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Técnica de implante de stent coronário com e sem pré-dilatação: elucidação das bases fisiopatológicas pós-procedimento

EDITORIAL

Técnica de implante de stent coronário com e sem pré-dilatação : elucidação das bases fisiopatológicas pós-procedimento

Nadine Clausell

Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul - Serviço de Cardiologia - Hospital das Clínicas de Porto Alegre, RS

Correspondência Correspondência: Nadine Clausell Hospital das Clínicas de Porto Alegre - Serviço de Cardiologia 2º Andar - Sala 2060 Rua Ramiro Barcelos, 2350 Porto Alegre - RS - Brasil - CEP 90033-035 E-mail: clausell@portoweb.com.br

A fisiopatologia da reestenose coronariana envolve elementos reativos à lesão vascular propiciada pelo cateter-balão, assim como a lesão decorrente do implante de stents coronários. Portanto, a existência de trauma vascular parece ser uma condição sine qua non para o aparecimento de reestenose. Neste processo, inevitavelmente, há desendotelização, lesão direta de células da musculatura lisa e formação de trombos. Subseqüentemente, há proliferação e migração de células da musculatura lisa e deposição de matriz extracelular. Evidências crescentes e cada vez mais consolidadas têm apontado mecanismos inflamatórios como cruciais para o surgimento de reestenose ao exercerem papéis modulatórios em diversas etapas do processo.

A idéia consensual de que o trauma vascular é central para o desenvolvimento de reestenose tem levado diversos grupos a investigarem estratégias intervencionistas percutâneas coronárias, buscando minimizar o grau de lesão. Tradicionalmente, a técnica de implante de stent coronário recomendava o uso de pré-dilatação com cateter-balão com o objetivo de otimizar o resultado angiográfico. Por outro lado, o implante direto de stent sem pré-dilatação prévia poderia criar um cenário de menor agressão ao endotélio. Mesmo na ausência de estudos avaliando potenciais diferenças nos mecanismos envolvidos nestas duas técnicas, vários grupos passaram a estudar desfechos clínicos comparando as estratégias. Sob ângulos tanto clínicos quanto angiográficos, os estudos vêm apontando similaridade de resultados, preservando a técnica de pré-dilatação para situações em que variáveis anatômicas se impõem. Lacunas explorando desdobramentos fisiopatológicos diferenciados envolvendo ambas as técnicas, no entanto, permaneciam inexplorados.

No artigo original de Zouvi et al.1, publicado nesta edição da Revista, os autores procuram investigar o perfil de elementos inflamatórios e trombóticos, comparando o implante de stent coronário com e sem prédilatação com cateter-balão em pacientes com indicação eletiva de tratamento coronário percutâneo. A pergunta é pertinente, pois assumindo um menor trauma endotelial sem o uso de pré-dilatação, poderia se esperar menor magnitude de resposta inflamatória, aqui avaliada por níveis de PCR ultra-sensível. O componente de ativação pró-trombótica foi avaliado pela expressão de CD 40. A escolha pelos autores de um desenho experimental de ensaio clínico randomizado já de antemão qualifica os resultados e assegura a propriedade das análises subseqüentes.

Os autores mostram que, após a intervenção percutânea, nos dois tipos de abordagem, há aumento similar de PCR ultra-sensível, sem diferença entre os grupos. Em outras palavras, se a reação inflamatória existe, a julgar pela liberação de PCR, esta parece ter magnitude semelhante havendo ou não pré-dilatação. Depreende-se com estes dados que o endotélio é extremamente suscetível ao trauma imposto, seja diretamente com a colocação do stent ou pelo uso do cateterbalão prévio. Já os dados da expressão de CD 40 parecem menos claros, ou talvez menos relevantes neste cenário de doença estável. Houve uma inesperada redução da expressão deste mediador após ambas as intervenções, também de magnitude similar. O comportamento de outros fatores envolvidos no processo trombótico, como as plaquetas e seus receptores, talvez desempenhem papéis que merecessem ser explorados de maneira mais específica. De toda forma, reconhecendo-se tratar de uma amostra relativamente pequena de pacientes e todos com quadro estável de doença coronariana isquêmica, têm-se aqui dados originais que contribuem para o conhecimento, ou pelo menos buscam responder a uma lacuna do conhecimento das bases fisiopatológicas.

Em conclusão, os achados deste estudo como um todo vêm ao encontro dos resultados de estudos clínicos e angiográficos comparando as duas técnicas, em que vários grupos mostraram não haver vantagem de uma sobre outra em relação ao desenvolvimento de reestenose. Neste sentido, com este artigo, fica claro que, pelo menos, no que diz respeito à magnitude da reação inflamatória, não há de fato bases para se esperar resultados angiográficos de reestenose diferentes entre as duas técnicas. Consolida-se, então, o conceito de que a decisão sobre qual técnica a ser empregada para implante de stent coronário - com ou sem dilatação prévia com balão - deve permanecer a critério do operador. Por fim, Zouvi et al.1 devem ser congratulados por terem levado adiante um ensaio clínico randomizado, realizado em um Hospital francamente assistencial, no interior do Rio Grande do Sul, mostrando que é possível levantar questionamentos científicos relevantes e com alta aplicabilidade clínica para nosso meio, independente da localização institucional, desde que haja liderança com formação acadêmica atuante.

Recebido em: 22/02/2007

Aceito em: 23/02/2007

Ver artigo relacionado na página 25

  • 1. Zouvi JP, Wainstein MV, Ribeiro JP. Implante direto de stent coronariano: efeitos na resposta inflamatória sistêmica. Rev Bras Cardiol Invas 2007;15(1):25-30.
  • Correspondência:

    Nadine Clausell
    Hospital das Clínicas de Porto Alegre - Serviço de Cardiologia
    2º Andar - Sala 2060 Rua Ramiro Barcelos, 2350
    Porto Alegre - RS - Brasil - CEP 90033-035
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      17 Ago 2012
    • Data do Fascículo
      Mar 2007
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