Acessibilidade / Reportar erro

Avaliação in vitro da eficácia de método para limitar a pressão de insuflação dos balonetes das cânulas endotraqueais Estudo realizado no Hospital Central da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVO:

Os balonetes das cânulas traqueais protegem as vias aéreas inferiores da aspiração de conteúdo gástrico e facilitam a ventilação pulmonar, mas podem provocar diversas complicações, principalmente quando a pressão do balonete supera 30 cm H2O. Isto ocorre em mais de 30% das insuflações convencionais, sendo recomendada a limitação desta pressão. Neste estudo avaliou-se in vitro a eficácia de um método para limitar a pressão dos balonetes à faixa entre 20 e 30 cm H2O.

MÉTODO:

Utilizando um adaptador para conectar a cânula testada ao aparelho de anestesia, regulou-se a válvula limitadora deste a 30 cm H2O, insuflando o balonete por meio do acionamento do botão de fluxo rápido de oxigênio. Realizaram-se 33 testes para cada cânula de três fabricantes, de cinco tamanhos (6.5 a 8.5), utilizando três tempos para insuflação (10, 15 e 20 segundos), totalizando 1485 testes. Terminada a insuflação, mediu-se a pressão obtida com um manômetro. Pressões >30 cm H2O ou < 20 cm H2O foram consideradas falhas.

RESULTADOS:

Ocorreram oito falhas (0,5%; IC 95%: 0,1-0,9%), sendo todas por pressões <20 cm H2O e após insuflações de 10 segundos (1,6%; IC 95%: 0,5-2,7%). Uma falha ocorreu com cânula 6.5 (0,3%; IC 95%: -0,3-0,9%), seis com cânulas 7.0 (2%; IC 95%: 0,4-3,6%), e uma com cânula 7.5 (0,3%; IC 95%: -0,3-0,9%).

CONCLUSÃO:

Este método mostrou-se eficaz para insuflar os balonetes de cânulas traqueais de diferentes tamanhos e fabricantes limitando sua pressão à faixa entre 20 e 30 cm H2O, com incidência de sucesso de 99,5% (IC 95%: 99,1-99,9%).

Palavras-chave:
Método; Insuflação; Balonetes; Cânulas; Pressão

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVE:

Cuffs of tracheal tubes protect the lower airway from aspiration of gastric contents and facilitate ventilation, but may cause many complications, especially when the cuff pressure exceeds 30 cm H2O. This occurs in over 30% of conventional insufflations, so it is recommended to limit this pressure. In this study we evaluated the in vitro effectiveness of a method of limiting the cuff pressure to a range between 20 and 30 cm H2O.

METHOD:

Using an adapter to connect the tested tube to the anesthesia machine, the relief valve was regulated to 30 cm H2O, inflating the cuff by operating the rapid flow of oxygen button. There were 33 trials for each tube of three manufacturers, of five sizes (6.5-8.5), using three times inflation (10, 15 and 20 s), totaling 1485 tests. After inflation, the pressure obtained was measured with a manometer. Pressure >30 cm H2O or <20 cm H2O were considered failures.

RESULTS:

There were eight failures (0.5%, 95% CI: 0.1-0.9%), with all by pressures <20 cm H2O and after 10 s inflation (1.6%, 95% CI: 0 5-2.7%). One failure occurred with a 6.5 tube (0.3%, 95% CI: -0.3 to 0.9%), six with 7.0 tubes (2%, 95% CI: 0.4-3.6%), and one with a 7.5 tube (0.3%, 95% CI: -0.3 to 0.9%).

CONCLUSION:

This method was effective for inflating tracheal tube cuffs of different sizes and manufacturers, limiting its pressure to a range between 20 and 30 cm H2O, with a success rate of 99.5% (95% CI: 99.1-99.9%).

Keywords:
Method; Inflation; Cuffs; Tube; Pressure

Introdução

Os balonetes de cânulas endotraqueais de alta pressão e baixo volume (APBV) ou alto volume e baixa pressão (AVBP), quando insuflados exercem pressão sobre a parede traqueal, podendo levar à isquemia da mucosa, que tem relação direta com a ocorrência de complicações em até 90% dos pacientes, desde desconforto, dor de garganta, formação de granuloma nas cordas vocais e rouquidão, até complicações graves como paralisia de nervo laríngeo recorrente e das cordas vocais, expectoração sanguinolenta, fístula traqueo-esofágica e rotura traqueal.11 Estebe JP, Delahaye S, Le Corre P. Alkalinization of intracuff lidocaine and use of gel lubrication protect against tracheal tube-induced emergence phenomena. Br J Anaesth. 2004;92:361-6.,22 Kaneda N, Goto R, Ishijima S, et al. Laryngeal granuloma caused by short-term endotracheal intubation. Anesthesiology. 1999;90:1482-3.,33 Audu P, Artz G, Scheid S, et al. Recurrent laryngeal nerve palsy after anterior cervical spine surgery. Anesthesiology. 2006;105:898-901.and44 Liu J, Zhang X, Gong W, et al. Correlations between controlled endotracheal tube cuff pressure and postprocedural complications: a multicenter study. Anesth Analg. 2010;111:1133-7.

Existem diversos métodos para a injeção de ar no balonete da cânula de intubação. O método padrão-ouro é a medição direta da Pbalonete com manômetro calibrado, analógico55 Blanch PB. Laboratory evaluation of 4 brands of endotracheal tube cuff inflator. Respir Care. 2004;49:166-73. ou digital,66 Crimlisk JT, Horn MH, Wilson DJ, et al. Artificial airways: a survey of cuff management practices. Heart Lung. 1996;25: 225-35. sendo recomendado em pacientes adultos e pediátricos.55 Blanch PB. Laboratory evaluation of 4 brands of endotracheal tube cuff inflator. Respir Care. 2004;49:166-73.,77 Galinski M, Tréoux V, Garrigue B, et al. Intracuff pressures of endotracheal tubes in the management of airway emergencies: the need for pressure monitoring. Ann Emerg Med. 2006;47:545-7.,88 Sengupta P, Sessler DI, Maglinger P, et al. Endotracheal tube cuff pressure in three hospitals, and the volume required to produce an appropriate cuff pressure. BMC Anesthesiol. 2004;4:8-13.and99 Tobias JD, Schwartz L, Rice J, et al. Cuffed endotracheal tubes in infants and children: should we routinely measure the cuff pressure? Int J Pediatr Otorhinolaryngol. 2012;76:61-3. No entanto, seu uso não é rotineiro no Brasil.

A injeção de ar no balonete com uma seringa é método mais utilizado. Este método é simples, rápido e de baixo custo, mas a relação entre o volume de ar injetado e a Pbal-traq resultante não é linear, causando a hiperdistensão do balonete em 30% a 98% dos casos,77 Galinski M, Tréoux V, Garrigue B, et al. Intracuff pressures of endotracheal tubes in the management of airway emergencies: the need for pressure monitoring. Ann Emerg Med. 2006;47:545-7.,88 Sengupta P, Sessler DI, Maglinger P, et al. Endotracheal tube cuff pressure in three hospitals, and the volume required to produce an appropriate cuff pressure. BMC Anesthesiol. 2004;4:8-13.,1010 Dobrin PB, Goldberg EM, Canfield TR. The endotracheal cuff: a comparative study. Anesth Analg. 1974;53:456-60.,1111 Chapman J, Pallin D, Ferrara L, et al. Endotracheal tube cuff pressures in patients intubated before transport. Am J Emerg Med. 2009;27:980-2.,1212 Felten ML, Schmautz E, Delaporte-Cerceau S, et al. Endotracheal tube cuff pressure is unpredictable in children. Anesth Analg. 2003;97:1612-6.and1313 Bassi M, Zuercher M, Erne JJ, et al. Endotracheal tube intracuff pressure during helicopter transport. Ann Emerg Med. 2010;56:89-93, e1. dependendo da população estudada, do calibre da cânula endotraqueal utilizada e do contexto clínico.1414 Yildirim ZB, Uzunkoy A, Cigdem A, et al. Changes in cuff pressure of endotracheal tube during laparoscopic and open abdominal surgery. Surg Endosc. 2012;26:398-401.

Outros métodos visando limitar a Pbal-traq foram propostos, como as técnicas do mínimo volume oclusivo (MVO) e a técnica do escape mínimo (TEM), entretanto sem confirmação científica de benefício clínico.66 Crimlisk JT, Horn MH, Wilson DJ, et al. Artificial airways: a survey of cuff management practices. Heart Lung. 1996;25: 225-35. Técnicas alternativas de ajuste da pressão foram sugeridas ou estão em desenvolvimento, utilizando cânulas endotraqueais modificadas,1515 Stanley TH, Foote JL, Liu WS. A simple pressure relief valve to prevent increases in endotracheal tube cuff pressure and volume in intubated patients. Anesthesiology. 1975;43: 478-81. seringas especiais,1616 Slocum AH Jr, Slocum AH Sr, Spiegel JE. Technical communication: design and in vitro testing of a pressure-sensing syringe for endotracheal tube cuffs. Anesth Analg. 2012;114: 967-71. equipamentos hospitalares disponíveis nas unidades,1717 Kim JM. The tracheal tube cuff pressure stabilizer and its clinical evaluation. Anesth Analg. 1980;59:291-6.,1818 Gravenstein N, Burwick N. Recoil of inflation syringe plunger limits excessive endotracheal tube cuff pressure. Anesthesiology. 1988;69:A730 [Abstract].,1919 Doyle DJ. Digital display of endotracheal tube cuff pressures made simple. Anesthesiology. 1999;91:329.,2020 Resnikoff E, Katz JA. A modified epidural syringe as an endotracheal tube cuff pressure-controlling device. Anesth Analg. 1990;70:208-11.and2121 Lenoir RJ. Venous congestion of the neck; its relation to laryngeal mask cuff pressures. Br J Anaesth. 2004;93:476-7. no entanto, sem eliminar a necessidade de equipamentos adicionais.

Quando o sistema circular é utilizado como fonte da pressão para insuflação do balonete das cânulas traqueais, é possível limitar a máxima pressão no sistema por meio da válvula limitadora de pressão ajustável (VLPA), também denominada válvula pop-off, impossibilitando que a Pbalonete e a Pbal-traq atinjam valores superiores ao máximo estabelecido pelo ajuste da VLPA. Para isto basta adaptar a saída do sistema circular à entrada tipo Luer do balão piloto da cânula traqueal, método não encontrado na literatura científica.

A possibilidade de limitar a pressão no interior do balonete a níveis seguros, utilizando um método simples, amplamente disponível e de baixo custo, pode reduzir a ocorrência e a magnitude de diversas complicações, muitas delas graves, o que motivou o presente estudo, que se propôs avaliar in vitro a eficácia de método de insuflação de balonetes de cânulas endotraqueais, com ajuste da pressão interna entre 20 e 30 cm H2O.

Método

Foi realizado estudo experimental, in vitro, do desempenho de um método para insuflação dos balonetes das cânulas endotraqueais. Devido à natureza deste estudo, foi dispensada a apreciação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Instituição.

O cálculo da amostra foi realizado com base em estudos prévios que demonstraram que a incidência de pressões na faixa de 20 a 30 cm H2O com método convencional de insuflação é de 27% a 35%.88 Sengupta P, Sessler DI, Maglinger P, et al. Endotracheal tube cuff pressure in three hospitals, and the volume required to produce an appropriate cuff pressure. BMC Anesthesiol. 2004;4:8-13.and1111 Chapman J, Pallin D, Ferrara L, et al. Endotracheal tube cuff pressures in patients intubated before transport. Am J Emerg Med. 2009;27:980-2. Foi calculado um intervalo de confiança para a taxa de sucesso, de cada exemplar de cânula endotraqueal do mesmo fabricante, mesmo tamanho (diâmetro interno, em mm) e tempo de insuflação - combinação tempo-diâmetro-fabricante (T-D-F). Considerando uma taxa de sucesso de 95%, margem de erro total = 15% e nível de confiança de 95%, obteve-se n = 32 por grupo (combinação de T-D-F).

Foram testados três diferentes tempos para a insuflação (10, 15 e 20 segundos) de cânulas endotraqueais de cinco diâmetros diferentes (6,5; 7,0; 7,5; 8,0 e 8,5 mm de diâmetro interno) de três fabricantes (Dahlhausen, Portex e Rüsch), resultando em 45 grupos (combinações diferentes de T-D-F). Com a intenção de identificar possíveis vieses causados pelos diferentes desempenhos de cada operador, ou pela mudança de desempenho do mesmo operador devido às múltiplas repetições dos testes, cada repetição foi numerada e realizada seguindo a sequência estabelecida. Além disto, a fim de identificar uma possível alteração de desempenho devido a uma cânula endotraqueal defeituosa, foram utilizados três exemplares de cânula endotraqueal de mesmo tamanho e fabricante, numerados de 1 a 3, e realizadas 11 insuflações por exemplar, por teste, resultando em 33 testes por grupo, totalizando 1485 testes. Para as insuflações com duração de 10 segundos, a sequência dos exemplares adotada foi 1, 2 e 3; para as insuflações com duração de 15 segundos, a sequência dos exemplares adotada foi 3, 1 e 2; e para as insuflações com duração de 20 segundos, a sequência dos exemplares adotada foi 2, 3 e 1, de forma que todos os exemplares numerados foram utilizados em todas as posições na sequência de insuflações. Ainda, os operadores se revezaram, alternando a ordem de insuflação, de forma que cada um realizou insuflações de 10, 15 ou 20 segundos, com cânulas de cada tamanho e de cada fabricante.

A parte prática foi realizada por dois operadores, um médico especialista em anestesiologia - denominado Operador 1 - e um médico residente do 3° ano de anestesiologia - denominado Operador 2, ambos com experiência prévia de 100 repetições cada, no método de insuflação proposto.

Para realizar o acoplamento entre a saída padrão de 15 mm do sistema circular do aparelho de anestesia e a conexão padrão Luer do balão piloto das cânulas traqueais, é necessário um adaptador, que foi confeccionado pelo próprio pesquisador, utilizando um conector de Adams padrão de 15 mm de uma cânula endotraqueal 7,5 (diâmetro interno, em mm), a uma seringa de 3 mL sem o êmbolo (fig. 1). Dessa forma o sistema circular do aparelho de anestesia se adaptava ao conector de 15 mm, enquanto a conexão padrão tipo Luer da seringa se adaptava ao balão piloto da cânula endotraqueal, abrindo sua válvula para permitir a insuflação.

Figura 1
Adaptador utilizado para conectar a saída do sistema circular do aparelho de anestesia ao balão piloto das cânulas traqueais.

O aparelho de anestesia utilizado para os testes foi Dräger Fabius GS(r) cuja válvula APL fora ajustada para a pressão máxima de 30 cm H2O e o fluxo de oxigênio ajustado para 10 L.min-1. Em seguida, o adaptador foi conectado à saída de 15 mm do aparelho de anestesia e o balão reservatório para ventilação insuflado por meio do acionamento do botão de alto fluxo de oxigênio.

Antes de cada insuflação, foi aspirado com uma seringa o máximo volume de ar possível do balonete de cada cânula. A seguir, a porção correspondente ao balonete da cânula endotraqueal foi posicionada dentro de uma seringa de 20 mL sem o êmbolo (com 20 mm de diâmetro interno), fixa à superfície da mesa de testes com fita adesiva, mantendo a cânula repousando passivamente nele e fixa à mesa também com fita adesiva.

Um de dois operadores iniciou espontaneamente cada insuflação conectando o balão piloto da cânula traqueal com o aparelho de anestesia por meio do adaptador. Transcorrido o tempo pré-determinado para a insuflação, o adaptador foi desconectado do balão piloto, interrompendo a insuflação. Em seguida, um manômetro aneroide (Cuff Pressure Gauge, VBM Medizintechnik, Sula, Alemanha) foi utilizado para medir a pressão alcançada com a insuflação.

Valores entre 20 e 30 cm H2O foram considerados adequados e valores inferiores a 20 cm H2O e superiores a 30 cm H2O foram considerados falhas. A análise estatística foi realizada utilizando osoftware SPSS v 13.0 para Windows, por meio de técnica com intervalos de confiança de 95%, sendo obtidos dados sobre a proporção de falha geral e de falha em relação às seguintes variáveis: fabricante, tamanho, tempo de insuflação e operador.

Resultados

Foram realizados todos os 1485 testes, não havendo nenhum teste descartado. Dos 1485 testes, 1477 (99,5%) apresentaram pressões consideradas adequadas e em 8 testes houve falha (0,5%) (95% IC: 0,1-0,9%). Todos os casos de falha ocorreram devido a pressões inapropriadamente baixas.

Comparação entre fabricantes

Comparando os diferentes fabricantes das cânulas utilizadas, não houve falha nos testes realizados com as cânulas fabricadas pela Dahlhausen, houve 6 falhas (1,2%) com cânulas fabricadas pela Portex (95% IC: 0,2-2,2%) e 2 falhas (0,4%) com cânulas fabricadas pela Rüsch (95% IC: -0,2-1,0%).

Comparação entre os tamanhos de cânulas

Observou-se uma falha (0,3%) com cânula de 6.5 mm (95% IC: -0,3-0,9%), seis falhas (2,0%) com cânulas de 7,0 mm (95% IC: 0,4-3,6%), uma falha (0,3%) com cânula de 7,5 mm (95% IC: -0,3-0,9%) e nenhuma falha com cânulas de 8,0 e 8,5 mm.

Comparação entre os tempos de insuflação

Todas as 8 falhas ocorreram em tubos insuflados durante 10 segundos (1,6%; 95% IC: 0,5-2,7%), não havendo ocorrido nenhuma falha com insuflações de 15 e 20 segundos.

Comparação entre operadores

Todas as 8 falhas ocorreram com o Operador 2 (1,1%; 95% IC: 0,3-1,9%).

As proporções de falha geral e específicas para cada variável observada estão expostas na tabela 1.

Tabela 1
Incidência de falha geral e para cada variável observada (resultados expressos em % e 95% IC)

Discussão

A incorporação de balonetes insufláveis às cânulas traqueais representou um enorme avanço tecnológico, promovendo maior segurança para os pacientes e permitindo o avanço das técnicas de ventilação pulmonar.2222 Miller RA. A new laryngoscope. Anesthesiology. 1941;2:317-20.and2323 Spiegel JE. Endotracheal tube cuffs: design and function. Anesthesiol News. 2010;36:51-8. Entretanto, seu uso associa-se a diversas complicações relacionadas principalmente às elevadas pressões do balonete (Pbalonete).22 Kaneda N, Goto R, Ishijima S, et al. Laryngeal granuloma caused by short-term endotracheal intubation. Anesthesiology. 1999;90:1482-3.,33 Audu P, Artz G, Scheid S, et al. Recurrent laryngeal nerve palsy after anterior cervical spine surgery. Anesthesiology. 2006;105:898-901.and2424 Nordin U. The trachea and cuff-induced tracheal injury: an experimental study on causative factors and prevention. Acta Otolaryngol Suppl. 1977;345:1-71. A limitação da Pbalonete a 30 cm H2O reduz significativamente as complicações relacionadas às vias aéreas44 Liu J, Zhang X, Gong W, et al. Correlations between controlled endotracheal tube cuff pressure and postprocedural complications: a multicenter study. Anesth Analg. 2010;111:1133-7.and2525 Combes J, Schauvliege F, Peyrouset O, et al. Intracuff pressure and tracheal morbidity: influence of filling cuff with saline during nitrus oxide anesthesia. Anesthesiology. 2001;95:1120-4. e por isso o emprego de um método para limitar a Pbalonete é mandatório.77 Galinski M, Tréoux V, Garrigue B, et al. Intracuff pressures of endotracheal tubes in the management of airway emergencies: the need for pressure monitoring. Ann Emerg Med. 2006;47:545-7.and2626 Lewis FR, Schlobohm RM, Thomas AN. Prevention of complications from prolonged tracheal intubation. Am J Surg. 1978;35:452-7.

O método padrão ouro para controle da Pbalonete, que consiste no uso de manômetros calibrados,55 Blanch PB. Laboratory evaluation of 4 brands of endotracheal tube cuff inflator. Respir Care. 2004;49:166-73.,66 Crimlisk JT, Horn MH, Wilson DJ, et al. Artificial airways: a survey of cuff management practices. Heart Lung. 1996;25: 225-35.and77 Galinski M, Tréoux V, Garrigue B, et al. Intracuff pressures of endotracheal tubes in the management of airway emergencies: the need for pressure monitoring. Ann Emerg Med. 2006;47:545-7. permite a medição, contínua ou intermitente, da Pbalonete em tempo real, possibilitando ajustá-la sem a interrupção da medição. Dentre suas limitações constam o alto custo do equipamento e a necessidade de calibrações regulares. Porém, este método não se difundiu entre os profissionais de saúde, sobretudo entre os médicos, não sendo utilizado rotineiramente após ou durante a manutenção da intubação traqueal.

No presente trabalho, foi realizado o teste in vitro de um método alternativo para insuflação dos balonetes de cânulas traqueais, limitando a Pbalonete a pressões não superiores a 30 cm H2O, não sendo encontrada na literatura nenhuma publicação com método igual ou semelhante a este. Também por este motivo, realizou-se inicialmente este estudo in vitro, a fim de comprovar o funcionamento do método, antes de expor pacientes a um método sem efeitos cientificamente comprovados.

Neste estudo ocorreram oito falhas em 1485 testes (0,5%; 95% IC: 0,1-0,9%), todas em decorrência de pressões inapropriadamente baixas. Isto representa uma proporção de falha extremamente pequena quando comparado este resultado com o método mais amplamente utilizado clinicamente, a insuflação do balonete injetando ar com uma seringa, que apresenta proporção de hiperinsuflação entre 23,5% e 64,5% dos casos88 Sengupta P, Sessler DI, Maglinger P, et al. Endotracheal tube cuff pressure in three hospitals, and the volume required to produce an appropriate cuff pressure. BMC Anesthesiol. 2004;4:8-13.,99 Tobias JD, Schwartz L, Rice J, et al. Cuffed endotracheal tubes in infants and children: should we routinely measure the cuff pressure? Int J Pediatr Otorhinolaryngol. 2012;76:61-3.,1111 Chapman J, Pallin D, Ferrara L, et al. Endotracheal tube cuff pressures in patients intubated before transport. Am J Emerg Med. 2009;27:980-2.and1212 Felten ML, Schmautz E, Delaporte-Cerceau S, et al. Endotracheal tube cuff pressure is unpredictable in children. Anesth Analg. 2003;97:1612-6. podendo chegar a 98%.1313 Bassi M, Zuercher M, Erne JJ, et al. Endotracheal tube intracuff pressure during helicopter transport. Ann Emerg Med. 2010;56:89-93, e1. Dentre estas falhas, seis (75%) ocorreram em um único experimento (cânulas Portex, #7.0, 10 segundos de insuflação, Operador 2), e as outras duas em experimentos distintos (uma com cânula Rüsch, #6.5, 10 segundos de insuflação, Operador 2; e uma com cânula Rüsch, #7.5, 10 segundos de insuflação, Operador 2).

Apesar do desenho experimental deste estudo, algumas variáveis são impossíveis de controlar e podem ter contribuído para estas falhas. Entre estas variáveis estão a pressão nominal da rede de oxigênio, a qualidade da fabricação das cânulas traqueais, o desempenho do operador que realizou a insuflação e a relação do balonete com o anteparo à insuflação.

A pressão de admissão dos gases medicinais utilizados nos aparelhos de anestesia é mantida na faixa de 4,5 a 5,5 kgf.cm-2. Entretanto, esta pressão eventualmente apresenta oscilações, o que pode aumentar ou reduzir o fluxo de oxigênio durante o acionamento do botão de alto fluxo de O2, interferindo diretamente no processo de insuflação dos balonetes pelo método proposto neste estudo.

Quanto ao padrão de construção das cânulas traqueais, pequenas variações na composição ou no formato dos balonetes, alteram a elastância (relação Δpressão:Δvolume), com efeito direto nos resultados obtidos.

Outro fator a ser considerado é o desempenho de cada operador. Mesmo aplicando o método com atenção e rigor técnico, as variações intra e interpessoais na execução do processo podem interferir na pressão final medida ao permitir a abertura e/ou fechamento da válvula do balão piloto por tempos ou em instantes diferentes, adicionando ou removendo involuntariamente uma alíquota de gás do balonete. Apesar da diferença de experiência profissional entre os operadores que realizaram os testes, ambos possuíam o mesmo grau de treinamento neste método, tendo realizado pelo menos 100 insuflações cada um, em estudo piloto anterior. Portanto, as diferentes incidências de falha entre os operadores não podem ser atribuídas ao grau de experiência com este método. Entretanto, pequenas variações na execução do método, não podem ser descartadas como possíveis causas para as falhas observadas com o Operador 2, ainda que bastante infrequentes (1,1%; 95% IC: 0,3-1,9%).

O tipo de anteparo escolhido também pode influenciar no resultado, já que a forma e as propriedades físicas deste (complacência e elastância) modificarão as do balonete. Assim, sem o anteparo, o balonete insuflar-se-ia livremente, necessitando de mais tempo até que atingisse a pressão máxima permitida pela VLPA. Portanto, a presença de um anteparo serviu para reduzir o tempo de insuflação para valores próximos do que se espera no humano, porém sem a pretensão de simular a traqueia humana. Isto seria possível com a utilização de materiais especificamente confeccionados para este fim, utilizando tubos feitos de delgadas membranas concêntricas de látex e poliuretano,2727 Lomholt N. Tracheal models which simulate the compliance of the adult male trachea. Br J Anaesth. 1992;69:98-100. mas sua confecção requereria recursos laboratoriais complexos, impossibilitando sua utilização neste trabalho.

A escolha da seringa de 20 mL como anteparo se deveu ao fato deste ser um tubo rígido, facilmente encontrado, de baixo custo, com diâmetro interno de 20 mm - semelhante ao diâmetro interno médio da traqueia do homem adulto. Como o objetivo deste trabalho foi avaliar a eficácia de um método para limitar a pressão no interior do balonete, o diâmetro e a complacência do anteparo não necessitavam ter as mesmas características da traqueia humana, já que, independentemente destes, a válvula ajustada a 30 cm H2O limitaria o aumento da pressão acima deste valor. No entanto, o uso de um anteparo de diâmetro fixo associado a cânulas de diferentes tamanhos pode influenciar o desempenho deste método, já que os balonetes de cânulas menores necessitam de mais volume - e para um dado fluxo, mais tempo - para atingirem tamanho suficiente para que suas paredes entrem em contato com o anteparo e permitam o equilíbrio da Pbalonete, enquanto que cânulas de tamanho maior atingem o equilíbrio da Pbalonete em menos tempo. Isto poderia explicar porque as falhas ocorreram com as cânulas de menor tamanho e no menor tempo para insuflação, ainda que com incidência muito baixa. Este problema poderia ser solucionado mantendo a insuflação por mais tempo, ou utilizando um anteparo de diâmetro interno menor, porém, não representa uma desvantagem deste método na prática clínica, já que o diâmetro interno da traqueia do paciente não é um fator modificável, e na maioria das vezes desconhecido, e a seleção do tamanho da cânula levando em consideração o sexo e dados antropométricos do paciente (ex.: peso, altura, tamanho da laringe) naturalmente mantém a relação de tamanho entre o diâmetro externo do balonete da cânula escolhida e o diâmetro interno da traqueia do paciente, minimizando ou até mesmo eliminando este problema. No entanto, estudos clínicos são necessários para a comprovação disto.

Na tentativa de relacionar algum destes fatores com os episódios de falha ocorridos, os testes foram realizados seguindo uma ordem fixa e pré-estabelecida, respeitando a sequência numérica de cada um dos três exemplares de cânulas de cada tamanho e fabricante, numeradas de 1 a 3. No entanto, a incidência de falhas neste estudo foi muito pequena, não permitindo a associação destas com quaisquer fatores observados. Todas as 8 falhas ocorreram com o menor tempo de insuflação (10 segundos) e com um único operador (Operador 2), sendo seis delas (75%) em um único experimento (cânulas Portex, #7.0, sendo 3 falhas com a cânula n° 1, duas com a cânula n° 2 e uma com a cânula n° 3. Não é possível afirmar que estas falhas, concentradas neste experimento específico, são decorrentes do curto tempo para insuflação, ou de fatores não controlados como os citados anteriormente. Possivelmente estas falhas não decorrem de falha humana, pois o Operador 2 apresentou proporção de falha extremamente baixa, de apenas 1,1% (95% IC: 0,3-1,9%), ou de curto tempo para insuflação, já que, apesar de todas as falhas terem ocorrido em cânulas insufladas por 10 segundos, a proporção de falhas neste grupo foi de 1,6% (95% IC: 0,5-2,7%), com valores médios de pressão semelhantes aos dos outros tempos de insuflação (10s: 24,30 cm H2O; 15s: 25,77 cm H2O; 20s: 25,35 cm H2O).

O exposto nos parágrafos anteriores pode explicar as divergências de pressão observadas após a insuflação de cânulas de mesmo tamanho, utilizando método idêntico. A existência de tais variáveis fora do controle do método proposto não diminui o valor dos dados obtidos, já que as mesmas variáveis serão encontradas em outros contextos e influenciarão de forma semelhante o resultado da aplicação deste método em estudos clínicos ou mesmo na prática clínica.

Dentre as limitações do método proposto pode-se citar que ele não evita completamente a sub-pressurização dos balonetes, ainda que raramente, e não possibilita a medição e o ajuste da pressão, sendo possível apenas limitá-la ao valor máximo considerado seguro. Seu uso também não é possível em aparelhos de anestesia sem VLPA graduada, e desaconselhável nos casos em que não é possível medir a pressão do sistema circular devido a não comunicação da VLPA com o manômetro do aparelho, como ocorre em aparelhos de qualidade inferior.

O fato de não ter havido falhas relacionadas a pressões inapropriadamente altas (superiores a 30 cm H2O) demonstra que este método, ao limitar eficazmente a Pbalonete, pode ser útil para reduzir lesões relacionadas à compressão da mucosa e outras estruturas das vias aéreas pelos balonetes. Outros estudos, em contextos clínicos e com outros dispositivos com balonetes insufláveis, como cânulas de traqueostomia, dispositivos supraglóticos e tubos de duplo-lúmen, devem ser realizados a fim de demonstrar a utilidade prática bem como possíveis benefícios deste método.

Conclusão

O método proposto e aplicado neste trabalho foi eficaz para insuflar in vitro os balonetes de cânulas traqueais de diferentes tamanhos e fabricantes, limitando sua pressão interna à faixa entre 20 e 30 cm H2O.

References

  • 1
    Estebe JP, Delahaye S, Le Corre P. Alkalinization of intracuff lidocaine and use of gel lubrication protect against tracheal tube-induced emergence phenomena. Br J Anaesth. 2004;92:361-6.
  • 2
    Kaneda N, Goto R, Ishijima S, et al. Laryngeal granuloma caused by short-term endotracheal intubation. Anesthesiology. 1999;90:1482-3.
  • 3
    Audu P, Artz G, Scheid S, et al. Recurrent laryngeal nerve palsy after anterior cervical spine surgery. Anesthesiology. 2006;105:898-901.
  • 4
    Liu J, Zhang X, Gong W, et al. Correlations between controlled endotracheal tube cuff pressure and postprocedural complications: a multicenter study. Anesth Analg. 2010;111:1133-7.
  • 5
    Blanch PB. Laboratory evaluation of 4 brands of endotracheal tube cuff inflator. Respir Care. 2004;49:166-73.
  • 6
    Crimlisk JT, Horn MH, Wilson DJ, et al. Artificial airways: a survey of cuff management practices. Heart Lung. 1996;25: 225-35.
  • 7
    Galinski M, Tréoux V, Garrigue B, et al. Intracuff pressures of endotracheal tubes in the management of airway emergencies: the need for pressure monitoring. Ann Emerg Med. 2006;47:545-7.
  • 8
    Sengupta P, Sessler DI, Maglinger P, et al. Endotracheal tube cuff pressure in three hospitals, and the volume required to produce an appropriate cuff pressure. BMC Anesthesiol. 2004;4:8-13.
  • 9
    Tobias JD, Schwartz L, Rice J, et al. Cuffed endotracheal tubes in infants and children: should we routinely measure the cuff pressure? Int J Pediatr Otorhinolaryngol. 2012;76:61-3.
  • 10
    Dobrin PB, Goldberg EM, Canfield TR. The endotracheal cuff: a comparative study. Anesth Analg. 1974;53:456-60.
  • 11
    Chapman J, Pallin D, Ferrara L, et al. Endotracheal tube cuff pressures in patients intubated before transport. Am J Emerg Med. 2009;27:980-2.
  • 12
    Felten ML, Schmautz E, Delaporte-Cerceau S, et al. Endotracheal tube cuff pressure is unpredictable in children. Anesth Analg. 2003;97:1612-6.
  • 13
    Bassi M, Zuercher M, Erne JJ, et al. Endotracheal tube intracuff pressure during helicopter transport. Ann Emerg Med. 2010;56:89-93, e1.
  • 14
    Yildirim ZB, Uzunkoy A, Cigdem A, et al. Changes in cuff pressure of endotracheal tube during laparoscopic and open abdominal surgery. Surg Endosc. 2012;26:398-401.
  • 15
    Stanley TH, Foote JL, Liu WS. A simple pressure relief valve to prevent increases in endotracheal tube cuff pressure and volume in intubated patients. Anesthesiology. 1975;43: 478-81.
  • 16
    Slocum AH Jr, Slocum AH Sr, Spiegel JE. Technical communication: design and in vitro testing of a pressure-sensing syringe for endotracheal tube cuffs. Anesth Analg. 2012;114: 967-71.
  • 17
    Kim JM. The tracheal tube cuff pressure stabilizer and its clinical evaluation. Anesth Analg. 1980;59:291-6.
  • 18
    Gravenstein N, Burwick N. Recoil of inflation syringe plunger limits excessive endotracheal tube cuff pressure. Anesthesiology. 1988;69:A730 [Abstract].
  • 19
    Doyle DJ. Digital display of endotracheal tube cuff pressures made simple. Anesthesiology. 1999;91:329.
  • 20
    Resnikoff E, Katz JA. A modified epidural syringe as an endotracheal tube cuff pressure-controlling device. Anesth Analg. 1990;70:208-11.
  • 21
    Lenoir RJ. Venous congestion of the neck; its relation to laryngeal mask cuff pressures. Br J Anaesth. 2004;93:476-7.
  • 22
    Miller RA. A new laryngoscope. Anesthesiology. 1941;2:317-20.
  • 23
    Spiegel JE. Endotracheal tube cuffs: design and function. Anesthesiol News. 2010;36:51-8.
  • 24
    Nordin U. The trachea and cuff-induced tracheal injury: an experimental study on causative factors and prevention. Acta Otolaryngol Suppl. 1977;345:1-71.
  • 25
    Combes J, Schauvliege F, Peyrouset O, et al. Intracuff pressure and tracheal morbidity: influence of filling cuff with saline during nitrus oxide anesthesia. Anesthesiology. 2001;95:1120-4.
  • 26
    Lewis FR, Schlobohm RM, Thomas AN. Prevention of complications from prolonged tracheal intubation. Am J Surg. 1978;35:452-7.
  • 27
    Lomholt N. Tracheal models which simulate the compliance of the adult male trachea. Br J Anaesth. 1992;69:98-100.
  • Estudo realizado no Hospital Central da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar-Apr 2016

Histórico

  • Recebido
    24 Abr 2014
  • Aceito
    17 Jun 2014
Sociedade Brasileira de Anestesiologia R. Professor Alfredo Gomes, 36, 22251-080 Botafogo RJ Brasil, Tel: +55 21 2537-8100, Fax: +55 21 2537-8188 - Campinas - SP - Brazil
E-mail: bjan@sbahq.org