Acessibilidade / Reportar erro

Uso de produtos naturais como coadjuvante no tratamento da doença periodontal

Use of natural products as adjuvant in the treatment of periodontal disease

Resumos

A doença periodontal (DP) é descrita como um conjunto de processos inflamatórios e infecciosos que acomete os tecidos periodontais, de etiologia multifatorial, localização sítiodependente e considerada pela Organização Mundial de Saúde como uma das duas principais enfermidades de risco para a saúde bucal. Desencadeada e perpetuada por bactérias anaeróbias Gram-negativas, cuja resistência a antibioticoterapia convencional e a antissépticos bucais exigem a busca por novos métodos coadjuvantes ao tratamento clínico (raspagem e alisamento radicular) da DP. Neste enfoque, o uso de produtos naturais poderia ser muito promissor. O objetivo do trabalho foi realizar uma revisão bibliográfica sobre o tema: utilização de produtos naturais no controle químico do crescimento do biofilme dental subgengival. O trabalho mostrou que este novo conceito de tratamento a base de produtos naturais, merece uma atenção especial, desde que o Brasil é detentor de uma rica biodiversidade e já que diversos trabalhos científicos indicam uma atividade antimicrobiana in vitro em ensaios laboratoriais utilizando produtos naturais. Assim, métodos de tratamento da doença periodontal eficazes e acessíveis à população poderiam modificar o quadro atual em que se encontra a saúde bucal dos brasileiros no cenário internacional.

periodontopatógenos; plantas medicinais; periodontite


The periodontal disease (PD) is described as a set of inflammatory and infectious process that attacks periodontal tissue of multifactorial etiology, localized and considered by the World Health Organization (WHO) as one of the two main disease in odontology. Unchained and perpetuated for Gram negative anaerobic bacteria, whose anti-septic and antibiotic resistance demand new methods for clinical treatment (scaling and root planing). In this approach, the use of natural products could be promising. The aim of this work was a literature review about the use of natural products in the chemical control of the growth of subgingival dental biofilm. The work showed that antimicrobial natural agents can be useful as adjunct to mechanical therapy and deserve a special attention, since Brazil hold a rich biodiversity and because scientific works indicate an antimicrobial activity in vitro in assays using natural products. Thus, methods of treatment of periodontal diseases, efficient and accessible to Brazilian population could change the actual scenery of odontology in Brazil.

natural products; periodontitis; periodontopathogens


REVISÃO

Uso de produtos naturais como coadjuvante no tratamento da doença periodontal

Use of natural products as adjuvant in the treatment of periodontal disease

Paulo J. L. Juiz* * E-mail: paulojuiz@ufrb.edu.br, Tel./Fax +55 75 3632 4629. ,I; Reinaldo J. C. AlvesII; Tânia F. BarrosIII

IUniversidade Federal do Recôncavo da Bahia, Rua do Cajueiro s/n, Campo do Governo, 44570-000 Santo Antônio de Jesus-BA, Brasil

IIUniversidade Estadual de Feira Santana, km 03, BR 116, Campus Universitário. 44.031-460 Feira de Santana-BA, Brasil

IIIDepartamento de Análises Clínicas e Toxicológicas, Faculdade de Farmácia, Universidade Federal da Bahia, Rua Barão de Geremoabo s/n, Campus Universitário de Ondina, 40170-290 Salvador-BA, Brasil

RESUMO

A doença periodontal (DP) é descrita como um conjunto de processos inflamatórios e infecciosos que acomete os tecidos periodontais, de etiologia multifatorial, localização sítiodependente e considerada pela Organização Mundial de Saúde como uma das duas principais enfermidades de risco para a saúde bucal. Desencadeada e perpetuada por bactérias anaeróbias Gram-negativas, cuja resistência a antibioticoterapia convencional e a antissépticos bucais exigem a busca por novos métodos coadjuvantes ao tratamento clínico (raspagem e alisamento radicular) da DP. Neste enfoque, o uso de produtos naturais poderia ser muito promissor. O objetivo do trabalho foi realizar uma revisão bibliográfica sobre o tema: utilização de produtos naturais no controle químico do crescimento do biofilme dental subgengival. O trabalho mostrou que este novo conceito de tratamento a base de produtos naturais, merece uma atenção especial, desde que o Brasil é detentor de uma rica biodiversidade e já que diversos trabalhos científicos indicam uma atividade antimicrobiana in vitro em ensaios laboratoriais utilizando produtos naturais. Assim, métodos de tratamento da doença periodontal eficazes e acessíveis à população poderiam modificar o quadro atual em que se encontra a saúde bucal dos brasileiros no cenário internacional.

Unitermos: periodontopatógenos, plantas medicinais, periodontite

ABSTRACT

The periodontal disease (PD) is described as a set of inflammatory and infectious process that attacks periodontal tissue of multifactorial etiology, localized and considered by the World Health Organization (WHO) as one of the two main disease in odontology. Unchained and perpetuated for Gram negative anaerobic bacteria, whose anti-septic and antibiotic resistance demand new methods for clinical treatment (scaling and root planing). In this approach, the use of natural products could be promising. The aim of this work was a literature review about the use of natural products in the chemical control of the growth of subgingival dental biofilm. The work showed that antimicrobial natural agents can be useful as adjunct to mechanical therapy and deserve a special attention, since Brazil hold a rich biodiversity and because scientific works indicate an antimicrobial activity in vitro in assays using natural products. Thus, methods of treatment of periodontal diseases, efficient and accessible to Brazilian population could change the actual scenery of odontology in Brazil.

Keywords: natural products, periodontitis, periodontopathogens.

INTRODUÇÃO

A procura por produtos naturais com atividade antibacteriana no combate a doenças que afetam o elemento dental tem merecido destaque, principalmente com o advento de cepas multirresistentes a antibióticos (Roberts, 2002) e efeitos colaterais associados ao uso da clorexidina, que é aclamada como padrão ouro no controle da placa bacteriana (Jones, 1997), incluindo: inativação na presença de sulfatos e cálcio (Van Grunsven & Cardoso, 1995), manchamento extrínsico no esmalte dentário, hiperplasia de papilas linguais e perda do sentido da gustação. Desta forma, a utilização de produtos naturais associada ao tratamento preventivo poderia reduzir a alta incidência de doenças que afetam o elemento dental, como à doença periodontal.

A doença periodontal é descrita como um conjunto de processos inflamatórios e infecciosos que ISSN 0102-695X acomete os tecidos periodontais, de etiologia multifatorial, incluindo Diabetes mellitus insulino dependente, infecção por HIV, tabagismo (Genco, 1996; Yoshimitus et al., 1998), alterações neutrofílicas (Page & Kornman, 1997) e predisposição genética (Cullinan et al., 2008; Loos et al., 2008).

O processo inflamatório é desencadeado e perpetuado por bactérias Gram-negativas como Porphyromonas gingivalis, Tannerella forsythensis, Aggregatibacter actinomycetemcomitans, Prevotella intermedia, Fusobacterium nucleatum, Campylobacter rectus e Eikenella corrodens, Gram-positivas como Peptostreptococcus micros, Streptococcus intermedius e bactérias espiraladas como o Treponema denticola que colonizam o biofilme dental subgengival (Darveau et al., 1997) e estimulam uma resposta imune, cuja consequência é a destruição da matriz extracelular e reabsorção do osso alveolar (Tonetti et al., 1997), o que pode acarretar na perda do elemento dental. Desta forma métodos coadjuvantes no controle do crescimento do biofilme dental subgengival são essenciais para a manutenção dos tecidos periodontais.

Produtos naturais: uma nova perspectiva para controlar o crescimento do biofilme dental subgengival

A terapia periodontal convencional realizada com sucesso tem o objetivo de manter a saúde dos tecidos periodontais, porém a recolonização da área subgengival pelos periodontopatógenos, resultado de uma terapia preventiva de manutenção falha, pode acarretar em uma doença recorrente. Desta forma produtos naturais poderiam auxiliar no controle do crescimento do biofilme dental subgengival.

Feres e colaboradores (2005) avaliaram o efeito de própolis em amostras de saliva de 25 pacientes com doença periodontal e 25 pacientes sadios. O mecanismo de ação da própolis seria uma bacteriólise parcial devido a ruptura da parede celular e desorganização da membrana plasmática bacteriana, bem como inibição de síntese protéica. Segundo os pesquisadores, a própolis mostrou uma propriedade antimicrobiana significativa frente à periodontopatógenos, sugerindo que esta substância poderia ser usada terapeuticamente no controle do crescimento da microbiota oral. Segundo Gebara e colaboradores (2002), a própolis também mostrou atividade antimicrobiana em cepas de A. actinomycetemcomitans, Prevotella intermedia, P. melaninogenica, P. gingivalis, Capnocytophaga gingivalis e Fusobacterium nucleatum, microrganismos envolvidos no desenvolvimento da periodontite.

Estudos que mostram a ação da própolis contra o crescimento microbiano por vezes apresentam resultados controversos. Uma possível explicação para este fato é que a composição química da própolis parece variar segundo a época e região onde é coletada, com alteração quantitativa e qualitativa dos seus princípios ativos (Gebara et al., 2002). Porém, segundo Sforcin e colaboradores (2000), a própolis coletada no Brasil não mostra variação na constituição química em função da época e região da coleta.

Santos (2003) relatam que nenhum dos princípios ativos testados isoladamente em seus estudos foram mais efetivos contra periodontopatógenos do que o extrato etanólico de própolis, mostrando que a atividade antimicrobiana é provavelmente causada pelo efeito sinérgico dos diferentes componentes da própolis.

Alho (Allium sativum) tem mostrado conhecida propriedade antibacteriana, antifúngica e antiviral, a esse respeito Bakri & Douglas (2005) testaram o efeito desta planta sobre o crescimento e enzimas proteolíticas de Porphyromonas gingivalis. O extrato de alho inibiu o crescimento, CIM (Concentração Inibitória Mínima) 142,7-35,7 mg/mL e também mostrou um efeito bactericida, CBM (Concentração Bactericida Mínima) 35,7-1,1 mg/mL, sobre o organismo testado. Ainda, a atividade proteolítica da protease de P. gingivalis foi inibida em 94,88%. Estes dados sugerem que esta planta é um importante coadjuvante no tratamento de pacientes portadores de periodontite (Bakri & Douglas 2005).

A resposta imunoinflamatória na doença periodontal é um dos fatores desencadeantes da destruição dos tecidos periodontais, a este respeito Harokopakis e colaboradores (2006) determinaram a habilidade do extrato aquoso extraído de flores de Sambucus nigra em inibir a ativação do fator de transcrição NFκB p65 de células T auxiliares, sugerindo que esta planta poderia ser utilizada como adjuvante na terapia periodontal, já que a não ativação de NFκB, citocinas pró-inflamatórias como TNFα, IL-1ß e IL-6 não seriam liberadas no sítio da inflamação, consequentemente osteoclastos não seriam ativados e o osso alveolar não seria reabsorvido. Além disso, o extrato aquoso extraído de flores de Sambucus nigra regula a diapedese de neutrófilos por inibir a expressão de integrinas CD11b/CD18, o que levaria a uma resposta inflamatória modulada e equilibrada.

O efeito imunomodulador de determinadas substâncias químicas utilizadas como terapia é uma qualidade relevante, desde que a droga possa induzir um feito antiinflamatório e uma resposta imune direcionada e eficaz contra o patógeno.

Centella asiatica e Punica granatum são plantas medicinais que promovem regeneração tecidual e modulação da resposta imune. Estudos preliminares revelaram efeitos clínicos favoráveis quando o extrato das duas ervas foram impregnados em chips biodegradáveis, os quais foram introduzidos no sulco gengival de pacientes com doença periodontal, após raspagem e alisamento radicular. Os parâmetros clínicos que incluíram profundidade de sondagem, nível de inserção clínica do ligamento periodontal, índice de sangramento a sondagem, índice de placa foram avaliados. Amostra de fluido crevicular gengival foi obtida antes e depois da terapia periodontal. Os resultados indicaram uma redução na produção da citocina pró-inflamatória IL-1β e baixa produção de IL-6 (Sastravaha et al., 2005).

Óleos essenciais da Artemisia lavandulaefolia parecem exibir um considerável efeito inibitório sobre bactérias anaeróbias da cavidade oral, como P. gingivalis e A. actinomycetemcomitans (CIM 0,025 a 0,05 mg/mL; CBM 0,025 a 0,1 mg/mL).

Óleos de Leptospermum scoparium, Melaleuca alternifolia, Eucalyptus radiata, Lavandula officinalis e Rosmarinus officinalis foram obtidos no laboratório PhytoSun'Aroms (Ance, França). Segundo o estudo, a CIM de óleos extraídos de Melaleuca alternifolia, Eucalyptus radiata foi 0,06 a 0,5% contra A. actinomycetemcomitans Y4, ATCC 29523, ATCC 29524, P. gingivalis ATCC 33277, ATCC 53977, Su63, W50 e F. nucleatum ATCC 25586. A exposição por trinta segundos da cepa de A. actinomycetemcomitans, P. gingivalis, F. nucleatum submetidas a ação dos óleos de Leptospermum scoparium, Melaleuca alternifolia, Eucalyptus radiata na concentração de 0,2 a 0,5% mostrou atividade bactericida. Porém, o óleo da Lavandula officinalis não mostrou atividade contra nenhuma cepa testada (Takarada et al., 2004).

A habilidade dos microrganismos que causam a periodontite em aderir a superfície dental é considerada um fator de patogenicidade. Óleos essencias de Leptospermum scoparium, Malaleuca alternifolia, Eucalyptus radiata, Lavandula officinalis e Rosmarinus officinalis possuem a capacidade de inibir a formação do biofilme dental e não mostram atividade citotóxica sobre as células humanas na concentração de até 0,2% (Takarada et al., 2004).

Uma das grandes preocupações na odontologia é com o paciente que utiliza aparelho ortodôntico fixo para correção de maloclusão. O uso desta aparelhagem permite um maior acúmulo de resíduos provenientes da alimentação e maior crescimento bacteriano sobre a superfície dental, sendo que a maioria destes pacientes também desenvolve gengivite e hiperplasia gengival. Neste contexto, óleo essencial extraído de folhas de Croton cajucara foi utilizado no trabalho realizado por Alviano e colaboradores (2005) que mostraram atividade frente a Candida albicans, Lactobacillus casei, Staphylococcus aureus, Streptococcus sobrinus, Porphyromonas gingivalis e Streptococcus mutans. Embora o princípio ativo mais eficiente desta planta seja o linalool, este composto isoladamente, apenas inibiu o crescimento de Candida albicans sugerindo a presença de outros componentes ativos com atividade antibacteriana.

O óleo essencial extraído de Melaleuca alternifolia tem sido usado na Austrália a mais de 80 anos por aborígenes de New South Wales. O óleo essencial obtido por hidrodestilação contém aproximadamente 100 componentes. A propriedade antiinflamatória e a antibacteriana elegem esta planta para o uso em odontologia. A CIM/CBM para A. actinomycetemcomitans foi 0,06/0,06%, respectivamente. O tempo requisitado para que o óleo essencial fosse considerado bactericida foi de trinta segundos e este período de tempo é preconizado para a maioria dos antissépticos utilizados na cavidade bucal (Hammer et al., 2003).

Milhões de Yemenitas e africanos do leste da África habitualmente mascam as folhas e ramos de Catha edulis uma planta da família Celestraceae comumente conhecida como chá-da-absintia, que contém um complexo grupo de alcalóides, também vitamina C, tanino (8-19 mg/g), óleos essenciais (onze componentes diferentes), esteróis, triterpenos, tiamina, riboflavina, niacina, ferro e aminoácidos (Al-Hebshi et al., 2005). Em um estudo realizado in vivo foi mostrado que o chá-da absintia tem a capacidade de influenciar na prevalência de periodonto patógenos localizados sub e supra gengivalmente, induzindo um perfil na microbiota adequado à saúde periodontal. Testes de susceptibilidade foram executados segundo normas do Clinical and Laboratory Standards Institute. Os resultados indicaram que a maioria das cepas de periodonto patógenos testados, incluindo P. gingivalis, T. forsythensis e A. actinomycetemcomitans foram sensíveis aos extratos de Catha edulis (CIM de 5-20 mg/mL). Apenas Campylobacter rectus e Fusobacterium nucleatum mostraram resistência (Al-Hebshi et al., 2005).

É sabido que a formação da placa bacteriana é o desencadeador dos processos patológicos que acometem a estrutura do elemento dental e o tecido de suporte dentário, assim o controle da formação da placa bacteriana é imprescindível quando se quer controlar o desenvolvimento da periodontite.

Dentre os microrganismos colonizadores do biofilme dental o Streptococcus mutans, um dos agentes etiológicos da cárie dental, facilita a colonização de microrganismos anaeróbios. Assim o controle do crescimento do S. mutans resultará na prevenção também da periodontite.

Com relação a inibição de S. mutans, é conhecido que o alecrim-do-campo, a principal matéria-prima da própolis verde produzida mais especificamente nos estados de Minas Gerais e São Paulo, mostrou capacidade em inibir a proliferação de S. mutans (Medcenter, 2005).

O desenvolvimento tecnológico e industrial traz ao mercado diariamente produtos como escovas elétricas, irrigadores elétricos, que facilitam a higiene bucal e controle de placa. A esse respeito Pistorius e colaboradores (2003) associaram a esta tecnologia um antisséptico bucal contendo extrato de ervas medicinais de Salvia officinalis, Mentha piperita, Matricaria chamomilla, Commiphora myrrha, Carvum carvi, Eugenia caryophyllus e Echinacea purpurea na concentração de 2,5 partes do agente em 100 partes de água, preparado pelos participantes do projeto. Esta inovação conseguiu reduzir o índice de sangramento gengival no grupo de pacientes com gengivite, resultado estatisticamente significante quando comparado ao grupo controle, composto de pacientes que utilizavam irrigadores convencionais.

Propriedades farmacológicas de plantas e hortaliças usadas na odontologia como: agrião, alecrim, alfavaca, alho, amora, artemija, babosa, batata-doce, bardana, caju, calêndula, cambuí, camomila, cenoura, dormideira, erva-luiza, erva-escorpião, eucalipto, extremosa, figo, framboesa, fruta-pão, funcho, gelsêmico, gengibre, goiaba, guaco, guaçatonga, guando, guiná, hortelã, jabuticaba, jamelão, joá, jucá, labaça, limão, macelinha, malva, manga, melissa, morango, mulungu, nêspera, pau-brasil, picão, ratânia, rebenta-cavalo, romã, sabugueiro, sálvia, suína, tanchagem, tomate, tomilho, vedelia, zedoária são meios auxiliares na prevenção em odontologia.

METODOLOGIA

O trabalho consistiu em uma revisão da literatura sobre o tema: uso de produtos naturais sobre o crescimento de microrganismos que contribuem com o desenvolvimento da doença periodontal. Foram pesquisados 110 artigos, destes foram selecionados 100. Sendo 50% relativos a doença periodontal, incluindo a etiologia e características morfológicas e de patogenicidade de alguns periodontopatógenos, 38% relacionados à utilização de produtos naturais no controle do biofilme dental, 6% relacionados à resistência de periodontopatógenos a antibioticoterapia e 7% relacionados ao uso de clorexidina no tratamento da doença periodontal.

DISCUSSÃO

A doença periodontal é considerada uma infecção oportunista induzida por bactérias anaeróbias que colonizam o biofilme dental subgengival. Alguns pacientes podem não responder eficazmente a terapia periodontal convencional, que consiste em reduzir a microbiota patogênica e promover a regeneração tecidual, por meio de técnicas mecânicas (raspagem e alisamento radicular) e cirúrgicas, associadas a antibioticoterapia e uso de antissépticos. Porém, a presença de cepas de microrganismos multirresistentes são obstáculos a terapia periodontal.

O Brasil possui a mais rica flora em todo o mundo, com mais de 56.000 espécies de plantas, cerca de 19% da flora mundial. Estimativas indicam aproximadamente 5 a 10 espécies de gimnosperma, 55.000 a 60.000 espécies de angiospermas, 3100 espécies de briófitas e 1200 a 1300 espécies de pteridófitas, e em torno de 525 espécies de algas marinhas (Giulietti et al., 2005). Esta biodiversidade pode ser uma rica fonte de matéria-prima de produtos naturais com atividade antimicrobiana e representa uma alternativa promissora no combate as cepas multirresistentes.

A efetividade de um antimicrobiano pode ser influenciada pela presença de sangue, matéria orgânica, biofilmes intactos menos susceptíveis a ação da droga, o que dificulta a análise da atividade antimicrobiana frente a periodontopatógenos em testes in vitro.

O uso da clorexidina, a despeito de seus efeitos colaterais, poderia suplantar as dificuldades no controle químico da placa dental, visto que a clorexidina é um potente agente bactericida, embora seu efeito seja maior nas camadas superficiais do biofilme dental.

A atividade antibacteriana da clorexidina poderia ser melhorada por meio de sua combinação com óleos essenciais, que poderiam ser usados para reduzir a concentração de clorexidina em colutórios bucais, minimizando os efeitos colaterais e maximizando a atividade antimicrobiana deste antisséptico.

Branda e colaboradores (2005) descrevem o biofilme microbiano como uma comunidade multicelular fisiológica, bioquímica e estruturalmente organizada por uma matriz extracelular, a desorganização do biofilme ou a inibição da produção da matriz extracelular seriam mecanismos de ações ideais de um fitofármaco, mais do que agir exclusivamente sobre as bactérias planctônicas.

Muitos trabalhos (Bakri et al., 2005; Feres et al.,2005; Iauk et al., 2003; Lee & Chung, 2004) têm sugerido que o uso de plantas medicinais associado ao tratamento periodontal convencional, além da ação antiinflamatória, poderia resultar em diminuição da contagem de microrganismos responsáveis pela destruição dos tecidos de sustentação do elemento dental.

O efeito sinérgico das ações antiinflamatórias, imunomoduladoras e antimicrobianas das plantas medicinais é uma ferramenta útil no tratamento da doença periodontal.

Não devemos, no entanto, desmerecer e abolir por completo o uso de drogas convencionais, cujo efeito comprovado corrobora a importância de sua utilização como: penicilina, tetraciclina, amoxicilina, doxicilina, metronidazol, ciprofloxacina e outros. Embora, a conscientização da população como um todo e dos profissionais da área de saúde habilitados para prescrição de medicamentos, quanto ao uso indiscriminado de antibióticos deverá fazer parte dos Programas anuais desenvolvidos pelo Ministério da Saúde, já que segundo Rodrigues e colaboradores (2004), cepas de Aggregatibacter actinomycetemcomitans, Porphyromonas gingivalis e Tannerella forsythensis já apresentam um perfil de resistência a determinadas drogas como a tetraciclina.

O uso de plantas medicinais em saúde preventiva e curativa é cercado de recomendações rigorosas quando da sua utilização, pois segundo Veiga Jr e Pinto (2005) muitas plantas têm mostrado efeitos adversos como irritação gástrica, lesões no sistema nervoso, hemorragias, irritação na mucosa bucal.

Plantas com atividade sobre os periodontopatógenos seriam mais eficazes se também inibissem o crescimento de microrganismos como o S. mutans, que facilitam a instalação de periodontopatógenos no biofilme dental.

A terapia periodontal tem como objetivo a saúde periodontal, evitando a perda do elemento dental. Os cirurgiões-dentistas procuram novas informações, a fim de torná-los capazes de identificar e tratar a doença periodontal, reduzindo o risco de desenvolvimento de doenças como as cardiovasculares, incluindo endocardite bacteriana, bem como minimizando problemas de cunho psicosocial, incluindo ausência de autoestima e oportunidade de trabalho, que estão diretamente relacionados às conseqüências que a DP pode gerar. Neste contexto, novos instrumentos de tratamento como o uso de plantas medicinais no controle do crescimento e organização do biofilme subgengival trará uma nova possibilidade para o tratamento de um problema, hoje, mundial: a Doença Periodontal.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A literatura consultada aponta a doença periodontal como um problema de saúde pública. Estudos mostram que produtos naturais poderiam ser coadjuvantes no tratamento da Doença Periodontal e o Brasil pode ser considerado um importante fornecedor de matéria-prima na área de farmacognosia, visto que possui a mais rica flora em todo o mundo, com mais de 56.000 espécies de plantas, cerca de 19% da flora mundial.

Testes in vivo são necessários para confirmar a eficácia de fitofarmácos e permitir a comercialização e utilização pela sociedade. Dentre as ações esperadas, um efeito imunomodulador, antiinflamatório e antimicrobiano deveria ser levado em conta quando se estuda a eficiência de uma droga a base de plantas medicinais.

Foi relatada a atividade comprovada da própolis no controle de microrganismos e como antiinflamatório. A associação deste produto natural com outros fitofármacos poderia resultar em uma ação sinérgica favorável.

A literatura aponta que o biofilme dental estruturado pode inibir a ação de diversas drogas. Assim, plantas medicinais com comprovada atividade sobre a produção de matriz extracelular devem ser selecionadas para pesquisas científicas relacionadas ao controle químico do biofilme dental subgengival e supragengival.

É indiscutível a importância de pesquisas direcionadas para utilização de plantas medicinais como parte integrante do tratamento odontológico preventivo e curativo da doença periodontal.

Received 3 July 2008; Accepted 6 October 2009

  • Al-Hebshi N, Al-Haroni M, Skaug N 2005. In vitro antimicrobial and resistence-modifying activities of aqueous crude khat extracts against oral microorganisms. Arch Oral Biol 51: 183-188.
  • Alviano WS, Mendonça-Filho RR, Alviano DS, Bizzo HR, Souto-Padrón T, Rodrigues ML, Bolognese AM, Alviano CS, Souza MMG 2005. Antimicrobial activity of Croton cajucara Benth linalool-rich essential oil on artificial biofilms and planktonic microorganisms. Oral Microbiol Immun 20: 101-105.
  • Bakri IM, Douglas CWI 2005. Inhibitory effect of garlic extract on oral bacteria. Arch Oral Biol 50: 645-651.
  • Branda SS, Vik A, Friedman L, Kolter R 2005. Biofilms: the matrix revisited. Trends Microbiol 13: 20-26.
  • Cullinan MP, Westerman B, Hamlet SM, Palmer JE, Faddy MJ, Seymour GJ, Middleton PG, Taylor JJ 2008. Progression of periodontal disease and interleukin-10 gene polymorphism. J Periodontal Res 43: 328-333.
  • Darveau RP, Tanner A, Page RC 1997. The microbial challenge in periodontitis. Periodontol 2000 14: 12-32.
  • Feres M, Figueiredo LC, Barreto IM, Coelho MH, Araujo MW, Cortelli SC 2005. In vitro antimicrobial activity of plant extracts and propolis in saliva samples of healthy and periodontally-involved subjects. J Int Acad Periodontol 7: 90-96.
  • Gebara ECE, Lima L.A, Mayer MPA 2002. Própolis antimicrobial activity against periodontopathic bactéria. Braz J Microbiol 33: 365-369.
  • Genco RJ 1996. Current view of risk factors for periodontal diseases. J Periodontol 67:1041-1049.
  • Giulietti AM, Harley RM, Queiroz LP, Wanderley MGL, van den Berg C 2005. Biodiversity and conservation of plants in Brazil. Conserv Biol 19: 632-639.
  • Hammer KA, Johnson M, Dry L, Michalak EM, Carson CF, Riley TV 2003. Susceptibility of oral bacteria to Malaleuca alternifolia (tea tree) oil in vitro. Oral Microbiol Immun 18: 389-392.
  • Harokopakis E, Albzreh MH, Haase EM, Scannapieco FA, Hajishengallis G 2006. Inhibition of proinflammatory activities of major periodontal pathogens by aqueous extracts from elder flower (Sambucus nigra). J Periodontol 77: 271-279.
  • Iauk L, LO Bue AM, Milazzo I, Rapisarda A, Blandino G 2003. Antibacterial activity of medicinal plant extracts against periodontopathic bacteria. Phytother Res 17: 599-604.
  • Jones CG 1997. Chlorhexidine: is it still the gold standart? Periodontol 2000 15: 55-62.
  • Lee JH, Chung MS 2004. In vitro anti-adhesive activity of an acidic polysaccharide from Panax ginseng on Porphyromonas gingivalis binding to erythrocytes. Planta Med 70: 566-568.
  • Loos BG, van der Velden U, Laine ML 2008. Genetics and periodontitis. Ned Tijdschr Tandheelkd 115: 87-92.
  • Medcenter 2005. Alecrim-do-campo apresenta propriedades preventivas contra a cárie dental. Disponível no site: http://www.odontologia.com.br/noticias.asp?id=860 Acessado em agosto de 2006.
  • Page RC, Kornman KS 1997. The pathogenesis of human periodontitis: an introduction. Periodontol 2000 14: 9-11.
  • Pistorius A, Willershausen B, Steinmeier EM, Kreisler T M 2003. Efficacy of subgingival irrigation using herbal extracts on gingival inflammation. J Periodontol 74: 616-622.
  • Roberts MC 2002. Antibiotic toxicity, interactions and resistence development. Periodontol 2000 28: 280-297.
  • Rodrigues RM, Gonçalves C, Feres-Filho JE, Uzeda M, Colombo APV 2004. Antibiotic resistence profile of the subgengival microbiota following systemic or local tetracycline therapy. J Clin Periodontol 31: 420-427.
  • Santos A 2003. Evidence-based control of plaque and gingivitis. J Clin Periodontol 30: 13-16.
  • Sastravaha G, Gassmann G, Sangtherapitikul P, Grimm WD 2005. Adjunctive periodontal treatment with Centella asiatica and Punica granatum extracts in supportive periodontal therapy. J Int Acad Periodontol 7: 70-79.
  • Sforcin JM, Fernandes Jr.A, Lopes CAM, Bankova V, Funari SRC 2000. Seasonal effect on Brazilian própolis antibacterial activity. J Ethnopharmacol 73: 243-249.
  • Takarada KR, Kimizuka N, Takahashi K, Honma K, Okuda TK 2004. A comparison of the antibacterial efficacies of essential oils against oral pathogens. Oral Microbiol Immun 19: 61-64.
  • Tonetti S, Kornman KS, Page RC 1997. The host response to the microbial challenge in periodontitis: assembling the players. Periodontol 2000 14: 33-53.
  • Veiga Jr. VF, Pinto AC 2005. Plantas medicinais: cura segura? Quim Nova 28: 519-528.
  • Van Grunsven MF, Cardoso EBT 1995. Atendimento odontológico em crianças especiais. Rev Assoc Paul Cir Dent 49: 364-370.
  • Yoshimitus A, Noriyoshi S, Masaru Y 1998. Effect of aging on functional changes of periodontal tissue cells. Ann Periodontol 3: 350-369.
  • *
    E-mail:
    paulojuiz@ufrb.edu.br, Tel./Fax +55 75 3632 4629.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Abr 2010
    • Data do Fascículo
      Mar 2010

    Histórico

    • Recebido
      03 Jul 2008
    • Aceito
      06 Out 2009
    Sociedade Brasileira de Farmacognosia Universidade Federal do Paraná, Laboratório de Farmacognosia, Rua Pref. Lothario Meissner, 632 - Jd. Botânico, 80210-170, Curitiba, PR, Brasil, Tel/FAX (41) 3360-4062 - Curitiba - PR - Brazil
    E-mail: revista@sbfgnosia.org.br