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Nota complementar sobre o famoso chute de Pelé

Complementary note on Pelé's famous kick

Resumos

Baseado nos dados levantados e calculados em recente artigo publicado nesta revista, de autoria de C.E. Aguiar e G. Rubini [1] sobre o famoso chute de Pelé na Copa do Mundo do México de 1970, obtem-se a posição em que a impulsão foi aplicada à bola.

chute de Pelé; impulsão; velocidade de translação; velocidade de rotação


Based on monitored and calculated data performed in recent article published in this journal, by C.E. Aguiar and G. Rubini [1] about the famous Pelé kick in the 1970 Mexico World Cup, the position where the impulse was applied on the ball is calculated.

Pelé's kick; impulse; translation velocity; angular velocity


NOTAS E DISCUSSÕES

Nota complementar sobre o famoso chute de Pelé

Complementary note on Pelé's famous kick

G.F. Leal Ferreira1 1 E-mail: guilherm@if.sc.usp.br.

Instituto de Física de São Carlos, Universidade de São Paulo, São Carlos, SP, Brasil

RESUMO

Baseado nos dados levantados e calculados em recente artigo publicado nesta revista, de autoria de C.E. Aguiar e G. Rubini [1] sobre o famoso chute de Pelé na Copa do Mundo do México de 1970, obtem-se a posição em que a impulsão foi aplicada à bola.

Palavras-chave: chute de Pelé, impulsão, velocidade de translação, velocidade de rotação.

ABSTRACT

Based on monitored and calculated data performed in recent article published in this journal, by C.E. Aguiar and G. Rubini [1] about the famous Pelé kick in the 1970 Mexico World Cup, the position where the impulse was applied on the ball is calculated.

Keywords: Pelé's kick, impulse, translation velocity, angular velocity.

No muito interessante artigo recém aparecido nesta revista, 'A aerodinâmica da bola de futebol', C.E. Aguiar e G. Rubini [1] procuram explicar os efeitos físicos presentes no movimento da bola de futebol (diâmetro D = 22,2 cm, massa M = 454 g) no famoso chute de Pelé na Copa de 70 no México (sobre o assunto, mas referente à Copa de 58, ver [2], também comentado em [1]). Aqueles autores concluiram que dois efeitos 'especiais' tiveram importância na explicação: a chamada 'crise do arrasto' e a 'sustentação de Magnus'. Pela primeira, chutes que partem com velocidades superiores a do limite de 20 m/s (e a do chute em questão foi de 29 m/s) enfrentam resistência do ar (quadrática na velocidade) cerca de cinco vezes menor até que a velocidade eventualmente alcance aquele limite. Porém, a sustentação Magnus - sustentação criada pela rotação anti-horária [3] quando a velocidade é positiva, de 6,84 Hz no nosso caso -, certamente teve efeito mais decisivo no movimento ao diminuir o efeito da gravidade em cerca de 50%, permitindo que o alcance do chute fosse mesmo superior àquele que ocorreria se executado no vácuo [1], isto é, sem resistência alguma.

Portanto, o chute imprimiu tanto a velocidade de translação, V, de 29,2 m/s, 27,8 na horizontal e 8,8 na vertical, ângulo de tiro de j = 17,6º [1], como também a de rotação anti-horária de frequência f = 6,84 Hz e através desses dados pode-se inferir, como mostrado abaixo, o ponto de aplicação do impulso recebido pela bola. Isto permite dar maior precisão ao termo que os autores empregaram ao dizer que Pelé 'pegou embaixo'.

Na Fig. 1 está esquematizada a seção da bola sobre o solo no plano vertical, que contém o centro da bola O e o impulso I. HO é uma reta horizontal que faz com A'O ângulo j igual ao ângulo de tiro, 17,6º. Oz é perpendicular a A'O. Se a impulsão I fosse aplicada em A', a bola adquiriria somente velocidade de translação, calculada de

I = MV,

mas se aplicada em A, com braço O'O = d, produzirá, além de V, a rotação anti-horária calculável de

Id = 2pf,

sendo o momento de inércia relativo a qualquer eixo passando pelo centro da esfera. O momento de inércia é o da casca esférica, igual a 2MR2/3, R sendo o raio da bola (11,1 cm). Das duas relações acima obtem-se


Pela Fig. 1 vê-se que d/R é o seno do ângulo A'OA e que então A'OA = 6,1º. Portanto, o ângulo AOH é 17,6 + 6,1 = 23,7º, e o arco HA igual a 4,6 cm. Dada, porém, a dimensão da ponta da chuteira que executa o chute, seria bastante improvável que com os dados obtidos aqui, que o famoso chute fosse repetido com precisão. Podemos também estimar a frequência do movimento de rotação da perna de Pelé no chute, considerando o choque elástico entre esta, de grande massa, e a bola leve, inicialmente parada. Neste caso, a bola se moverá com o duplo da velocidade do pé, ou seja, a velocidade deste era de 29/2 = 14,5 m/s no momento do chute. Para uma perna de cerca de 1 m, vamos dizer, 1,1 m, calcula-se a frequência deste movimento de rotação em 2,1 voltas/s no momento do choque.

Em artigo anterior [4], estudou-se o movimento de projéteis com resistência quadrática na velocidade, sem levar em conta os efeitos especiais, crise do arrasto e sustentação Magnus. Nesse caso, a solução aproximada de J. Bernoulli [4], válida em princípio para ângulo de tiro até 20º, é completamente inadequada por ignorá-los. Mas verificou-se que se usamos para a aceleração da gravidade g/1,75, simulando assim a sustentação de Magnus, e o coeficiente de resistência cerca de 2,2 vezes menor do que o literalmente esperado, compensando (imperfeitamente) a diminuição pela crise do arrasto, chega-se a um acordo razoável (dentro de cerca de 10%), inclusive no tempo de duração, calculado como de 2,96 s quando a duração real foi de 3,23 s [1].

Agradecimento

Agradeço ao árbitro sua sobriedade de julgamento e a importante caracterização assinalada em [3].

[3] Devo ao árbitro a correta caracterização da rotação como 'anti-horária'.

Recebido em 30/3/2005; Revisado em 24/7/2005; Aceito em 29/7/2005

  • [1] C.E. Aguiar e G. Rubini, Rev. Bras. Ens. Fís. 26, 297 (2004).
  • [2] B. Leroy, Rev. Bras. Física 7, 691 (1977).
  • [4] G.F. Leal Ferreira, Rev. Bras. Ens. Fís. 23, 271 (2001).
  • 1
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      27 Mar 2006
    • Data do Fascículo
      Dez 2005

    Histórico

    • Aceito
      29 Jul 2005
    • Revisado
      24 Jul 2005
    • Recebido
      30 Mar 2005
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