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Dengue e o ambiente urbano

EDITORIAL ESPECIAL SPECIAL EDITORIAL

Dengue e o ambiente urbano

Roberto de Andrade Medronho

Núcleo de Estudos de Saúde Coletiva/UFRJ

Correspondência para Correspondência para: Av. Brigadeiro Trompowsky s/n – Ilha do Fundão Praça da Prefeitura da Cidade Universitária da UFRJ 21949-900 – Rio de Janeiro – RJ E-mail: medronho@nesc.ufrj.br

A introdução do sorotipo 3 do vírus da dengue em dezembro de 2001 provocou a maior e mais grave epidemia da doença no Brasil, tendo sido notificados mais de 1,2 milhão de casos em 2001 e 2002, ocorrendo também a co-circulação dos sorotipos 1 e 2. Após esse período, o processo endêmico-epidêmico manteve-se predominantemente nas grandes regiões metropolitanas do país, contribuindo também para a disseminação da doença para outros municípios. Diversas características contribuem para a proliferação do Aedes aegypti nessas regiões. O processo de urbanização desordenado produzindo regiões com alta densidade demográfica com graves deficiências no abastecimento de água e na limpeza urbana, o intenso trânsito de pessoas entre as áreas urbanas e, fundamentalmente, a ineficiência no combate ao vetor tornam o controle da dengue uma árdua tarefa.

A grande complexidade desse ambiente antrópico torna essencial repensar a estratégia de controle da doença. O mecanismo de produção da doença requer a adoção de políticas integradas entre diversos setores e não apenas a saúde. Deve-se ter em mente que a dengue embora se expresse na área da saúde, não é um problema especifico desse setor. Além disso, as políticas de combate à doença devem extrapolar o âmbito municipal nessas grandes metrópoles. Na verdade, a integração das ações de controle do vetor deve começar no âmbito das próprias secretarias de saúde, já que em muitas delas a vigilância epidemiológica não está integrada à vigilância entomológica. Uma boa iniciativa poderia ser a integração do Sistema de Informações de Febre Amarela e Dengue – SISFAD com o Sistema de Informações de Agravos de Notificação - SINAN. Isto poderia facilitar a adoção de medidas de contenção através da notificação de casos suspeitos, com a oportunidade necessária.

Atualmente, dispõe-se de tecnologias para estratificar os municípios de acordo com áreas de risco, com a definição de indicadores específicos (entomológicos, epidemiológicos e sócio-ambientais) para aperfeiçoar as ações. Assim, a utilização dos sistemas de informações geográficas pode se constituir em um poderoso recurso para o apoio às ações de prevenção e controle da dengue.

Até o momento, o único elemento controlável da cadeia epidemiológica da dengue é o seu vetor. Neste sentido, faz-se necessário investir em pesquisa para o estudo mais detalhado do comportamento do Aedes aegypti. O conhecimento da produtividade dos diversos tipos de criadouros em meio urbano e dos condicionantes ambientais e a presença e a dinâmica do vírus da dengue nos mosquitos são de grande relevância para se compreender a dinâmica da transmissão da doença.

As estratégias de controle do vetor procuram priorizar locais que contêm grande quantidade de criadouros com formas imaturas do mosquito. Uma questão que vem sendo discutida atualmente é a produtividade do foco. Os pequenos focos parecem não ter grande importância na produtividade da forma alada e, conseqüentemente, na transmissão da doença. Assim, podem existir localidades com grande número de focos de pequeno porte, que tendem a ter baixa produtividade para as formas aladas do vetor. Por outro lado, um único foco de grande porte pode apresentar grande produtividade, além de contribuir para a geração de pequenos focos do mosquito. As ações educativas poderiam ser direcionadas preferencialmente para os grandes focos. Neste sentido, é fundamental incorporar a análise da produtividade dos criadouros de Aedes aegypti, através do cálculo de emergência de fêmeas adultas, levando-se em conta o número de pupas coletadas nos recipientes. A estimativa da produtividade poderia definir de forma mais precisa as áreas de risco e contribuir para otimizar as ações de controle do vetor.

Uma boa iniciativa para o acesso das informações sobre o vetor foi tomada pelo Ministério da Saúde através da realização do levantamento rápido do índice de infestação predial, que deve ser mantido e ampliado para outros municípios. Esses dados devem ser disponibilizados pelo Ministério da Saúde com a desagregação necessária para se conhecer índices por localidades e não apenas as médias municipais, que acabam por suavizar as diferenças intramunicipais.

Até o momento a modulação do processo epidêmico infelizmente tem sido função da imunidade de grupo e não do controle eficiente do vetor. Assim, com a circulação do sorotipo 4 em países próximos ou mesmo fronteiriços, como a Venezuela, existe o risco da reintrodução desse sorotipo, o que aliado a uma população suscetível e a grande densidade vetorial seriam os ingredientes ideais para um novo processo epidêmico explosivo. Neste cenário, a chave para a não ocorrência de uma epidemia explosiva é o eficiente controle do vetor. Ainda há tempo, embora pareça faltar vontade política em muitas situações.

  • Correspondência para:

    Av. Brigadeiro Trompowsky s/n
    – Ilha do Fundão
    Praça da Prefeitura da Cidade Universitária da UFRJ
    21949-900
    – Rio de Janeiro
    – RJ
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Jun 2007
    • Data do Fascículo
      Jun 2006
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