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Educação Física Escolar: Percepções do Aluno com Deficiência1

Physical Education: Disabled Students' Perceptions

RESUMO:

a inclusão de alunos com deficiência é prevista em lei e manter boas estruturas físicas e pedagógicas na escola é um ponto fundamental para que o acesso possa acontecer. A Educação Física faz parte desta inclusão e pode proporcionar grandes melhoras na qualidade de vida de alunos com deficiência. Este estudo teve como objetivo compreender as percepções do aluno com deficiência a respeito das aulas de Educação Física. Para isso foi realizada uma pesquisa de natureza qualitativa utilizando para coleta de dados uma entrevista semiestruturada a qual foi gravada, transcrita e posteriormente analisada. A amostra foi constituída de 20 alunos com deficiência matriculados em escolas regulares da cidade de Santos Dumont - MG. A partir das entrevistas, destacou-se a percepção do aluno com deficiência a respeito da Educação Física escolar; o entendimento deles quanto ao conceito de qualidade de vida; as melhoras proporcionadas na qualidade de vida através da Educação Física; as facilidades e as dificuldades nas aulas; e as questões concernentes à relação aluno/professor e aluno/aluno. Os resultados dessa pesquisa podem auxiliar a comunidade escolar e o professor de Educação Física a melhorarem a inclusão nas escolas regulares. Além disso, as percepções dos alunos com deficiência sobre as aulas podem ajudar o professor na busca de um ambiente melhor com aulas que atendam a todos e proporcionem uma melhor qualidade de vida.

PALAVRAS-CHAVE:
Educação Especial; Educação Física; Pessoas com Deficiência; Qualidade de Vida

ABSTRACT:

The inclusion of disabled students is based on the law and the adaptation of physical and pedagogical structure at school represents a key point in order to make the access happen. Physical education is a part of the social inclusion and can provide great improvements in quality of life of students with disabilities. This research aimed to verify the perception of the student with disabilities on physical education classes. Therefore, a qualitative research was carried out, using a semi structured interview to collect data. The interviews were recorded, transcribed and analyzed. The sample was constituted by 20 students with disabilities enrolled in general schools at Santos Dumont, Minas Gerais. From the interviews, we highlighted the perceptions of students with disabilities on physical education at school; their understanding about the concept of quality of life; the improvements provided in the quality of life through physical education; successes and difficulties in class; and issues concerning the relationship student/ teacher and student/student. The results of this research can help the educational community and the physical education teacher to improve the quality of inclusion in general schools. In addition, perceptions of students with disabilities about the lessons can help the teacher in the search for a better environment with classes that meet everyone's needs and provide a better of quality of life.

KEYWORDS:
Especial Education; Physical Education; Disabled Persons; Quality of Life

1 Introdução

A inclusão começou a fazer parte do cotidiano das escolas a partir de dois marcos importantes: a Conferência Mundial de Educação para Todos e a Declaração de Salamanca (BRASIL, 2001BRASIL, Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Diretrizes nacionais para a educação especial inclusiva na educação básica. Brasília, DF: MEC/SEESP, 2001.). A primeira foi realizada em 1990, na Tailândia, por quatro organismos internacionais: a Organização das Nações Unidas para a Educação (UNESCO); o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF); o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD); e o Banco Mundial (BID). Nela afirmou-se que a educação é um direito fundamental de todos no mundo inteiro (SILVA; SAMPAIO, 2010DA SILVA, N.; SAMPAIO, T. M. V. A formação docente e a inclusão da criança com deficiência auditiva nas aulas de educação física. Educação Física em Revista, v.4, n.1, p.1-16, 2010.). A segunda aconteceu em 1994 sob a liderança da Organização das Nações Unidas (ONU) que declarou a necessidade de transformação dos sistemas educacionais, sendo o aluno reconhecido pelas suas potencialidades (BRASIL, 2001BRASIL, Ministério da Educação. Secretaria de Educação Especial. Diretrizes nacionais para a educação especial inclusiva na educação básica. Brasília, DF: MEC/SEESP, 2001.; SILVA; SAMPAIO, 2010DA SILVA, N.; SAMPAIO, T. M. V. A formação docente e a inclusão da criança com deficiência auditiva nas aulas de educação física. Educação Física em Revista, v.4, n.1, p.1-16, 2010.).

Além disso, sabe-se que a inclusão de alunos com deficiência no Ensino Regular está prevista pela lei de número 7.853/89. Entretanto, notam-se obstáculos em relação à capacidade dessas pessoas e muita dificuldade de ensino e aprendizagem dentro da escola. Para tal, é preciso que as escolas mantenham boas estruturas físicas e pedagógicas, projetos educacionais bem elaborados e currículo adaptado que atenda a todos (RODRIGUES, 2013RODRIGUES, A. Aspectos limitadores de inclusão educacional nas aulas regulares de educação física. 2013. 55f. Trabalho de Conclusão de Curso (Educação Física) - Universidade de Brasília, Pólo Ariquemes, Ariquemes, 2013.). O processo de inclusão engloba também a área de Educação Física, a qual é apontada como parte de integração e socialização dos alunos com deficiência (CHICON, 2008CHICON, J. F. Inclusão e exclusão no contexto da educação física escolar. Movimento, Porto Alegre, v.14, n.1, p.13-38, 2008.). Cabe ao professor de Educação Física, juntamente com os familiares e toda a comunidade escolar, ser mediador na inclusão, vencendo as diferenças no que se refere às interações com o outro, com o objeto de aprendizagem e à prática pedagógica (SILVA, 2013DA SILVA, E. J. Principais dificuldades encontradas nas classes inclusivas de educação física, nas escolas públicas: estudo de caso sobre inclusão. 2013. 61f. Trabalho de Conclusão de Curso (Pós-Graduação em Educação Física) - Universidade de Brasília, Pólo Alto Paraíso, Goiás, 2013.).

A Educação Física compreende uma série de conteúdos (DARIDO; JUNIOR, 2007DARIDO, S. C.; JUNIOR, O. M. S. Para ensinar educação física: possibilidades de intervenção na escola. Campinas: Papirus, 2007.) que se organizados de forma adequada, possibilita ao aluno com deficiência a compreensão de suas limitações e capacidades, auxiliando na busca de um melhor desempenho nas atividades, promovendo autonomia e desenvolvimento da consciência corporal (AGUIAR; DUARTE, 2005AGUIAR, J. S.; DUARTE, E. Educação inclusiva: um estudo na área da educação física. Revista Brasileira de Educação Especial, Marília, v.11, n.2, p.223-240, 2005.; BIAVATTI, 2012BIAVATTI, M. M. Z. S. O profissional de educação física frente ao processo de inclusão escolar. 2012. 48f. Trabalho de Conclusão de Curso (Educação Física) - Universidade de Brasília, Porto Velho.).

Torna-se então imprescindível que as aulas de Educação Física diante de seus diversos conteúdos possam melhorar a qualidade de vida desses alunos (BARRETO et al., 2013BARRETO, M. A. et al. A preparação do profissional de educação física para a inclusão de alunos com deficiência. Podium Sport Leisure and Tourism Review, São Paulo, v.2, n.1, p.152-167, 2013.). Esta é definida pelo Grupo de Qualidade de Vida da Divisão de Saúde Mental da Organização Mundial da Saúde (OMS) como a percepção do sujeito sobre aspectos da cultura e de sistemas de valores em que vive considerando suas expectativas, objetivos, padrões e preocupações (FLECK et al., 2000FLECK, M. P. A. et al. Aplicação da versão em português do instrumento abreviado de avaliação de qualidade de vida "WHOQOL-bref". Revista de Saúde Pública, São Paulo. v.34, n.2, p.178-183, 2000.). Farquhar (1995)FARQUHAR, M. Definitions of quality of life: a taxonomy. Journal of Advanced Nursing, v.22, p.502508, 1995 completa e define qualidade de vida como sendo a representação de respostas individuais a fatores físicos, psicológicos e sociais, contribuindo para uma vida permeada pela satisfação pessoal, experiências prévias, comparação com o outro, estado de saúde, autoestima, estado emocional e situação econômica.

No aspecto físico, a Educação Física pode favorecer o desenvolvimento da consciência corporal, de habilidades e capacidades, bem como reflexões sobre as possibilidades de movimento de cada aluno (Palma; Manta, 2010PALMA, L, E.; MANTA, S. W. Alunos com deficiência física: a compreensão dos professores de educação física sobre a acessibilidade nos espaços de prática para as aulas. Revista Educação, Santa Maria, v.35, n.2, p.303-314, 2010.). No âmbito psicológico, há a melhora da autoestima, a diminuição dos sintomas depressivos e do nível de ansiedade (DA SILVA, 2013DA SILVA, E. J. Principais dificuldades encontradas nas classes inclusivas de educação física, nas escolas públicas: estudo de caso sobre inclusão. 2013. 61f. Trabalho de Conclusão de Curso (Programa de pósgraduação) - Universidade de Brasília, Alto Paraíso, 2013.). Por fim, no contexto social, a possibilidade do aluno com deficiência participar das atividades com os colegas, favorece as relações afetivas além de contribuir com o respeito pelas diferenças (CHICON, 2008CHICON, J. F. Inclusão e exclusão no contexto da educação física escolar. Movimento, Porto Alegre, v.14, n.1, p.13-38, 2008.).

A relevância do estudo se mostra pelas constatações de que há poucas pesquisas abordando o significado de qualidade de vida na visão dos adolescentes (PREBIANCHI; BARBARINI, 2009PREBIANCHI, H. B.; BARBARINI, E. H. Qualidade de vida infantil: limites e possibilidades das questões teórico-metodológicas. Psico-Usf, v.14, n.3, p.355-364, 2009.). Além disso, segundo esses autores, muitas vezes as percepções da qualidade de vida dos adolescentes com deficiência são refletidas através do responsável, o que não contempla fidedignamente a opinião desses jovens (PREBIANCHI; BARBARINI, 2009PREBIANCHI, H. B.; BARBARINI, E. H. Qualidade de vida infantil: limites e possibilidades das questões teórico-metodológicas. Psico-Usf, v.14, n.3, p.355-364, 2009.). Interdonato e Greguol (2011)INTERDONATO, G. C.; GREGUOL, M. Qualidade de vida e prática habitual de atividade física em adolescentes com deficiência. Revista Brasileira de Crescimento e Desenvolvimento Humano, São Paulo, v.21, n.2, p.282-295, 2011. afirmam que se existe alguém que deva falar e avaliar a qualidade de vida sob os hábitos de atividade física, com as mais diferentes perspectivas, este alguém com certeza é o próprio indivíduo.

Sendo assim, é necessário que sejam feitos estudos avaliando a inclusão e os benefícios das aulas de Educação Física, bem como o entendimento do aluno com deficiência sobre qualidade de vida. Como objetivo primário buscou compreender as percepções do aluno com deficiência a respeito das aulas de Educação Física. Posteriormente, verificar o conceito de qualidade de vida sob a ótica de alunos com deficiência. Identificar as melhoras proporcionadas pelas aulas de Educação Física na qualidade de vida do aluno com deficiência assim como as facilidades e dificuldades. E por fim, explorar as relações professor/aluno e aluno/aluno a partir do ponto de vista do aluno com deficiência.

2 Método

2.1 Amostra

Participaram do estudo 21 alunos. Entretanto, um aluno não soube responder às perguntas da entrevista devido ao grau elevado de sua deficiência e, por isso, foi excluído da amostra. Dessa forma, a amostra contou com 20 alunos (13 meninas e sete meninos com idade entre 11 e 18 anos), sendo todos de escolas públicas (estaduais e municipais) da cidade de Santos Dumont-MG (Quadro 1). A partir dos dados coletados, percebeu-se que a maior parte dos alunos entrevistados apresentava deficiência intelectual (60%), seguido pela deficiência auditiva (15%), física (15%), visual (5%) e múltipla (5%). Foram incluídos no estudo alunos: com alguma das deficiências supracitadas, frequentes nas aulas de Educação Física.

Quadro 1
Caracterização da Amostra (n=20).

2.2 Procedimentos

O presente estudo apresenta características de cunho qualitativo, descritivo e transversal descritos por Thomas, Nelson e Silverman (2012)THOMAS, J.R.; NELSON, J.K.; SILVERMAN, S.J. Métodos de pesquisa em atividade física. Artmed, 2012.. A coleta de dados foi realizada por meio de uma entrevista semiestruturada, determinada previamente e conduzida em formato de conversa (THOMAS; NELSON; SILVERMAN, 2012THOMAS, J.R.; NELSON, J.K.; SILVERMAN, S.J. Métodos de pesquisa em atividade física. Artmed, 2012.). Todas as entrevistas foram gravadas com aparelho gravador ICD-BX132 da marca Sony e realizadas em um ambiente calmo, sem tempo limite de duração para as mesmas. No caso de deficiência auditiva, as entrevistas foram realizadas com o auxílio do Tradutor / Intérprete da escola em que o aluno se encontrasse.

Este estudo obteve aprovação pelo Comitê de Ética e Pesquisa em Seres Humanos da Universidade Federal de Juiz de Fora, através do número de inscrição 32148214.8.0000.5147, parecer número 701.590.

Inicialmente, foi realizado contato com a direção e com o professor de Educação Física das escolas para explanar os métodos e os objetivos do estudo. Além disso, foi pedida a autorização para a realização das entrevistas em uma sala reservada nas próprias escolas. Os alunos que se dispuseram a participar do estudo de forma voluntária entregaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido assinado pelos responsáveis e o Termo de Assentimento assinado por eles mesmos. Ambos os documentos possuíam explicações sobre os objetivos e procedimentos do estudo, ressaltando a garantia de anonimato dos alunos e que eles poderiam interromper sua participação a qualquer momento. Após o consentimento, foram agendados individualmente os melhores dias e horários para a realização das entrevistas e foi solicitada aos alunos uma autorização para gravação do encontro. Vale ressaltar que a entrevista foi conduzida pela mesma pesquisadora e não houve limite de tempo para a coleta de dados.

2.3 Análise dos dados

Para análise dos dados, as entrevistas foram transcritas na íntegra e analisadas pela técnica de Bardin (1977)BARDIN, L. Análise de conteúdo. Tradução de Luís Antero Reto e Augusto Pinheiro. Lisboa: Edições 70, 1977.. Essa análise visa obter indicadores - quantitativos e qualitativos - que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção e recepção dessas mensagens, por meio de procedimentos objetivos de descrição das informações da entrevista. Neste estudo, o conteúdo foi analisado com a técnica de formação de categorias que permite ao pesquisador concluir algumas informações destacando as que apareceram repetidas vezes em situações distintas, tornando possível uma análise exploratória do fenômeno.

3 Resultados e discussão

A partir da análise das entrevistas, com a finalidade de responder aos objetivos do estudo, foram criadas cinco categorias: Educação Física - Percepções para o aluno com deficiência; Qualidade de vida - Significados; Educação Física e Qualidade de vida - Melhoras proporcionadas; Educação Física - Facilidades e Dificuldades; Educação Física - Relação aluno/ professor, aluno/aluno.

Em se tratando das percepções sobre a aula de Educação Física para os alunos com deficiência, quando perguntados se gostavam ou não das aulas, apenas dois alunos não deram uma resposta positiva: "Mais ou menos [...] ah não tem muita atividade que eu possa fazer não" (E11); "Mais ou menos. Ah porque tem várias coisas que eu não gosto de fazer" (E10).

Alves e Duarte (2014)ALVES, M. L. T.; DUARTE, E. A percepção dos alunos com deficiência sobre a inclusão nas aulas de educação física escolar: um estudo de caso. Revista Brasileira de Educação Física e Esporte, São Paulo, v.28, n.2, p.329-338, 2014. apontaram que a falta de adaptação nas aulas de Educação Física pode contribuir para que o adolescente com deficiência tenha dificuldades de aprendizagem e, consequentemente, não participe das atividades. Além disso, experiências negativas como rejeição podem levar os alunos com deficiência a se excluírem das aulas de Educação Física (GOODWIN; WATKINSON, 2000GOODWIN, D. L.; WATKINSON, E. J. Inclusive physical education from the perspective of students with physical disabilities. Adapted physical activity quarterly, n.17, p.144-163, 2000.; SPENCER; WATKINSON, 2010SPENCER, C. N.; WATKINSON, E. J. Inclusion understood from the perspectives of children with disability. Adapted physical activity quarterly, v.27, n.4, p.275-293, 2010.). Sendo assim, o professor deve se preocupar com o tipo de atividade que irá propor para esses adolescentes, bem como estar atento quanto a alguma exclusão por parte dos colegas.

No que tange as respostas positivas, todos os outros alunos relataram gostar das aulas de Educação Física porque podem fazer alguma atividade física. Isso é demonstrado nas falas a seguir: "Gosto, porque aqui eu posso jogar vôlei" (E6); "Sim. Porque eu gosto de jogar bola, futsal, futebol, jiu-jitsu e vôlei, né?!" (E14); "Gosto! Porque tem várias coisas. Tem exercício físico, é muito bom." (E18); "Gosto. A gente faz atividades legais, né?!" (E19).

Corroborando com o presente estudo, Spencer e Watinkson (2010)SPENCER, C. N.; WATKINSON, E. J. Inclusion understood from the perspectives of children with disability. Adapted physical activity quarterly, v.27, n.4, p.275-293, 2010. demonstraram que o gosto por participar das aulas de Educação Física pelo aluno com deficiência está vinculado a oportunidade de inclusão nas atividades. Além disso, a capacidade de conseguir realizar as tarefas propostas promove uma maior participação destes alunos (ALVES; DUARTE, 2014ALVES, M. L. T.; DUARTE, E. A percepção dos alunos com deficiência sobre a inclusão nas aulas de educação física escolar: um estudo de caso. Revista Brasileira de Educação Física e Esporte, São Paulo, v.28, n.2, p.329-338, 2014.). Sendo assim, a aula de Educação Física tem importância no horário escolar ea forma com que o professor propõe as atividades faz toda diferença para uma efetiva participação destes alunos. A deficiência não é impedimento para que o adolescente pratique nenhuma atividade ou esporte nas aulas, sendo necessário que tanto professores quanto colegas ofereçam oportunidades de inclusão.

Com relação às atividades que os entrevistados mais gostam nas aulas de Educação Física, quatro conquistaram a preferência dos alunos com deficiência: dama; futebol; queimada; e vôlei. No que diz respeito à dama e ao futebol, cada um teve quatro menções e se configuram como preferência dos alunos com justificativas bem diferentes. "Ah eu gosto de dama, porque isso pode ativar a inteligência, né?!" (E16); "Gosto de jogar dama. Ah, é o que eu sei um pouquinho mais que outras coisas" (E19); "Jogar futebol. Porque eu gosto, é legal jogar bola e fazer gol. Me deixa muito animado" (E4); "Futebol, porque eu gosto de ficar no gol, ser goleiro, né?!" (E14).Queimada e vôlei foram lembrados três vezes: "Jogar queimada. Eu acho um jogo muito interessante" (E7); "Jogar queimada. Eu gosto de levar bolada" (E20); "De jogar vôlei. É muito bom e eu gosto de jogar a bola com a mão pra cima" (E6); "Jogar vôlei,porque eu me inspiro mais e é muito mais legal, os movimentos são melhores" (E12).

Silva, Duarte e Almeida (2011)SILVA, A. J.; DUARTE, E.; ALMEIDA, J. J. G. Campeonato escolar e deficiência visual: o discurso dos professores de educação física. Movimento, Porto Alegre, v.17, n.2, p.37-55, 2011. ressaltam que as práticas esportivas podem desenvolver habilidades motoras, mobilidade e orientação dos alunos com deficiência. Pessoas com deficiência que tiveram sua primeira experiência esportiva na Educação Física Escolar são mais propensas a manter-se na prática podendo até mesmo incluir-se em programas de alto rendimento (PONCHILLIA; STRAUSE; PONCHILLIA, 2002PONCHILLIA, P. E.; STRAUSE, B.; PONCHILLIA, S. V. Athletes with visual impairments: attributes and sports participation. Journal of visual impairment & blindness, v.96, n.4, p.267-272, 2002.). Todas essas respostas sobre gostar das aulas de Educação Física são importantes no sentido de dar cada vez mais oportunidades ao aluno com deficiência de praticar uma atividade, além de mostrá-lo que sua deficiência não é impedimento e que ele tem tanta capacidade quanto qualquer outro adolescente.

Quando perguntados se há alguma atividade que eles não gostam de fazer nas aulas de Educação Física, foi constatado que mais da metade dos entrevistados (n=12) informou ter alguma coisa que não gostam nas aulas: "Atletismo não é muito bom. Cansa bastante" (E4); "Jogar bola porque cansa muito" (E11); "Correr, porque me da dor na perna" (E3). As impressões que alunos com deficiência têm das aulas de Educação Física estão relacionadas a aspectos como: sentir-se parte do grupo, participar das aulas, sentir-se incluído pelo professore ter apoio familiar para participar das aulas (BRITO; LIMA, 2012BRITO, R. F. A.; LIMA, J. F. Desafios encontrados pelos professores de educação física no trabalho com alunos com deficiência. Corpo movimento e saúde, Salvador, v.2, n.1, p.1-12, 2012.; FALKENBACH; LOPES, 2010FALKENBACH, A. P.; LOPES, E. R. Professores de educação física diante da inclusão de alunos com deficiência visual. Pensar a prática, Goiânia, v.13, n.3, p.118, 2010.; SILVA; DUARTE; ALMEIDA, 2011SILVA, A. J.; DUARTE, E.; ALMEIDA, J. J. G. Campeonato escolar e deficiência visual: o discurso dos professores de educação física. Movimento, Porto Alegre, v.17, n.2, p.37-55, 2011.).

Ainda sobre as atividades que não agradam estes adolescentes na Educação Física escolar, o futebol foi citado por quatro entrevistadas. Vale a pena destacar que da mesma forma que uma parte dos alunos mencionou o futebol como preferência, outra parte citou como desagrado, como mostram as seguintes falas: "Futebol eu não gosto, é chato e difícil" (E2); "Futebol. É muito ruim chutar a bola e tem que correr muito" (E6); "O futebol porque são mais para meninos" (E12). Não há muitos estudos relatando sob o ponto de vista do adolescente o motivo de não gostarem de algum esporte específico. Pode ser que, como relata Martins (2002)MARTINS, A. S. Educação física escolar: novas tendências. Revista Mineira de Educação Física, Viçosa, v.10, n.1, p.171-194, 2002., indo ao encontro à fala da E12, apesar dos avanços da Educação Física Escolar, ainda são vistas lacunas consideráveis como o sexismo. Além da dificuldade de incluir alunos com deficiência em certos esportes como o futebol, há a tendência de se excluir meninas dessa prática por parte de alguns professores (MELO; MARTINEZ, 2012MELO, A. C. R.; MARTINEZ, A. M. As principais tendências pedagógicas da educação física e sua relação com a inclusão. Revista da Faculdade de Educação Física da UNICAMP, Campinas, v.10, n.2, p.180-195, 2012.).

Sobre o significado de "qualidade de vida" para o aluno com deficiência, a partir das entrevistas, verificou-se que todos os adolescentes mostraram-se certos dessa definição. Destacaram-se três tópicos principais: Amigos (75%); Família (45%); Atividade física e momento de lazer (45%).

O aspecto dos amigos foi mencionado por 15 alunos: "[...] aquela vida com bons amigos [...]" (E16); "é estar alegre com meus amigos [...]" (E1); "Quando é meu aniversário, eu fico feliz porque estou com meus amigos [...]" (E3). A família foi citada por nove alunos: "Estar com a minha família [...]" (E10); "Eu estar bem, minha família estar bem [...]" (E19); "[...] estar com minha tia que é um amor de pessoa [...]" (E7).Como último ponto enfatizado, nove dos alunos relataram a atividade física e o momento de lazer como fatores de qualidade de vida: "Sair, se divertir,jogar bingo, andar de bicicleta [...]" (E12); "As aulas de Educação Física, o jogo" (E18); "É viver a vida, é praticar, é se movimentar é fazer tudo! É lazer" (E17).

Vale a pena destacar que apesar de ter sido constatado pelo intérprete que na língua de sinais não há distinção entre os termos "qualidade" e "vida", os alunos com deficiência auditiva também não mostraram dúvidas ou dificuldades para dar a resposta: "Estar com as pessoas que eu conheço, com os colegas, andar de moto com minha família" (E13); "É fazer a aula de Educação Física né?! [...] (E14); "Acho que é quando eu bato papo com minha amiga, porque ela conta piada, diverte [...] também quando eu interajo com meus colegas" (E15).

Farquhar (1995)FARQUHAR, M. Definitions of quality of life: a taxonomy. Journal of Advanced Nursing, v.22, p.502508, 1995 define qualidade de vida como sendo a representação de respostas individuais a fatores físicos, psicológicos e sociais, contribuindo para uma vida permeada pela satisfação pessoal, experiências prévias, comparação com o outro, estado de saúde, autoestima, estado emocional e situação econômica. Ainda sobre este conceito Del Vecchio (2007)DEL VECCHIO, F. B. et al. Análise multivariada da interação entre qualidade de vida e capacidades físicas. Acta Médica Portuguesa, v.20, p.131-137, 2007. destaca que qualidade de vida envolve a forma de compreensão e sentimento sobre o cotidiano do próprio indivíduo.

Observou-se que os adolescentes têm seu conceito formado sobre qualidade de vida, não necessitando da ajuda dos pais ou responsáveis para defini-lo quando perguntados. Sendo assim, recomendam-se pesquisas para mensurar a qualidade de vida em adolescentes com deficiência que avaliem os próprios jovens, sem a necessidade de que os significados deste conceito sejam refletidos pelos responsáveis.

Com relação às melhoras da qualidade de vida através da Educação Física Escolar, todos os alunos argumentaram a favor das aulas. Os aspectos principais mencionados foram interação social e desenvolvimento físico e psicológico.

Na interação social, a convivência com os amigos foi a que mais se destacou: "[...] eu brinco e fico com minhas amigas" (E3); "Ajuda né?! Aqui eu converso com mais gente [...] convivo mais [...]" (E2); "é um momento que eu posso fazer o que gosto [...] brincar com minhas amigas [...]" (E20);

De acordo com Spencer e Watkinson (2010)SPENCER, C. N.; WATKINSON, E. J. Inclusion understood from the perspectives of children with disability. Adapted physical activity quarterly, v.27, n.4, p.275-293, 2010., a melhora de interação social pode ser associada à experiências positivas como as oportunidades de participar do jogo, as relações de amizade dentro do grupo e o fato de se sentir como um participante legítimo das atividades. Hutzleret al. (2002)HUTZLER, Y. et al. Perspectives of children with disabilities on inclusion and empowerment: supporting and limiting factors. Adapted physical activity quarterly, v.19, n.3, p.300-317, 2002. completam que as melhores relações sociais se devem pelo suporte que o aluno com deficiência recebe na hora de realizar as atividades, além de ser aceito pelos colegas por suas diferenças.

Outro fator citado como contribuinte para a melhoria da interação social foi o fato da mesma ser possibilitada devido as aulas de Educação Física acontecerem fora da sala de aula convencional, como mostram as falas a seguir: "sair um pouco da sala de aula" (E17); "eu converso mais com as minhas colegas, porque não tem muito tempo na sala" (E11); "porque a gente sai um pouquinho da sala, respira um pouquinho" (E19).

De acordo com Alves e Duarte (2014)ALVES, M. L. T.; DUARTE, E. A percepção dos alunos com deficiência sobre a inclusão nas aulas de educação física escolar: um estudo de caso. Revista Brasileira de Educação Física e Esporte, São Paulo, v.28, n.2, p.329-338, 2014., o espaço das aulas de Educação Física é facilitador da interação social e fundamental para que ocorra a inclusão. Foi percebido, em nosso estudo, como uma das contribuições na melhora da qualidade de vida dos alunos, tendo em vista o convício destes com os demais colegas.

Com relação aos aspectos físico e psicológico, uma parte significativa dos alunos (n=7) relatou que a Educação Física proporciona melhoras: "Sim! É [...] eu ficava bastante curvada [...] agora eu não fico tanto mais e junto com a Educação Física eu me fortaleci e estou me desenvolvendo mais" (E16); "[...] fico melhor, mais animado e forte também [...]" (E4).

A literatura disponível corrobora com esses relatos, evidenciando diversas pesquisas que relatam benefícios físicos advindos participação nas aulas de Educação Física como a melhoria da consciência corporal e controle motor (GOODWIN; WATKINSON, 2001GOODWIN, D. L. The meaning of help in PE: perceptions of students with physical disabilities. Adapted physical activity quarterly, v.18, n.3, p.289-303, 2001.; SILVA; DUARTE; ALMEIDA, 2011SILVA, A. J.; DUARTE, E.; ALMEIDA, J. J. G. Campeonato escolar e deficiência visual: o discurso dos professores de educação física. Movimento, Porto Alegre, v.17, n.2, p.37-55, 2011.),assim como psicológicos como maior independência e autonomia para a realização das atividades diárias (CARDOSO, 2011CARDOSO, V. D. A reabilitação de pessoas com deficiência através do desporto adaptado. Revista Brasileira Ciências e Esporte, Florianópolis, v.33, n.2, p.529-539, 2011.).

Sendo assim, sob o ponto de vista dos alunos com deficiência, melhoras consideráveis em sua qualidade de vida são observadas através da Educação Física Escolar inclusiva. Então, é importante que os professores continuem se capacitando de forma a atender estes alunos e cada vez melhor.

No que se refere às dificuldades nas aulas de Educação Física Escolar, cinco alunos destacaram a sua deficiência como fator dificultador: "[...] fica difícil por causa da minha deficiência" (E16); "[...] é difícil, dói minhas costas por causa da cadeira de rodas" (E20). Para os alunos que apontaram alguma dificuldade relacionada à atividades específicas, o vôlei foi o mais citado, seis vezes: "Ah o vôlei! Ah porque tem que correr, tem que pegar a bola, tem que sacar a bola do outro lado [...] muita coisa!" (E17); "Vôlei é muito difícil e machuca também [...]" (E5).

Tendo em vista que um aluno com deficiência pode se privar da participação nas aulas de Educação Física devido a falta de adaptações nas atividades (DIEHL, 2006DIEHL, R. M. Jogando com as diferenças: jogos para crianças e jovens com deficiência. São Paulo: Phorte, 2006.; MUNSTER, 2013MUNSTER, M. A. V. Inclusão de estudantes com deficiências em programas de educação física: adaptações curriculares e metodológicas. Revista da Sobama, Marília, v.14, n.2, p.27-34, 2013.), é importante que o professor esteja atento às necessidades dos seus alunos. Já foi visto que a Educação Física Escolar pode trazer grandes benefícios para o aluno. Sendo assim, ele deve ser incentivado cada vez mais a participar das aulas.

Em contrapartida, sete entrevistados apontaram não haver dificuldade alguma nas atividades da Educação Física Escolar, comprovado por algumas falas a seguir: "É tudo fácil" (E7); "Eu acho tudo fácil [...] faço tudo" (E14); "Não! Tudo fácil!" (E9). Seabra Júnior (2008)SEABRA-JÚNIOR, M. O. Estratégia de ensino e recursos pedagógicos para o ensino do aluno com deficiência visual na atividade física adaptada. 2008. 128f. Tese de Doutorado (Faculdade de Filosofia e Ciências) - Universidade Estadual Paulista, Marília, 2008. concluiu que se as estratégias e os recursos pedagógicos selecionados forem adequados e adaptados, os alunos com deficiência vão desempenhar as atividades propostas de forma satisfatória e sem maiores problemas. Estas estratégias de ensino são cruciais dentro das aulas de Educação Física, de forma que estes adolescentes possam sentir prazer ao praticar as atividades, além de não encontrarem dificuldades.

Com relação às facilidades encontradas, é interessante destacar que todos os entrevistados mencionaram algum tipo de atividade, o que demonstra a participação deles em pelo menos uma proposta e que não há nada que seja impossível de fazer, sendo adaptado ou não. As mais diversas atividades foram citadas: corrida, badminton, queimada, pique-bandeirinha, basquete e futebol. Os jogos de tabuleiro, o vôlei e o alongamento foram as mais mencionadas: "[...] a dama e o xadrez porque eu sou fera em quase tudo" (E16); "Dama é fácil [...] é legal e ainda trabalha raciocínio" (E19); "Vôlei. É fácil pegar a bola e jogar pra cima" (E6); "O alongamento [...] ele da e é só fazer o movimento" (E13).

É interessante apontar a fala da E20 que vê facilidade em manejar a cadeira de rodas e assim participar das atividades: "Correr e jogar queimada [...] porque é fácil pra mim girar as rodas da cadeira [...] é como se fosse minha perna mesmo" (E20). De modo semelhante ao que a participante disse, autores verificaram que a deficiência física não impede as pessoas de praticarem atividade física e que a maioria acredita que nada era impossível, entretanto em alguns relatos as pessoas se preocupavam que a cadeira de rodas poderia machucar alguém (LEHNHARD; MANTA; PALMA, 2012LEHNHARD, G. R.; MANTA, S. W.; PALMA, L. E. A prática de atividade física na história de vida de pessoas com deficiência física. Revista da Educação Física/UEM, Maringá, v.23, n.1, p.45-46, 2012.).

Para facilitar a participação efetiva e satisfatória de alunos com deficiência nas aulas, Munster e Almeida (2006)MUNSTER, M. A. V.; ALMEIDA, J. J. G. Atividade motora adaptada: a alegria do corpo. São Paulo: Artes Médicas, 2006. propuseram adaptações quanto: às instruções dadas pelo professor; aos materiais utilizados, à melhora dos espaços onde acontecem as aulas; e às regras que podem ser modificadas de acordo com a necessidade de cada turma. Além disso, Lieberman (2002) destaca alguns princípios que podem ser utilizados pelo professor para que os alunos com deficiência possam participar das aulas: o oferecimento de variedade de jogos, esportes e atividades; o incentivo às praticas; opções de escolhas; e assistência, se for necessário.

As adaptações devem ser feitas respeitando todos os alunos envolvidos tendo em vista alcançar os objetivos do professor, bem como a participação dos alunos com deficiência nas atividades juntamente com seus colegas. A deficiência não deve ser vista como impedimento para a prática da atividade, uma vez que devido à variedade de conteúdos da Educação Física,existe uma grande possibilidade de que algum destes seja considerado mais prazeroso pelos adolescentes com deficiência, motivando-os à prática.

O quinto tópico diz respeito aos relacionamentos entre o aluno com deficiência e o professor de Educação Física e também com seus colegas de turma. No que tange as relações aluno/professor, todos os entrevistados afirmaram gostar do professor e, ao que parece, mantém uma boa convivência com os mesmos. A seguir alguns exemplos: "É aquela que quer ser nossa amiga, não quer ser aquela chata mandona" (E16); "Ele me incentiva fazer a aula" (E13); "Gosto porque ele é atencioso, me ajuda e tenta se comunicar comigo" (E20); "Porque ele é um professor que não é bravo igual aos outros [...] ele conversa e tal" (E19).

Foi possível perceber também que, muitas vezes na hora de ir para o local onde acontecem as aulas de Educação Física, os entrevistados mencionaram ir acompanhados pelo professor: "Vou com o professor" (E1); "O professor pega a gente na sala e a gente vai" (E4); "O professor me ajuda, ele desce com minha cadeira e me carrega" (E20).Diversos estudos têm demonstrado que quando o professor de Educação Física está aberto à inclusão e busca fazer diferença no sentido de montar propostas que atinjam positivamente os alunos, a relação professor/aluno é mais saudável e proveitosa (SAAD, 2003SAAD, S. N. Preparando o caminho da inclusão: dissolvendo mitos e preconceitos em relação à pessoa com Síndrome de Down. Revista Brasileira de Educação Especial, Marília, v.9, n.1, p.57-58, 2003.; Monteiro e Manani, 2008MONTEIRO, A. P. H.; MANZINI, E. J. Mudanças nas concepções do professor do ensino fundamental em relação à inclusão após a entrada de alunos com deficiência em sua classe. Revista Brasileira de Educação Especial, Marília, v.14, n.1, p.35-52, 2008.; Omote; Júnior, 2011OMOTE, S.; JÚNIOR., A. A. Atitudes sociais de professoras de um município de médio porte do Paraná em relação à inclusão. Pesquisas e Práticas Psicossociais, v.6, n.1, p.7-15, 2011.).

Em se tratando do relacionamento entre os alunos com deficiência e seus colegas, a grande maioria relatou gostar dos amigos de classe afirmando também que eles ajudam nas aulas de Educação Física: "Eles me ajudam quando eu preciso. Já teve uma vez que eu quase caí e eles me ajudaram a não cair." (E16); "Gosto, eles me ajudam lá na hora que eu não consigo no atletismo" (E4); "Sim, gosto, ajudam sim, pegam água, pegam alguma coisa que eu preciso" (E17).Uma pequena parte dos adolescentes entrevistados afirmou gostar apenas de alguns dos colegas da turma, citando também que são poucos os que ajudam se precisarem: "Mais ou menos. Porque tem alguns que não combinam muito comigo, só uma amiga me ajuda" (E12); "Alguns eu gosto [...] assim só alguns ajudam né?!" (E10).

A importância de se ter um intérprete na escola para auxiliar os alunos com deficiência auditiva é um fator merecedor de destaque, e foi mencionado por mais de um estudante. Os entrevistados demonstram a possibilidade de interação social e entendimento das aulas apenas pelo fato de existir um intérprete na escola: "me sinto motivado porque aí eu posso interagir com meus colegas e entendo porque tem a intérprete pra me explicar o que eu vou fazer" (E15); "eu posso é [...] conversar [...] fazer a atividade né?! Isso me deixa melhor" (E14).

Investigando especificamente esta temática, Lacerda (2006)LACERDA, C. B. F. A inclusão escolar de alunos surdos: o que dizem alunos, professores e intérpretes sobre esta experiência. Caderno Cedes, Campinas, v.26, n.69, p.163-184, 2006. verificou que adolescentes com deficiência auditiva embora reconheçam que seus professores não sabem LIBRAS, não se sentem prejudicados ao terem um intérprete ao seu lado que os auxilia em suas tarefas. De forma semelhante, o autor observou que os alunos sem deficiência auditiva passam a reconhecer através da convivência com o amigo com deficiência auditiva, a língua de sinais, proporcionando entre eles uma comunicação efetiva e sem tantos problemas.

Embora diversos autores tenham destacado que o convívio entre alunos com e sem deficiência proporciona a aquisição de valores como respeito e cooperação com o próximo (SANTA CATARINA, 2000SANTA CATARINA. Secretaria de Estado da Educação e do Desporto. Avaliação do processo de integração de alunos com necessidades especiais na rede estadual de ensino de Santa Catarina no período de 1988 a 1997. São José, 2000.; TEIXEIRA; KUBO, 2008TEIXEIRA, F. C.; KIBO, O. M. Características das interações entre alunos com síndrome de down e seus colegas de turma no sistema regular de ensino. Revista Brasileira de Educação Especial, Marília, v.14, n.1, p.75-92, 2008.), alguns estudos evidenciam que alunos com deficiência são aceitos com menos frequência do que seus colegas de turma sem deficiência, podendo este fato estar ligado à estranheza causada pela diferença (BATISTA; ENUMO, 2004BATISTA, M. W.; ENUMO, S. R. F. Inclusão escolar e deficiência mental: análise da interação social entre companheiros. Estudos de psicologia, v.9, n.1, p.101-109, 2004.). Tal contexto reforça a importância da convivência de adolescentes com e sem deficiência, assim como a necessidade de inclusão dos alunos com deficiência e suas famílias na comunidade escolar, a fim de promover a aquisição de valores e conhecimentos que permitam dirimir a estranheza causada pela deficiência e o aprendizado do convívio com as diferenças.

5 Conclusão

Este estudo foi relevante no sentido de ampliar o conhecimento sobre a qualidade de vida de alunos adolescentes com deficiência através da Educação Física Escolar. Foram verificados pontos importantes que devem ser considerados: as percepções que estes jovens têm das aulas de Educação Física; os significados de qualidade de vida e de sua melhora através da Educação Física; as facilidades e dificuldades enfrentadas nas atividades em aula; e as relações estabelecidas entre os alunos com deficiência, seus colegas de turma e o professor.

A partir dos relatos, os alunos apontaram que gostar ou não das aulas são aspectos que podem ser influenciados por experiências de exclusão que o aluno com deficiência vivencia, assim como a falta de adaptações nas atividades. A oportunidade de participar das atividades dadas na aula também é um aspecto fundamental para que estes alunos se interessem pelas propostas do professor de Educação Física, e isso pode ser facilitado por aqueles que estão abertos à inclusão.

São necessários que sejam feitos mais estudos sobre o significado de qualidade de vida sob a ótica de adolescentes com deficiência. As pesquisas realizadas anteriormente tratavam do significado deste termo refletidos pelos responsáveis, sendo evidenciado neste estudo a total possibilidade de que os próprios adolescentes definam qualidade de vida. Foi possível destacar também que através das estratégias e adaptações metodológicas do professor pode haver uma efetiva participação dos alunos com deficiência nas aulas.

Por fim, foi demonstrado que as relações exercidas entre o professor, os colegas e os adolescentes com deficiência favorecem uma visão positiva com relação às aulas de Educação Física. No que diz respeito aos alunos com deficiência auditiva, a presença do intérprete auxilia essa relação e permite o entendimento das aulas e o convívio com os colegas. É preciso que a comunidade escolar juntamente com os familiares e colegas estejam abertos à inclusão.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2016

Histórico

  • Recebido
    15 Out 2015
  • Revisado
    15 Mar 2016
  • Aceito
    17 Mar 2016
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