Acessibilidade / Reportar erro

O Habitus de uma Rede em Expansão: as disposições do arranjo vitivinícola do Vale do São Francisco

El Habitus de una Red en Expansión: disposiciones de la red vitivinícola del Valle São Francisco

RESUMO

Nas últimas décadas, teve início a produção de vinhos finos no Vale do São Francisco, atividade que se consolidou, dando origem a um arranjo produtivo vitivinícola no semiárido brasileiro. Diante da importância dessa rede de vitivinicultura, e na tentativa de melhor entendê-la, adotamos o pensamento bourdieusiano para explicitar as disposições subjetivas que permeiam a dinâmica de (inter)ação dos agentes dessa rede. Para tal, utilizamos a teoria do habitus de Pierre Bourdieu como base teórica. O corpus da pesquisa foi constituído por entrevistas em profundidade realizadas com representantes de cinco das seis vinícolas instaladas naquele campo produtor. As entrevistas foram tratadas por meio de análise de discurso pautada em categorias da teoria bourdieusiana adotada. Nossos achados indicam quatro disposições subjetivas dos agentes dessa rede: busca por uma unidade no discurso, postura de “boa vizinhança”, crença no papel da rede para o desenvolvimento local e percepção e reprodução de desfavorecimentos e preconceitos. Limitações e indicações de futuras pesquisas são consideradas.

Palavras-chave:
Rede vitivinícola; Vale do São Francisco; Bourdieu; Habitus

RESUMEN

En las últimas décadas se ha iniciado la producción de vinos finos en el Valle São Francisco, actividad que se ha consolidado, dando origen a una red productiva vinícola en el semiárido brasileño. Por la importancia de esta red de vitivinicultura, y en un intento de comprenderla mejor, adoptamos el pensamiento bourdieusiano para explicar las disposiciones subjetivas inherentes a la dinámica de la (inter)acción de los agentes de esta red. Para ello, utilizamos la teoría del habitus de Pierre Bourdieu como base teórica. El corpus de la investigación fue constituido por entrevistas en profundidad realizadas con representantes de cinco de las seis bodegas ubicadas en aquel campo productor. Las entrevistas fueron analizadas mediante el análisis del discurso guiado en las categorías de la teoría bourdieusiana adoptada. Nuestros hallazgos indican cuatro disposiciones subjetivas de los agentes de esta red: búsqueda de una unidad en el discurso, la postura de “buena vecindad”, la creencia en el papel de la red para el desarrollo local y la percepción y la reproducción de las desventajas y los perjuicios. Se consideran las limitaciones y necesidades de la investigación.

Palabras clave:
Red de vino; Valle São Francisc; Bourdieu; Habitus

ABSTRACT

Over the last few decades, fine wines have begun to be produced in the São Francisco Valley - and the activity has established itself and led to a viticulture productive arrangement in the Brazilian semi-arid region. Given the importance of this viticulture network, and as an attempt to better understand it, we took up bourdieusian theory to explain the subjective characteristics that permeate the dynamics of (inter)actions amongst network stakeholders. To this end, we used Pierre Bourdieu’s habitus theory as a basis. The research corpus was made up of in-depth interviews carried out with representatives from five out of six wineries located in that productive area. Interviews were analyzed through speech analysis based on categories taken from the bourdieusian theory. Our findings indicate four subjective characteristics amongst network stakeholders: the effort towards speech coherence; a “good neighbor” attitude; a belief in the role of the network towards local development; and the perception and repetition of disadvantages and prejudices. Limitations and directions for future research are considered.

Keywords:
Viticulture Network; São Francisco Valley; Bourdie;Habitus.

1 INTRODUÇÃO

A discussão acerca da temática de redes tem recebido cada vez mais espaço na produção acadêmica contemporânea. As redes são um elemento essencial na articulação da sociedade da informação, ou sociedade pós-industrial, que elegeu as informações, em detrimento dos bens materiais de produção, como elemento-chave do novo paradigma técnico-científico com o qual deparamos na atualidade, no qual tecnologia, inovação e conhecimento formam a nova economia produtiva (CASTELLS, 2007CASTELLS, M. A sociedade em rede. 6. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2007.; HENRIQUE, 2005HENRIQUE, A. L. S. O paradigma do silêncio ou a racionalização como absoluto. Holos, Natal, v. 3, p. 57-65, dez. 2005.; MARTELETO, 2010MARTELETO, R. M. Redes sociais, mediação e apropriação de informações: situando campos, objetos e conceitos na pesquisa em ciência da informação. Pesq. Bras. Ci. Inf., Brasília, v.3, n.1, p.27-46, jan./dez. 2010.; WERTHEIN, 2000WERTHEIN, J. A sociedade da informação e seus desafios. Ci. Inf., Brasília, v. 29, n. 2, p. 71-77, maio/ago. 2000.).

O conceito de redes permeia os mais diversos domínios do conhecimento e da prática humana, se fazendo presente em áreas como as da ciência da informação, sociologia, economia e política. No atual cenário do âmbito organizacional, as redes surgem como um formato, ou modelo, amplamente difundido, atraindo a atenção de profissionais e pesquisadores da área (TOMAÉL; ALCARÁ; DI CHIARA, 2005TOMAÉL, M. I.; ALCARÁ, A. R.; DI CHIARA, I. G. Das redes sociais à inovação. Ci. Inf., Brasília, v. 34, n. 2, p. 93-104, maio/ago. 2005.).

Na perspectiva organizacional, as redes colaborativas permitem a organização e a interação dos diversos atores que comungam dos mesmos valores e objetivos, a fim de terem acesso ao fluxo de informação e aos benefícios oriundos da ação coletiva. Nesse sentido, é possível perceber a importância do papel desempenhado pelas redes na disseminação da informação e na geração e no compartilhamento de conhecimento (MARTELETO; SILVA, 2004MARTELETO, R. M.; SILVA, A. B. O. Redes e capital social: o enfoque da informação para o desenvolvimento local. Ci. Inf., Brasília, v. 33, n. 3, p.41-49, set./dez. 2004.; TOMAÉL; ALCARÁ; DI CHIARA, 2005TOMAÉL, M. I.; ALCARÁ, A. R.; DI CHIARA, I. G. Das redes sociais à inovação. Ci. Inf., Brasília, v. 34, n. 2, p. 93-104, maio/ago. 2005.).

Uma das aplicações do conceito de redes se dá no estudo de arranjos produtivos locais. Vem se fortalecendo a ideia de que o sucesso desses arranjos está diretamente ligado aos elos existentes entre as firmas, que se configuram na forma de redes (COSTA; COSTA, 2007COSTA, A. B.; COSTA, B. M. Cooperação e capital social em arranjos produtivos locais. RDE - Revista de Desenvolvimento Econômico, Salvador, v. 9, n. 15, p. 51-60, jan. 2007.).

Nos últimos anos, inúmeros trabalhos têm se debruçado sobre o pensamento de Bourdieu, mais especificamente sobre seu conceito de “capital social”, para analisar a realidade das redes nos mais diversos cenários (ALBAGLI; MACIEL, 2002ALBAGLI, S.; MACIEL, M. L. Capital social e empreendedorismo local: rede de pesquisa em sistemas produtivos e inovativos locais. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2002.; COSTA; COSTA, 2007COSTA, A. B.; COSTA, B. M. Cooperação e capital social em arranjos produtivos locais. RDE - Revista de Desenvolvimento Econômico, Salvador, v. 9, n. 15, p. 51-60, jan. 2007.; PASSOS, DIAS, CRUZ, 2005PASSOS, F. H.; DIAS, C. C.; CRUZ, R. C. Capital social, competências e demandas tecnológicas de arranjos produtivos locais: o caso do APL de sisal em Valente, Bahia. E&G - Economia e Gestão, Belo Horizonte, v. 5, n. 10, p. 92-112, ago. 2005.). Esse conceito ganhou grande notoriedade dentro dos estudos sobre redes; no entanto, é válido destacar que grande parte desses trabalhos tem se limitado à análise desse único componente da teoria da prática de Bourdieu, sem levar em consideração as outras possibilidades de aplicação de sua teoria para melhor entender a dinâmica de funcionamento de uma rede. A teoria bourdieusiana vai além da ideia de “capital social”, apresentando elementos como outros capitais (econômico, cultural e simbólico), “campo” e “habitus”, possibilitando a compreensão da dinâmica de um determinado grupo objeto de estudo (ALBAGLI; MACIEL, 2002ALBAGLI, S.; MACIEL, M. L. Capital social e empreendedorismo local: rede de pesquisa em sistemas produtivos e inovativos locais. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2002.; SETTON, 2002SETTON, M. G. J. A teoria do habitus em Pierre Bourdieu: uma leitura contemporânea. Revista Brasileira de Educação, São Paulo, n. 20, p. 60-70, maio/ago. 2002.).

Nesse contexto, nas últimas décadas a região do Vale do São Francisco vem despontando como uma das principais produtoras de vinhos finos do Brasil, graças a projetos de irrigação realizados na área. A rede de empreendimentos instalados na região pernambucana próxima à cidade de Petrolina tem se destacado por sua extraordinária produtividade, superior à média habitual das safras de uvas. A região vitivinícola do Submédio do São Francisco, formada por seis produtoras, sendo uma delas em território baiano, ainda é, no entanto, considerada muito nova e sem tradição na produção de vinhos finos, sendo vista por muitos como uma região com grande potencial, mas ainda em processo de formação e consolidação (GUERRA et al., 2009GUERRA, C. C. et al. Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos. Bento Gonçalves: Embrapa Uva e Vinho, 2009.).

A fim de melhor compreender a rede vitivinícola do Vale do São Francisco, este trabalho tem por objetivo explicitar as disposições subjetivas que permeiam a dinâmica de (inter)ação dos agentes dessa rede.

É mister ressaltarmos que, apesar da complementariedade dos elementos campo e habitus, os mesmos são abordados por Pierre Bourdieu em teorias distintas e específicas - a teoria dos campos e a teoria do habitus (LAHIRE, 2002LAHIRE, B. Reprodução ou prolongamentos críticos? Educação & Sociedade, Campinas, v. 23, n. 78, p. 37-55, abr. 2002.). Dessa forma, em nosso trabalho optamos por direcionar nossos esforços especificamente para a melhor compreensão do habitus, buscando compreender melhor as disposições subjetivas dos agentes que compõem a rede vitivinícola do Vale do São Francisco. Nesse sentido, trataremos do campo como elemento de complementariedade do habitus.

Para alcançar os propósitos deste trabalho, o primeiro passo dado foi a ampliação do conhecimento sobre o contexto e as idiossincrasias que envolvem a produção de vinho no Vale do São Francisco. Com o intuito de melhorar o entendimento do modelo que estrutura a relação entre os membros da rede e caracterizar suas dinâmicas de interação, a etapa seguinte consistiu no aprofundamento das questões referentes às configurações de arranjos produtivos locais na perspectiva de redes colaborativas. Em seguida, apresentamos uma discussão sobre os conceitos desenvolvidos por Bourdieu em sua teoria do habitus, e como estes se aplicam ao estudo da rede vitivinícola em questão. Então, expomos os aspectos relacionados aos procedimentos metodológicos da pesquisa e, finalmente, os resultados apurados serão apresentados e analisados.1 1 . Para além de uma escolha teórica, o pensamento de Bourdieu foi utilizado como referência acerca do papel do pesquisador no fazer ciência (BOURDIEU, 2001). Tal escolha se reflete na própria redação deste trabalho, uma vez que, por questões axiológicas, optamos por assumir uma redação na 3ª pessoa do plural, nos posicionando no texto. Nesse sentido, em consonância com Bourdieu, Boaventura de Souza Santos afirma que “o cientista social não pode libertar-se, no ato da observação, dos valores que informam a sua prática em geral e, portanto, também a sua prática de cientista” (SANTOS, 2006, p. 36). Dessa forma, com este estudo buscamos contribuir com o aprofundamento do conhecimento acerca da vitivinicultura do Vale do São Francisco, além do avanço do conhecimento na área de estudos de Redes e Arranjos Produtivos Locais.

2 A REDE VITIVINÍCOLA E O VALE DO SÃO FRANCISCO

A vitivinicultura na região do Vale do São Francisco surgiu na década de 1980, quando a Vinícola Vale do São Francisco iniciou a produção de vinhos na região, na Fazenda Milano, no município de Santa Maria da Boa Vista. O projeto se baseou na produção de vinhos leves, derivados de cepas europeias e norte-americanas, utilizando a mão de obra especializada de técnicos vindos do Rio Grande do Sul (LIMA et al., 2005LIMA, R. C.; SAMPAIO, Y.; SAMPAIO, G. R.; AIRES, A. Perfil econômico e cenários de desenvolvimento para a cadeia produtiva de vinho e uva. Recife: Secretaria de Planejamento do Estado de Pernambuco, 2005.).

Após o sucesso da empreitada da vinícola Vale do São Francisco e da consolidação de sua marca, Vinho Botticelli, o interesse de outras empresas do setor foi despertado para o potencial da região. Atualmente, seis vinícolas estão instaladas na região. O quadro abaixo apresenta cada uma delas:

Quadro 1:
Vitivinícolas do Vale do São Francisco.

As vitivinícolas da região do Vale do São Francisco, objeto do estudo ora proposto, se diferenciam das demais produtoras de vinhos espalhadas por todo o mundo. A região do submédio do Vale do São Francisco, graças ao clima seco e aos projetos de irrigação, apresenta um maior nível de produtividade. As vitivinícolas da região produzem 2,5 safras por ano, diferentemente do restante da produção mundial, que produz apenas uma safra por ano (LIMA et al., 2005LIMA, R. C.; SAMPAIO, Y.; SAMPAIO, G. R.; AIRES, A. Perfil econômico e cenários de desenvolvimento para a cadeia produtiva de vinho e uva. Recife: Secretaria de Planejamento do Estado de Pernambuco, 2005.; VITAL, 2005VITAL, T. W.; MORAES FILHO, R. A.; FERRAZ FILHO, Z. E. Vitivinicultura no Nordeste do Brasil: um arranjo produtivo em expansão. Brasília: Sober, 2005.).

Alguns fatores contribuem para o desenvolvimento do setor vitivinícola na região: o apoio do Estado e a disponibilização de crédito para investimentos pelo Banco do Brasil, Banco do Nordeste e BNDES, a entrada de capital estrangeiro na atividade, a tecnologia de produção trazida dos EUA e incrementada por pesquisas junto à Embrapa e os últimos anos de taxa cambial favorável na concorrência com os produtos europeus e norte-americanos (LIMA et al., 2005LIMA, R. C.; SAMPAIO, Y.; SAMPAIO, G. R.; AIRES, A. Perfil econômico e cenários de desenvolvimento para a cadeia produtiva de vinho e uva. Recife: Secretaria de Planejamento do Estado de Pernambuco, 2005.; VITAL, 2005VITAL, T. W.; MORAES FILHO, R. A.; FERRAZ FILHO, Z. E. Vitivinicultura no Nordeste do Brasil: um arranjo produtivo em expansão. Brasília: Sober, 2005.).

Ainda existem, no entanto, diversos obstáculos a serem superados para a consolidação da Região do Vale do São Francisco como referência nacional na produção de vinhos de mesa. Os principais desafios são o fato de os mercados do sul e do sudeste do país, maiores consumidores de vinhos no Brasil, praticamente desconhecerem os vinhos produzidos e engarrafados no Nordeste, e a concorrência dos vinhos importados do Chile e Argentina, beneficiados pelos acordos comerciais do Mercosul, além da falta da marca de território, que serve como certificado de origem dos vinhos (VITAL, 2005VITAL, T. W.; MORAES FILHO, R. A.; FERRAZ FILHO, Z. E. Vitivinicultura no Nordeste do Brasil: um arranjo produtivo em expansão. Brasília: Sober, 2005.).

3 ARRANJOS PRODUTIVOS LOCAIS COMO REDES COLABORATIVAS

No atual cenário socioeconômico, marcado pelo aumento da competitividade até limites nunca antes imaginados, a necessidade das empresas de fortalecer as relações interorganizacionais se faz urgente, tendo em vista o melhor aproveitamento das potencialidades oferecidas pela ação coletiva. Esse movimento de internacionalização da economia pode ser responsabilizado pela crescente especialização e diferenciação de territórios que se tornam fontes de vantagens concorrenciais a partir dos recursos, práticas e interdependências específicas do local, o que se traduz na necessidade crescente das organizações de fortalecer as relações interorganizacionais, objetivando o incremento das potencialidades provenientes da ação coletiva (SGARBI et al., 2010SGARBI, V. S. et al. Inovação e competitividade sistêmica: influências percebidas no APL de tecnologia da informação e comunicação de Recife - porto digital. In: SIMPÓSIO DE GESTÃO DA INOVAÇÃO TECNOLÓGICA, 26., 2010, Vitória. Anais eletrônicos... Vitória: ANPAD, 2010. Disponível em: <Disponível em: http://www.anpad.org.br/evento.php?acao=trabalho&cod_edicao_subsecao=640&cod_evento_edicao=55&cod_edicao_trabalho=12571 >. Acesso em: 21 jan. 2010.
http://www.anpad.org.br/evento.php?acao=...
; BENKO, 1999BENKO, G. Economia, espaço e globalização na aurora do século XXI. 2. ed. São Paulo: Hucitec, 1999.). Diante desse cenário, caracterizado por alguns como da era, sociedade ou economia do conhecimento (LASTRES; CASSIOLATO, 2003aLASTRES, H. M. M.; CASSIOLATO, J. E. Novas políticas na era do conhecimento: o foco em arranjos produtivos e inovativos locais. Parcerias Estratégicas, Brasília, v. 8, n. 17, p. 05-30, set. 2003a.), estudos têm tentado estabelecer e explicar a relação existente entre o desempenho competitivo das empresas e sua proximidade geográfica (TEIXEIRA et al., 2006TEIXEIRA, K. H. et al. Território, cooperação e inovação: um estudo sobre o arranjo produtivo pingo d’água. Rev. Econ. Sociol. Rural, Rio de Janeiro, v. 44, n.3, p. 573-594, jul./set. 2006.).

Nesse sentido, a noção de arranjos produtivos locais (APLs) vem se fortalecendo e sendo aplicada nos mais diferentes cenários, graças a sua grande capacidade de criação de vantagens competitivas para seus componentes (CEZARINO; CAMPOMAR, 2006CEZARINO, L. O.; CAMPOMAR, M. C. Vantagem competitiva para micro, pequenas e médias empresas: clusters e APLs. E&G - Economia e Gestão, Belo Horizonte, v. 6, n. 12, p. 143-158, jun. 2006.). Tais arranjos apresentam características específicas desse tipo de configuração produtiva, elementos que os diferenciam de outros modelos de organização coletiva. Os APLs concentram, em uma determinada região, a produção de bens e serviços, podendo ser definidos como “aglomerações territoriais de agentes econômicos, políticos e sociais - com foco em um conjunto específico de atividades econômicas” (LASTRES; CASSIOLATO, 2003bLASTRES, H. M. M.; CASSIOLATO, J. E. (Coord.). Glossário de arranjos e sistemas produtivos e inovativos locais. Rio de Janeiro: UFRJ-Rede de Pesquisa em Sistemas Produtivos e Inovativos Locais, 2003b (Arranjos produtivos locais: uma nova estratégia de ação para o Sebrae)., p. 3). A coletividade do arranjo é uma fonte de vantagem competitiva para seus integrantes, atraindo novas empresas interessadas em se instalar na região (SANTOS; DINIZ; BARBOSA, 2004SANTOS, G. A. G.; DINIZ, E. J.; BARBOSA, E. K.. Aglomerações, arranjos produtivos locais e vantagens competitivas locacionais. In: BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO. Arranjos produtivos locais e desenvolvimento. Rio de Janeiro: BNDES, 2004.).

Alguns dos elementos que caracterizam os arranjos produtivos locais são: a) a dimensão territorial, que define o recorte espacial específico no qual se desenrolam as ações produtivas e políticas; b) a diversidade de atividades e atores do arranjo, envolvendo não só empresas, mas também suas representações associativas, organizações públicas e privadas relacionadas com atividades como a formação e a capacitação de recursos humanos, por exemplo; c) o conhecimento tácito compartilhado pelos atores integrantes do arranjo; d) inovação e aprendizado interativos, que oferecem a possibilidade de introdução de novos produtos e processos a serem adotados pelo arranjo; e) a governança, referente às diferentes maneiras de coordenação entre os diversos agentes envolvidos no arranjo; f) e o grau de enraizamento, que trata da articulação dos agentes integrantes do arranjo com os elementos do ambiente local (LASTRES; CASSIOLATO, 2003bLASTRES, H. M. M.; CASSIOLATO, J. E. (Coord.). Glossário de arranjos e sistemas produtivos e inovativos locais. Rio de Janeiro: UFRJ-Rede de Pesquisa em Sistemas Produtivos e Inovativos Locais, 2003b (Arranjos produtivos locais: uma nova estratégia de ação para o Sebrae).).

Uma forma de enxergar um APL é como um tipo de configuração em rede, que também pode se apresentar de diferentes maneiras, como clusters, redes de cooperação, redes de pequenas e médias empresas, consórcios de empresas, entre outros. Neste sentido, “[...] as redes constituem uma forma organizacional passível de ser identificada em diversos tipos de aglomerações produtivas e inovativas; seu enfoque revela, fundamentalmente, a forma de interação entre os diversos agentes” (LASTRES; CASSIOLATO, 2003bLASTRES, H. M. M.; CASSIOLATO, J. E. (Coord.). Glossário de arranjos e sistemas produtivos e inovativos locais. Rio de Janeiro: UFRJ-Rede de Pesquisa em Sistemas Produtivos e Inovativos Locais, 2003b (Arranjos produtivos locais: uma nova estratégia de ação para o Sebrae)., p. 22).

O uso do termo “rede” em si pode levar a uma noção abstrata, cristalizando-se de maneira mais genérica como um conjunto de nós que se interconectam por meio de relacionamentos variados, possibilitando o maior intercâmbio e fluxo de pessoas, bens e informações. Tais relações se apresentam pautadas na ideia de modelos diversos de integração e coordenação entre unidades específicas, indo desde sujeitos atomizados até organizações complexas, mas todas elas, independente de seu nível de análise, baseando-se em relações sociais (MACHADO-DA-SILVA; COSER, 2006MACHADO-DA-SILVA, C. L.; COSER, C. Rede de relações interorganizacionais no campo organizacional de Videira-SC. RAC - Revista de Administração Contemporânea, Rio de Janeiro, v.10, n.4, p. 9-45, out./dez., 2006.).

As configurações pautadas na ideia de redes interorganizacionais ganham cada vez mais destaque à medida que se percebe seu papel de mediação das interdependências transacionais e das relações cooperativas, competitivas ou conflituosas entre as organizações. Na tentativa de se compreender melhor esse fenômeno complexo das formações em rede, têm se aplicado diferentes metodologias de pesquisa, dentre as quais podemos destacar a análise de redes sociais (ARS) e a análise estrutural das redes (MACHADO-DA-SILVA; COSER, 2006MACHADO-DA-SILVA, C. L.; COSER, C. Rede de relações interorganizacionais no campo organizacional de Videira-SC. RAC - Revista de Administração Contemporânea, Rio de Janeiro, v.10, n.4, p. 9-45, out./dez., 2006.).

A análise de redes sociais (ARS) está pautada em três princípios gerais que orientam este tipo de estudo: a preocupação com a amplidão e os limites da rede no que diz respeito ao espaço local; o entendimento das redes densas e das redes ampliadas no contexto específico; e a noção de que, pela configuração da rede e dos elos entre os atores, é possível analisar o comportamento individual e coletivo de cada um e de todos eles (MARTELETO, 2010MARTELETO, R. M. Redes sociais, mediação e apropriação de informações: situando campos, objetos e conceitos na pesquisa em ciência da informação. Pesq. Bras. Ci. Inf., Brasília, v.3, n.1, p.27-46, jan./dez. 2010.).

Para além da metodologia dominante de ARS, é de grande importância apresentar também a perspectiva de análise que se baseia na investigação da rede como uma estrutura social, permeada por relações de compartilhamento, competição e conflito. Tal perspectiva permite uma abordagem mais sensível às complexidades inerentes às interações que se desenvolvem em um ambiente de rede, que é mais bem acessado não pela atenção a comportamentos individuais, mas sim pela análise de padrões relacionais, sustentada por um contexto socio-histórico específico, o que envolve também as relações entre os atores econômicos e outras organizações, como o governo e os institutos de pesquisa. Essa maneira de encarar a rede por meio de uma ótica social e subjetiva vem ganhando cada vez mais espaço nos estudos acadêmicos em administração (MACHADO-DA-SILVA; COSER, 2006MACHADO-DA-SILVA, C. L.; COSER, C. Rede de relações interorganizacionais no campo organizacional de Videira-SC. RAC - Revista de Administração Contemporânea, Rio de Janeiro, v.10, n.4, p. 9-45, out./dez., 2006.; MARTELETO; SILVA, 2004MARTELETO, R. M.; SILVA, A. B. O. Redes e capital social: o enfoque da informação para o desenvolvimento local. Ci. Inf., Brasília, v. 33, n. 3, p.41-49, set./dez. 2004.).

4 PIERRE BOURDIEU E A TEORIA DO HABITUS

Assumindo uma postura de análise de redes pautada em uma realidade relacional, permeada pela dinâmica de interação entre os diversos atores que convivem em um mesmo espaço, a obra do sociólogo francês Pierre Bourdieu apresenta-se como uma abordagem apropriada para o entendimento das redes sociais de maneira geral, em toda sua complexidade. Nesse sentido, esta seção tem como propósito apresentar um breve apanhado do pensamento geral de Bourdieu e, posteriormente, tratar de sua teoria do habitus, passível de aplicação nos estudos das redes.

4.1 O pensamento de Pierre Bourdieu

Nascido em 1930, em uma região rural da França, Pierre Bourdieu ficou conhecido como um dos pensadores mais importantes do final do século XX. Com mais de 35 livros e 400 artigos publicados, Bourdieu não se limitou à discussão de temas e problemas atinentes especificamente à sociologia, exercendo influência sobre as mais diversas áreas das ciências sociais, como a antropologia, a educação, os estudos culturais e a filosofia da ciência, esta última tratada principalmente a partir de reflexões contínuas acerca dos fundamentos epistemológicos das práticas da ciência social com relação à crítica das concepções fragmentadas originárias da dicotomia sujeito/objeto (SCOTT, 2009SCOTT, J. 50 grandes sociólogos contemporâneos. São Paulo: Contexto, 2009.; SANTOS, 2007SANTOS, P. S. M. B. A aplicabilidade dos conceitos bourdieusianos de habitus e campo em uma pesquisa na área da história da educação. Dialogia, São Paulo, v.6, p. 49-54, 2007.).

Em se tratando do cerne de seu pensamento, Bourdieu orientou seus estudos em direção à construção de uma variante modificada do Estruturalismo. É mister ressaltar, no entanto, que sua sociologia se distancia do Estruturalismo tradicional, recusando o determinismo e a redução objetivista das estruturas estáveis e imutáveis que desprezam a presença e ação dos agentes que as povoam. Dessa forma, o pensamento bourdieusiano se localiza a meio caminho entre o subjetivismo e o estruturalismo puros, buscando evidências da existência de uma estrutura subjacente ao social, analisada por meio de uma ótica crítica, destinada a expor os mecanismos de dominação e (re)produção de idéias (THIRY-CHERQUES, 2006THIRY-CHERQUES, H. R. Pierre Bourdieu: a teoria na prática. RAP - Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 40, n.1, p.27-53, jan./fev. 2006.; 2008THIRY-CHERQUES, H. R. Métodos estruturalistas: pesquisa em ciências de gestão. São Paulo: Atlas, 2008.; WACQUANT, 2006WACQUANT, L. Pierre Bourdieu. In: STONES, Rob. Key contemporary thinkers. London: Macmillan, 2006, p. 261-278.; BOURDIEU, 2010BOURDIEU, P. O poder simbólico. 13. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil , 2010.). Nas palavras de Loïc Wacquant, aluno e parceiro de Bourdieu, sua obra sociológica procura “forjar uma teoria disposicional da ação capaz de reintroduzir na antropologia estruturalista a capacidade inventiva dos agentes” (WACQUANT, 2007WACQUANT, L. Esclarecer o habitus. Educação & Linguagem, São Paulo, v. 10, n. 16, p. 63-71, jul./dez, 2007., p. 64).

A grande contribuição de Bourdieu para a sociologia, ou ao menos aquela que se encontra mais amplamente difundida, foi a elaboração das teorias do habitus e do campo. Por meio dessas teorias, Bourdieu apresenta a ideia de que a sociedade é formada por diversos campos, dentro dos quais os agentes reproduzem habitus específicos em uma constante disputa pelo poder, determinado pelo domínio dos capitais de interesse dentro de cada campo (ARAÚJO; ALVES; CRUZ, 2009ARAÚJO, F. M. B., ALVES, E. M.; CRUZ, M. P. Algumas reflexões em torno dos conceitos de campo e de habitus na obra de Pierre Bourdieu. Perspectivas da Ciência e Tecnologia, Rio de Janeiro, v.1, n.1, p.31-40, jan./jun. 2009.; SCOTT, 2009SCOTT, J. 50 grandes sociólogos contemporâneos. São Paulo: Contexto, 2009.).

O presente trabalho se debruça especificamente sobre a teoria do habitus. Para apresentá-la, todavia, alguns aspectos descritivos da noção de campo precisam ser tratados, na medida em que se façam necessários à compreensão do habitus. Nesse sentido, duas categorias conceituais presentes em ambas as dimensões, agente e capital, são também alçadas, ainda que buscando enfatizar seus papéis no entendimento do habitus.

4.2 A teoria do habitus

O conceito de habitus goza de grande centralidade e notoriedade na obra de Bourdieu. Discutido por diversos autores, o termo habitus tem origem em Aristóteles, e foi usado por outros tantos pensadores ao longo dos tempos, como Mauss e Heidegger, mas sem nunca receber grande atenção, até que Bourdieu o resgatou na tentativa de “romper com o paradigma estruturalista sem cair na velha filosofia do sujeito ou da consciência” (BOURDIEU, 2010BOURDIEU, P. O poder simbólico. 13. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil , 2010., p. 61). Destarte, sua intenção foi a de se manifestar em discordância à visão althusseriana do agente reduzido ao papel de suporte da estrutura, bem como à do homo economicus oriundo da filosofia da consciência e do individualismo metodológico (BOURDIEU, 2010BOURDIEU, P. O poder simbólico. 13. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil , 2010.; BOURDIEU, 2007aBOURDIEU, P. Meditações pascalianas. 2. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007a.).

Nas palavras de Bourdieu:

[...] uma das funções principais da noção de habitus consiste em descartar dois erros complementares cujo princípio é a visão escolástica: de um lado o mecanismo segundo o qual a ação constitui o efeito mecânico da coerção de causas externas; de outro, o finalismo segundo o qual, sobretudo por conta da teoria da ação racional, o agente atua de maneira livre, consciente e, como dizem alguns utilitaristas, with full understanding, sendo a ação o produto de um cálculo das chances e dos ganhos. (BOURDIEU, 2007aBOURDIEU, P. Meditações pascalianas. 2. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007a., p. 169).

Adotado na teoria da prática para representar um sistema de disposições, modos de sentir, e pensar, o habitus é uma espécie de matriz de ação que nos leva a enxergar o mundo de determinada forma, e orienta o nosso agir em determinadas circunstâncias. O conceito trata da interiorização das estruturas sociais, traduzidas na história individual e coletiva, absorvidas a tal ponto que se tornam imperceptíveis pelos agentes, convertendo-se em uma lógica infraconsciente de racionalidade prática (BOURDIEU, 2007aBOURDIEU, P. Meditações pascalianas. 2. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007a.; SETTON, 2002SETTON, M. G. J. A teoria do habitus em Pierre Bourdieu: uma leitura contemporânea. Revista Brasileira de Educação, São Paulo, n. 20, p. 60-70, maio/ago. 2002.; WACQUANT, 2007WACQUANT, L. Esclarecer o habitus. Educação & Linguagem, São Paulo, v. 10, n. 16, p. 63-71, jul./dez, 2007.).

Ao conceder especial atenção à diferenciação entre habitus e conceitos como “hábito”, “costume” e “praxe”, Bourdieu tenta mostrar que o habitus não diz respeito apenas a uma espécie de condicionamento. O habitus é, sim, uma disposição interiorizada e geradora da prática, podendo então ser considerada como estrutura e estruturante da dinâmica social, o que explicita o fato da crença de Bourdieu em uma forma de Estruturalismo permeado pela agência, e não no estruturalismo puro de Lévi-Strauss (BOURDIEU, 2010BOURDIEU, P. O poder simbólico. 13. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil , 2010.; CASTILHOS, 2007CASTILHOS, R. B. Subindo o morro: consumo, posição social e distinção entre famílias de classes populares. 2007. 204 f. Dissertação (Mestrado em Administração)-Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. 2007.).

No papel de condicionante e condicionador da prática dos agentes, o habitus é constituído pela forma de apreender, compreender e julgar o mundo, sendo formado por três elementos centrais, sintetizados por THIRY-CHERQUES (2006THIRY-CHERQUES, H. R. Pierre Bourdieu: a teoria na prática. RAP - Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 40, n.1, p.27-53, jan./fev. 2006.; 2008THIRY-CHERQUES, H. R. Métodos estruturalistas: pesquisa em ciências de gestão. São Paulo: Atlas, 2008.):

  • ethos - os valores não conscientes que orientam a moral cotidiana, materializados em estado prático;

  • eidos - maneira específica de pensar a realidade, baseada em crença pré-reflexiva;

  • hexis - princípios incorporados fisicamente, manifestado pelo corpo em posturas e expressões específicas.

Uma das maiores contribuições trazidas pelo conceito de habitus foi a possibilidade de rediscussão acerca da dicotomia entre objetividade/subjetividade nas ciências sociais. Para Bourdieu, a dinâmica social é traduzida pela relação dialética entre a objetivação das posições referentes ao espaço social - espaço este ao qual Bourdieu dá o nome de “campo” - e a subjetivação das disposições individuais (habitus), reflexo dessas mesmas posições e que se fazem notar por meio de comportamentos e posturas do indivíduo (OLIVEIRA, 2001OLIVEIRA, F. S. O habitus no lugar e o lugar da Tijuca. 2001. 142 f. Dissertação (Mestrado em Administração)-Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2001.; WACQUANT, 2006WACQUANT, L. Pierre Bourdieu. In: STONES, Rob. Key contemporary thinkers. London: Macmillan, 2006, p. 261-278.; BOURDIEU 2007bBOURDIEU, P. A distinção: crítica social do julgamento. São Paulo: Edusp; Porto Alegre: Zouk, 2007b.). Sendo assim, é possível afirmar que “o habitus é a internalização ou incorporação da estrutura social, ao passo que o campo é a exteriorização ou objetivação do habitus” (THIRY-CHERQUES, 2008THIRY-CHERQUES, H. R. Métodos estruturalistas: pesquisa em ciências de gestão. São Paulo: Atlas, 2008., p. 172).

Nessa relação, outra noção crítica é a de capital, que aparece na teoria bourdieusiana como as disputas de poder impetradas pelos interesses e investimentos dos agentes no campo em que estão estruturados. Logo, trata-se de uma noção que tanto localiza o agente em um campo social quanto remete a suas disposições em um dado habitus.

Para Bourdieu, existem quatro tipos de capitais distintos, que os agentes podem possuir em diferentes medidas. São eles (BOURDIEU, 2007bBOURDIEU, P. A distinção: crítica social do julgamento. São Paulo: Edusp; Porto Alegre: Zouk, 2007b.; ARAÚJO; ALVES; CRUZ, 2009ARAÚJO, F. M. B., ALVES, E. M.; CRUZ, M. P. Algumas reflexões em torno dos conceitos de campo e de habitus na obra de Pierre Bourdieu. Perspectivas da Ciência e Tecnologia, Rio de Janeiro, v.1, n.1, p.31-40, jan./jun. 2009.):

  • capital cultural - compreende as qualificações intelectuais (conhecimento, informações, habilidades);

  • capital social - corresponde ao total dos acessos sociais de relacionamentos e contatos;

  • capital econômico - compreende a riqueza material (bens, patrimônios);

  • capital simbólico - formado pelos rituais de reconhecimento, prestígio e honra.

As disputas e relações de poder podem ser traduzidas como a busca dos agentes em conquistar posições, por meio do acúmulo de capitais de interesse dentro do campo em questão. Por meio do uso de estratégias específicas, explícitas ou não, os agentes tentam conservar e conquistar posições dentro da estrutura na qual estão inseridos. Dessa maneira, os agentes que ocupam posições de dominação procuram lançar mão da violência simbólica para privilegiar interesses de conservação, ou reprodução da ordem vigente em detrimento dos interesses de alteração da configuração do campo (BOURDIEU, 2010BOURDIEU, P. O poder simbólico. 13. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil , 2010.; BOURDIEU, 2009BOURDIEU, P. O senso prático. Petrópolis: Vozes , 2009.; OLIVEIRA, 2001OLIVEIRA, F. S. O habitus no lugar e o lugar da Tijuca. 2001. 142 f. Dissertação (Mestrado em Administração)-Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2001.; THIRY-CHERQUES, 2006THIRY-CHERQUES, H. R. Pierre Bourdieu: a teoria na prática. RAP - Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 40, n.1, p.27-53, jan./fev. 2006.; 2008THIRY-CHERQUES, H. R. Métodos estruturalistas: pesquisa em ciências de gestão. São Paulo: Atlas, 2008.).

Por meio da identificação dos diferentes habitus presentes dentro de um campo é possível, então, entender a matriz geradora por trás das ações desses agentes, permitindo uma maior compreensão acerca das posturas assumidas pelos mesmos frente a outros agentes. Logo, a caracterização do habitus oferece a oportunidade de extrapolação do mapeamento estrutural básico do estruturalismo tradicional, explicitando aspectos subjetivos subjacentes à interação de um grupo.

4.3 Expandindo o “uso” de Bourdieu no estudo das redes

Antes de adentrarmos na questão dos procedimentos metodológicos em si, e na sequência na apresentação e discussão dos resultados, faz-se necessário um esclarecimento rápido. Apesar das inúmeras possibilidades oferecidas pela obra de Bourdieu para a análise e o questionamento acerca dos mais diversos fenômenos sociais, os estudos relacionados às redes têm se restringido apenas ao uso do conceito de “capital social” em suas discussões acadêmicas.

Nesse sentido, por acreditarmos ser inegável o potencial da obra de Pierre Bourdieu para a análise de fenômenos econômicos e produtivos, fornecendo os fundamentos para lidarmos de maneira segura com os aspectos estruturais desses fenômenos, julgamos pertinente e extremamente enriquecedor tentar promover uma maior aproximação entre os estudos de redes e o pensamento bourdieusiano em toda sua complexidade (SWEDBERG, 2004SWEDBERG, R. Sociologia econômica: hoje e amanhã. Tempo Soc., São Paulo, v. 16, n. 2, p. 7-34, nov. 2004.).

Corroborando como o que foi dito a respeito da existência de aspectos sociais, muitas vezes negligenciados pelas pesquisas, Marteleto afirma que:

[...] o estudo das redes coloca assim em evidência um dado da realidade social contemporânea que ainda está sendo pouco explorado, ou seja, de que os indivíduos, dotados de recursos e capacidades propositivas, organizam suas ações nos próprios espaços políticos em função de socializações e mobilizações suscitadas pelo próprio desenvolvimento das redes. Mesmo nascendo em uma esfera informal de relações sociais, os efeitos das redes podem ser percebidos fora de seu espaço, nas interações com o Estado, a sociedade ou outras instituições representativa. (MARTELETO, 2001MARTELETO, R. M. Análise de redes sociais: aplicação nos estudos de transferência da informação. Ci. Inf., Brasília, v. 30, n. 1, p. 71-81, jan./abr. 2001, p. 72).

Sendo assim, parece-nos clara a relevância da ampliação dos estudos das redes, a fim de que os mesmos acabem por abordar questões outras que não apenas o mapeamento dos agentes constituintes de uma rede específica, levando em consideração a construção histórica de habitus pautados por interesses divergentes que se relacionam, estabelecendo um campo com regras formais e informais, baseado na coordenação e disputa de interesses (CHALITA, 2008CHALITA, M. A. N. Produção do habitus empresarial na citricultura paulista. Revista de Economia Agrícola, São Paulo, v. 55, n. 1, p. 41-61, jan./jun. 2008.).

5 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

O trabalho aqui apresentado adota uma postura qualitativa de pesquisa, assumindo o interpretativismo como orientação paradigmática; logo, não se pretende explicar o fenômeno objeto do estudo, mas sim compreendê-lo em suas particularidades. Tal escolha se dá pela natureza do estudo ora proposto e pelas características inerentes ao tipo de abordagem escolhida no momento da definição do estudo (DENZIN; LINCOLN, 2005DENZIN, N. K.; LINCOLN, Y. S. (Ed.). Paradigmatic controversies, contradictions, and emerging confluences. In: DENZIN, N. K.; LINCOLN, Y. S. The sage handbook of qualitative research. 3rd ed. Thousand Oaks: Sage Publications, 2005. p.191-215.).

Definimos o limite da rede objeto de nosso estudo como sendo formado pelos agentes da vitivinicultura da região do Vale do São Francisco. O corpus foi formado por entrevistas com cinco indivíduos, representantes de cinco das seis vinícolas presentes na região do Vale do São Francisco. Por questões de acessibilidade não foi possível entrevistar um representante de uma das vinícolas. Os entrevistados foram: Flávia Helena Cavalcanti (CAVALCANTI, 2009CAVALCANTI, F. H. Flávia Helena Cavalcanti: depoimento [nov. 2009] . Entrevistador: André Luiz Maranhão de Souza Leão. Casa Nova/BA, 2009. 1 arquivo digital de áudio wave (71 min.). Entrevista concedida para os projetos de pesquisa “Para uma identificação dos valores humanos de uma cultura de consumo do vinho do Vale do São Francisco: uma proposta de abordagem de mercado para um setor em crescimento” (CNPq) e “Em busca de identificação dos valores humanos de uma cultura de consumo do vinho do Vale do São Francisco: uma proposta de análise do mercado consumidor para um setor em crescimento” (FACEPE).), enóloga da Vinícola Ouro Verde (Miolo Wine Group); José Gualberto Almeida (ALMEIDA, 2009ALMEIDA, J. G. José Gualberto Almeida: depoimento [dez. 2009]. Entrevistador: André Luiz Maranhão de Souza Leão. Recife/PE, 2009. 1 arquivo digital de áudio Wave (38 min). Entrevista concedida para os projetos de pesquisa “Para uma Identificação dos Valores Humanos de uma Cultura de Consumo do Vinho do Vale do São Francisco: Uma Proposta de Abordagem de Mercado para um Setor em Crescimento” (CNPq) e “Em Busca de Identificação dos Valores Humanos de uma Cultura de Consumo do Vinho do Vale do São Francisco: Uma Proposta de Análise do Mercado Consumidor para um Setor em Crescimento” (FACEPE).), proprietário da Vinícola do Vale do São Francisco (Botticelli); Izanete Bianchetti Tedesco (TEDESCO, 2009TEDESCO, I. B. Izanete Bianchetti Tedesco: depoimento [nov. 2009]. Entrevistador: André Luiz Maranhão de Souza Leão. Lagoa Grande/PE, 2009. 1 arquivo digital de áudio Wave (63 min.). Entrevista concedida para os projetos de pesquisa “Para uma identificação dos valores humanos de uma cultura de consumo do vinho do Vale do São Francisco: uma proposta de abordagem de mercado para um setor em crescimento” (CNPq) e “Em busca de identificação dos valores humanos de uma cultura de consumo do vinho do Vale do São Francisco: uma proposta de análise do mercado consumidor para um setor em crescimento” (FACEPE).), enóloga e proprietária da Vinícola Bianchetti; João Santos (SANTOS, 2009SANTOS, J. João Santos: depoimento [nov. 2009]. Entrevistador: André Luiz Maranhão de Souza Leão. Lagoa Grande/PE, 2009. 1 arquivo digital de áudio Wave (90 min.). Entrevista concedida para os projetos de pesquisa “Para uma identificação dos valores humanos de uma cultura de consumo do vinho do Vale do São Francisco: uma proposta de abordagem de mercado para um setor em crescimento” (CNPq) e “Em busca de identificação dos valores humanos de uma cultura de consumo do vinho do Vale do São Francisco: uma proposta de análise do mercado consumidor para um setor em crescimento” (FACEPE).), diretor técnico da Vitivinícola Santa Maria (Vinibrasil); Mábio Dutra (DUTRA, 2009DUTRA, M. Mábio Dutra: depoimento [nov. 2009]. Entrevistador: André Luiz Maranhão de Souza Leão. Lagoa Grande/PE, 2009. 1 arquivo digital de áudio Wave (44 min.). Entrevista concedida para os projetos de pesquisa “Para uma identificação dos valores humanos de uma cultura de consumo do vinho do Vale do São Francisco: uma proposta de abordagem de mercado para um setor em crescimento” (CNPq) e “Em busca de identificação dos valores humanos de uma cultura de consumo do vinho do Vale do São Francisco: uma proposta de análise do mercado consumidor para um setor em crescimento” (FACEPE).), enólogo e gerente geral Vitivinícola Lagoa Grande (Garziera)2 2 . Destacamos que os trechos das entrevistas a serem apresentados posteriormente no decorrer deste artigo não terão a indicação dos entrevistados, uma vez que, por questões éticas, um compromisso quanto à preservação da identidade de cada um deles em relação a suas falas foi assumido quando da realização da pesquisa. .

Tal corpus de pesquisa foi construído por meio de entrevistas individuais semiestruturadas, orientadas por um roteiro de entrevista que abordou aspectos mais gerais sobre o consumo e os consumidores de vinho e sobre o arranjo produtivo da vitivinicultura do Vale do São Francisco e das ações da própria vinícola. Tal abordagem permitiu ao pesquisador obter dos entrevistados informações que vão além daquelas possivelmente obtidas com a aplicação de simples questionários ou formulários. As entrevistas semiestruturadas conferem maior liberdade para entrevistador e entrevistado, contribuindo para o surgimento de informações mais específicas e detalhadas, levando ao enriquecimento do estudo (BAUER; GASKELL, 2005BAUER, M. W.; GASKELL, G. Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som. 5. ed. Petrópolis: Vozes, 2005.). Dessa forma, partindo das entrevistas realizadas com os cinco agentes, pudemos identificar outros agentes relacionados à rede objeto deste estudo e entender como eles são enxergados pelos entrevistados.

No que compete à análise dos dados, a interpretação se deu por meio do uso da técnica de análise de discurso, que pode ser definida como uma leitura cuidadosa que vai além do texto, procurando entender também o contexto em questão, para examinar o conteúdo, a organização e as funções do discurso. Para realizar tal análise foi utilizado o software de apoio à pesquisa Nvivo 8, que auxiliou na organização, no gerenciamento e na codificação dos dados analisados (BAUER; GASKELL, 2005BAUER, M. W.; GASKELL, G. Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som. 5. ed. Petrópolis: Vozes, 2005.).

É imprescindível ressaltar o papel desempenhado pela teoria no desenvolvimento do presente estudo. Assumindo um caráter indutivo e uma lógica de “modelo de construto”, a teoria bourdieusiana forneceu as bases conceituais para a realização da análise de categorias específicas presentes na mesma. Tendo em vista a existência de um método bourdieusiano, julgamos importante, no entanto, destacar que tal método não foi adotado no decorrer desta pesquisa. Sendo assim, podemos afirmar que a teoria do habitus de Pierre Bourdieu foi utilizada em uma perspectiva de “teoria geral” (LEÃO; MELLO; VIEIRA, 2009LEÃO, A. L. M. S.; MELLO, S. C. B.; VIEIRA, R. S. G. O papel da teoria no método de pesquisa em administração. Organizações em contexto, São Bernardo do Campo, v. 5, n. 10, p. 1-16, jul./dez. 2009.).

Nesse sentido, nossa análise debruçou-se, primeiramente, sobre a identificação dos agentes da rede e do uso de seus capitais, propiciando-nos, na sequência, uma análise de suas disposições subjetivas. É preciso ressaltar que o hexis não pôde ser analisado na presente pesquisa. Tal limitação se deu em razão da natureza da coleta de dados, pautada exclusivamente por entrevistas em profundidade, o que não possibilitou a coleta de dados referentes aos princípios interiorizados pelo corpo relativos ao habitus de cada um dos agentes entrevistados.

6 RESULTADOS

Tendo em vista que a proposta deste artigo é a caracterização das disposições subjetivas que orientam a dinâmica de inter(ação) dos produtores vitivinícolas da região do Vale do São Francisco, nossos esforços se concentraram na identificação de aspectos relativos ao habitus (ethos e eidos) dos agentes da rede, bem como na verificação das relações entre tais agentes por meio de seus capitais.

6.1 Agentes e capitais

Inicialmente, a análise do corpus partiu da identificação dos agentes que compunham a rede vitivinícola do Vale do São Francisco, e também os agentes externos a ela, mas que mantinham algum tipo de relação e exerciam alguma influência sobre a rede. Internamente, os agentes encontrados foram as seis empresas produtoras e a Vinhovasf, associação formada pelos produtores (agentes institucionais), e os gestores e especialistas de cada uma das vinícolas (agentes individuais). Nesse ponto, é importante destacar a quantidade reduzida de vinícolas na região, se comparada com outras regiões vinícolas do país, o que pode ser um dos motivos de algumas dificuldades enfrentadas pelas empresas do Vale do São Francisco.

Quanto aos agentes externos à rede, identificaram-se a Embrapa, os investidores estrangeiros, os especialistas, os consumidores, os concorrentes e, por fim, os governos dos Estados de Pernambuco e Bahia e o governo nacional. Os entrevistados deixaram transparecer sua insatisfação com a postura do Governo Federal em relação à rede vitivinícola, que recebe poucos incentivos e sofre com a alta carga tributária, ao passo que, em nível estadual, a rede recebe apoio mais efetivo dos governos. No caso específico dos concorrentes, se faz necessário chamar a atenção para o fato de que eles foram tratados de maneiras diferentes durante as entrevistas, ora fazendo-se referência a um grupo mais amplo de produtores (europeus, chilenos, argentinos, gaúchos, por exemplo), ora a concorrentes específicos (Salton, Carreteiro).

Por meio da análise foi possível perceber que as relações de poder dentro da rede virivinícola se pautavam pelos capitais econômico e simbólico de cada uma das empresas. As empresas com maior lastro financeiro parecem se sobressair em relação às outras, investindo em tecnologia, no aumento do volume de produção e na divulgação. Um aspecto que parece ser relevante, contudo, é a importância que a tradição e o reconhecimento das vinícolas têm para a conquista de espaço no mercado, fator que pesa em favor das vinícolas da região Sul do país. A pouca tradição da região do Vale do São Francisco na produção de vinhos finos acaba dificultando o crescimento e o reconhecimento da rede. Isso fica claro na passagem em que um dos entrevistados afirma que:

[...] competitividade de preço aqui a gente tem alguns dos melhores custos-benefícios do país. A gente tem um vinho reserva, um vinho que passa por barrica e vai pra o mercado, aqui por dezesseis reais. Enquanto que tu pegas um reserva lá do Sul que tá aí na casa de uns vinte e cinco, vinte e poucos. Tem um espumante que vai pra o mercado por dezenove reais, enquanto que no Sul a gente tem a maioria que vai por, no mínimo, vinte e cinco ou tem espumante que vai por cinquenta e cinco reais. (E1; P.15; L.39-44).3 3 . Após cada trecho, códigos entre parênteses identificam as citações. O código E indica a entrevista na ordem de sua realização; P indica a página e L a linha da transcrição da mesma. Exemplo: “E3; P.4; L.16-20” quer dizer que o trecho foi extraído da 3ª. entrevista, à página 4, entre as linhas 16 e 20 de sua transcrição.

Ainda em relação ao capital simbólico presente na rede, é possível perceber questões relacionadas à distinção de algumas empresas em razões de premiações recebidas por seus vinhos em concursos, como fica evidente nas palavras de um dos entrevistados que diz que:

[...] fizemos um investimento muito forte em pesquisa, temos nossas vinhas já plantadas, temos nosso produto no mercado e desde 2003 temos ganho prêmios nacionais e internacionais, somos a maior exportadora de vinhos do Brasil, né? Conseguimos exportar pra cerca de vinte países. (E4; P.10; L.2-5).

Quanto aos demais capitais, podemos afirmar que o alto capital cultural é uma característica presente em todos os agentes, o que pode ser explicado pelo campo de atuação em que estão inseridos. A produção de vinhos finos requer um vasto conhecimento específico com relação às peculiaridades das atividades, o que inclui não só aspectos técnicos do processo de produção e consumo da bebida, mas também conhecimento de mercado. Tal aspecto fica expresso no trecho abaixo, retirado de uma das entrevistas, em que o respondente demonstra conhecer especificidades técnicas da vitivinicultura:

[...] pros vinhos mais ricos em aromas, primários e secundários: pros primários as características da própria uva; pros brancos vêm aí algumas características aromáticas florais, frutadas; já pros tintos, nada de deixar macerar muito tempo, porque senão cai naquela de extrair muito tanino, então, buscando ainda pros vinhos tintos, um vinho mais jovem. (E1; P.7; L.33-37).

Já o capital social na rede pode ser identificado na tentativa de articulação interna por parte das vinícolas. A Vinhovasf, associação dos produtores do Vale do São Francisco, é a expressão concreta dessa busca pelo fortalecimento dos produtores como um grupo coeso. Tal elemento é percebido na entrevista de um dos agentes quando este afirma que:

[...] o Vinhovasf, até o momento, o que a gente tem feito nas parcerias é participar de feiras, dos eventos, sempre no conjunto. Então (...) é colocado um stand onde entram todas as vinícolas dentro do Vinhovasf. Que é até uma forma de redução de custos, aquela coisa toda, porque individualmente é muito caro. (E3; P.4; L.14-17).

Apesar do discurso positivo, no entanto, é possível perceber que ainda há dificuldades na condução de ações coletivas, explicitada pela menor participação de alguns agentes na associação, e pela dificuldade enfrentada pelas empresas em relação à definição da tipicidade dos vinhos do Vale, ação que, para alguns dos agentes entrevistados, seria crucial para o fortalecimento da vitivinicultura da região.

O capital social presente na rede pode ser analisado também na perspectiva da relação entre a rede e os agentes externos a ela. Nesse sentido, o principal aspecto evidenciado pelos entrevistados foi a necessidade de uma articulação mais forte junto ao governo nacional, a fim de reivindicar o apoio dele, que se daria principalmente por meio da redução da carga tributária sobre a produção e a comercialização do vinho no país, como podemos perceber na afirmação de que:

[...] nós temos tido também, e isso precisa ser dito, uma relação muito boa com o Governo de Pernambuco, que tem tido essa compreensão, tem adotado políticas de estado, ao longo dos últimos anos, em especial neste governo, aonde ele compreendeu e tá tentando diminuir essa carga tributária no que lhe compete. (E2; P.2; L.7-11).

6.2 As disposições e o habitus na interação entre os agentes

Com relação especificamente às disposições da rede, as entrevistas foram analisadas buscando os elementos que compõem o habitus que orienta as ações das empresas do Vale.

No que compete ao ethos, foi possível perceber no raciocínio dos agentes a importância da construção de uma identidade vitivinícola do Vale do São Francisco, capaz de ser alcançada por meio da valorização das características dos vinhos jovens e varietais ali produzidos, apontando, portanto, para a necessidade de tipificar o vinho da região. De maneira geral, os agentes demonstram uma preocupação com a construção dessa tipicidade, como podemos acompanhar na passagem de um dos proprietários de vinícola, quando afirma que “é importante tipificar o vinho e nós estamos trabalhando pra fazer vinhos típicos do São Francisco” (E2; P.2; L.21-22).

O entendimento de que o investimento em pesquisa é importante para a evolução dos vinhos produzidos no Vale do São Francisco foi outro elemento do ethos que se destacou. Essa valorização da pesquisa pode ser percebida na fala de um dos agentes, segundo o qual:

[...] tem que continuar com a pesquisa, sempre aprofundando, porque a pesquisa não pode parar: em produção de novos cultivares, elaboração de novos produtos, não podemos parar. O homem, ele não para as suas pesquisas em nada, não deve parar, porque se parar, fica pra trás. (E2; P.10; L.3-6).

Também chamou atenção nas entrevistas a luta contra os preconceitos sofridos pelo vinho do Nordeste do país, situação pontuada por um dos agentes quando ressalta: “Mas existe um preconceito sim, até mesmo do pessoal lá da região Sul, de um modo geral. Quando fala que o Nordeste produz vinho, já fica... ‘ih, nunca vão fazer tão bem’...” (E1; P.12; L.16-18). É importante observar que, como forma de reagir a esse preconceito, atitudes de autoafirmação surgem por parte de algumas empresas que se propõem fabricar vinhos que fogem às características naturais da região motivadas pela necessidade de demonstrar o potencial de produção do Vale. Essa questão se apresenta na fala de um agente:

Então, ao tentar imitar vinhos de outras regiões, eu acho que nós nos perdemos. Em resumo, eu acho que o vinho do São Francisco não deve privilegiar o uso de madeira, não deve. É o que nós fazemos. Nós vamos fazer agora com madeira pra provar que nós podemos fazer [...]. (E2; P.6; L.38-41).

Nessa passagem fica evidente a necessidade de autoafirmação das vinícolas do Vale perante os demais produtores de vinhos; uma tentativa, portanto, de conquistar o respeito de concorrentes e consumidores.

Por fim, outro aspecto que chamou a atenção foi o fato de que, em geral, os entrevistados afirmam não haver concorrência interna entre as empresas do Vale. Para todos os informantes da pesquisa, as empresas que constituem a rede do Vale do São Francisco precisam trabalhar em conjunto, de modo a fortalecer a região como um todo. Essa política de “boa vizinhança” fica evidente quando um dos agentes afirma que “aqui a gente ainda não tem muito isso, essa questão dessa concorrência direta por mercado. O que eu tô observando daqui é que a gente tá tentando sempre se ajudar, sabe?” (E1; P.16/17; L.45/1-2).

Em se tratando do eidos da rede vitivinícola, ele é formado por crenças relacionadas ao grande potencial da região do Vale do São Francisco para a produção de vinhos finos jovens. Tal convicção é percebida no discurso de um dos agentes:

A empresa espanhola, que tem parceria conosco, olhou pro Vale do São Francisco com outros olhos também, e escolheu, dentre as unidades da Miolo, a Miolo do Vale do São Francisco pra trabalhar. Então é porque tem potencial. Ninguém investe por acaso e ninguém dá tiro no escuro, principalmente o pessoal que tá com visão de crescimento. Aí tem que buscar algo que tenha... que seja um diferencial. Aqui é um diferencial. (E1; P.22; L.15-20)

Os agentes revelaram, ainda, que acreditam no grande potencial do mercado consumidor de vinhos finos brasileiros, crença que se percebe na fala de um dos produtores entrevistados: “a gente tem um baita mercado em potencial e que... Quando o brasileiro começar a tomar o seu próprio vinho, vai faltar vinho no mercado” (E1; P.3; L.12-14). Os produtores acreditam, no entanto, que a concretização desse mercado em potencial se dará somente quando houver uma popularização do consumo de vinhos, questão essa que passa diretamente pela redução dos impostos que hoje incidem sobre a fabricação do produto e dificultam o crescimento do setor em todo o país.

Manifestou-se também nos entrevistados a crença de que a produção de vinhos favorece o desenvolvimento social e cultural de uma região, tornando consensual entre os agentes a importância que tem a presença da rede vitivinícola para o crescimento do Vale do São Francisco. Essa percepção dos benefícios que a produção do vinho pode trazer para a região fica evidente nas palavras de um entrevistado ao expressar que “temos aqui um projeto que pode criar uma sustentabilidade, não à volta do vinho, mas à volta do turismo, à volta do desenvolvimento da região” (E4; P.1; L.19-21).

Para além dos aspectos constituintes do habitus, a análise também se dedicou a questões voltadas para as relações de poder existentes entre os agentes internos e externos à rede. Como foi citado anteriormente, o capital econômico é decisivo nas relações de poder que se estabelecem entre as vinícolas do Vale. As empresas com maior lastro financeiro parecem se sobressair em relação às outras, destaque que se faz notar na fala de um dos respondentes da pesquisa, que afirma: “duas empresas que eu falo aqui no Vale, que têm um baita potencial: a Rio Sol, que é ViniBrasil, e a Miolo Terranova são hoje, pra mim, os vinhos que estão conseguindo um melhor destaque aqui, representando o Vale”. (E1; P.8; L.9-11).

Além disto, percebemos que a formatação do Instituto dos Vinhos do Vale do São Francisco - Vinhovasf - expressa relações de poder entre os gestores das empresas, uns mais influentes que outros. O presidente do Instituto, gestor de uma das vinícolas, deixa transparecer em sua entrevista as diferenças de poder e influência que se dão dentro da estrutura do Vinhovasf. Algumas empresas possuem maior força em detrimento das demais, ao passo que outras ainda não participam efetivamente das articulações do Instituto, caracterizando uma hierarquia institucional, como podemos acompanhar no trecho abaixo:

Existe o Instituto do Vinho, exatamente. Eu sou o presidente do Instituto do Vinho, o João Santos, da Vinibrasil, é o vice-presidente, nós temos uma participação muito grande de Izanete Biachetti, de Mábio Dutra, que representam as outras vinícolas, parte das outras vinícolas. Nós estamos estimulando que as outras vinícolas, não essas citadas, participem mais ativamente, como a Terra Nova, que é da Bahia, como a Ducos, que é de um grupo europeu. (E2; P.7; L. 15-19).

Fora da rede, fica evidente que o poder do Estado, ao estabelecer uma alta tarifação em cima da produção de vinhos, termina por praticar uma violência simbólica sobre os produtores vitivinícolas da região, situação que também recai sobre os concorrentes nacionais da rede do Vale. Ao conceder uma tributação inferior aos vinhos importados do Mercosul e definir uma tarifação maior sobre os produtos nacionais, o Estado acaba por privilegiar os vinhos chilenos e argentinos, por exemplo. Em contrapartida, a entrada de alguns outros produtos nacionais no mercado de nossos vizinhos sul-americanos, como eletrodomésticos, é privilegiada em detrimento de outros produtos, como o vinho. De outra maneira, as regiões brasileiras e estrangeiras com maior tradição na produção de vinhos - e, portanto, detentoras de um maior poder no mercado - acabam por exercer violência simbólica ao desmerecer o vinho nordestino, tornando alvo de preconceito a rede do Vale do São Francisco, como deixa transparecer a fala de um dos agentes entrevistados: “A gente recebe aqui alguns donos de restaurante de várias regiões do país, alguns sommeliers também de várias regiões, e a gente sente um certo preconceito com os vinhos do Nordeste” (E1; P.2; L.25-27). Em contrapartida, os agentes integrantes da rede vitivinícola do Vale também praticam a violência simbólica quando menosprezam os vinhos suaves e coquetéis produzidos na região, tratados como bebidas inferiores. Essa constatação aparece de maneira explicita quando o mesmo agente há pouco citado afirma que “a gente não produz vinho suave. A gente só produz vinho seco e fino. De vinífera, né? Nada de fazer vinho comum” (E1; P.2; L.16-17).

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao término da análise das entrevistas e partindo do contexto em que a rede vitivinícola do Vale do São Francisco está inserida, pudemos perceber que seus agentes ainda procuram se consolidar e se afirmar entre si e perante o mercado e a concorrência, percebendo dificuldades oriundas da falta de apoio do Estado em nível nacional e do preconceito que recai sobre a região. Nesse sentido, nossos achados apontam na direção de quatro disposições subjetivas destes agentes, apresentadas a seguir.

No âmbito interno, é clara a busca por uma unidade no discurso dos agentes, que acreditam na vocação da região para a produção de “vinhos jovens” e no valor comercial das características de seus produtos (eidos). As vinícolas acabam por assumir uma postura contraditória, no entanto, ao tentarem fabricar “vinhos de guarda”, motivadas pela necessidade de conquistar o reconhecimento do mercado vitivinícola (ethos). Esse tipo de contradição acaba por enfraquecer o discurso difundido entre os produtores quanto à importância da valorização da tipicidade dos vinhos da região (ethos).

Merece destaque também a afirmação dos agentes de que as empresas da região não são concorrentes (ethos). Essa postura de “boa vizinhança” explicita o discurso dos entrevistados em defesa do crescimento da rede como um todo, ou seja, há uma percepção de que o desenvolvimento do conjunto implicará o crescimento individual de cada vinícola. Cabe aqui nos questionarmos até que ponto esse raciocínio se concretiza, pois parece haver ainda um descompasso entre o plano do discurso e o da ação. Nesse sentido, ganha destaque a disparidade que se estabelece entre as duas vinícolas de maior lastro econômico e estrutural e as demais empresas, de menor porte e capacidade econômica, instaladas na mesma região. As duas primeiras parecem estar mais alinhadas quanto a objetivos e estratégias, o que contribui para acentuar ainda mais o distanciamento em relação às outras integrantes da rede (capital social). A falta de alinhamento entre as vinícolas está presente também no discurso acerca da configuração do Vinhovasf, associação de produtores que, a despeito das boas intenções, ainda não parece atuar efetivamente como elemento agregador da rede. O Instituto, portanto, parece marcado por relações de poder institucionalizadas.

Pudemos perceber também que há, por parte dos produtores, uma crença no papel da rede para o desenvolvimento local. Isso fica evidente no reconhecimento da importância de investimentos em pesquisas voltadas para a melhoria da qualidade dos vinhos produzidos no Vale (ethos), assim como uma convicção sobre a relevância da atividade vinícola para o desenvolvimento econômico da região como um todo (eidos).

Quanto às relações de poder entre os agentes, ficam explícitas algumas tensões, expressas por meio de violências simbólicas, tanto sofridas como praticadas pelos agentes que compõem a rede do Vale, às quais nos referimos como percepção e reprodução de desfavorecimentos e preconceitos. As vinícolas sofrem de violência simbólica frente às políticas tributárias desfavoráveis praticadas pelo Governo Federal e diante da atitude dos concorrentes que desmerecem os vinhos do Vale e menosprezam o potencial produtivo da região. Em contrapartida, os produtores da rede praticam violência simbólica quando assumem uma postura negativa em relação aos vinhos menos elaborados da concorrência local, tratados por eles como bebidas de qualidade inferior.

Por fim, é preciso reiterar que o presente artigo teve como proposta analisar as disposições dos agentes que compõem a rede do Vale do São Francisco; portanto, não foram exploradas de maneira aprofundada questões relacionadas às características do campo e às posições da rede. Podemos vislumbrar, então, a oportunidade para a realização de um estudo mais completo que contemple e discuta de modo mais detalhado todos os aspectos que envolvem a rede. Sugerimos ainda a realização de estudos que abordem o contexto desse arranjo por meio da perspectiva de outros agentes vinculados a ele, como o Estado, as instituições de apoio, os concorrentes e os consumidores.

REFERÊNCIAS

  • ALBAGLI, S.; MACIEL, M. L. Capital social e empreendedorismo local: rede de pesquisa em sistemas produtivos e inovativos locais. Rio de Janeiro: Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2002.
  • ALMEIDA, J. G. José Gualberto Almeida: depoimento [dez. 2009]. Entrevistador: André Luiz Maranhão de Souza Leão. Recife/PE, 2009. 1 arquivo digital de áudio Wave (38 min). Entrevista concedida para os projetos de pesquisa “Para uma Identificação dos Valores Humanos de uma Cultura de Consumo do Vinho do Vale do São Francisco: Uma Proposta de Abordagem de Mercado para um Setor em Crescimento” (CNPq) e “Em Busca de Identificação dos Valores Humanos de uma Cultura de Consumo do Vinho do Vale do São Francisco: Uma Proposta de Análise do Mercado Consumidor para um Setor em Crescimento” (FACEPE).
  • ARAÚJO, F. M. B., ALVES, E. M.; CRUZ, M. P. Algumas reflexões em torno dos conceitos de campo e de habitus na obra de Pierre Bourdieu. Perspectivas da Ciência e Tecnologia, Rio de Janeiro, v.1, n.1, p.31-40, jan./jun. 2009.
  • BAUER, M. W.; GASKELL, G. Pesquisa qualitativa com texto, imagem e som. 5. ed. Petrópolis: Vozes, 2005.
  • BENKO, G. Economia, espaço e globalização na aurora do século XXI. 2. ed. São Paulo: Hucitec, 1999.
  • BOURDIEU, P. A distinção: crítica social do julgamento. São Paulo: Edusp; Porto Alegre: Zouk, 2007b.
  • BOURDIEU, P. Meditações pascalianas. 2. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2007a.
  • BOURDIEU, P. A miséria do mundo. Petrópolis: Vozes , 2001.
  • BOURDIEU, P. O poder simbólico. 13. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil , 2010.
  • BOURDIEU, P. O senso prático. Petrópolis: Vozes , 2009.
  • CASTELLS, M. A sociedade em rede. 6. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2007.
  • CASTILHOS, R. B. Subindo o morro: consumo, posição social e distinção entre famílias de classes populares. 2007. 204 f. Dissertação (Mestrado em Administração)-Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre. 2007.
  • CAVALCANTI, F. H. Flávia Helena Cavalcanti: depoimento [nov. 2009] . Entrevistador: André Luiz Maranhão de Souza Leão. Casa Nova/BA, 2009. 1 arquivo digital de áudio wave (71 min.). Entrevista concedida para os projetos de pesquisa “Para uma identificação dos valores humanos de uma cultura de consumo do vinho do Vale do São Francisco: uma proposta de abordagem de mercado para um setor em crescimento” (CNPq) e “Em busca de identificação dos valores humanos de uma cultura de consumo do vinho do Vale do São Francisco: uma proposta de análise do mercado consumidor para um setor em crescimento” (FACEPE).
  • CEZARINO, L. O.; CAMPOMAR, M. C. Vantagem competitiva para micro, pequenas e médias empresas: clusters e APLs. E&G - Economia e Gestão, Belo Horizonte, v. 6, n. 12, p. 143-158, jun. 2006.
  • CHALITA, M. A. N. Produção do habitus empresarial na citricultura paulista. Revista de Economia Agrícola, São Paulo, v. 55, n. 1, p. 41-61, jan./jun. 2008.
  • COSTA, A. B.; COSTA, B. M. Cooperação e capital social em arranjos produtivos locais. RDE - Revista de Desenvolvimento Econômico, Salvador, v. 9, n. 15, p. 51-60, jan. 2007.
  • DENZIN, N. K.; LINCOLN, Y. S. (Ed.). Paradigmatic controversies, contradictions, and emerging confluences. In: DENZIN, N. K.; LINCOLN, Y. S. The sage handbook of qualitative research. 3rd ed. Thousand Oaks: Sage Publications, 2005. p.191-215.
  • DUTRA, M. Mábio Dutra: depoimento [nov. 2009]. Entrevistador: André Luiz Maranhão de Souza Leão. Lagoa Grande/PE, 2009. 1 arquivo digital de áudio Wave (44 min.). Entrevista concedida para os projetos de pesquisa “Para uma identificação dos valores humanos de uma cultura de consumo do vinho do Vale do São Francisco: uma proposta de abordagem de mercado para um setor em crescimento” (CNPq) e “Em busca de identificação dos valores humanos de uma cultura de consumo do vinho do Vale do São Francisco: uma proposta de análise do mercado consumidor para um setor em crescimento” (FACEPE).
  • GUERRA, C. C. et al. Conhecendo o essencial sobre uvas e vinhos. Bento Gonçalves: Embrapa Uva e Vinho, 2009.
  • HENRIQUE, A. L. S. O paradigma do silêncio ou a racionalização como absoluto. Holos, Natal, v. 3, p. 57-65, dez. 2005.
  • LAHIRE, B. Reprodução ou prolongamentos críticos? Educação & Sociedade, Campinas, v. 23, n. 78, p. 37-55, abr. 2002.
  • LASTRES, H. M. M.; CASSIOLATO, J. E. Novas políticas na era do conhecimento: o foco em arranjos produtivos e inovativos locais. Parcerias Estratégicas, Brasília, v. 8, n. 17, p. 05-30, set. 2003a.
  • LASTRES, H. M. M.; CASSIOLATO, J. E. (Coord.). Glossário de arranjos e sistemas produtivos e inovativos locais. Rio de Janeiro: UFRJ-Rede de Pesquisa em Sistemas Produtivos e Inovativos Locais, 2003b (Arranjos produtivos locais: uma nova estratégia de ação para o Sebrae).
  • LEÃO, A. L. M. S.; MELLO, S. C. B.; VIEIRA, R. S. G. O papel da teoria no método de pesquisa em administração. Organizações em contexto, São Bernardo do Campo, v. 5, n. 10, p. 1-16, jul./dez. 2009.
  • LIMA, R. C.; SAMPAIO, Y.; SAMPAIO, G. R.; AIRES, A. Perfil econômico e cenários de desenvolvimento para a cadeia produtiva de vinho e uva. Recife: Secretaria de Planejamento do Estado de Pernambuco, 2005.
  • MACHADO-DA-SILVA, C. L.; COSER, C. Rede de relações interorganizacionais no campo organizacional de Videira-SC. RAC - Revista de Administração Contemporânea, Rio de Janeiro, v.10, n.4, p. 9-45, out./dez., 2006.
  • MARTELETO, R. M. Análise de redes sociais: aplicação nos estudos de transferência da informação. Ci. Inf., Brasília, v. 30, n. 1, p. 71-81, jan./abr. 2001
  • MARTELETO, R. M. Redes sociais, mediação e apropriação de informações: situando campos, objetos e conceitos na pesquisa em ciência da informação. Pesq. Bras. Ci. Inf., Brasília, v.3, n.1, p.27-46, jan./dez. 2010.
  • MARTELETO, R. M.; SILVA, A. B. O. Redes e capital social: o enfoque da informação para o desenvolvimento local. Ci. Inf., Brasília, v. 33, n. 3, p.41-49, set./dez. 2004.
  • OLIVEIRA, F. S. O habitus no lugar e o lugar da Tijuca. 2001. 142 f. Dissertação (Mestrado em Administração)-Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2001.
  • PASSOS, F. H.; DIAS, C. C.; CRUZ, R. C. Capital social, competências e demandas tecnológicas de arranjos produtivos locais: o caso do APL de sisal em Valente, Bahia. E&G - Economia e Gestão, Belo Horizonte, v. 5, n. 10, p. 92-112, ago. 2005.
  • SANTOS, B. S. Um discurso sobre a ciência. São Paulo: Cortez, 2006.
  • SANTOS, J. João Santos: depoimento [nov. 2009]. Entrevistador: André Luiz Maranhão de Souza Leão. Lagoa Grande/PE, 2009. 1 arquivo digital de áudio Wave (90 min.). Entrevista concedida para os projetos de pesquisa “Para uma identificação dos valores humanos de uma cultura de consumo do vinho do Vale do São Francisco: uma proposta de abordagem de mercado para um setor em crescimento” (CNPq) e “Em busca de identificação dos valores humanos de uma cultura de consumo do vinho do Vale do São Francisco: uma proposta de análise do mercado consumidor para um setor em crescimento” (FACEPE).
  • SANTOS, P. S. M. B. A aplicabilidade dos conceitos bourdieusianos de habitus e campo em uma pesquisa na área da história da educação. Dialogia, São Paulo, v.6, p. 49-54, 2007.
  • SANTOS, G. A. G.; DINIZ, E. J.; BARBOSA, E. K.. Aglomerações, arranjos produtivos locais e vantagens competitivas locacionais. In: BANCO NACIONAL DO DESENVOLVIMENTO. Arranjos produtivos locais e desenvolvimento. Rio de Janeiro: BNDES, 2004.
  • SCOTT, J. 50 grandes sociólogos contemporâneos. São Paulo: Contexto, 2009.
  • SETTON, M. G. J. A teoria do habitus em Pierre Bourdieu: uma leitura contemporânea. Revista Brasileira de Educação, São Paulo, n. 20, p. 60-70, maio/ago. 2002.
  • SGARBI, V. S. et al. Inovação e competitividade sistêmica: influências percebidas no APL de tecnologia da informação e comunicação de Recife - porto digital. In: SIMPÓSIO DE GESTÃO DA INOVAÇÃO TECNOLÓGICA, 26., 2010, Vitória. Anais eletrônicos... Vitória: ANPAD, 2010. Disponível em: <Disponível em: http://www.anpad.org.br/evento.php?acao=trabalho&cod_edicao_subsecao=640&cod_evento_edicao=55&cod_edicao_trabalho=12571 >. Acesso em: 21 jan. 2010.
    » http://www.anpad.org.br/evento.php?acao=trabalho&cod_edicao_subsecao=640&cod_evento_edicao=55&cod_edicao_trabalho=12571
  • SWEDBERG, R. Sociologia econômica: hoje e amanhã. Tempo Soc., São Paulo, v. 16, n. 2, p. 7-34, nov. 2004.
  • TEDESCO, I. B. Izanete Bianchetti Tedesco: depoimento [nov. 2009]. Entrevistador: André Luiz Maranhão de Souza Leão. Lagoa Grande/PE, 2009. 1 arquivo digital de áudio Wave (63 min.). Entrevista concedida para os projetos de pesquisa “Para uma identificação dos valores humanos de uma cultura de consumo do vinho do Vale do São Francisco: uma proposta de abordagem de mercado para um setor em crescimento” (CNPq) e “Em busca de identificação dos valores humanos de uma cultura de consumo do vinho do Vale do São Francisco: uma proposta de análise do mercado consumidor para um setor em crescimento” (FACEPE).
  • TEIXEIRA, K. H. et al. Território, cooperação e inovação: um estudo sobre o arranjo produtivo pingo d’água. Rev. Econ. Sociol. Rural, Rio de Janeiro, v. 44, n.3, p. 573-594, jul./set. 2006.
  • THIRY-CHERQUES, H. R. Pierre Bourdieu: a teoria na prática. RAP - Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 40, n.1, p.27-53, jan./fev. 2006.
  • THIRY-CHERQUES, H. R. Métodos estruturalistas: pesquisa em ciências de gestão. São Paulo: Atlas, 2008.
  • TOMAÉL, M. I.; ALCARÁ, A. R.; DI CHIARA, I. G. Das redes sociais à inovação. Ci. Inf., Brasília, v. 34, n. 2, p. 93-104, maio/ago. 2005.
  • VITAL, T. W.; MORAES FILHO, R. A.; FERRAZ FILHO, Z. E. Vitivinicultura no Nordeste do Brasil: um arranjo produtivo em expansão. Brasília: Sober, 2005.
  • WACQUANT, L. Pierre Bourdieu. In: STONES, Rob. Key contemporary thinkers. London: Macmillan, 2006, p. 261-278.
  • WACQUANT, L. Esclarecer o habitus. Educação & Linguagem, São Paulo, v. 10, n. 16, p. 63-71, jul./dez, 2007.
  • WERTHEIN, J. A sociedade da informação e seus desafios. Ci. Inf., Brasília, v. 29, n. 2, p. 71-77, maio/ago. 2000.

NOTAS

  • 1
    . Para além de uma escolha teórica, o pensamento de Bourdieu foi utilizado como referência acerca do papel do pesquisador no fazer ciência (BOURDIEU, 2001BOURDIEU, P. A miséria do mundo. Petrópolis: Vozes , 2001.). Tal escolha se reflete na própria redação deste trabalho, uma vez que, por questões axiológicas, optamos por assumir uma redação na 3ª pessoa do plural, nos posicionando no texto. Nesse sentido, em consonância com Bourdieu, Boaventura de Souza Santos afirma que “o cientista social não pode libertar-se, no ato da observação, dos valores que informam a sua prática em geral e, portanto, também a sua prática de cientista” (SANTOS, 2006SANTOS, B. S. Um discurso sobre a ciência. São Paulo: Cortez, 2006., p. 36).
  • 2
    . Destacamos que os trechos das entrevistas a serem apresentados posteriormente no decorrer deste artigo não terão a indicação dos entrevistados, uma vez que, por questões éticas, um compromisso quanto à preservação da identidade de cada um deles em relação a suas falas foi assumido quando da realização da pesquisa.
  • 3
    . Após cada trecho, códigos entre parênteses identificam as citações. O código E indica a entrevista na ordem de sua realização; P indica a página e L a linha da transcrição da mesma. Exemplo: “E3; P.4; L.16-20” quer dizer que o trecho foi extraído da 3ª. entrevista, à página 4, entre as linhas 16 e 20 de sua transcrição.
  • Processo de Avaliação: Double Blind Review

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2013

Histórico

  • Recebido
    07 Maio 2011
  • Aceito
    19 Mar 2013
Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado, Av. da Liberdade, 532, 01.502-001 , São Paulo, SP, Brasil , (+55 11) 3272-2340 , (+55 11) 3272-2302, (+55 11) 3272-2302 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: rbgn@fecap.br