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Relação entre consumo de tabaco e concentração de monóxido de carbono na expiração com complicações respiratórias perioperatórias

Resumo

Justificativa

O objetivo deste estudo foi determinar os efeitos do tabagismo pré-operatório e o nível de monóxido de carbono no ar expirado sobre complicações respiratórias perioperatórias em pacientes submetidos a colecistectomias laparoscópicas eletivas.

Métodos

No total, 152 pacientes (Grupo F: fumantes; Grupo NF: não fumantes) submetidos a colecistectomias laparoscópicas sob anestesia geral foram avaliados. Os pacientes completaram o Teste para Dependência de Nicotina de Fagerstrom. Os níveis pré-operatórios de monóxido de carbono no ar expirado foram determinados usando o piCO + Smokerlyzer 12 h antes da cirurgia. As complicações respiratórias foram registradas durante a indução da anestesia, no intraoperatório, durante a extubação e na sala de recuperação.

Resultados

Aumentos estatisticamente significativos foram observados no Grupo F em relação à incidência de hipóxia durante a indução da anestesia, broncoespasmo intraoperatório, tratamento broncodilatador intraoperatório e broncoespasmo durante a extubação. O nível de monóxido de carbono no ar expirado, o Teste para Dependência de Nicotina de Fagerstrom e o número de cigarros fumados em 12 h no pré-operatório foram designados como covariáveis no modelo de regressão. A análise de regressão logística da indução anestésica mostrou que um aumento de uma unidade no nível de monóxido de carbono no ar expirado foi associado a um aumento de 1,16 vez do risco de hipóxia (OR = 1,16; IC de 95% 1,01–1,34; p = 0,038). A análise de regressão logística do período intraoperatório mostrou que um aumento de uma unidade no número de cigarros fumados em 12 h no pré-operatório foi associado a um aumento de 1,16 vez no risco de broncoespasmo (OR = 1,16; IC de 95% 1,04–1,30, p = 0,007). Enquanto na sala de recuperação, um aumento de uma unidade no escore do Teste para Dependência de Nicotina de Fagerstrom resultou em um aumento de 1,73 vez no risco de broncoespasmo (OR = 1,73; IC de 95% 1,04–2,88; p = 0,036).

Conclusões

O tabagismo mostrou aumentar a incidência de complicações respiratórias intraoperatórias sob anestesia geral. Além disso, o nível estimado de monóxido de carbono no ar expirado no pré-operatório pode servir como um indicador do risco em potencial de complicações respiratórias perioperatórias.

PALAVRAS-CHAVE
Tabagismo; CO expirado; Perioperatório; Complicações respiratórias; Coleistectomia laparoscópica

Abstract

Background

The purpose of the current study was to determine the effects of preoperative cigarette smoking and the carbon monoxide level in the exhaled breath on perioperative respiratory complications in patients undergoing elective laparoscopic cholecystectomies.

Methods

One hundred and fifty two patients (smokers, Group S and non-smokers, Group NS), who underwent laparoscopic cholecystectomies under general anesthesia, were studied. Patients completed the Fagerstrom Test for Nicotine Dependence. The preoperative carbon monoxide level in the exhaled breath levels were determined using the piCO+ Smokerlyzer 12 h before surgery. Respiratory complications were recorded during induction of anesthesia, intraoperatively, during extubation, and in the recovery room.

Results

Statistically significant increases were noted in group S with respect to the incidence of hypoxia during induction of anesthesia, intraoperative bronchospasm, bronchodilator treatment intraoperatively, and bronchospasm during extubation. The carbon monoxide level in the exhaled breath and the Fagerstrom Test for Nicotine Dependence, and number of cigarettes smoked 12 h preoperatively were designated as covariates in the regression model. Logistic regression analysis of anesthetic induction showed that a 1 unit increase in the carbon monoxide level in the exhaled breath level was associated with a 1.16 fold increase in the risk of hypoxia (OR = 1.16; 95% CI 1.01–1.34; p = 0.038). Logistic regression analysis of the intraoperative course showed that a 1 unit increase in the number of cigarettes smoked 12 h preoperatively was associated with a 1.16 fold increase in the risk of bronchospasm (OR = 1.16; 95% CI 1.04–1.30; p = 0.007). While in the recovery room, a 1 unit increase in the Fagerstrom Test for Nicotine Dependence score resulted in a 1.73 fold increase in the risk of bronchospasm (OR = 1.73; 95% CI 1.04–2.88; p = 0.036).

Conclusions

Cigarette smoking was shown to increase the incidence of intraoperative respiratory complications while under general anesthesia. Moreover, the estimated preoperative carbon monoxide level in the exhaled breath level may serve as an indicator of the potential risk of perioperative respiratory complications.

KEYWORDS
Smoking; CO exhaled; Peri-operative; Respiratory complications; Laparoscopic cholecystectomy

Introdução

O tabagismo, um dos mais sérios problemas que ameaçam a saúde, é responsável pelo aumento da incidência de distúrbios crônicos dos sistemas respiratório e circulatório.11 Graybill WS, Frumovitz M, Nick AM, et al. Impact of smoking on perioperative pulmonary and upper respiratory complications after laparascopic gynecologic surgery. Gynecol Oncol. 2012;125:556-60.44 Myles PS, Iacono GA, Hunt JO, et al. Risk of respiratory complications and wound infection in patients undergoing ambulatory surgery: smokers versus nonsmokers. Anesthesiology. 2002;97:842-7. Relatou-se que as probabilidades de estreitamento das pequenas vias aéreas, alterações pulmonares crônicas e aumento da reatividade brônquica devem ser consideradas durante a administração de anestesia a pacientes fumantes.55 Sakai RL, Abrao GM, Avres JF, et al. Prognostic factors for perioperative pulmonary events among patients undergoing upper abdominal surgery. Sao Paulo Med J. 2007;125:315-21. Além disso, complicações pulmonares pós-operatórias, como faringite, tosse e apneia, ocorrem com mais frequência em fumantes. A taxa de mortalidade pós-operatória é maior em fumantes do que em não fumantes.66 Lee SM, Landry J, Jones PM, et al. The effectiveness of a perioperative smoking cessation program: a randomized clinical trial. Anasth Analg. 2013;117:605-13.1010 Bluman LG, Mosca L, Newman N, et al. Preoperative smoking habits and postoperative pulmonary complications. Chest. 1998;113:883-9. A função pulmonar, em particular, é afetada pela estimulação dos órgãos abdominais durante a colecistectomia laparoscópica e tração da vesícula biliar.1111 Warner DO. Preventing postoperative pulmonary complications the role of the anesthesiologist. Anesthesiology. 2000;92:1467-72.

Há uma série de estudos que se dedicaram a avaliar a incidência de complicações respiratórias no período perioperatório de pacientes que descontinuaram ou reduziram o hábito de fumar semanas antes da cirurgia.44 Myles PS, Iacono GA, Hunt JO, et al. Risk of respiratory complications and wound infection in patients undergoing ambulatory surgery: smokers versus nonsmokers. Anesthesiology. 2002;97:842-7.,77 Nakagawa M, Tanaka H, Tusukuma H, et al. Relationship between the duration of the postoperative smoke-free period and the incidence of postoperative pulmonary complications after pulmonary surgery. Chest J. 2001;120:705-10.,88 Theadom A, Cropley M. Effects of preoperative smoking cessation on the incidence and risk of intraoperative and postoperative complications in adult smokers: a systematic review. Tob Control. 2006;15:352-8. Embora os efeitos fisiológicos em longo prazo da cessação do tabagismo antes da cirurgia sejam amplamente conhecidos, inclusive redução das complicações respiratórias, os efeitos pré-operatórios da cessação do tabagismo em curto prazo não foram completamente investigados.1212 Myers K, Hajek P, Hinds C, et al. Stopping smoking shortly before surgery and postoperative complications: a systematic review and meta-analysis. Arch Intern Med. 2011;171:983-9.,1313 Schwilk B, Bothner U, Schraag S, et al. Perioperative respiratory events in smokers and nonsmokers undergoing general anaesthesia. Acta Anaesthesiol Scand. 1997;41:348-55. Vários estudos que envolveram o tabagismo tiveram como base o autorrelato e dados detalhados sobre o tabagismo não foram registrados em estudos retrospectivos.11 Graybill WS, Frumovitz M, Nick AM, et al. Impact of smoking on perioperative pulmonary and upper respiratory complications after laparascopic gynecologic surgery. Gynecol Oncol. 2012;125:556-60.,44 Myles PS, Iacono GA, Hunt JO, et al. Risk of respiratory complications and wound infection in patients undergoing ambulatory surgery: smokers versus nonsmokers. Anesthesiology. 2002;97:842-7.,1313 Schwilk B, Bothner U, Schraag S, et al. Perioperative respiratory events in smokers and nonsmokers undergoing general anaesthesia. Acta Anaesthesiol Scand. 1997;41:348-55. A estimativa do nível de monóxido de carbono no ar expirado (Exhaled Breath Carbon Monoxide – COexp) é uma técnica simples, não invasiva, rápida e de baixo custo que ajuda a confirmar o intervalo de cessação do tabagismo.22 Krzych-Falta E, Modzelewska D, Samolinski B. Levels of carbon monoxide in healthy active and passive smokers. Przegl Lek. 2015;72:99-102.44 Myles PS, Iacono GA, Hunt JO, et al. Risk of respiratory complications and wound infection in patients undergoing ambulatory surgery: smokers versus nonsmokers. Anesthesiology. 2002;97:842-7.,1414 Nihaya AS, Kheirallah KA, Mangnall LJ, et al. Agreement between exhaled breath carbon monoxide threshold levels and self-reported cigarette smoking in a sample of male adolescent in Jordan. Int J Environ Res Public Health. 2015;12:841-54.,1515 Lindström D, Azodi OS, Aladis A, et al. Effects of a perioperative smoking cessation intervention on postoperative complications. Ann Surg. 2008;248:739-45.

No presente estudo, determinamos as relações entre as complicações respiratórias perioperatórias durante colecistectomia laparoscópica eletiva e o tabagismo pré-operatório e o nível de COexp.

Métodos

Termo de consentimento informado assinado foi obtido de cada paciente. O protocolo do estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética local. O estudo foi conduzido de acordo com os princípios da Declaração de Helsinque. O trabalho foi uma investigação prospectiva, cega e feita em centro único entre dezembro de 2014 e maio de 2016, envolveu pacientes com diagnóstico de colelitíase submetidos à colecistectomia laparoscópica eletiva. Os pacientes incluídos no estudo tinham entre 18-70 anos, hábito constante de fumar nos seis meses anteriores, classificação ASA I–II (American Society of Anesthesiologists – ASA) e um Índice de Massa Corporal (IMC) de < 30 kg. m-2. Os critérios de exclusão foram rigorosos para garantir a eliminação de qualquer outra causa que não o tabagismo regular que pudesse afetar as funções respiratórias monitoradas e incluiu o seguinte: pacientes com história de alergias aos medicamentos a serem usados, infecção respiratória no mês anterior, distúrbio psiquiátrico conhecido, doença pulmonar obstrutiva crônica, insuficiência hepática ou renal, doença cardíaca coronariana, doenças pulmonares restritivas e infiltrativa, complicações antecipadas de intubação e aqueles que pararam de fumar 12 horas (h) antes da cirurgia. Os pacientes que não consumiam produtos derivados de tabaco, inclusive cigarros, charutos e cachimbos, mas que haviam sido expostos passivamente à fumaça de tabaco em casa ou no trabalho foram designados como fumantes passivos e excluídos. Os pacientes que recusaram o procedimento para estimar o nível de COexp antes da indução da anestesia também foram excluídos.

Os pacientes recrutados foram agrupados como fumantes (Grupo F, n = 75) e não fumantes (Grupo NF, n = 77). Os dados demográficos e os hábitos de fumar de todos os pacientes foram investigados e registrados. No Grupo F, a idade em que o paciente começou a fumar, a duração do hábito (em anos), o número de cigarros fumados por dia e se o paciente fumou ou não nas 12 h anteriores à cirurgia e, caso positivo, o número de cigarros fumados também foram registrados. No dia da cirurgia, a dependência de nicotina foi avaliada por meio do teste de Fagerstrom para dependência de nicotina (Fagerstrom Test for Nicotine Dependence – FTND)1616 Kunzel B, Cabalza C, Faurot M, et al. Prospective pilot study of smoking cessation in patients undergoing urologic surgery. Urology. 2012;80:104-9. e o nível de COexp foi estimado com o piCO + Smokerlyzer ® (Bedfont Micro Breathalyzer; Kent, Inglaterra) antes da indução da anestesia.

Os anestesiologistas desconheciam o nível pré-operatório de COexp ou o escore FTND. Midazolam (0,01–0,02 mg.kg–1) foi infundido como pré-medicação, seguido por injeção intravenosa de propofol (2 mg.kg–1), rocurônio (0,6 mg.kg–1) e fentanil (1–2 mcg.kg–1) para indução da anestesia. Sevoflurano em O2/ar foi usado como anestesia de manutenção para atingir o valor mínimo de concentração alveolar de 1,0. Perto do término da intervenção, metoclopramida HCl (10 mg) e acetaminofeno (2 g) foram administrados por via intravenosa (IV). No início da respiração espontânea, a extubação foi feita após administração IV de neostigmina em doses de reversão (0,03–0,05 mg.kg–1) e sulfato de atropina (0,01 mg.kg–1).

Desfechos primários

Todos os pacientes foram rotineiramente monitorados e os seguintes dados foram registrados: saturação periférica de oxigênio no pré-operatório (SpO2); hipóxia no momento da indução; tratamento de hipóxia, broncoespasmo e broncodilatador no intraoperatório; broncoespasmo e broncodilatador na extubação e hipóxia, broncoespasmo e incidência de apneia, dor de garganta, dor de cabeça e tosse (inclusive Grau 1) na sala de recuperação.1717 Minogue SC, Ralph J, Lampa MJ. Laryngotracheal topicalization with lidocaine before intubation decreases the incidence of coughing on emergence from general anesthesia. Anesth Analg. 2004;99:1253-7. Hipóxia foi definida como SpO2 ≤ 95% para saturação periférica de oxigênio em >1 min.

Desfechos secundários

Os desfechos secundários incluíram: o tempo decorrido desde a indução até a extubação, que representou o período sob anestesia geral, e o tempo necessário para a recuperação completa após a extubação. O escore de Aldrete modificado (Modified Aldrete Score – MAS) foi registrado nos minutos 5, 10 e 15 após a admissão na sala de recuperação. O escore MAS após a conclusão satisfatória da recuperação no pós-operatório foi registrado.

Análise estatística

O teste de Kolmogorov-Smirnov foi usado para determinar se as variáveis foram ou não normalmente distribuídas. As variáveis contínuas foram expressas em média ± desvio-padrão ou mediana (mínimo:máximo) e os dados categóricos expressos em n (%). Os testes do qui-quadrado de Pearson e o exato de Fisher foram usados para detectar diferenças entre os grupos com base nas variáveis categóricas. Um teste t para amostras independentes foi feito para comparar os seguintes parâmetros nos grupos F e NF: idade, altura, peso, duração da anestesia, nível de COexp. O teste U de Mann-Whitney foi feito para comparar os escores MAS no minuto cinco e a diferença entre os minutos 15 e cinco e também entre os minutos 10 e cinco no escore MAS. Anova de dois fatores com efeitos mistos para medidas repetidas foi feita para examinar o efeito principal das mensurações do MAS e a interação desses efeitos principais com os grupos F e NF. Para determinar os fatores de risco que afetam a hipóxia e o desenvolvimento de broncoespasmo no Grupo F, uma análise de regressão logística binária foi feita com a abordagem de seleção reversa. O nível de COexp, FTND e o número de cigarros fumados nas 12 h de pré-operatório foram selecionados como covariáveis nos modelos de regressão. Uma análise do poder post hoc foi feita com base nas proporções de hipóxia na indução (18,70% no Grupo F vs. 5,20% no Grupo NF). Com o GPower 3.1 (http://www.gpower.hhu.de/), um poder de 74% com um de 0,05 foi calculado na comparação do teste do qui-quadrado com n = 75 para o Grupo F e n = 77 para o Grupo NF, com tamanho de efeito de d = 0,19. A avaliação estatística dos dados foi feita no SPSS 21.0 for Windows (Statistical Package for Social Sciences, Armonk, NY, EUA) e p < 0,05 indicou significância estatística.

Resultados

Dos 221 pacientes submetidos à colecistectomia laparoscópica, os dados derivados de 152 foram incluídos na análise do estudo. Os dados dos seguintes pacientes foram excluídos: 37 fumantes passivos, 13 do Grupo F que pararam de fumar 12 h antes da cirurgia, cinco do Grupo F e quatro do Grupo NF que não concordaram com a mensuração do nível de COexp, quatro do Grupo NF com nível de COexp > 10 ppm atribuído ao tabagismo passivo e dois submetidos à conversão para colecistectomia aberta (fig. 1).

Figura 1
Fluxograma dos procedimentos.

Os dados demográficos dos pacientes são apresentados na tabela 1. Não houve diferença estatisticamente significativa entre os grupos F e NF (p > 0,05).

Tabela 1
Dados demográficos

Os dados sobre o hábito de fumar dos pacientes do Grupo F são apresentados na tabela 2. O escore médio do FTND foi determinado para representar um nível baixo de dependência (3,76 ± 2,07).

Tabela 2
Hábito de fumar

Desfechos primários

Não foram detectadas diferenças intergrupos estatisticamente significativas em relação aos dados de hipóxia pré-operatória, hipóxia intraoperatória, tratamento com broncodilatador no momento da extubação e incidência de dor de garganta e cefaleia durante o período de recuperação; entretanto, hipóxia durante a indução, broncoespasmo intraoperatório, broncodilatador e broncoespasmo no momento da extubação foram significativamente superiores no Grupo F. Além disso, as incidências de hipóxia, apneia e tosse durante a recuperação foram significativamente maiores no Grupo F (tabela 3).

Tabela 3
Comparação dos pacientes dos grupos F e NF para incidências perioperatórias de complicações respiratórias (n,%)

A análise de regressão logística multivariada foi usada para determinar os fatores de risco que afetam a hipóxia e o desenvolvimento de broncoespasmo no Grupo F e os desfechos avaliados estão resumidos nas tabelas 4 e 5, respectivamente. Com base nos modelos de regressão logística construídos para hipóxia, os modelos não foram significativos para os períodos pré-operatório, intraoperatório e de recuperação (respectivamente, p = 0,809, p = 0,882 e p = 0,070), mas foram significativos para período de indução (p = 0,047) e, portanto, os resultados para os períodos pré-operatório, intraoperatório e de recuperação não puderam ser interpretados. O aumento de uma unidade no nível de COexp resultou em um aumento de 1,16 vez do risco de hipóxia durante a indução anestésica por análise de regressão logística (OR = 1,16; IC de 95% 1,01–1,34; p = 0,038). Com base no desenvolvimento de broncoespasmo durante o modelo de regressão logística na extubação, os resultados não foram significativamente diferentes e, portanto, não puderam ser interpretados. Com base nos modelos de regressão logística construídos para o desenvolvimento de broncoespasmo, os modelos não foram significativos para o período de extubação (p = 0,082), mas foram significativos para os períodos intraoperatório e de recuperação (p = 0,005 e p = 0,019) e, portanto, os resultados para o período de extubação não puderam ser interpretados. Com base na análise de regressão logística, o aumento de uma unidade no nível do tabagismo levou a um aumento de 1,16 vez do risco de broncoespasmo (OR = 1,16; IC de 95% 1,04–1,30; p = 0,007). Durante a fase de recuperação, um aumento de uma unidade no escore do FTND levou a um aumento de 1,73 vez do risco de broncoespasmo (OR = 1,77; IC de 95% 1,04–2,88; p = 0,036).

Tabela 4
Fatores de risco independentes que afetam o desenvolvimento de hipóxia
Tabela 5
Fatores de risco independentes que afetam o desenvolvimento de broncoespasmo

Desfechos secundários

Não houve diferença intergrupos estatisticamente significativa na duração da cirurgia entre os grupos F e NF (p = 0,21). O período de tempo sob anestesia foi significativamente maior no Grupo F (p = 0,048). O tempo necessário para a recuperação também foi significativamente maior no Grupo F (p = 0,031) (tabela 6). O escore MAS no 5°min foi significativamente maior no Grupo NF (p < 0,001). As medianas dos escores MAS dos grupos F e NF no 5°min foram 9 (5:10) e 10 (7:10), respectivamente, e o aumento mediano do escore MAS foi de 2 (0:5) (0:3) e houve diferença entre os dois grupos quanto ao aumento das quantidades obtidas, de acordo com a mensuração no 5°min (p < 0,001). No 15°min, as medianas dos escores MAS nos grupos F e NF foram 10 (8:10) e 10 (8:10), respectivamente, e o aumento mediano do escore MAS no Grupo F foi de 2 (0:7) (0:4) e houve diferença entre os dois grupos nas quantidades de aumento obtidas, de acordo com a mensuração no 5ºmin (p < 0,001) (tabela 6). Anova foi feita para avaliar as mudanças nos parâmetros do MAS tanto para as mensurações seriadas quanto para os escores entre os grupos. Anova de variância simples para medidas repetidas foi feita para avaliar a hipótese nula de que não houve alteração nos escores MAS dos participantes. Os resultados de Anova indicaram um efeito de tempo significativo, Lambda de Wilks = 0,35, F(2, 149) = 137,94, p< 0,001, /2 = 0,65. Logo, há evidências significativas para rejeitar a hipótese nula. Os testes post hoc com a correção de Bonferroni revelaram que cada diferença pareada foi significativa (o valor de p para MAS no 5°min vs. 10°min, MAS no 5°min vs. 15°min e MAS no 10°min vs. 15°min foi p < 0,001). Houve aumento significativo dos escores MAS ao longo do tempo (as médias dos escores MAS nos minutos 5, 10 e 15 foram: 8,10 ± 1,64, 9,36 ± 1,86 e 9,89 ± 0,37, respectivamente). Houve efeito principal significativo nas mensurações do MAS em geral (p < 0,001) e houve efeito de interação significativo entre o MAS e os grupos de estudo; portanto, pode-se concluir que a diferença entre as mensurações depende da associação dos grupos (p< 0,001). Os efeitos separados do MAS para o Grupo F e Grupo NF seriam obscurecidos se considerados em conjunto, então os grupos F e NF foram analisados separadamente (efeitos simples). Para a análise do Grupo F, o MAS tem um efeito para os respondentes, Lambda de Wilks = 0,27, F(2, 73) = 97,72, p< 0,001, /2 = 0,76. Testes post hoc com a correção de Bonferroni revelaram que cada diferença pareada foi significativa (o valor de p para MAS no 5°min vs. 10°min, MAS no 5°min vs. 15°min e MAS no 10°min vs. 15°min foi p < 0,001). Houve aumento significativo dos escores MAS ao longo do tempo (as médias dos escores MAS nos minutos 5, 10 e 15 foram: 7,25 ± 1,73, 9,09 ± 1,04 e 9,83 ± 0,45, respectivamente). Para a análise do Grupo NF, MAS também apresentou efeito para os respondentes, Lambda = 0,50, F(2, 75) = 37,95, p< 0,001, /2 = 0,50. Os testes post hoc com a correção de Bonferroni revelaram que cada diferença pareada foi significativa (o valor de p para MAS no 5°min vs. 10°min, MAS no 5°min vs. 15°min e MAS no 10°min vs. 15°min foi p< 0,001). Houve aumento significativo dos escores MAS ao longo do tempo (as médias dos escores MAS nos minutos 5, 10 e 15 foram: 8,92 ± 1,04, 9,69 ± 0,59 e 9,92 ± 0,25, respectivamente). Os níveis pré-operatórios de COexp no Grupo F foram significativamente maiores em comparação com o Grupo NF (7,50 ± 4,66 ppm vs. 2,53 ± 1,22 ppm, respectivamente; p< 0,001) (tabela 6).

Tabela 6
Comparação dos escores MAS e do COexp entre os grupos

Discussão

A relação entre os níveis pré-operatórios de COexp e os efeitos do tabagismo nas complicações respiratórias perioperatórias foi o foco do presente estudo. Nos pacientes do Grupo F houve aumento significativo das incidências de hipóxia durante a indução anestésica, broncoespasmo intraoperatório e tratamento com broncodilatador, broncoespasmo no momento da extubação, hipóxia, tosse e apneia na sala de recuperação e do tempo necessário para a recuperação.

Incidências mais altas de complicações perioperatórias, como aumento da reatividade do sistema respiratório, dor de garganta, tosse e apneia, foram relatadas nos pacientes fumantes.11 Graybill WS, Frumovitz M, Nick AM, et al. Impact of smoking on perioperative pulmonary and upper respiratory complications after laparascopic gynecologic surgery. Gynecol Oncol. 2012;125:556-60.,44 Myles PS, Iacono GA, Hunt JO, et al. Risk of respiratory complications and wound infection in patients undergoing ambulatory surgery: smokers versus nonsmokers. Anesthesiology. 2002;97:842-7.1010 Bluman LG, Mosca L, Newman N, et al. Preoperative smoking habits and postoperative pulmonary complications. Chest. 1998;113:883-9. Nossos achados estão de acordo com a literatura existente.

Embora o tempo até a conclusão da cirurgia não tenha diferido significativamente entre os pacientes dos grupos F e NF, o tempo sob anestesia geral foi significativamente prolongado nos pacientes do Grupo F. Relatou-se que a duração das colecistectomias laparoscópicas ficou entre 30 e 166 min,33 Møller AM, Villebro N, Pedersen T, et al. Effect of preoperative smoking intervention on postoperative complications: a randomised clinical trial. Lancet. 2002;359:114-7.66 Lee SM, Landry J, Jones PM, et al. The effectiveness of a perioperative smoking cessation program: a randomized clinical trial. Anasth Analg. 2013;117:605-13. o que está de acordo com nossos achados, e que a duração da anestesia ficou entre 3h30 min e 4h30 min, geralmente baseada em comparações entre grupos.55 Sakai RL, Abrao GM, Avres JF, et al. Prognostic factors for perioperative pulmonary events among patients undergoing upper abdominal surgery. Sao Paulo Med J. 2007;125:315-21.,1818 Lee A, Chui PT, Chui CH, et al. Risk of perioperative respiratory complications and postoperative morbidity in a cohort of adults exposed to passive smoking. Ann Surg. 2015;261:297-303. Lee et al.1818 Lee A, Chui PT, Chui CH, et al. Risk of perioperative respiratory complications and postoperative morbidity in a cohort of adults exposed to passive smoking. Ann Surg. 2015;261:297-303. compararam fumantes e não fumantes submetidos a cirurgias diferentes e não encontraram diferença significativa na duração da anestesia, enquanto o tempo sob anestesia no Grupo F foi significativamente prolongado no presente estudo. Porém, a significância clínica de alguns minutos para despertar é mínima e esse resultado não pode ser considerado válido.

Vários estudos relataram que o nível de COexp em fumantes varia entre 11 e 15,5 ppm.44 Myles PS, Iacono GA, Hunt JO, et al. Risk of respiratory complications and wound infection in patients undergoing ambulatory surgery: smokers versus nonsmokers. Anesthesiology. 2002;97:842-7.,66 Lee SM, Landry J, Jones PM, et al. The effectiveness of a perioperative smoking cessation program: a randomized clinical trial. Anasth Analg. 2013;117:605-13.,1515 Lindström D, Azodi OS, Aladis A, et al. Effects of a perioperative smoking cessation intervention on postoperative complications. Ann Surg. 2008;248:739-45. A média de COexp para fumantes no presente estudo foi de 7 ppm. Apenas um estudo relatou a relação entre o nível de COexp e a incidência de complicações respiratórias.1919 Dennis A, Curran J, Sherriff J, et al. Effects of passive and active smoking on induction of anaesthesia. Br J Anaesth. 1994;73:450-2. No presente estudo, os dados sobre tabagismo e não tabagismo 12 h antes da cirurgia foram usados para determinar a correlação com complicações respiratórias – dados sobre fumantes passivos não foram incluídos na avaliação.

A média do escore FTND no presente estudo foi consistente com um nível baixo de dependência de nicotina. O escore FTND foi usado para estimar a magnitude e o perfil da dependência de nicotina.33 Møller AM, Villebro N, Pedersen T, et al. Effect of preoperative smoking intervention on postoperative complications: a randomised clinical trial. Lancet. 2002;359:114-7.,66 Lee SM, Landry J, Jones PM, et al. The effectiveness of a perioperative smoking cessation program: a randomized clinical trial. Anasth Analg. 2013;117:605-13. Moller et al.33 Møller AM, Villebro N, Pedersen T, et al. Effect of preoperative smoking intervention on postoperative complications: a randomised clinical trial. Lancet. 2002;359:114-7. relataram um nível moderado de dependência na maioria dos pacientes em seu estudo, enquanto a média do escore FTND relatada por Lee et al.66 Lee SM, Landry J, Jones PM, et al. The effectiveness of a perioperative smoking cessation program: a randomized clinical trial. Anasth Analg. 2013;117:605-13. foi de 4,3. Na maioria dos estudos que avaliaram os efeitos do tabagismo nos desfechos cirúrgicos, a magnitude da dependência de nicotina não foi investigada.11 Graybill WS, Frumovitz M, Nick AM, et al. Impact of smoking on perioperative pulmonary and upper respiratory complications after laparascopic gynecologic surgery. Gynecol Oncol. 2012;125:556-60.,33 Møller AM, Villebro N, Pedersen T, et al. Effect of preoperative smoking intervention on postoperative complications: a randomised clinical trial. Lancet. 2002;359:114-7.,1313 Schwilk B, Bothner U, Schraag S, et al. Perioperative respiratory events in smokers and nonsmokers undergoing general anaesthesia. Acta Anaesthesiol Scand. 1997;41:348-55.,1818 Lee A, Chui PT, Chui CH, et al. Risk of perioperative respiratory complications and postoperative morbidity in a cohort of adults exposed to passive smoking. Ann Surg. 2015;261:297-303.

O presente estudo limitou-se a pacientes sem doenças sistêmicas que precisaram de colecistectomias laparoscópicas. Portanto, os dados são mais uniformes em comparação com estudos anteriores que avaliaram os efeitos do tabagismo sobre complicações respiratórias perioperatórias, com dados coletados de diversos procedimentos cirúrgicos e anestésicos.33 Møller AM, Villebro N, Pedersen T, et al. Effect of preoperative smoking intervention on postoperative complications: a randomised clinical trial. Lancet. 2002;359:114-7.66 Lee SM, Landry J, Jones PM, et al. The effectiveness of a perioperative smoking cessation program: a randomized clinical trial. Anasth Analg. 2013;117:605-13.,1010 Bluman LG, Mosca L, Newman N, et al. Preoperative smoking habits and postoperative pulmonary complications. Chest. 1998;113:883-9.,1515 Lindström D, Azodi OS, Aladis A, et al. Effects of a perioperative smoking cessation intervention on postoperative complications. Ann Surg. 2008;248:739-45.,2020 Smith T, Pinnock C, Lin T. Fundamentals of anaesthesia. 3rd ed. New York: Cambridge University Press; 2008. p. 3-4. Além disso, alguns dos estudos incluíram fumantes com distúrbios cardiovasculares e respiratórios, diferentemente do presente estudo.55 Sakai RL, Abrao GM, Avres JF, et al. Prognostic factors for perioperative pulmonary events among patients undergoing upper abdominal surgery. Sao Paulo Med J. 2007;125:315-21.,1313 Schwilk B, Bothner U, Schraag S, et al. Perioperative respiratory events in smokers and nonsmokers undergoing general anaesthesia. Acta Anaesthesiol Scand. 1997;41:348-55.

A maioria dos estudos relatou uma incidência elevada de complicações respiratórias em pacientes com hábito regular de fumar.44 Myles PS, Iacono GA, Hunt JO, et al. Risk of respiratory complications and wound infection in patients undergoing ambulatory surgery: smokers versus nonsmokers. Anesthesiology. 2002;97:842-7.66 Lee SM, Landry J, Jones PM, et al. The effectiveness of a perioperative smoking cessation program: a randomized clinical trial. Anasth Analg. 2013;117:605-13.,1010 Bluman LG, Mosca L, Newman N, et al. Preoperative smoking habits and postoperative pulmonary complications. Chest. 1998;113:883-9. No presente estudo, demonstramos uma incidência maior de complicações respiratórias nos pacientes do Grupo F. Alguns dos estudos relatados avaliaram complicações intra- e pós-operatórias separadamente,44 Myles PS, Iacono GA, Hunt JO, et al. Risk of respiratory complications and wound infection in patients undergoing ambulatory surgery: smokers versus nonsmokers. Anesthesiology. 2002;97:842-7.66 Lee SM, Landry J, Jones PM, et al. The effectiveness of a perioperative smoking cessation program: a randomized clinical trial. Anasth Analg. 2013;117:605-13.,1818 Lee A, Chui PT, Chui CH, et al. Risk of perioperative respiratory complications and postoperative morbidity in a cohort of adults exposed to passive smoking. Ann Surg. 2015;261:297-303. enquanto outros estudos se concentraram apenas nas complicações pós-operatórias.33 Møller AM, Villebro N, Pedersen T, et al. Effect of preoperative smoking intervention on postoperative complications: a randomised clinical trial. Lancet. 2002;359:114-7.,77 Nakagawa M, Tanaka H, Tusukuma H, et al. Relationship between the duration of the postoperative smoke-free period and the incidence of postoperative pulmonary complications after pulmonary surgery. Chest J. 2001;120:705-10.,1010 Bluman LG, Mosca L, Newman N, et al. Preoperative smoking habits and postoperative pulmonary complications. Chest. 1998;113:883-9.,1515 Lindström D, Azodi OS, Aladis A, et al. Effects of a perioperative smoking cessation intervention on postoperative complications. Ann Surg. 2008;248:739-45.,2121 Taber DJ, Ashccraft E, Cattanach LA, et al. No difference between smokers, former smokers, or nonsmokers in the operative outcomes of laparoscopic donor nephrectomies. Surg Laparosc Endosc Percutan Tech. 2009;19:153-6. Monitoramos os pacientes do estudo para complicações respiratórias durante a indução anestésica, no período intraoperatório, no momento da extubação e durante a recuperação. Complicações respiratórias ocorreram em 25,3% dos pacientes do Grupo F e em 3,9% dos pacientes do Grupo NF enquanto estavam na sala de cirurgia, indicaram um aumento de aproximadamente seis vezes atribuível ao tabagismo. A inclusão dos dados de complicações respiratórias na sala de recuperação aumentou a incidência de complicações em cinco vezes; especificamente, as complicações respiratórias afetaram 58,7% e 13% dos pacientes dos grupos F e NS, respectivamente. A incidência de complicações respiratórias no perioperatório relatada por Lee et al.1818 Lee A, Chui PT, Chui CH, et al. Risk of perioperative respiratory complications and postoperative morbidity in a cohort of adults exposed to passive smoking. Ann Surg. 2015;261:297-303. foi de 9,5%. Myless et al.44 Myles PS, Iacono GA, Hunt JO, et al. Risk of respiratory complications and wound infection in patients undergoing ambulatory surgery: smokers versus nonsmokers. Anesthesiology. 2002;97:842-7. relataram uma incidência de complicações respiratórias perioperatórias de 32,8% em pacientes fumantes, o que foi 1,7 vez maior do que nos não fumantes. O uso de anestesia geral e a feitura de cirurgia abdominal superior nas proximidades do diafragma podem ter contribuído para os efeitos no sistema respiratório e para a presença de tosse leve na sala de recuperação, conforme relatado aqui. Observamos uma incidência de 18% de hipóxia durante a indução nos pacientes do Grupo F, três vezes maior do que nos pacientes do Grupo NF. Sabe-se que um IMC elevado complica a ventilação com máscara.2121 Taber DJ, Ashccraft E, Cattanach LA, et al. No difference between smokers, former smokers, or nonsmokers in the operative outcomes of laparoscopic donor nephrectomies. Surg Laparosc Endosc Percutan Tech. 2009;19:153-6. O valor médio do IMC > 27 kg.m-2 em nossos pacientes pode ter contribuído para o aumento da incidência de hipóxia junto com o tabagismo. Dennis et al.1919 Dennis A, Curran J, Sherriff J, et al. Effects of passive and active smoking on induction of anaesthesia. Br J Anaesth. 1994;73:450-2. relataram uma incidência 2,2 vezes maior de hipóxia durante a indução da anestesia em fumantes passivos, em comparação com não fumantes. Em pacientes com níveis elevados de carboxiemoglobina, mas sem dados sobre tabagismo, o declínio da SpO2 durante a indução da anestesia foi mais pronunciado do que outras complicações.1919 Dennis A, Curran J, Sherriff J, et al. Effects of passive and active smoking on induction of anaesthesia. Br J Anaesth. 1994;73:450-2. As complicações respiratórias perioperatórias relacionadas ao tabagismo em vários estudos estão resumidas na tabela 7.

Tabela 7
Os estudos das complicações respiratórias perioperatórias relacionadas ao tabagismo

No presente estudo, as incidências intraoperatórias de broncoespasmo e broncodilatador foram de 8% e 9,3%, respectivamente, refletiram complicações respiratórias significativamente aumentadas nos pacientes do Grupo F. Nossos resultados estão de acordo com os achados de Myles et al.,44 Myles PS, Iacono GA, Hunt JO, et al. Risk of respiratory complications and wound infection in patients undergoing ambulatory surgery: smokers versus nonsmokers. Anesthesiology. 2002;97:842-7. que relataram incidência de broncoespasmo e laringoespasmo no intraoperatório e na SRPA de 9,4%. A incidência de broncoespasmo intraoperatório foi de 5% entre os pacientes fumantes, conforme relatado por Lee et al.1818 Lee A, Chui PT, Chui CH, et al. Risk of perioperative respiratory complications and postoperative morbidity in a cohort of adults exposed to passive smoking. Ann Surg. 2015;261:297-303. De fato, esse resultado é menor do que o determinado em nosso estudo e pode ser devido à inclusão de casos ortopédicos, gerais, ginecológicos e urológicos em seus grupos de estudo.44 Myles PS, Iacono GA, Hunt JO, et al. Risk of respiratory complications and wound infection in patients undergoing ambulatory surgery: smokers versus nonsmokers. Anesthesiology. 2002;97:842-7.,1818 Lee A, Chui PT, Chui CH, et al. Risk of perioperative respiratory complications and postoperative morbidity in a cohort of adults exposed to passive smoking. Ann Surg. 2015;261:297-303. Warner et al.2222 Warner DO, Warner MA, Offord KP, et al. Airway obstruction and perioperative complications in smokers undergoing abdominal surgery. Anesthesiology. 1999;90:372-9. relataram uma incidência de 2,2% de broncoespasmo perioperatório em seu estudo retrospectivo. O motivo de a incidência de broncoespasmo ser menor do que a registrada em nosso estudo pode ser a predominância de pacientes não fumantes e o fato de aproximadamente 40% dos casos não serem submetidos à cirurgia abdominal superior. Em um estudo retrospectivo, Schwilk et al.1313 Schwilk B, Bothner U, Schraag S, et al. Perioperative respiratory events in smokers and nonsmokers undergoing general anaesthesia. Acta Anaesthesiol Scand. 1997;41:348-55. relataram uma incidência de 2% de broncoespasmo perioperatório em fumantes com diferentes classificações ASA e submetidos a procedimentos cirúrgicos ortopédicos. Em outro estudo retrospectivo, Sakai et al.55 Sakai RL, Abrao GM, Avres JF, et al. Prognostic factors for perioperative pulmonary events among patients undergoing upper abdominal surgery. Sao Paulo Med J. 2007;125:315-21. relataram aumento significativo da incidência de hipóxia no intraoperatório e durante a recuperação em pacientes com problemas respiratórios e cardíacos, o que é similar às nossas observações.

Relatou-se que a incidência de hipóxia em sala de recuperação ficou entre 1% e 9,4%.44 Myles PS, Iacono GA, Hunt JO, et al. Risk of respiratory complications and wound infection in patients undergoing ambulatory surgery: smokers versus nonsmokers. Anesthesiology. 2002;97:842-7.,55 Sakai RL, Abrao GM, Avres JF, et al. Prognostic factors for perioperative pulmonary events among patients undergoing upper abdominal surgery. Sao Paulo Med J. 2007;125:315-21.,1818 Lee A, Chui PT, Chui CH, et al. Risk of perioperative respiratory complications and postoperative morbidity in a cohort of adults exposed to passive smoking. Ann Surg. 2015;261:297-303. A título de comparação, a incidência de hipóxia nos pacientes do Grupo F foi de 36%, muito superior aos resultados dos estudos acima mencionados. A SpO2 < 90–92% estimada nesses estudos pode em parte destacar a menor incidência de hipóxia em comparação com o estudo atual.

Observamos uma incidência de 41,3% e 6,5% de tosse entre os pacientes fumantes e não fumantes, respectivamente, indicou uma diferença significativa entre os dois grupos na sala de recuperação. Em estudos que relataram a incidência de tosse entre fumantes e não fumantes, os valores variaram entre 1,7–20% e 0,3–11%, respectivamente.44 Myles PS, Iacono GA, Hunt JO, et al. Risk of respiratory complications and wound infection in patients undergoing ambulatory surgery: smokers versus nonsmokers. Anesthesiology. 2002;97:842-7.,1818 Lee A, Chui PT, Chui CH, et al. Risk of perioperative respiratory complications and postoperative morbidity in a cohort of adults exposed to passive smoking. Ann Surg. 2015;261:297-303. Os valores mais elevados obtidos em nosso estudo podem ser devidos à nossa diferenciação entre as intensidades leve e grave da tosse, bem como a inclusão de apenas pacientes submetidos à cirurgia abdominal superior.

Registramos uma incidência significativamente elevada de apneia (6,7%) durante o período de recuperação nos pacientes do Grupo F. No estudo conduzido por Myles et al.44 Myles PS, Iacono GA, Hunt JO, et al. Risk of respiratory complications and wound infection in patients undergoing ambulatory surgery: smokers versus nonsmokers. Anesthesiology. 2002;97:842-7., a incidência de apneia entre os fumantes durante sete dias de pós-operatório foi de 6,8%, o que é consistente com nossos resultados.

Quanto aos relatos publicados do efeito do tabagismo sobre as complicações respiratórias perioperatórias, não identificamos dados sobre os escores MAS em adultos. Além disso, alguns estudos não incluíram o tempo necessário para a recuperação.33 Møller AM, Villebro N, Pedersen T, et al. Effect of preoperative smoking intervention on postoperative complications: a randomised clinical trial. Lancet. 2002;359:114-7.,66 Lee SM, Landry J, Jones PM, et al. The effectiveness of a perioperative smoking cessation program: a randomized clinical trial. Anasth Analg. 2013;117:605-13.,1010 Bluman LG, Mosca L, Newman N, et al. Preoperative smoking habits and postoperative pulmonary complications. Chest. 1998;113:883-9. No presente estudo, o tempo necessário para a recuperação foi significativamente maior nos pacientes do Grupo F. Neto et al.2323 Neto JY, Thomson JC, Cardosa JR. Postoperative respiratory complications from elective and urgent/emergency surgery performed at a university hospital. J Bras Pneumol. 2005;31:41-7. relataram resultados que estão de acordo com os nossos resultados, enquanto Graybill et al.11 Graybill WS, Frumovitz M, Nick AM, et al. Impact of smoking on perioperative pulmonary and upper respiratory complications after laparascopic gynecologic surgery. Gynecol Oncol. 2012;125:556-60. não encontraram diferença significativa entre fumantes e não fumantes. Embora nossos resultados sobre o despertar na sala de recuperação tenham sido significativamente diferentes entre os dois grupos, o tempo necessário para despertar não resultou em alterações clínicas significativas.

As limitações de nosso estudo incluem os baixos escores de FNDT, a falta de uma escala objetiva para a gravidade da tosse e a ausência de dados sobre complicações respiratórias no longo prazo.

Conclusão

O presente estudo é o primeiro a avaliar as complicações respiratórias associadas à colecistectomia laparoscópica em cada fase do procedimento, inclusive os períodos de indução anestésica, de intraoperatório, de extubação e de recuperação. Acreditamos ter contribuído para a literatura em geral ao relatar o aumento da incidência de complicações do sistema respiratório no perioperatório de colecistectomias laparoscópicas eletivas entre pacientes com hábito regular de fumar. Especificamente, o número de cigarros consumidos nas 12 h anteriores à cirurgia, o nível de COexp pré-operatório e o escore FNDT mostraram impacto nas complicações respiratórias perioperatórias.

Devemos ter em mente que consultas pré-operatórias detalhadas sobre o estado de tabagismo dos pacientes e mensuração do nível de COexp com uma técnica simples e não invasiva seriam úteis para os anestesiologistas no que diz respeito à probabilidade de complicações respiratórias perioperatórias. Demonstramos aqui que pesquisas adicionais são necessárias.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Oct 2018

Histórico

  • Recebido
    7 Jan 2017
  • Aceito
    19 Fev 2018
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