foram expressos em mediana e intervalo interquartil (IQR). Os dados que apresentaram distribuição normal foram expressos em média e desvio padrão (DP). Testes não paramétricos foram feitos para as comparações (teste de sinais de Wilcoxon e teste U de Mann-Whitney). O teste do qui-quadrado ou teste exato de Fisher foi usado para comparar as proporções entre dois grupos de indivíduos. As amostras relacionadas do teste de sinais de Wilcoxon foram usadas para comparar os escores do SF-36 antes da cirurgia e três meses após a cirurgia. As diferenças foram consideradas estatisticamente significativas quando p < 0,05. O programa estatístico SPSS para Windows Versão 20,0 (SPSS Inc., Chicago, IL, EUA) foi usado para todas as análises estatísticas.

Resultados

Dos 221 pacientes admitidos consecutivamente na SRPA durante o período de estudo, 41 foram incluídos. De acordo com os critérios de exclusão, 163 foram excluídos: 21 não puderam fazer a avaliação no pré-operatório, 112 tinham menos de 45 anos, 12 foram internados em unidade de terapia intensiva cirúrgica, oito não conseguiram fornecer o consentimento informado ou apresentaram escore MMSE < 24, dois não foram submetidos à cirurgia, dois foram submetidos à neurocirurgia, três não falavam o idioma português e três recusaram-se a participar. Dos 57 restantes, apenas 41 concluíram todas as avaliações cognitivas e de qualidade de vida em três meses de acompanhamento.

As características da população estão resumidas na tabela 1. A mediana de idade foi de 64 anos; 78% dos pacientes foram submetidos à anestesia geral ou combinação de anestesia geral e locorregional, com tempo médio de duração de 120 min; cirurgia gastrointestinal foi feita em 49% dos pacientes; cirurgia plástica e reconstrutiva em 15%; cirurgia ginecológica e ortopédica em 10% cada; urológica em 8%; vascular em 45; cirurgia de cabeça e pescoço em 3%; otorrinolaringológica em 1%. Não houve diferença estatisticamente significativa entre os pacientes com e sem DCPO em relação às variáveis estudadas.

Tabela 1
Características e resultados dos pacientes pré-admissão (n = 41)

A incidência de DCPO três meses após a cirurgia foi de 24% (n = 10). Em T0, não houve diferença entre os pacientes com e sem comprometimento cognitivo nos escores MOCA (mediana de 25 vs. 21, p = 0,139). Em T3, no entanto, os pacientes com DCPO apresentaram escores MOCA piores (mediana de 20 vs. 25, p = 0,009). Na comparação com os escores MOCA do pré-operatório, os pacientes com DCPO apresentaram escores MOCA piores em T3 (mediana de 20 vs. 25, p = 0,001), enquanto os pacientes sem DCPO apresentaram escores melhores (25 vs. 21, p < 0,001).

As tabelas 2 e 3 apresentam os escores medianos nos domínios do SF-36 para os dois grupos de pacientes, comparam os escores em T0 e T3. Para pacientes com DCPO e na comparação de cada um dos domínios do SF-36 em T0 e T3, há resultados semelhantes para cada um dos oito domínios do SF-36 (tabela 2). Os pacientes sem DCPO apresentaram escores melhores em T3 em seis domínios (tabela 3): capacidade funcional limitada devido a problemas físicos (mediana de 63 vs. 50, p = 0,021), dor (mediana de 74 vs. 62, p = 0,022), saúde geral (mediana de 65 vs. 57, p = 0,016), função social (mediana de 100 vs. 75, p < 0,001), função emocional limitada devido a problemas emocionais (mediana de 92 vs. 67, p = 0,014) e saúde mental (mediana de 68 vs. 52, p < 0,001); os escores foram semelhantes para os domínios vitalidade (p = 0,208) e função física (p = 0,289).

Tabela 2
SF-36 em pacientes com DCPO
Tabela 3
SF-36 em pacientes sem DCPO

As tabelas 4 e 5 apresentam os escores medianos para todos os domínios do SF-36 obtidos antes e depois da cirurgia, respectivamente, comparam os pacientes com e sem DCPO. Como apresentado, todos os escores em T0 e T3 para os domínios do SF-36 foram semelhantes.

Tabela 4
Comparação dos grupos com e sem DCPO antes da cirurgia para SF-36 (T0)
Tabela 5
Comparação dos grupos com e sem DCPO para SF-36 três meses após a cirurgia (T3)

A tabela 6 mostra que houve níveis semelhantes de dependência em T0 em P-ADL e I-ADL, quando comparados com os pacientes com e sem DCPO; em T3, no entanto, os pacientes com DCPO apresentaram níveis mais elevados de dependência em P-ADL (50% vs. 16%, p = 0,030). Na comparação dos níveis de dependência em T0 e T3 dos pacientes com DCPO houve um nível de dependência mais elevado em I-ADL (50% vs. 10%, p = 0,037) do que em P-ADL (10% vs. 10%, p = 1,0). Na mesma comparação, os pacientes sem DCPO não apresentaram diferença em I-ADL (29% vs. 29%, p = 1,0) ou dependência em P-ADL (3% vs. 7%, p = 0,572).

Tabela 6
Independência em atividades da vida diária, antes e depois da cirurgia

Discussão

Relatamos uma incidência de DCPO de 24% três meses após a cirurgia. Na literatura, a incidência de DCPO não está claramente definida e pode variar entre 25% e 80%.44 Funder KS, Steinmetz J, Rasmussen LS. Cognitive dysfunction after cardiovascular surgery. Minerva Anestesiol. 2009;75:329-32.,1313 Deiner S, Silverstein JH. Postoperative delirium and cognitive dysfunction. Br J Anaesth. 2009;103(Suppl. 1):i41-6. Muitos relatos atuais estabelecem que a cirurgia, especialmente cirurgia cardíaca, pode resultar em DCPO e que a sua incidência aumenta com a idade, independentemente da técnica anestésica.1111 Steinmetz J, Siersma V, Kessing LV, et al. Is postoperative cognitive dysfunction a risk factor for dementia? A cohort follow-up study. Br J Anaesth. 2013;110(Suppl. 1):i92-7.

A DCPO pode ter um impacto considerável sobre a qualidade de vida e resultar em isolamento do convívio social.1111 Steinmetz J, Siersma V, Kessing LV, et al. Is postoperative cognitive dysfunction a risk factor for dementia? A cohort follow-up study. Br J Anaesth. 2013;110(Suppl. 1):i92-7.,1313 Deiner S, Silverstein JH. Postoperative delirium and cognitive dysfunction. Br J Anaesth. 2009;103(Suppl. 1):i41-6.,1515 Xu T, Bo L, Wang J, et al. Risk factors for early postoperative cognitive dysfunction after non-coronary bypass surgery in Chinese population. J Cardiothorac Surg. 2013;8:204.,1717 Tsai TL, Sands LP, Leung JM. An update on postoperative cognitive dysfunction. Adv Anesth. 2010;28:269-84. Nos últimos anos, a DCPO após cirurgias não cardíacas tem sido sistematicamente avaliada. Um estudo em particular, o ISPOCD (Grupo Internacional de Estudo da Disfunção Cognitiva no Pós-operatório) foi bem-sucedido em descobrir a extensão do problema e definir os fatores de risco. A DCPO precoce ocorre em aproximadamente 25% dos pacientes uma semana após a cirurgia e, em seguida, diminui para menos de 10% após três meses.66 Moller JT, Cluitmans P, Rasmussen LS, et al. International Study of Post-Operative Cognitive Dysfunction. Lancet. 1998;351:857-61.

DCPO refere-se à deterioração temporária da cognição associada à operação; logo, o número crescente de pacientes idosos submetidos à cirurgia deve alertar anestesiologistas e cirurgiões sobre suas graves repercussões.1111 Steinmetz J, Siersma V, Kessing LV, et al. Is postoperative cognitive dysfunction a risk factor for dementia? A cohort follow-up study. Br J Anaesth. 2013;110(Suppl. 1):i92-7. No entanto, não há informação explícita para confirmar se uma mudança nos procedimentos mudaria a incidência de DCPO, mas é possível que a medicação pré-operatória com anticolinérgico e catecolaminas e alguns eventos como hipotensão, hipotermia, hipoxia, ateroembolismo ou hipoperfusão cerebral, controle glicêmico inadequado e endarterectomia carotídea podem contribuir para níveis elevados da incidência de DCPO.22 Bekker AY, Weeks EJ. Cognitive function after anaesthesia in the elderly. Best Pract Res Clin Anaesthesiol. 2003;17:259-72. Em nosso estudo, não encontramos diferenças relacionadas às variáveis demográficas ou características cirúrgicas ou anestésicas dos pacientes.

Nos vários estudos de DCPO não houve uma metodologia padrão3333 Newman S, Stygall J, Hirani S, et al. Postoperative cognitive dysfunction after noncardiac surgery: a systematic review. Anesthesiology. 2007;106:572-90. e a escolha dos instrumentos para testes neuropsicológicos, os critérios a considerar, o momento do teste e reteste e os critérios de inclusão e exclusão são variados.3434 Rasmussen LS, Larsen K, Houx P, et al. The International Study of Postoperative Cognitive Dysfunction. The assessment of postoperative cognitive function. Acta Anaesthesiol Scand. 2001;45:275-89.

O uso de testes neuropsicológicos altamente sensíveis e específicos permite a identificação de déficits cognitivos sutis com excelente validade do teste/reteste, mas com risco maior de erros Tipo II (falha em detectar DCPO). Para este estudo, o teste MOCA foi escolhido porque é fácil e rápido de aplicar e permite avaliar vários domínios funcionais da cognição. Mesmo assim, o MOCA pode não conseguir identificar alguns pacientes com formas mais leves de DCPO.3535 Gögenur I, Middleton B, Burgdorf S, et al. Impact of sleep and circadian disturbances in urinary 6-sulphatoxymelatonin levels, on cognitive function after major surgery. J Pineal Res. 2007;43:179-84.,3636 Newman MF, Grocott HP, Mathew JP, et al. Report of the substudy assessing the impact of neurocognitive function on quality of life 5 years after cardiac surgery. Stroke. 2001;32:2874-81.

As intervenções no período perioperatório produzem efeitos em longo prazo sobre o indivíduo; portanto, estratégias para preservar o desempenho cognitivo em longo prazo e a qualidade de vida são necessárias.3737 Bedford PD. Adverse cerebral effects of anaesthesia on old people. Lancet. 1955;269:259-63.

O risco de declínio cognitivo aumenta com a idade e é reforçado após a internação para procedimentos cirúrgicos, resulta em morbidade e redução da qualidade de vida.3838 Ehlenbach WJ, Hough CL, Crane PK, et al. Association between acute care and critical illness hospitalization and cognitive function in older adults. JAMA. 2010;303:763-70. Na verdade, não há uma abordagem individual para evitar a deterioração cognitiva,22 Bekker AY, Weeks EJ. Cognitive function after anaesthesia in the elderly. Best Pract Res Clin Anaesthesiol. 2003;17:259-72. mas a manutenção e/ou recuperação da independência funcional, inclusive a cognição, no paciente idoso hospitalizado é um grande desafio para o sistema de saúde.

O declínio cognitivo no pós-operatório pode impedir melhorias na qualidade de vida e estratégias para reduzir o declínio cognitivo podem permitir aos pacientes o máximo de melhoria da qualidade de vida após a cirurgia. Esse tem sido o tema de vários estudos77 Phillips-Bute B, Mathew JP, Blumenthal JA, et al. Association of neurocognitive function and quality of life 1 year after coronary artery bypass graft (CABG) surgery. Psychosom Med. 2006;68:369-75. e, semelhante a eles, o presente estudo demonstrou que o declínio cognitivo limita a melhoria da QV.

Mesmo os déficits cognitivos leves antes da cirurgia podem ser um marcador para o aumento do risco de declínio cognitivo;3939 Selnes OA, Gottesman RF, Grega MA, et al. Cognitive and neurologic outcomes after coronary-artery bypass surgery. N Engl J Med. 2012;366:250-7. além disso, é consenso que o DCPO geralmente desaparece dentro de 1-3 meses na maioria dos pacientes que desenvolvem novos sintomas cognitivos durante o período de pós-operatório.3333 Newman S, Stygall J, Hirani S, et al. Postoperative cognitive dysfunction after noncardiac surgery: a systematic review. Anesthesiology. 2007;106:572-90.,3939 Selnes OA, Gottesman RF, Grega MA, et al. Cognitive and neurologic outcomes after coronary-artery bypass surgery. N Engl J Med. 2012;366:250-7.,4040 Sweet JJ, Finnin E, Wolfe PL, et al. Absence of cognitive decline one year after coronary bypass surgery: comparison to nonsurgical and healthy controls. Ann Thorac Surg. 2008;85:1571-8.

Três meses após a cirurgia, uma melhoria significativa da qualidade de vida em pacientes sem DCPO foi demonstrada por um aumento em quase todos os escores dos domínios do SF-36; porém, entre os doentes com DCPO, nenhuma melhoria foi observada em qualquer dos escores do SF-36. Essa limitação na melhoria da qualidade também foi demonstrada em pacientes com DCPO por uma dependência mais significativa em P-ADL três meses após a cirurgia, em comparação com os pacientes sem DCPO.

Este estudo tem várias limitações. É observacional e com uma pequena amostra de pacientes. Houve muitas desistências e perdas para o acompanhamento (explicadas, em parte, pela necessidade de entrevistas completas antes e depois da cirurgia para o acompanhamento). Além disso, não avaliamos as variáveis clínicas após a cirurgia, inclusive complicações e medicamentos que poderiam ter afetado não apenas as perdas do acompanhamento, mas também os resultados do desempenho cognitivo, da qualidade de vida e da independência em ADL.

Conclusões

Os principais achados deste estudo foram os seguintes: (1) a incidência de DCPO foi de 24%; (2) os pacientes com DCPO não apresentaram melhoria nos escores de qualidade de vida; (3) os pacientes sem DCPO apresentaram escores melhores em quase todos os domínios do SF-36 e um aumento nos de dependência após a cirurgia.

DCPO é um evento real, com complicações reais e comprometimento da qualidade de vida, que requer uma melhor compreensão, especialmente em relação aos fatores etiológicos para preveni-los. Não devemos subestimá-lo, pois o DCPO diminui a qualidade de vida e aumenta o grau de dependência para as atividades da vida diária e cuidados perioperatórios de alta qualidade e apoio social e financeiro são essenciais.

Autoria

Todos os autores confirmam que leram e aprovaram o documento.

Todos os autores confirmam que preencheram os critérios de autoria, conforme estabelecido pelo ICMJE, acreditam que o estudo representa um trabalho honesto e podem atestar a validade dos resultados relatados.

Todas as pessoas designadas como autores são qualificadas para a autoria.

Cada autor participou o suficientemente do trabalho para assumir responsabilidade pública pelas partes apropriadas do conteúdo.

Todos os autores apresentaram contribuições substanciais para a concepção e o desenho do estudo, aquisição dos dados, análise e interpretação dos dados, elaboração do artigo ou revisão crítica do conteúdo intelectual.

Todos os autores deram sua aprovação final para a versão a ser publicada.

Agradecimentos

Ao pessoal da Unidade de Recuperação Pós-Anestesia do Centro Hospitalar de São João pela assistência durante o estudo.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Aug 2017

Histórico

  • Recebido
    17 Set 2015
  • Aceito
    20 Jul 2016
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