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Qualidade de vida em idosos quilombolas no nordeste brasileiro

Resumo

Objetivo:

Avaliar a qualidade de vida (QV) dos idosos quilombolas das agrovilas de Alcântara, Maranhão, Brasil.

Método:

Estudo observacional, transversal e descritivo. A amostra foi composta por 129 idosos, de ambos os sexos, com idade igual ou maior a 60 anos e residentes na região nordeste do Brasil. A amostra foi alocada em três grupos, distribuídos conforme o espaço geográfico. A QV foi avaliada por meio do instrumento WHOQOL-Bref e também foi aplicado um questionário sociodemográfico. A comparação entre grupos foi obtida pelo teste de Anova (one-way) e em seguida foi aplicado o teste de Post-Hoc de Bonferroni. A correlação foi obtida pelo teste de Pearson, p<0,05.

Resultados:

Os idosos quilombolas tiveram média de idade de 69,7 (±7,9) anos, sendo predominantemente homens com baixa renda e escolaridade. A QV teve maior pontuação para o domínio social (valores) e menor para o domínio meio ambiente (valores). A QV, quando verificado o domínio psicológico, houve destaque do Grupo I, o qual apresentou diferença com o Grupo II (p=0,012) e III (p=0,002). As facetas da QV tiveram correlação com as facetas de saúde para o Grupo I (r=0,357; p=0,032) e III (r=0,461; p<0,001).

Conclusão:

Considera-se que a situação da população quilombola pesquisada é vulnerável e fatores psicológicos influenciam a QV.

Palavras-chave:
Saúde do Idoso; Grupos com Ancestrais do Continente Africano; Quilombolas; Qualidade de Vida

Abstract

Objective:

To evaluate the quality of life (QoL) of elderly quilombolas (residents of quilombo settlements first established by escaped slaves) in mixed urban and rural residential developments (agrovilas) in Alcântara, Maranhão, Brazil.

Method:

An observational, cross-sectional and descriptive study was performed. The sample consisted of 129 elderly people of both genders, aged 60 years or older and living in northeastern Brazil. The sample was allocated into three groups, distributed according to geographic space. Quality of life was assessed using the WHOQoL-Bref instrument and a sociodemographic questionnaire was applied. The comparison between groups was carried out using the Anova test (one-way) and subsequently the Bonferroni Post-Hoc test. The correlation was obtained by the Pearson test, p<0.05.

Results:

Elderly quilombolas had a mean age of 69.7 years (±7.9) and were predominantly men with low income and schooling. Quality of life had higher scores in the social domain (values) and lower in the environmental domain (values). Quality of life as measured by the psychological domain was higher in group I than in groups II (p=0.012) and III (p=0.002). The facets of QoL correlated with facets of health for group I (r=0.357; p=0.032) and III (r=0.461; p<0.001).

Conclusion:

The situation of the quilombola population surveyed is considered vulnerable and psychological factors influence QoL.

Keywords:
Health of the Elderly; African Continental Ancestry Group; Quilombolas; Quality of Life

INTRODUÇÃO

A população quilombola apresenta condições de vulnerabilidade para doenças que incluem os aspectos sociais nas diferentes fases da vida e individualmente11 Cardoso CS, Melo LO, Freitas DA. Condições de saúde nas comunidades quilombolas. Rev Enferm UFPE [Internet]. 2018 [acesso em 18 jun. 2019];12(4):1037-45. Disponível em: https://periodicos.ufpe.br/revistas/revistaenfermagem/article/viewFile/110258/28665
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. Essa situação de vulnerabilidade vivenciada pela população negra no Brasil foi reconhecida pelo governo federal brasileiro por meio da criação, em 2003, da Secretaria Especial de Políticas de Promoção de Igualdade Racial (Seppir)22 BRASIL. Ministério da Saúde. Política nacional de saúde integral da população negra: uma política do SUS [Internet]. Brasília, DF: MS; 2017 [acesso em 28 jun 2019]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_saude_populacao_negra_3d.pdf
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; em 2004, por meio do Programa Brasil Quilombola; e, em 2009, com a instituição da Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN)22 BRASIL. Ministério da Saúde. Política nacional de saúde integral da população negra: uma política do SUS [Internet]. Brasília, DF: MS; 2017 [acesso em 28 jun 2019]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_saude_populacao_negra_3d.pdf
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. Essa enfatiza a necessidade de garantir e ampliar o acesso da população rural, em particular as populações quilombolas, às ações e aos serviços de saúde22 BRASIL. Ministério da Saúde. Política nacional de saúde integral da população negra: uma política do SUS [Internet]. Brasília, DF: MS; 2017 [acesso em 28 jun 2019]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_saude_populacao_negra_3d.pdf
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O processo de reconhecimento institucional oficial pelo Estado brasileiro de uma comunidade como quilombola se inicia por sua própria autoidentificação como tal, com território, relações sociais e manifestações culturais específicos, com inferência de hereditariedade africana e memórias da resistência à opressão histórica sofrida33 Chehuen Neto JA, Fonseca GM, Brum IV, Dos Santos JLCT, Rodrigues TCGF, Paulino KR, et al. Política nacional de saúde integral da população negra: implementação, conhecimento e aspectos socioeconômicos sob a perspectiva desse segmento populacional. Ciênc Saúde Colet [Internet]. 2015 [acesso em 17 jun. 2019];20(6):1909-16. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-81232015000601909&script=sci_abstract&tlng=pt
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,44 Bezerra VM, Medeiros DS, Gomes KO, Souzas R, Giatti L, Steffens, et al. Inquérito de Saúde em Comunidades Quilombolas de Vitória da Conquista, Bahia, Brasil (Projeto COMQUISTA): aspectos metodológicos e análise descritiva. Ciênc Saúde Colet [Internet]. 2014 [acesso em 06 jan. 2015];19(6):1835-47. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232014000601835&lng=pt. http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232014196.01992013
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.

Segundo a Fundação Cultural Palmares55 Fundação Cultural Palmares. Quadro geral de comunidades remanescentes de quilombos (CRQs) [Internet]. Brasília, DF: [sem editora]; 2015 [acesso em 14 maio 2015]. Disponível em: http://www.palmares.gov.br/wp-content/uploads/crqs/quadro-geral-por-estado-ate-23-02-2015.pdf
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, dentre os estados brasileiros, o Maranhão apresenta o segundo maior número de comunidades quilombolas certificadas, com o total de 492 (o primeiro maior número é o da Bahia, com 638). Entre os municípios maranhenses, Alcântara apresenta o maior número de comunidades, com o total de 79. Para a Associação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas do Maranhão (Aconeruq) os quilombolas ainda lutam para assegurar direitos básicos, como o acesso à saúde, à educação formal, à capacitação profissional, à melhoria das condições de trabalho e de geração de renda66 Paixão RMM. Enriba daterra: da sinergia da luta individual para a coletiva, refletindo a partir do quilombo de Cana Brava [Dissertação na Internet]. São Luíz: Universidade Estadual do Maranhão; 2015 [acesso em 18 jun. 2019 ]. Disponível em: http://www.ppgcspa.uema.br/wp-content/uploads/2016/06/DISSERTA%C3%87%C3%83O-MAUR%C3%8DCIO-PAIX%C3%83O-vers%C3%A3o-final-29.10.2015-com-inclus%C3%A3o-de-sugest%C3%B5es-da-Banca-revisada-Lilian-Gomes-e-configurado-por-Lilian-Bernardes-3.pdf
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Em Alcântara, entre os anos de 1986 e 1987, 312 famílias passaram pelo processo da perda do território quando foram transferidas para sete agrovilas criadas pela Aeronáutica na época da implantação do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA): Espera, Cajueiro, Ponta Seca, Só Assim, Pepital, Marudá e Peru77 Viegas DP, Varga IVD. Promoção à saúde da mulher negra no povoado Castelo, Município de Alcântara, Maranhão, Brasil. Saúde Soc [Internet]. 2016 [acesso em 17 jun. 2019];25(3):619-30. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/sausoc/v25n3/1984-0470-sausoc-25-03-00619.pdf
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,88 Clímaco VDN. Territórios sociais de resistência em comunidades de remanescentes de quilombos. Rev Desenv Reg [Internet]. 2015 [acesso em 15 jun. 2019];12(1):89-100. Disponível em: file:///D:/REVIS%C3%83O%20DE%20TEXTOS/2019/BRUNA%20ARAG%C3%83O/ARTIGO%2011.06.19/CORRE%C3%87%C3%83O%20ARTIGO/NOVOS%20ARTIGOS%20PARA%20SUBSTITUIR/222-466-2-PB.pdf. De forma geral, as pesquisas já realizadas66 Paixão RMM. Enriba daterra: da sinergia da luta individual para a coletiva, refletindo a partir do quilombo de Cana Brava [Dissertação na Internet]. São Luíz: Universidade Estadual do Maranhão; 2015 [acesso em 18 jun. 2019 ]. Disponível em: http://www.ppgcspa.uema.br/wp-content/uploads/2016/06/DISSERTA%C3%87%C3%83O-MAUR%C3%8DCIO-PAIX%C3%83O-vers%C3%A3o-final-29.10.2015-com-inclus%C3%A3o-de-sugest%C3%B5es-da-Banca-revisada-Lilian-Gomes-e-configurado-por-Lilian-Bernardes-3.pdf
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7 Viegas DP, Varga IVD. Promoção à saúde da mulher negra no povoado Castelo, Município de Alcântara, Maranhão, Brasil. Saúde Soc [Internet]. 2016 [acesso em 17 jun. 2019];25(3):619-30. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/sausoc/v25n3/1984-0470-sausoc-25-03-00619.pdf
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-88 Clímaco VDN. Territórios sociais de resistência em comunidades de remanescentes de quilombos. Rev Desenv Reg [Internet]. 2015 [acesso em 15 jun. 2019];12(1):89-100. Disponível em: file:///D:/REVIS%C3%83O%20DE%20TEXTOS/2019/BRUNA%20ARAG%C3%83O/ARTIGO%2011.06.19/CORRE%C3%87%C3%83O%20ARTIGO/NOVOS%20ARTIGOS%20PARA%20SUBSTITUIR/222-466-2-PB.pdf sobre os territórios quilombolas de Alcântara evidenciaram as transformações e impactos ocorridos em função dos reassentamentos nas agrovilas; entretanto, não se discutiu sobre a qualidade de vida (QV), sobretudo dos idosos que vivenciaram todo o processo de perda dos seus territórios.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) define QV como “a percepção do indivíduo sobre a sua posição na vida, no contexto da cultura e dos sistemas de valores nos quais ele vive, e em relação a seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações”99 World Health Organization. Quality of life assesment group: development of the world health organization whoqol-bref quality of life assesment. Soc Sci Med. 1995;41:1403-9..

Esta pesquisa teve como objetivo avaliar a QV dos idosos quilombolas das agrovilas de Alcântara, Maranhão, descrevendo suas características sociodemográficas e ponderando as facetas gerais e os domínios físicos, psicológicos, relações sociais e meio ambiente.

MÉTODO

Trata-se de um estudo observacional, transversal e descritivo, realizado na zona urbana do município de Alcântara, Maranhão, Brasil, nas agrovilas criadas pela Aeronáutica.

A pesquisa foi realizada entre junho e dezembro de 2012 por uma equipe composta com cinco profissionais da área de saúde (um enfermeiro, três técnicos de enfermagem e um farmacêutico) que foram previamente treinados para a coleta de dados.

O total de idosos e endereços, em cada uma das agrovilas, foi obtido por meio das visitas domiciliares realizadas pelos agentes comunitários de saúde da Estratégia Saúde da Família (ESF). A população total das agrovilas é de, aproximadamente, 1.600 habitantes. Com base nesse quantitativo de pessoas, a amostra foi calculada por meio da ferramenta StatCalc do programa estatístico Epi Info 7, considerando uma prevalência de idosos da ordem de 5% a 9%, intervalo de confiança (IC) de 95%, atingindo um valor de 117, no entanto, acrescentou-se 10% a esse valor, como fator de correção para possíveis perdas.

As agrovilas foram agrupadas por tamanho e proximidade geográfica, onde consistiu na divisão de três grupos, sendo estes: Grupo I: Ponta Seca, Cajueiro, Espera; Grupo II: Só Assim, Pepital, Marudá e Grupo III: Peru. Foram aplicados 129 questionários, o Grupo I apresentou 36 idosos, o Grupo II 48 idosos e o Grupo III 45 idosos. Houve 22 indivíduos não elegíveis, sendo 11 pessoas não localizadas, seis viajando e cinco sem condições de responder. O cálculo final da amostra foi de 129 indivíduos.

A abordagem aos idosos foi iniciada pela aplicação do Miniexame de Estado Mental para avaliar as condições cognitivas dos elegíveis para comunicarem-se com o pesquisador e consentirem em participar das entrevistas. Após essa etapa, foram explicados os objetivos e procedimentos da pesquisa e a solicitação da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), seguido da realização das entrevistas nas residências dos participantes.

A QV foi avaliada por meio do questionário World Health Organization Quality of Life-Bref (WHOQOL-Bref), sendo criado a partir do WHOQOL-100, com a finalidade de ser aplicável, pois é breve, conveniente e preciso. O questionário é composto por quatro domínios (físico, psicológico, relações sociais e meio ambiente) com 24 facetas e duas facetas gerais sobre a autoavaliação da QV por meio das perguntas: “Como você avaliaria sua qualidade de vida?” (faceta qualidade de vida) e “Quão satisfeito(a) você está com a sua saúde?” (faceta saúde global). O WHOQOL-Bref possui cinco opções de respostas (variando de 1 a 5) em escala tipo Likert99 World Health Organization. Quality of life assesment group: development of the world health organization whoqol-bref quality of life assesment. Soc Sci Med. 1995;41:1403-9..

O WHOQOL-Bref possui três modalidades de administração: autorrelato, assistido pelo entrevistador e administrado pelo entrevistador, sendo essa última, adotada pelos pesquisadores. O entrevistador leu as instruções, as questões, os descritores da escala de resposta e assinalou a resposta dada pelo participante. Também foi aplicado um questionário adaptado pelo pesquisador com questões fechadas para identificar o nível socioeconômico (principal fonte de renda; renda familiar).

Os dados foram apresentados por meio de média, desvio-padrão, frequência absoluta e relativa. O teste de Anova (one-way) foi utilizado para comparação de médias intergrupos, logo após foi aplicado o teste de Post-Hoc de Bonferroni para verificar qual grupo diferiu. Também foi aplicado o teste de Pearson para análise de correlação entre as facetas gerais da QV com a percepção dos domínios da QV. Os dados foram analisados pelo programa estatístico Statistical Package for Social Science (SPSS) versão 2.0, considerando um α=5%, ou seja, p<0,05.

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal do Maranhão por meio do parecer nº 23115-017526 de 01.03.2012.

RESULTADOS

A amostra da pesquisa foi composta de 129 idosos quilombolas (Grupo I= 36 idosos, Grupo II= 48 idosos e Grupo III= 45 idosos).

As características sociodemográficas dos idosos das agrovilas estão descritas na Tabela 1. Pretos e pardos equivaleram a 96,1% e os homens representaram 51,9% do total. O sexo feminino apresentou maioria nos Grupos I (52,8%) e III (66,7%). O analfabetismo predominou em todos os grupos, atingindo valores percentuais altos.

Tabela 1
Caracterização sociodemográfica dos idosos quilombolas (N=129). Alcântara, MA, 2012.

A Tabela 2 apresenta os valores por meio de média e desvio-padrão dos quatro domínios do WHOQOL-Bref (físico, psicológico, relações sociais e meio ambiente), considerando a escala de 0-100. Os escores médios observados para o domínio relações sociais foram os que atingiram valores percentuais mais elevados dentre os quatro domínios analisados para todas as agrovilas.

Tabela 2
Comparação entre os domínios da qualidade de vida em idosos quilombolas (N=129). Alcântara, MA, 2012.

Os resultados sumarizados na Tabela 3 mostram as facetas que explicam o diferencial do Grupo I, pois apresentam médias diferentes e percepção inferior para o domínio psicológico.

Tabela 3
Facetas do domínio psicológico em idosos quilombolas (N=129). Alcântara, MA, 2012.

Na Tabela 4 observam-se os escores médios e desvio-padrão para as facetas gerais de QV e de saúde para os três grupos analisados. O Grupo III obteve os maiores escores 3,3 e 3,1 e o Grupo II os menores 3,0 e 2,9.

Tabela 4
Relação entre facetas gerais, qualidade de vida e percepção de saúde com os domínios: físico, psicológico, relações sociais e meio ambiente (N=129). Alcântara, MA, 2012.

Os resultados das correlações para as variáveis quantitativas do WHOQOL-Bref, tomadas duas a duas entre as facetas gerais QV e percepção da saúde entre si e entre cada uma dessas facetas gerais com os quatro domínios, também estão resumidos na Tabela 4.

No Grupo I houve correlações positivas e significantes, sendo essas: entre as facetas da QV e saúde (r=0,357; p=0,032), como também facetas da saúde com o domínio físico (r=0,615; p<0,001), psicológico (r=0,447; p=0,006) e meio ambiente (r=0,486; p=0,003). O Grupo II só apresentou correlação positiva e significante entre a faceta da saúde com o domínio físico da QV (r=0,462; p=0,001). O Grupo III também apresentou várias correlações positivas e significantes, que foram: entre as facetas da QV e saúde (r=0,461; p<0,001), faceta da QV com o domínio meio ambiente (r=0,358; p=0,016), além da faceta saúde com o domínio físico (r=0,591; p<0,001) e meio ambiente (r=0,375; p=0,011) da QV (Tabela 4).

DISCUSSÃO

As agrovilas mostraram perfil de população majoritariamente negra. Os negros, em comparação com os brancos, apresentam maior exposição a fatores que alteram tanto a QV quanto a percepção de saúde autoatribuída, como pior situação socioeconômica, piores condições de vida, moradia, maior acometimento de doenças infecto-parasitárias, maior exposição a situações de violência sexual, física e psicológica11 Cardoso CS, Melo LO, Freitas DA. Condições de saúde nas comunidades quilombolas. Rev Enferm UFPE [Internet]. 2018 [acesso em 18 jun. 2019];12(4):1037-45. Disponível em: https://periodicos.ufpe.br/revistas/revistaenfermagem/article/viewFile/110258/28665
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,44 Bezerra VM, Medeiros DS, Gomes KO, Souzas R, Giatti L, Steffens, et al. Inquérito de Saúde em Comunidades Quilombolas de Vitória da Conquista, Bahia, Brasil (Projeto COMQUISTA): aspectos metodológicos e análise descritiva. Ciênc Saúde Colet [Internet]. 2014 [acesso em 06 jan. 2015];19(6):1835-47. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232014000601835&lng=pt. http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232014196.01992013
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.

Com relação à composição por sexo, chama a atenção o fato de haver o predomínio de homens no total geral. Assim, o perfil demográfico foi diferente das comunidades pesquisadas na Paraíba1010 De Oliveira SM, Menezes Junior JO, Da Silva Junior SV, Dias MD, Fernandes MGM, Ferreira Filha MO. Rodas de terapia comunitária: construindo espaços terapêuticos para idosos em comunidades quilombolas. Rev Enferm UFSM [Internet]. 2017[acesso em 15 jun. 2019];7(4):712-24. Disponível em: https://periodicos.ufsm.br/reufsm/article/view/20299/pdf
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e Bahia44 Bezerra VM, Medeiros DS, Gomes KO, Souzas R, Giatti L, Steffens, et al. Inquérito de Saúde em Comunidades Quilombolas de Vitória da Conquista, Bahia, Brasil (Projeto COMQUISTA): aspectos metodológicos e análise descritiva. Ciênc Saúde Colet [Internet]. 2014 [acesso em 06 jan. 2015];19(6):1835-47. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232014000601835&lng=pt. http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232014196.01992013
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, em que houve o predomínio das mulheres. Cabe destacar que os dados do Censo 201011 corroboram o predomínio da população masculina nas áreas rurais e urbanas do município de Alcântara, respectivamente, 8.044 e 3.214. No tocante à idade, destaca-se a baixa frequência de octogenários e nonagenários comparados aos sexagenários e septuagenários, podendo, portanto, serem considerados idosos jovens.

Os três grupos apresentaram percentagem de analfabetos em torno dos 60%, muito acima da taxa nacional que é de 26,5% na população com 60 anos ou mais1111 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Síntese de indicadores sociais: uma análise das condições de vida da população brasileira 2010 [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE; 2010 [acesso em 25 out. 2011]. Disponível em: www.ibge.gov.br. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)1111 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Síntese de indicadores sociais: uma análise das condições de vida da população brasileira 2010 [Internet]. Rio de Janeiro: IBGE; 2010 [acesso em 25 out. 2011]. Disponível em: www.ibge.gov.br, as taxas de analfabetismo no Maranhão, para os declarados pretos e pardos com 60 anos ou mais, totalizam, respectivamente, 62,2% e 56,9%. No que se refere ao primeiro grupo, a taxa do estado maranhense foi superada apenas pela do Piauí, de 67,8%; de Alagoas, 66,4%; e da Paraíba, 63,6%. No segundo grupo, pelas de Alagoas, 59,6%, e do Piauí, com 58,4%.

Houve predomínio de casados, seguido de viúvos nos três grupos. Em pesquisa realizada por Vieira e Monteiro1212 Vieira ABD, Monteiro PS. Comunidade quilombola: análise do problema persistente do acesso à saúde, sob o enfoque da bioética de intervenção. Saúde Debate. 2013 [acesso em 8 jan. 2014];37(99):610-8. Disponível: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-11042013000400008&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt
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prevaleceu o percentual de 75% para solteiros, mas, em condição de união estável. Os autores ressalvam ainda que, entre os quilombolas com idade mais avançada, até bem pouco tempo atrás, inexistia o registro civil, o que pode ser explicado pela baixa renda social dessa população.

A renda familiar, entre os três grupos, foi similar e variou em torno de um a dois salários mínimos, considerando o desvio-padrão. Diversos estudos identificam baixa renda em comunidades quilombolas, quantificando a renda entre meio e um salário mínimo44 Bezerra VM, Medeiros DS, Gomes KO, Souzas R, Giatti L, Steffens, et al. Inquérito de Saúde em Comunidades Quilombolas de Vitória da Conquista, Bahia, Brasil (Projeto COMQUISTA): aspectos metodológicos e análise descritiva. Ciênc Saúde Colet [Internet]. 2014 [acesso em 06 jan. 2015];19(6):1835-47. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232014000601835&lng=pt. http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232014196.01992013
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,1212 Vieira ABD, Monteiro PS. Comunidade quilombola: análise do problema persistente do acesso à saúde, sob o enfoque da bioética de intervenção. Saúde Debate. 2013 [acesso em 8 jan. 2014];37(99):610-8. Disponível: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-11042013000400008&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
,1313 Freitas IA, Rodrigues ILA, Silva IFS, Nogueira LMV. Perfil sociodemográfico e epidemiológico de uma comunidade quilombola na Amazônia Brasileira. Rev Cuid [Internet]. 2018 [acesso em 16 jun. 2019];9(2):2187-200. Disponível em: http://www.scielo.org.co/pdf/cuid/v9n2/2346-3414-cuid-9-2-2187.pdf
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, ou mencionando atividades ocupacionais, pequena agricultura1010 De Oliveira SM, Menezes Junior JO, Da Silva Junior SV, Dias MD, Fernandes MGM, Ferreira Filha MO. Rodas de terapia comunitária: construindo espaços terapêuticos para idosos em comunidades quilombolas. Rev Enferm UFSM [Internet]. 2017[acesso em 15 jun. 2019];7(4):712-24. Disponível em: https://periodicos.ufsm.br/reufsm/article/view/20299/pdf
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, agriculta de subsistência e empregada doméstica1414 Luiz JM. Quilombolas de caiana dos crioulos (alagoa grande - PB): memória, etnicidade e autoconsciência cultural. Rev ABPN [Internet]. 2018 [acesso em 15 jun. 2019];10(Ed. Esp.):435-64. Disponível em: http://www.abpnrevista.org.br/revista/index.php/revistaabpn1/article/view/477
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, que pressupõe baixa renda. A renda familiar dos nossos idosos quilombolas foi superior ao encontrado na literatura (meio a um salário mínimo), o que pode ser decorrente da renda comercial de artesanatos, além dos benefícios sociais44 Bezerra VM, Medeiros DS, Gomes KO, Souzas R, Giatti L, Steffens, et al. Inquérito de Saúde em Comunidades Quilombolas de Vitória da Conquista, Bahia, Brasil (Projeto COMQUISTA): aspectos metodológicos e análise descritiva. Ciênc Saúde Colet [Internet]. 2014 [acesso em 06 jan. 2015];19(6):1835-47. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232014000601835&lng=pt. http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232014196.01992013
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,1212 Vieira ABD, Monteiro PS. Comunidade quilombola: análise do problema persistente do acesso à saúde, sob o enfoque da bioética de intervenção. Saúde Debate. 2013 [acesso em 8 jan. 2014];37(99):610-8. Disponível: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-11042013000400008&lng=pt&nrm=iso&tlng=pt
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
,1313 Freitas IA, Rodrigues ILA, Silva IFS, Nogueira LMV. Perfil sociodemográfico e epidemiológico de uma comunidade quilombola na Amazônia Brasileira. Rev Cuid [Internet]. 2018 [acesso em 16 jun. 2019];9(2):2187-200. Disponível em: http://www.scielo.org.co/pdf/cuid/v9n2/2346-3414-cuid-9-2-2187.pdf
http://www.scielo.org.co/pdf/cuid/v9n2/2...
. As condições gerais dos idosos pesquisados são similares as comunidades quilombolas brasileiras, como afirmam Cabral-Miranda et al.1515 Cabral-Miranda G, Dattoli VCC, Dias-Lima A. Enteroparasitos e condições socioeconômica e sanitárias em uma comunidade quilombola do semiárido baiano. Rev Patol Trop [Internet]. 2010. [acesso em 05 jun. 2013];39(1):48-55. Disponível em: http://www.revistas.ufg.br/index.php/iptsp/article/view/9498
http://www.revistas.ufg.br/index.php/ipt...
. Esses grupos estão localizados nas áreas rurais e em condições de desigualdade sociais e de saúde, pois ambos vivem em áreas remotas com dificuldades de acesso aos serviços de saúde e educação.

As comunidades, originalmente, estavam instaladas próximas ao litoral, e tinham na pesca uma de suas principais fontes de alimento. As agrovilas agora estão instaladas entre 10 e 21 km de distância em relação ao mar, inviabilizando, na prática, sua atividade pesqueira.

À distância em relação ao mar e a inviabilização da pesca se adicionam as dificuldades no acesso aos serviços de saúde, educação e lazer. As dificuldades constatadas no acesso à rede de serviços públicos de saúde demonstram a situação de vulnerabilidade das comunidades quilombolas, em especial, dos idosos pesquisados. Além da alta taxa de analfabetismo entre os idosos, evidencia-se a urgência na implementação de programas de alfabetização de adultos que, embora previstos no Programa Brasil Quilombola, na prática ainda não conseguiu realizar a maioria das ações propostas.

O domínio psicológico apresentou diferenças estatísticas entre os grupos, no Grupo I houve o predomínio de autodeclarados pretos (80,6%) e analfabetos (61,1%) com as piores médias. Nesse grupo, as facetas que compõem esse domínio apresentaram escores médios inferiores em comparação aos demais grupos; o que indica a necessidade de ações direcionadas à saúde mental de seus participantes e, em especial, uma investigação e abordagem dos transtornos relativos à depressão.

Dos grupos analisados, o Grupo III apresentou as melhores médias para as duas facetas gerais. Entretanto, todos os grupos possuem realidade socioeconômica e cultural compatível, o que tenderia a torná-los semelhantes.

O domínio relações sociais foi o que alcançou a maior média de escores em cada grupo analisado, ao passo que o domínio meio ambiente foi o pior avaliado em todos os grupos. Resultado similar foi detectado em comunidades quilombolas do estado de Sergipe1616 Santos VC, Boery EN, Pereira R, Rosa DOS, Vilela ABA, Dos Anjos KF, et al. Socioeconomic and health conditions associated with quality of life of elderly quilombolas. Texto & Contexto Enferm [Internet]. 2016 [acesso em 17 jun. 2019];25(2):1-9. Disponível em: http://www.revenf.bvs.br/pdf/tce/v25n2/0104-0707-tce-25-02-1300015.pdf
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.

Supõe-se que a superioridade do domínio relações sociais, composto pelas facetas relações sociais, suporte social e atividade sexual, tenha ocorrido por ser o domínio com o menor número de facetas e, também, pelo fato de a própria organização social das comunidades serem fortemente marcadas pelo parentesco, imprimindo maior apoio e suporte social oferecidos aos idosos. Santos et al.16 sugerem que os laços familiares e sociais são fortes nas comunidades quilombolas e justifica as maiores médias para o domínio social.

O domínio pior avaliado por todas as agrovilas foi o meio ambiente. Uma provável explicação para uma percepção tão ruim pode ser consequência do processo de reassentamento compulsório, conforme descrito anteriormente. O processo de deslocamento compulsório repercutiu negativamente nas comunidades e, passados mais de 30 anos, os impactos na vida dos reassentados ainda são sentidos e lembrados. A perda de seus antigos locais de moradia pode ser mais bem compreendida pela análise feita por Duprat1717 Duprat D,organizador. Pareceres jurídicos: direitos dos povos e das comunidades tradicionais. Manaus: Documentos de Bolso; 2007., ao afirmar que a terra significa o elo de união do grupo e permite a sua continuidade temporal nas sucessivas gerações, preservando a cultura e o seu modo peculiar de vida.

O decurso do deslocamento para as agrovilas impossibilitou as práticas tradicionais de pesca, caça, extrativismo e atividades agrícolas que garantiam autossuficiência às comunidades. Em troca, os camponeses receberam lotes pequenos, pouco férteis e erodidos. Em análise geral, sobre a criação das sete agrovilas e seus impactos, Clímaco88 Clímaco VDN. Territórios sociais de resistência em comunidades de remanescentes de quilombos. Rev Desenv Reg [Internet]. 2015 [acesso em 15 jun. 2019];12(1):89-100. Disponível em: file:///D:/REVIS%C3%83O%20DE%20TEXTOS/2019/BRUNA%20ARAG%C3%83O/ARTIGO%2011.06.19/CORRE%C3%87%C3%83O%20ARTIGO/NOVOS%20ARTIGOS%20PARA%20SUBSTITUIR/222-466-2-PB.pdf identificou vários autores que relataram instabilidade, descontentamento e repercussão negativa entre os quilombolas de Alcântara.

O domínio psicológico foi o único que apresentou diferenças estatisticamente significativas de médias entre os três grupos, sendo o Grupo I com a pior média nas seguintes facetas: “O quanto você aproveita a vida?” - sentimentos positivos, “Em que medida você acha que sua vida tem sentido?” - espiritualidade/religiosidade/crenças pessoais e “Com que frequência você tem sentimentos negativos, tais como: mau humor, desespero, ansiedade, depressão?” - sentimentos negativos. Pode-se inferir que esse domínio tem relação direta com a percepção e presença da depressão.

O domínio relações sociais foi o que alcançou a maior média de escores. De forma contrária, Santos et al.1616 Santos VC, Boery EN, Pereira R, Rosa DOS, Vilela ABA, Dos Anjos KF, et al. Socioeconomic and health conditions associated with quality of life of elderly quilombolas. Texto & Contexto Enferm [Internet]. 2016 [acesso em 17 jun. 2019];25(2):1-9. Disponível em: http://www.revenf.bvs.br/pdf/tce/v25n2/0104-0707-tce-25-02-1300015.pdf
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descobriram pouca diferença nos domínios relações sociais e psicológico, relacionando hipertensão e QV em quilombolas. Assis et al.1818 Assis ES, Araújo JA, De Rezende MIRC, Oliveira CCC, Reis FPR, De Melo CM. Prevalence of variant hemoglobins and thalassemias in a maroon community in Sergipe, Brazil. Acta Sci [Internet]. 2015 [acesso em 18 jun. 2019];37(2):211-16. Disponível em: http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/ActaSciHealthSci/article/view/23444/pdf_92
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identificaram piores médias para o domínio psicológico em quilombolas aposentados ou pensionistas e em mulheres.

O domínio físico não demonstrou diferença estatística entre os grupos, o que pode estar relacionada à faixa etária. A possiblidade para justificar a satisfação para esse domínio pode ser a média da idade (idosos jovens), pois a capacidade funcional do idoso ainda não está comprometida e influencia positivamente na percepção da QV. Assis et al.1818 Assis ES, Araújo JA, De Rezende MIRC, Oliveira CCC, Reis FPR, De Melo CM. Prevalence of variant hemoglobins and thalassemias in a maroon community in Sergipe, Brazil. Acta Sci [Internet]. 2015 [acesso em 18 jun. 2019];37(2):211-16. Disponível em: http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/ActaSciHealthSci/article/view/23444/pdf_92
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observaram correlação entre idade e domínio físico, entre as comunidades quilombolas investigadas em Sergipe.

As facetas gerais tiveram relação entre os grupos, entretanto o Grupo I apresentou destaque por obter mais correlações da faceta da saúde com diferentes domínios da QV. Em estudo sobre condições sanitárias e de saúde em quilombolas foi identificada baixa QV em função da ausência dos serviços básicos de saneamento e saúde44 Bezerra VM, Medeiros DS, Gomes KO, Souzas R, Giatti L, Steffens, et al. Inquérito de Saúde em Comunidades Quilombolas de Vitória da Conquista, Bahia, Brasil (Projeto COMQUISTA): aspectos metodológicos e análise descritiva. Ciênc Saúde Colet [Internet]. 2014 [acesso em 06 jan. 2015];19(6):1835-47. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413-81232014000601835&lng=pt. http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232014196.01992013
http://www.scielo.br/scielo.php?script=s...
,1010 De Oliveira SM, Menezes Junior JO, Da Silva Junior SV, Dias MD, Fernandes MGM, Ferreira Filha MO. Rodas de terapia comunitária: construindo espaços terapêuticos para idosos em comunidades quilombolas. Rev Enferm UFSM [Internet]. 2017[acesso em 15 jun. 2019];7(4):712-24. Disponível em: https://periodicos.ufsm.br/reufsm/article/view/20299/pdf
https://periodicos.ufsm.br/reufsm/articl...
. Em função da subjetividade e multidimensionalidade que a expressão QV pode significar; a avaliação e comparação com demais estudos e/ou grupos quilombolas, torna-se mais complexa ainda. Mesmo entre as sete agrovilas pesquisadas, com realidades muito semelhantes, a polissemia da expressão QV pode ser a justificativa para as desigualdades de avaliação entre os grupos.

Em geral, os estudos para avaliar saúde e/ou QV dos quilombolas, ainda são escassos4 como afirmam Santos et al.1616 Santos VC, Boery EN, Pereira R, Rosa DOS, Vilela ABA, Dos Anjos KF, et al. Socioeconomic and health conditions associated with quality of life of elderly quilombolas. Texto & Contexto Enferm [Internet]. 2016 [acesso em 17 jun. 2019];25(2):1-9. Disponível em: http://www.revenf.bvs.br/pdf/tce/v25n2/0104-0707-tce-25-02-1300015.pdf
http://www.revenf.bvs.br/pdf/tce/v25n2/0...
. Demonstrando assim, que as incipientes pesquisas sobre quilombolas contradizem um dos objetivos do PNSIPN, que é fomentar estudos e pesquisas sobre racismo e saúde da população negra. Constituindo-se ainda um desafio ao processo de implantação e aprimoramento da PNSIPN1717 Duprat D,organizador. Pareceres jurídicos: direitos dos povos e das comunidades tradicionais. Manaus: Documentos de Bolso; 2007..

Em função dos aspectos supramencionados, o presente estudo apresentou limitações, pois não foram avaliados outros parâmetros que podem estar relacionados com a QV, entretanto, foi utilizado o instrumento WHOQOL-Bref que permite um resultado mais aprofundado da QV. Ressalta-se ainda o difícil acesso dos pesquisadores as agrovilas de Alcântara para realizar a investigação, justificando, em muitos outros casos, a baixa produção acadêmica sobre as comunidades quilombolas.

CONCLUSÃO

O estudo mostrou predomínio de homens em relação às mulheres e idosos jovens com média de 67 anos de idade, casados e/ou viúvos, com baixa escolaridade e renda. O instrumento WHOQOL-Bref identificou o domínio relações sociais como o mais bem avaliado e o do meio ambiente, o pior.

Infere-se que a avaliação positiva por parte dos idosos no domínio relações sociais, reflete, em grande medida, a força dos laços afetivos e de parentesco, das culturas e práticas de solidariedade dessas comunidades quilombolas. Entre povos e comunidades tradicionais, em geral, o respeito e a proteção ao idoso é uma característica ainda presente. O aparato cultural deve ser sempre considerado nas pesquisas e políticas públicas que tenham como objeto grupos étnicos com arraigadas tradições.

O domínio meio ambiente mostrou-se o mais preocupante, tendo em vista as baixas médias apresentadas em todas as agrovilas. O processo de reassentamento nessas agrovilas interferiu diretamente na baixa avaliação da QV nesse domínio. Em parte, a baixa avaliação pode ratificar o pressuposto da pesquisa - que o processo de deslocamento compulsório repercutiu negativamente nas comunidades e ainda são sentidos e lembrados pelos idosos.

Por fim, o domínio físico foi bem avaliado, uma provável explicação para esse nível de satisfação seria a faixa etária, pois nas agrovilas houve o predomínio de idosos jovens, portanto, com capacidade funcional ativa. Porém, esse quadro pode se reverter considerando a carência de políticas públicas integrativas que visem à promoção à saúde.

Considera-se que a situação da população quilombola pesquisada é preocupante, dada sua vulnerabilidade institucional que se expressa, além dos aspectos avaliados nas dificuldades de acesso a serviços e frequente deficiência ou mesmo ausência da implementação das políticas voltadas à promoção da saúde, acesso à água potável, saneamento básico, educação, proteção e recuperação ambiental, dentre outros. Ressalta-se que em um estado como o Maranhão, em que a população negra é majoritária, a Política Nacional de Saúde Integral da População Negra (PNSIPN) não vem sendo implementada adequadamente em vários aspectos, evidenciando-se as suas deficiências e os desafios a serem enfrentados.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Nov 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    28 Jan 2019
  • Aceito
    17 Jul 2019
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