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Efeitos do alongamento ativo excêntrico dos músculos flexores do joelho na amplitude de movimento e torque

Resumos

OBJETIVO: Avaliar a amplitude de movimento (ADM) e o torque flexor e extensor do joelho após a realização de um programa de alongamento ativo excêntrico dos músculos flexores do joelho. MATERIAIS E MÉTODOS: Trinta e quatro voluntários (23 mulheres e 11 homens), 34,42±9,3 anos, realizaram um programa de alongamento ativo excêntrico dos músculos flexores do joelho na postura em pé, que consistiu de sete repetições de um minuto com 30 segundos de descanso entre as repetições. O programa de alongamento foi realizado duas vezes por semana, durante quatro semanas. A ADM de extensão e o torque flexor e extensor do joelho foram avaliados no dinamômetro isocinético pré e pós-programa de alongamento. O torque foi avaliado nos modos isométrico e isocinético concêntrico e excêntrico a 30°/s e 60°/s. RESULTADOS: Houve aumento na ADM de 53,7±13° para 30,1±16° (p=0,0001), no torque isométrico flexor de 89±32Nm para 93±33Nm (p=0,01) e extensor de 178±67Nm para 187±73Nm (p=0,006). O torque flexor concêntrico e excêntrico a 30°/s aumentou de 90±31Nm para 96±31Nm (p=0,001) e de 100±34Nm para 105±35Nm (p=0,01), respectivamente. O torque extensor concêntrico a 60°/s aumentou de 144±51Nm para 151±58Nm (p=0,02) e o excêntrico a 30°/s de 175±71Nm para 189±73Nm (p=0,01). CONCLUSÕES: O programa de alongamento proposto foi efetivo para aumentar a flexibilidade dos músculos alongados e torque dos grupos musculares agonistas (alongados) e seus antagonistas.

alongamento ativo excêntrico; flexibilidade; torque; ADM; flexores do joelho


OBJECTIVE: To evaluate the changes in knee range of motion (ROM) and torque of knee flexor and extensor muscles after an active eccentric stretching program for the knee flexor muscles. METHODS: Thirty-four volunteers (23 women and 11 men), aged 34.42±9.3 years, performed an active eccentric stretching program for the knee flexor muscles in the standing posture, consisting of seven repetitions of one minute each, with 30 seconds of resting between them. The stretching program was performed twice a week, for four weeks. Knee extension ROM and the torque of the knee flexor and extensor muscles were evaluated using an isokinetic dynamometer before and after the stretching program. The torque was evaluated in the isometric, isokinetic concentric and eccentric modes at 30°/s and 60°/s. RESULTS: There was an increase in ROM from 53.7±13° to 30.1±16° (p=0.0001), in isometric torque of the flexors from 89±32Nm to 93±33Nm (p=0.01) and of the extensors from 178±67Nm to 187±73Nm (p=0.006). The concentric and eccentric torque of the flexors at 30°/s increased from 90±31Nm to 96±31Nm (p=0.001) and from 100±34Nm to 105±35Nm (p=0.01), respectively. The concentric torque of the extensors at 60°/s increased from 144±51Nm to 151±58Nm (p=0.02), and the eccentric torque at 30°/s increased from 175±71Nm to 189±73Nm (p=0.01). CONCLUSIONS: The stretching program proposed was effective for increasing the flexibility of the stretched muscles and the torque of the agonist (stretched) muscle groups and their antagonists.

active eccentric stretching; flexibility; torque; ROM; knee flexors


ARTIGO CIENTÍFICO

FISIOTERAPIA NAS CONDIÇÕES MUSCULOESQUELÉTICAS

Efeitos do alongamento ativo excêntrico dos músculos flexores do joelho na amplitude de movimento e torque

Batista LHI; Camargo PRI; Oishi JII;Salvini TFI

IUnidade de Plasticidade Muscular, Laboratório de Neurociências, Departamento de Fisioterapia, Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) – São Carlos (SP), Brasil

IIDepartamento de Estatística, UFSCar

Correspondência para Correspondência para: Tania Fátima Salvini Departamento de Fisioterapia, Universidade Federal de São Carlos Rodovia Washington Luís, km 235 CEP 13565-905, São Carlos (SP), Brasil e-mail: tania@power.ufscar.br

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar a amplitude de movimento (ADM) e o torque flexor e extensor do joelho após a realização de um programa de alongamento ativo excêntrico dos músculos flexores do joelho.

MATERIAIS E MÉTODOS: Trinta e quatro voluntários (23 mulheres e 11 homens), 34,42±9,3 anos, realizaram um programa de alongamento ativo excêntrico dos músculos flexores do joelho na postura em pé, que consistiu de sete repetições de um minuto com 30 segundos de descanso entre as repetições. O programa de alongamento foi realizado duas vezes por semana, durante quatro semanas. A ADM de extensão e o torque flexor e extensor do joelho foram avaliados no dinamômetro isocinético pré e pós-programa de alongamento. O torque foi avaliado nos modos isométrico e isocinético concêntrico e excêntrico a 30°/s e 60°/s.

RESULTADOS: Houve aumento na ADM de 53,7±13° para 30,1±16° (p=0,0001), no torque isométrico flexor de 89±32Nm para 93±33Nm (p=0,01) e extensor de 178±67Nm para 187±73Nm (p=0,006). O torque flexor concêntrico e excêntrico a 30°/s aumentou de 90±31Nm para 96±31Nm (p=0,001) e de 100±34Nm para 105±35Nm (p=0,01), respectivamente. O torque extensor concêntrico a 60°/s aumentou de 144±51Nm para 151±58Nm (p=0,02) e o excêntrico a 30°/s de 175±71Nm para 189±73Nm (p=0,01).

CONCLUSÕES: O programa de alongamento proposto foi efetivo para aumentar a flexibilidade dos músculos alongados e torque dos grupos musculares agonistas (alongados) e seus antagonistas.

Palavras-chave: alongamento ativo excêntrico; flexibilidade; torque; ADM; flexores do joelho.

Introdução

A imobilização dos músculos em posição de alongamento promove o aumento em seu comprimento pela adição no número de sarcômeros em série das fibras musculares1. Essa adaptação tenta restabelecer a sobreposição fisiológica ideal entre os filamentos de actina e miosina, possibilitando ao músculo gerar maiores níveis de força em seu novo comprimento funcional2. Assim, o alongamento pode aumentar a flexibilidade muscular, bem como causar alterações na geração de força máxima.

Vários trabalhos constataram o aumento na flexibilidade dos músculos flexores do joelho, por meio da mensuração da amplitude de movimento (ADM), tanto de extensão do joelho quanto de flexão do quadril, após aplicarem diferentes programas de alongamento nos músculos flexores do joelho3-5; porém, poucos trabalhos estudaram a relação entre alterações na flexibilidade e torque muscular. Muitos deles analisaram as respostas musculares agudas pós-alongamentos6-8, mas faltam dados sobre os efeitos do alongamento a longo prazo9,10.

Worrell, Smith e Winegardner9 submeteram os músculos flexores do joelho a dois tipos de alongamento, estático e Facilitação Neuromuscular Proprioceptiva. Os autores verificaram que a ADM de extensão do joelho não alterou pós-alongamentos, mas houve aumento nos torques excêntrico e concêntrico do grupo muscular alongado. Hortobagyi et al.10 demonstraram aumento na flexibilidade dos músculos flexores do joelho (agonistas) pós-programa de alongamento estático deste mesmo grupo muscular. Apesar do desempenho deste grupo muscular não ter sido analisado, foi verificado aumento no desempenho dos músculos extensores do joelho, seus antagonistas. Assim, segundo os autores, há possibilidade dos músculos agonistas (alongados) terem influenciado as propriedades mecânicas dos antagonistas. Neste sentido, Winters et al.11 defendem que o alongamento ativo dos agonistas pode melhorar a função dos músculos antagonistas, mas propõem que novos trabalhos sejam realizados para investigar tal relação. Como se pode perceber, há ainda muita polêmica na literatura sobre o estudo das alterações na flexibilidade dos músculos alongados e desempenho (força) tanto dos músculos submetidos ao alongamento quanto de seus antagonistas.

Cabe mencionar também que, por meio da análise dos estudos acima citados, verifica-se que: a) os vários tipos de alongamentos dos músculos flexores do joelho, quando realizados na postura em pé, não foram executados com descarga de peso corporal no membro alongado, mas com este apoiado sobre uma superfície4,5; b) o aumento na flexibilidade dos músculos flexores do joelho foi maior quando estes foram mantidos sob tensão durante os alongamentos3,4, o que caracteriza alongamento ativo.

É importante salientar que a maioria dos autores que realizou pesquisas com humanos demonstrou a efetividade das técnicas de alongamento estático passivo, dinâmico ou por Facilitação Neuromuscular Proprioceptiva5, mas o alongamento estático ativo tem sido pouco estudado11. Estudos publicados na área – a maioria realizada com animais – demonstraram que o alongamento ativo excêntrico seria o mais indicado para promover o alongamento muscular, pois é o que mais rapidamente estimula adaptações no comprimento do músculo, aumentando, então, sua flexibilidade e podendo também causar mudanças nos níveis de geração de força12.

Diante destes dados, o maior conhecimento das alterações na flexibilidade e torque muscular, agonista e antagonista, geradas após aplicação de alongamentos ativos excêntricos em humanos, por meio de posturas que podem ser utilizadas na clínica ou nos esportes, dará suporte para que sejam executados mediante evidências científicas que comprovem sua eficácia. Assim, o objetivo deste estudo foi avaliar os efeitos de um programa de alongamento ativo excêntrico dos músculos flexores do joelho, realizado na postura em pé, com descarga de peso corporal no membro alongado, na sua flexibilidade, por meio da mensuração da ADM de extensão do joelho, e do torque flexor e extensor do joelho.

Materiais e métodos

Casuística

Participaram deste estudo 34 voluntários de ambos os sexos (23 mulheres e 11 homens), com idade de 34,42±9,3 anos. Os critérios de inclusão foram: a) serem sedentários; b) apresentarem limitação de, no mínimo, 20° na ADM de extensão do joelho13 do membro dominante, mensurada no dinamômetro isocinético; c) serem saudáveis (neste caso, só participaram os que não apresentaram distúrbios inflamatórios e osteomioarticulares dos membros inferiores e/ou coluna, bem como problemas cognitivos ou cardiovasculares que pudessem impossibilitá-lo de realizar os procedimentos descritos a seguir).

Todos os voluntários foram informados sobre os objetivos e procedimentos do estudo e assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido, conforme resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde (CNS). O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), com parecer número 179/2007, e está de acordo com a declaração de Helsinki para estudos em humanos.

Procedimentos

Todos os procedimentos foram realizados pelo mesmo avaliador. Semana 1 – inclusão. Semana 2 – medidas de ADM e torque flexor e extensor do joelho. Semanas 3 a 6 – alongamentos. Semana 7 – reavaliação da ADM e torque. Todas as avaliações de ADM e torque foram realizadas no dinamômetro isocinético (Biodex Multi-joint System 3). Somente o membro dominante foi avaliado.

Avaliações

a) Medida da ADM de extensão do joelho

Posicionamento no equipamento: para manter o quadril dos voluntários fletido com aproximadamente 90°, um acessório acolchoado foi confeccionado e acoplado ao encosto da cadeira do dinamômetro (Figura 1). Este procedimento manteve a pelve o mais próximo possível da posição neutra durante as avaliações. Em seguida, o voluntário foi devidamente posicionado e estabilizado na cadeira do dinamômetro por meio de cintos pélvico e diagonal, e o eixo mecânico do dinamômetro foi alinhado com o epicôndilo lateral do fêmur. Após o posicionamento, foram orientados a fechar os olhos e a se manterem relaxados;


Mensuração: para iniciar a avaliação, os voluntários deveriam acionar o dinamômetro, por meio do dispositivo (Figura 1), para que o braço de resistência do equipamento começasse a estender o joelho, passivamente, a partir de 90° de flexão, a 2°/s. Também foram orientados a parar o braço de resistência do dinamômetro, por meio do dispositivo, assim que sentissem iniciar a tensão de alongamento nos músculos flexores do joelho, o que ocorria entre 90° e 20° de flexão, já que os voluntários selecionados não conseguiam atingir a extensão total (0°). Foram realizadas três mensurações consecutivas e a média aritmética foi utilizada para análise estatística14. Para mensuração da ADM, não foi realizado aquecimento prévio.

b) Medida do torque isométrico dos flexores e extensores do joelho: após ter sido avaliada a ADM, os voluntários saíram da cadeira e realizaram aquecimento em uma bicicleta estacionária por cinco minutos, a 20km/h, e auto-alongamentos dos músculos flexores e extensores do joelho. A seguir, foram novamente posicionados na cadeira do dinamômetro, mas sem o auxílio do acessório acolchoado. O torque isométrico máximo da extensão do joelho foi avaliado por meio de contrações isométricas voluntárias máximas (CIVM) a 80° de flexão do joelho, como preconiza Marginson e Eston15. Foram realizadas três CIVM e considerou-se o maior pico de torque alcançado. Cada contração foi mantida por cinco segundos, com intervalo de repouso de 90 segundos entre elas. O procedimento utilizado durante a avaliação do torque isométrico flexor do joelho foi o mesmo utilizado para avaliar o torque extensor, exceto que o torque flexor foi avaliado com a articulação do joelho a 30° de flexão, de acordo com Murray et al.16.

c) Medida do torque isocinético flexor e extensor do joelho: o torque isocinético concêntrico e excêntrico dos músculos flexores e extensores do joelho foram avaliados em ADM de 60º17, partindo de 90º de flexão do joelho. Cabe mencionar que o programa utilizado para a análise das contrações máximas dos extensores do joelho foi concêntrico-excêntrico e, para a avaliação dos flexores, foi utilizado o programa excêntrico-concêntrico. Estas avaliações foram realizadas a 30º e 60º/s para ambos os grupos musculares. Foram executados cinco movimentos consecutivos de extensão e flexão do joelho em cada velocidade, com um intervalo de dois minutos entre elas. Iniciou-se sempre pela velocidade a 30°/s. Cabe mencionar que foram realizadas cinco contrações submáximas antes dos testes máximos para familiarização dos voluntários com o equipamento. Todos os testes foram realizados pelo mesmo terapeuta.

Alongamento

Programa de alongamento dos músculos flexores do joelho: primeiramente, os voluntários foram orientados a se posicionarem na postura em pé, em frente a uma maca, mantendo uma distância suficiente para que pudessem apoiar ambas as mãos sobre a maca. A seguir, o fisioterapeuta alinhou a coluna do voluntário com o auxílio de uma barra. Feito isto, o voluntário foi instruído a fletir, lentamente, o joelho e a inclinar o tronco anteriormente, até que conseguisse apoiar as mãos sobre a maca, porém sem descarregar o peso corporal sobre ela (Figura 2). Na seqüência, deveria estender, suavemente, o joelho e realizar, simultaneamente, uma anteversão da pelve4, até que referisse estar sentindo tensão máxima suportável de alongamento nos músculos flexores do joelho, porém sem sentir dor. Ao atingir a tensão máxima, o alongamento deveria ser mantido por um minuto. Ao término, o voluntário retornava à posição ereta na qual permanecia por 30 segundos e, então, repetia o procedimento.


O mesmo procedimento foi repetido por sete vezes, duas vezes por semana (com intervalo de dois dias entre cada sessão), por quatro semanas. Cabe mencionar que a barra foi mantida sobre a coluna do voluntário por todo o tempo que duraram os alongamentos, com o objetivo de evitar possíveis compensações.

Análise estatística

Os testes utilizados para avaliar a ADM de extensão do joelho e o torque dos músculos flexores e extensores do joelho pré e pós-programa de alongamento foram teste t de Student pareado, para avaliar os dados paramétricos, e o teste de Wilcoxon, para os não paramétricos. Para as conclusões das análises estatísticas, foi considerado um nível de significância de p<0,05 (5%).

Resultados

  • Avaliação da ADM: houve um aumento médio de 23,6° na ADM de extensão do joelho (p=0,0001, teste

    t pareado), quando comparados aos valores pré e pós-programa de alongamento (

    Tabela 1).

  • Torque isométrico e isocinético concêntrico e excêntrico extensor do joelho: o pico de torque extensor do joelho aumentou após o programa de alongamento em todos os modos avaliados: isométrico (p=0,006, teste

    t pareado); isocinético concêntrico a 60°/s (p=0,02, teste

    t pareado) e excêntrico a 30°/s (p=0,01, teste

    t pareado), conforme

    Tabela 1.

  • Torque isométrico e isocinético concêntrico e excêntrico flexor do joelho: conforme ilustrado na

    Tabela 1, também foi verificado aumento no pico de torque flexor do joelho pós-programa de alongamento nos modos avaliados: isométrico (p=0,01, teste

    t pareado); isocinético concêntrico a 30°/s (p=0,001, Wilcoxon) e excêntrico a 30°/s (p=0,01, Wilcoxon).

Discussão

Os resultados desse estudo mostram que o programa de alongamento para os músculos flexores do joelho, realizado de forma ativa excêntrica e com descarga de peso corporal sobre o membro alongado, foi efetivo para aumentar a ADM de extensão do joelho bem como o torque flexor e extensor desta articulação.

Vários estudos analisaram as alterações na flexibilidade dos músculos flexores do joelho, por meio de avaliações da ADM articular, após submetê-los a diferentes protocolos de alongamento5,17. Porém, os alongamentos utilizados foram, geralmente, o estático passivo na postura sentada ou em pé e sem descarga de peso no membro que foi alongado5,18,19. Nestes estudos, a ADM aumentou, em média, 10º5, 10º17 e 4º18, enquanto que, no presente trabalho, realizado com alongamento ativo excêntrico na postura em pé com descarga de peso corporal no membro alongado, o aumento na média ADM foi de 23,6°, indicando uma interessante vantagem no ganho de ADM com esse procedimento.

Nelson e Bandy20 não observaram diferença no ganho de ADM de extensão do joelho após alongamento ativo excêntrico e passivo, sendo em ambos verificado ganho médio de 12°. Essa diferença, talvez, tenha sido o melhor da posição da pelve que foi mantida em anteversão durante a realização dos alongamentos dos músculos flexores do joelho – cuidado não mencionado nos demais estudos5. Sullivan, Dejulia e Worrell4 comprovaram a relevância do posicionamento da pelve durante a realização de alongamentos dos flexores do joelho, pois a manutenção da posição da pelve garante a tensão muscular dos flexores durante a execução dos exercícios, ainda que os autores tenham verificado aumento médio de apenas 11° na ADM de extensão do joelho após os alongamentos. Em uma pesquisa realizada com animais, para avaliar o ganho da ADM, Taylor, Brooks e Ryan21 relatam que a combinação de alongamento e contração pode ser mais efetiva que apenas o alongamento, pois a aplicação de maiores níveis de tensão na unidade-musculotendínea causa maior estresse viscoelástico.

Os resultados de nosso trabalho apontam para a necessidade de estudos futuros em diferentes posturas de alongamentos, usando a descarga de peso no membro alongado, exigindo contração simultânea de diferentes grupos musculares para estabilizar a articulação3.

O ganho na ADM de extensora do joelho pode ter sido causado por mudanças no comprimento muscular, em virtude do aumento no número sarcômeros em série1,2. No entanto, cabe ressaltar que muitas dessas mudanças não foram confirmadas em músculos humanos22. Estudos com animais23 e humanos24 mostram que o aumento na extensibilidade muscular também pode ocorrer pelas alterações no tecido conjuntivo.

O pico de torque isométrico extensor e flexor do joelho aumentou pós-treino de alongamento. Como os voluntários que participaram do estudo tinham encurtamento dos músculos flexores do joelho, eles não conseguiam fletir o tronco e estender os joelhos ao mesmo tempo, durante a realização dos alongamentos, fazendo com que os exercícios fossem realizados com os joelhos semifletidos – o que aumentou a atividade do quadríceps, para manter esta postura25, e dos flexores do joelho (co-contração). Considerando o princípio da especificidade26,27, um programa de treinamento proporciona adaptações fisiológicas específicas nos músculos treinados em resposta ao estímulo do exercício realizado; desta forma, a especificidade do programa de alongamento está relacionado com o aumento no torque isométrico extensor e flexor do joelho.

O pico de torque isocinético extensor (concêntrico e excêntrico) também aumentou após execução do programa de alongamentos. Hortobagyi et al.10 defendem que o aumento na flexibilidade dos flexores do joelho pode influenciar as propriedades mecânicas intrínsecas dos extensores. Em seu estudo, foi constatado aumento na potência dos extensores do joelho após alongamentos passivos dos flexores. Como já mencionado acima e defendido também por Winters et al.11, ao alongar um grupo muscular, os antagonistas a ele se contraem. Desta forma, os alongamentos ativos realizados na postura em pé podem ter causado adaptações neurais, que controlam o nível de tensão no músculo, número de unidades motoras ativas, freqüência e sincronia de ativação entre elas26. O pico de torque isocinético flexor também aumentou durante as contrações excêntricas e concêntricas a 30º/s. Uma das explicações para este aumento no torque flexor seria a redução nos níveis de excitabilidade neural. Segundo Hamill e Knutzen28, o alongamento ativo induz a uma resposta mais pronunciada do órgão tendinoso de Golgi e pode atenuar a resposta deste componente neural, permitindo maior produção de tensão dos músculos que foram submetidos ao alongamento ativo.

Worrell, Smith e Winegardner9 também observaram aumento no torque concêntrico dos flexores do joelho pós-alongamentos. Os autores atribuíram este aumento à maior capacidade do músculo alongado em armazenar energia potencial elástica absorvida durante a contração excêntrica, potencializando a contração concêntrica subseqüente. O fenômeno da potencialização da contração concêntrica seguinte à contração excêntrica (pré-alongamento) do mesmo músculo é bem aceito na comunidade científica, sendo que grande parte do incremento da força pós-alongamento é originária dos componentes passivos bem como dos componentes contráteis ou ativos dos músculos29. Taylor, Brooks e Ryan21 relatam que, após alongamentos, há alterações nas propriedades viscoelásticas do tecido conjuntivo muscular, diminuindo a tensão de resistência e deixando o músculo mais complacente. Assim, ele será capaz de armazenar mais energia potencial elástica durante a contração excêntrica. Diante destes dados, supõe-se que o aumento no pico de torque concêntrico flexor do joelho observado neste estudo também pode ter ocorrido devido ao incremento do componente elástico, pois houve grande aumento na flexibilidade dos flexores.

De acordo com Hortobagyi e Katch30, o torque concêntrico diminui com o aumento da velocidade, pela diminuição das pontes cruzadas na maior velocidade de encurtamento muscular. O oposto ocorre, inicialmente, durante as contrações excêntricas. Em nosso estudo, o aumento no torque extensor excêntrico foi alcançado durante a execução do teste isocinético na velocidade mais baixa (30°/s), enquanto que, durante as contrações concêntricas, o maior torque extensor foi alcançado a 60°/s. No grupo flexor, apenas o teste concêntrico alcançou maior pico de torque na velocidade mais baixa, indo de encontro aos dados expostos pelos autores acima mencionados. Ou seja, os resultados encontrados neste estudo foram diferentes dos relatados na literatura, a não ser durante a contração concêntrica dos flexores. Estes dados demonstram que mais estudos devem ser realizados para elucidar as alterações no torque dos diferentes grupos musculares (agonistas e antagonistas) envolvidos em um programa de alongamento ativo excêntrico. Talvez estes estudos possam ser mais esclarecedores, caso utilizem velocidades mais altas que as utilizadas no presente estudo. Cabe ressaltar ainda que a grande variação encontrada nos resultados dos testes isocinéticos neste estudo pode ter ocorrido devido à dificuldade dos voluntários em realizá-los. Tais dificuldades ocorreram, principalmente, para iniciar os testes excêntricos de ambos os grupos musculares. Talvez estas dificuldades pudessem ser amenizadas como início do teste excêntrico dos flexores do joelho em um ângulo menor que 90° (entre 80 e 70°) de flexão, continuando, entretanto, com uma amplitude de teste de 60°, bem como realizar uma maior familiarização dos voluntários com o equipamento – fato que também pode ter influenciado nos testes inclusive dos extensores do joelho.

Conclusões

Os resultados desse estudo mostram que o programa de alongamento para os músculos flexores do joelho, realizado de forma ativa excêntrica e com descarga de peso corporal, foi efetivo para aumentar a ADM de extensão do joelho bem como o torque flexor e extensor desta articulação.

Recebido: 27/03/2007

Revisado: 11/09/07

Aceito: 14/03/2008

Apoio financeiro: esse trabalho recebeu apoio financeiro da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

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  • Correspondência para:
    Tania Fátima Salvini
    Departamento de Fisioterapia, Universidade Federal de São Carlos
    Rodovia Washington Luís, km 235
    CEP 13565-905, São Carlos (SP), Brasil
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      08 Ago 2008
    • Data do Fascículo
      Jun 2008

    Histórico

    • Revisado
      11 Set 2007
    • Recebido
      27 Mar 2007
    • Aceito
      14 Mar 2008
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