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Parâmetros de rugosidade aerodinâmica sobre vegetação esparsa em região semi-árida

Aerodynamic roughness parameters over sparse vegetation in a semi-arid region

Resumos

Utilizando observações micrometeorológicas e da estrutura física da vegetação do experimento HAPEX-Sahel foi possível avaliar alguns métodos para determinar o comprimento de rugosidade (z0) e o deslocamento do plano zero (d). Propõe-se também uma alternativa para estimar esses parâmetros em escoamentos atmosféricos sobre vegetação esparsa em região semi-árida. O método proposto combinou o perfil logarítmico do vento com z0 = lambda (h - d), em que, h é a altura da vegetação e lambda depende de sua estrutura física. Valores de lambda foram estimados em função da estrutura física da vegetação ou obtido na literatura. A altura média da vegetação era 2,06 (± 0,47) m. O perfil do vento foi caracterizado por medidas a quatro níveis acima da superfície (3,0; 4,1; 5,3 e 8,5 m), com a velocidade de fricção (u*) determinada por correlações dos turbilhões a 9 m. O método proposto estimou adequadamente a rugosidade aerodinâmica da superfície com lambda = 0,188 e 0,190, determinados pela estrutura da vegetação local, o que não ocorreu para lambda = 0,166, da literatura. Os parâmetros de rugosidade determinados pelos métodos que utilizam u* na solução da lei logarítmica do vento descreveram melhor a rugosidade da superfície. Nos períodos de observações a rugosidade da área foi descrita satisfatoriamente por d = 0,95 m = 0,46 h e z0 = 0,204 m = 0,1 h.

HAPEX-Sahel; deslocamento do plano zero; comprimento de rugosidade; transporte de momentum


Using micrometeorological observations and the physical structure of the vegetation during the HAPEX-Sahel experiment it was possible to evaluate some methods to determine the roughness length (z0) and the zero-plane displacement (d). It is also proposed an alternative to estimate such parameters for the atmospheric flow over sparse vegetation in a semi-arid region. It combines the wind logarithmic profile with z0 = lambda (h - d), where, h is the vegetation height, and lambda is a coefficient determined by the physical structure of the vegetation. Here, lambda values were determined for the site and also taken from the literature. The average vegetation height in the site was 2.06 (± 0.47) m. The wind logarithmic profiles were defined by measurements at four level above the surface (at 3.0, 4.1, 5.3 and 8.5m), and the friction velocity (u*) determined by eddy correlations at 9 m. The proposed method estimated well the surface roughness with lambda = 0.188 and 0.190, both determined by the structure of the vegetation in the site, but failed with lambda = 0.166, the average value of literature. The roughness parameters determined by methods that used u* in the solution of the wind logarithmic law better described the surface roughness. The aerodynamic roughness of the site was described well by d = 0.95 m = 0.46 h and z0 = 0.204 m = 0.1 h.

HAPEX-Sahel; zero-plane displacement; roughness length; momentum transfer


ARTIGOS

Parâmetros de rugosidade aerodinâmica sobre vegetação esparsa em região semi-árida

Aerodynamic roughness parameters over sparse vegetation in a semi-arid region

Gustavo Bastos LyraI; Antonio Roberto PereiraII

IUniversidade Federal de Alagoas, Instituto de Ciências Atmosféricas. Cidade Universitária, km 14, Rodovia BR 104, Tabuleiro dos Martins, Maceió, AL, CEP:57072-970. E-mail: gblyra@gmail.com

IIUniversidade de São Paulo, Escola Superior de Agricultura "Luiz de Queiroz", Dep. de Ciências Exatas. Av. Pádua Dias, 11, Piracicaba, SP, Caixa Postal 9, CEP 13418-900. E-mail: arpereir@esalq.usp.br

RESUMO

Utilizando observações micrometeorológicas e da estrutura física da vegetação do experimento HAPEX-Sahel foi possível avaliar alguns métodos para determinar o comprimento de rugosidade (z0) e o deslocamento do plano zero (d). Propõe-se também uma alternativa para estimar esses parâmetros em escoamentos atmosféricos sobre vegetação esparsa em região semi-árida. O método proposto combinou o perfil logarítmico do vento com z0 = l (h - d), em que, h é a altura da vegetação e l depende de sua estrutura física. Valores de l foram estimados em função da estrutura física da vegetação ou obtido na literatura. A altura média da vegetação era 2,06 (± 0,47) m. O perfil do vento foi caracterizado por medidas a quatro níveis acima da superfície (3,0; 4,1; 5,3 e 8,5 m), com a velocidade de fricção (u*) determinada por correlações dos turbilhões a 9 m. O método proposto estimou adequadamente a rugosidade aerodinâmica da superfície com l = 0,188 e 0,190, determinados pela estrutura da vegetação local, o que não ocorreu para l = 0,166, da literatura. Os parâmetros de rugosidade determinados pelos métodos que utilizam u* na solução da lei logarítmica do vento descreveram melhor a rugosidade da superfície. Nos períodos de observações a rugosidade da área foi descrita satisfatoriamente por d = 0,95 m = 0,46 h e z0 = 0,204 m = 0,1 h.

Palavras-chave: HAPEX-Sahel; deslocamento do plano zero; comprimento de rugosidade; transporte de momentum.

ABSTRACT

Using micrometeorological observations and the physical structure of the vegetation during the HAPEX-Sahel experiment it was possible to evaluate some methods to determine the roughness length (z0) and the zero-plane displacement (d). It is also proposed an alternative to estimate such parameters for the atmospheric flow over sparse vegetation in a semi-arid region. It combines the wind logarithmic profile with z0 = l (h - d), where, h is the vegetation height, and l is a coefficient determined by the physical structure of the vegetation. Here, l values were determined for the site and also taken from the literature. The average vegetation height in the site was 2.06 (± 0.47) m. The wind logarithmic profiles were defined by measurements at four level above the surface (at 3.0, 4.1, 5.3 and 8.5m), and the friction velocity (u*) determined by eddy correlations at 9 m. The proposed method estimated well the surface roughness with l = 0.188 and 0.190, both determined by the structure of the vegetation in the site, but failed with l = 0.166, the average value of literature. The roughness parameters determined by methods that used u* in the solution of the wind logarithmic law better described the surface roughness. The aerodynamic roughness of the site was described well by d = 0.95 m = 0.46 h and z0 = 0.204 m = 0.1 h.

Keywords: HAPEX-Sahel; zero-plane displacement; roughness length; momentum transfer.

1. INTRODUÇÃO

Na parametrização dos processos de transporte turbulento de momentum, calor e massa na camada de ar imediatamente acima de vegetações é fundamental conhecer o valor da rugosidade aerodinâmica da superfície. A rugosidade é descrita pelo comprimento de rugosidade (z0) e deslocamento do plano zero (d). Estes parâmetros são essenciais em modelos baseados no método aerodinâmico (fluxo-gradiente) e em correções de medidas obtidas por correlação de vórtices turbulentos (DE BRUIN & VERHOEF, 1997; TAKAGI et al., 2003). A teoria da similaridade de Monin & Obukhov (1954) utiliza d para expressar os coeficientes de transporte turbulento e para caracterizar as condições de estabilidade atmosférica (MONTEITH & UNSWORTH, 1990).

Algebricamente, z0 e d são apenas constantes de integração do perfil vertical da velocidade horizontal do vento (eq. 1) acima de uma superfície com obstáculos de porte alto e sob condições adiabáticas. Assim, z0 é a altura na qual a velocidade horizontal do vento tende a zero, ou seja, é o limite inferior de validade do perfil médio; e d é um escalar empírico para compensar o deslocamento vertical da dissipação de momentum pela superfície com obstáculos, isto é:

em que, Uz é a velocidade horizontal média do vento à altura z; k é a constante de von Kármán; u* é a velocidade de fricção e z* é o limite superior da subcamada atmosférica rugosa (SCR).

São diversos os métodos para determinação de z0 e d baseados na eq. (1). Esses métodos requerem observações de Uz na subcamada inercial (z > z*) da camada limite de fluxo constante ou de equilíbrio (GARRATT, 1980; MONTEITH & UNSWORTH, 1990) e bordadura (fetch) com extensão entre 50 e 100 vezes a maior altura de medida da velocidade do vento (WIERINGA, 1993; PEREIRA, 2002). Contudo, tais condições são difíceis de serem satisfeitas sobre vegetação esparsa e de porte alto, como no caso de arbustos e florestas (MOLION & MOORE, 1983; DE BRUIN & MOORE, 1985; LLOYD et al., 1992).

No método gráfico ou analítico convencional (PEREIRA, 2002), z0 e d são determinados pelo ajuste da eq. (1) com valores de Uz medidos, no mínimo, em quatro alturas acima da vegetação (WIERINGA, 1993). O ajuste é feito por tentativa e erro buscando o melhor ajuste da eq. (1). Freqüentemente o método convencional produz resultados incoerentes, principalmente para vegetação esparsa e de porte alto, em condições de bordadura limitada e de medidas no interior da subcamada rugosa (RAUPACH et al., 1980). A abordagem convencional tem a desvantagem de estimar três parâmetros (d, z0 e u*) com apenas uma equação. Estes parâmetros são inter-relacionados e obtidos por processo iterativo, não resultando necessariamente em solução física adequada (JACOBS & van BOXEL, 1988; SCHAUDT, 1998). Devido a isso, o método torna-se subjetivo e sensível a erros (MOLION & MOORE, 1983). Para minimizar esse problema, alguns autores (JACOBS & van BOXEL, 1988; LLOYD et al., 1992; TAKAGI et al., 2003) combinaram a eq. (1) com u* determinado por correlações de vórtices turbulentos, o que resultou em estimativas mais satisfatórias. A determinação independente de u* exige sensores sofisticados, sistema de aquisição de dados e software específico para cálculo das covariâncias dos componentes da velocidade do vento em tempo real.

Os parâmetros d e z0 são influenciados também pela estrutura física da vegetação (altura, forma e flexibilidade das plantas; tamanho e arranjo dos ramos e folhas) e por sua distribuição espacial pela área (SHAW & PEREIRA, 1982). Algumas equações analíticas, baseadas nas interpretações físicas dos parâmetros de rugosidade, e outras empíricas, relacionam essas características e a transferência de momentum com a rugosidade da superfície (LETTAU, 1969; RAUPACH, 1992, 1994; MacDONALD et al., 1998), sendo alternativas aos métodos baseados na eq. (1). Entretanto, a mudança no arrasto efetivo de cada elemento rugoso, com incremento relativo da proteção aerodinâmica entre os elementos, torna esses modelos aplicáveis somente em situações de moderada separação dos elementos, como no caso de vegetação esparsa (LLOYD et al., 1992; SHAW & PEREIRA, 1982).

Para diversas superfícies vegetadas tem-se observado que z0/h varia com o índice de área foliar (SHAW & PEREIRA, 1982; THOM, 1971). A taxa de variação pode ser representada pela relação z0/h = l (1 – d/h), sugerida por Thom (1971), em que, h é altura do dossel e l é um coeficiente de proporcionalidade. Relação linear entre z0 e (h – d) e proporcional a l = 0,29 foi observado por Pereira & Shaw (1982), para extensa faixa de densidade do dossel. Porém, para dosséis esparsos a relação não foi constante, sendo dependente da distribuição vertical e da densidade do dossel. Para essas condições, l pode ser determinado pela estrutura física da vegetação (RAUPACH, 1992, 1994; MacDONALD et al., 1998).

A relação de Thom (1971) pode ser combinada com a lei logarítmica do vento (eq. 1) para estimar os parâmetros de rugosidade. Dessa forma, têm-se duas equações para estimar três parâmetros, diferente do método convencional, em que, apenas uma equação é utilizada. Esta abordagem mostra-se também alternativa às que aplicam u* na solução da lei logarítmica, visto que a determinação de l é mais simples do que u*, além de serem apresentados na literatura valores para diversas culturas agrícolas e vegetação natural (WIERINGA, 1993). A combinação da relação de Thom (1971) e a lei logarítmica aplica-se à vegetação homogênea, o que não acontece com os métodos baseados apenas na relação entre transferência de momentum e características físicas da vegetação.

Considerando as dificuldades de estimativa de d e z0 para superfícies com vegetação esparsa e de porte alto, os objetivos do presente trabalho são: propor um método para determinar z0 e d, que combina a eq. (1) e a relação sugerida por Thom (1971) e avaliar as estimativas de d e z0 pelos métodos: i) convencional; ii) combinação do convencional com u* determinada por correlações de vórtices turbulentos e iii) baseados na relação entre estrutura física (dimensões) da vegetação e a transferência de momentum.

2. MATERIAL E MÉTODOS

2.1. Aspectos físicos da área experimental

Os experimentos micrometeorológicos e da vegetação foram conduzidos no subsítio Fallow Bush do super-sítio Sul (SS) do HAPEX-Sahel (Hydrological and Atmospheric Pilot Experiment in the Sahel). O HAPEX-Sahel foi conduzido numa região semi-árida de savana, no Niger, oeste da África. A área experimental (0,8 x 1,0 km) era limitada ao norte, nordeste e noroeste por áreas de Tiger Bush com altura da vegetação entre 4 e 6 m e, nas outras direções, por campos de milheto com altura média de 2,6 m (WALLACE et al., 1994). A área de Fallow Bush de SS apresentava vegetação escassa, dividida em duas camadas: uma, formada por vegetação rasteira de gramíneas e herbáceas e outra, composta por arbustos lenhosos distribuídos aleatoriamente e com predominância de Guiera senegalensis L., mas com algumas Combretum micranthum G. Don (LEVY & JARVIS, 1999).

Análises da estrutura física de 220 arbustos de Guiera senegalensis L. foram feitas em fevereiro de 1992, em uma área de 6.750 m2. O ponto central da área estava a 120 m do mastro micrometeorológico. Determinou-se a máxima altura (h, em m), a altura do raio máximo (hmáx, em m) e o raio máximo (rmáx, em m) da copa. Avaliações mensais semidiretas do índice de área foliar (IAF, em m2 m-2) e do índice de área superficial dos galhos (IAG, em m2 m-2) foram feitas entre junho e outubro de 1992 (LEVY & JARVIS, 1999). Havia cerca de 327 arbustos/ha de Guiera senegalensis L., com h = 2,06 ± 0,47 m e rmáx = 1,57 ± 0,56 m. A área projetada ocupada pelos arbustos representou cerca de 29% da área total de Fallow Bush.

2.2. Medidas micrometeorológicas

Medidas micrometeorológicas foram obtidas entre 20/08 e 30/09/92, no período de transição da estação chuvosa para a seca (WALLACE et al., 1994). O perfil de velocidade horizontal do vento foi medido por quatro anemômetros de canecas (A100H, VECTOR INSTRUMENTS, North Wales, UK) dispostos a 3,0; 4,1; 5,3 e 8,5 m acima do solo. O saldo de radiação (Rn) foi medido por dois saldos radiômetros (CN1-R, MIDDLETON SOLAR, Victoria, AU), sendo um sobre os arbustos e outro acima das gramíneas/herbáceas, ambos a 3 m acima do solo. O fluxo de calor no solo (G) foi medido por oito placas de fluxo de calor em pares (CN3, MIDDLETON SOLAR, Victoria, AU) a 0,05 m de profundidade abaixo de cada tipo de vegetação. Considerou-se a média de todas as medidas como fluxo de calor no solo. As medidas foram feitas em intervalos de 30 s e suas médias armazenadas a cada 10 min por um datalogger (CR21X, CAMPBELL SCIENTIFIC Inc., Logan, UT).

Os componentes vertical (w), longitudinal (u) e latitudinal (v) da velocidade do vento foram medidas por anemômetro sônico tridimensional (GILL R3, SOLENT, Southampton, UK). A temperatura do ar (T) foi medida por um termômetro resistivo de platina (Department of Meteorology, UNIVERSITY OF READING, Reading, UK), e um higrômetro a infravermelho (IR-2000, OPHIR CORPORATION, Lakewood, CO) media a umidade do ar (q). Estes instrumentos estavam no topo de um mastro e a 9 m acima do solo. As variâncias e covariâncias médias entre as flutuações das variáveis supracitadas foram calculadas a cada 10 min de medidas em freqüência de 20 Hz e armazenadas em datalogger (WALLACE et al., 1994). Correções para a rotação das coordenadas, freqüência de resposta limitada dos sensores, média do comprimento do trajeto, separação lateral e longitudinal do sensor e freqüência de resposta do sistema de aquisição de dados foram feitas conforme apresentado por Lloyd et al. (1997).

2.3. Estimativas dos parâmetros de rugosidade aerodinâmica da superfície

Nas determinações dos parâmetros de rugosidade da superfície utilizaram-se médias de 30 min de todos os elementos micrometeorológicos, como recomendado por Monteith & Unsworth (1990), e as médias das características físicas da vegetação.

2.3.1. Método convencional

Na abordagem convencional, d e z0 foram estimados por regressão linear simples de Uz em função de ln(z – d), variando-se d até que o coeficiente de determinação (r2) fosse máximo (PEREIRA, 2002). Posteriormente, u* e z0 foram determinados pelos valores do intercepto (a) e da inclinação (b) da regressão linear com maior r2, pelas seguintes relações analíticas:

em que, k (= 0,40) é a constante de von Kármán.

2.3.2. Métodos baseados na combinação do convencional com a velocidade de fricção medida por correlação de vórtices turbulentos

2.3.2.1. Método de Lloyd

Pelo método de Lloyd (LLOYD et al., 1992), os valores de d e z0 foram determinados pela regressão linear entre (z – d)/z0 e as respectivas alturas de medida z, em que o intercepto da regressão forneceu o valor de d e a inclinação o de z0. A relação (z – d)/z0 foi obtida diferenciando a eq. (1) em função de u* e aplicando-se a exponencial em ambos os lados da equação, o que resultou na seguinte expressão:

A taxa de variação dUz/du* foi estimada para cada altura de medida da velocidade do vento como sendo a inclinação da regressão linear de Uz em função de u* forçada a passar pela origem, como sugerido por Lloyd et al. (1992). Utilizou-se na determinação da inclinação da regressão u* determinado por correlação de vórtices turbulentos (u*e). u*e foi estimada pelas flutuações dos componentes longitudinal (u') e vertical (w') da velocidade do vento, i.e.:

2.3.2.2. Método de Takagi

O método de Takagi (TAKAGI et al., 2003) é similar ao convencional, porém utiliza u*e na solução da lei logarítmica. Por essa abordagem, a e b foram determinados para cada valor de d, gerando um valor para a velocidade de fricção pelo perfil (u*p). O processo foi interrompido quando u*p » u*e, determinando o valor de d, enquanto z0 foi fornecido pela eq. 3

2.3.3. Métodos derivados da relação entre estrutura física da vegetação e a transferência de momentum

2.3.3.1. Método de Raupach

Neste método, d foi calculado pela equação empírica ajustada a medidas em túnel de vento em função do índice de área do dossel (l), na forma (RAUPACH, 1994):

O índice de área do dossel foi calculado como a área total de um único lado de todos os elementos do dossel (folhas e galhos) pela área unitária de solo, ou seja, L = IAF + (IAG/2). Utilizou-se a média dos valores de IAF e IAG avaliados de setembro a outubro de 1992.

Na estimativa de z0 foi utilizado o perfil logaritmo do vento (eq. 1) com correções para a subcamada rugosa. Esse perfil quando aplicado a z = h apresenta a seguinte forma (RAUPACH, 1992, 1995):

em que, Yh é uma função de influência na forma do perfil, que quantifica o desvio do coeficiente atual de difusão turbulenta para momentum dentro da subcamada rugosa a z = h; g = Uh/u* e Uh é a velocidade do vento a z = h.

Na determinação de Yh utilizou-se a aproximação de Raupach (1992) e Raupach (1995), ou seja:

em que, cw = 2, como sugerido por Raupach (1995), resultando em Yh = 0,1932.

A relação Uh/u* = g foi calculada como função implícita do índice de área frontal ou densidade de rugosidade (lf), expressa na forma (RAUPACH, 1995):

em que, lf (= n D h / AT) é o índice de área frontal, definido como a área da silhueta dos obstáculos, dividida pela área de solo ocupada pelos mesmos (área específica); CS (= 0,003) é o coeficiente de arrasto do substrato; CR (= 0,3) é o coeficiente de arrasto de um elemento rugoso isolado; c (= 0,37) é o coeficiente de proteção aerodinâmica; n (= 220) é o número de elementos rugosos ocupando a área total de solo AT (= 6.750 m2) e D (= 2 rmáx, em m) é o máximo diâmetro dos arbustos. A eq. (9) foi resolvida por método iterativo (RAUPACH, 1992).

2.3.3.2. Método de MacDonald

Na estimativa de d por esse método foi utilizada a equação empírica ajustada a medidas dos parâmetros de rugosidade da superfície em função do índice de área plana (MacDONALD et al., 1998), ou seja:

em que, lP é o índice de área plana e A (= 4,43 para obstáculos dispostos aleatoriamente) é uma constante que controla a curvatura da função. lP foi estimado como a razão da área projetada dos arbustos por AT (MacDONALD et al., 1998). Considerou-se a área projetada como a área da circunferência dos arbustos calculada em função da média do seu raio máximo.

Nesse modelo a estimativa de z0 foi derivada do perfil logarítmico do vento, porém descartando a interferência das onduletas entre os elementos rugosos, ou seja, sem correções para a subcamada rugosa, isto é:

com CR = 0,6, o dobro do valor utilizado por Raupach (1992).

2.3.4. Método baseado na combinação do convencional com as características físicas da vegetação

O método proposto no presente trabalho utilizou a lei logarítmica do perfil de vento e a relação sugerida por Thom (1971), sendo aqui denominado de método convencional-Thom. A relação de Thom (1971) pode ser escrita da seguinte forma:

Variando-se d, a cada passo da iteração, z0 foi estimado pelo intercepto da regressão linear entre ln(z - d) e Uz, sendo simultaneamente calculado pela eq. (12). O valor de d foi determinado quando convergiram os valores de z0 estimados pelo perfil e pela eq. (12). Utilizaram-se três valores de l na estimativa dos parâmetros de rugosidade, sendo um valor médio (l = 0,166 ± 0,060) obtido de alguns trabalhos sobre vegetação esparsa de arbustos em região semi-árida (DOLMAN et al., 1992; MOLION & MOORE, 1983; LLOYD et al., 1992), e os outros dois determinados em função da estrutura física da vegetação na área em estudo.

As equações baseadas na estrutura física foram obtidas dos modelos de MacDonald e Raupach. Igualando as eq. (7) e (12), obteve-se a relação para estimativa de l pelo modelo de Raupach:

e igualando as eq. (11) e (12), determinou-se a equação derivada do modelo de MacDonald:

2.4. Condições de neutralidade atmosférica

Os dados utilizados nas análises foram restritos a condições próximas da neutralidade atmosférica para satisfazer a lei do perfil logarítmico do vento. Foram selecionadas observações que apresentavam módulo da energia disponível |Rn – G| < 20 W m-2 e do fluxo de calor sensível |H| < 15 W m-2, similar a de Bruin & Moore (1985). Devido aos erros proporcionados pela inércia dos anemômetros de canecas, perfis com velocidade do vento no anemômetro inferior menor que 1,0 ms-1 e u* < 0,1 ms-1 também foram excluídos, seguindo os procedimentos de Shuttleworth et al. (1988). Foram consideradas, apenas, observações com direção do vento entre SE e SSE, devido à bordadura inadequada para o nível superior (8,5 m) de medida nas outras direções (LYRA, 2005).

Sendo as condições acima satisfeitas, avaliou-se a estabilidade atmosférica no nível de medida do anemômetro sônico (9 m) pelo parâmetro z de estabilidade (MONIN & OBUKHOV, 1954), em que só foram utilizadas observações que apresentaram módulo de z < 0,0325. O parâmetro z foi estimado pela seguinte relação:

em que, L (em m) é a escala de comprimento (altura) de Monin-Obukhov; g (= 9,81 m s-2) é a aceleração devido a gravidade; q (em K) é a temperatura potencial; e (em m s-1 K) é a covariância média entre as flutuações do componente vertical do vento e da temperatura potencial do ar.

2.5. Análise estatística

Na avaliação da influência de d e z0 na estimativa da velocidade horizontal do vento pela eq. (1), os seguintes coeficientes estatísticos foram utilizados: média aritmética, desvio padrão e coeficiente de determinação (r2), intercepto (a) e coeficiente angular (b) da regressão linear entre Uz, medido (X) e estimado pela lei logarítmica do vento (Y). A velocidade horizontal do vento foi estimada para cada nível de medida (3,0; 4,1; 5,3 e 8,5 m), utilizando u* determinado por correlação de vórtices turbulentos (9 m), totalizando quatro amostras por horário para cada método.

Utilizou-se também a raiz do quadrado médio do erro (RQME, em m s-1), como descrito por Willmott (1981). Avaliou-se a concordância entre os valores observados e estimados pelo perfil logarítmico para os valores de d e z0 determinados pelos diversos métodos, utilizando o índice de concordância de Willmott (I) (WILLMOTT, 1981). Efetuaram-se os testes t e F para as médias e variâncias de Uz, respectivamente, estimados em função de d e z0 determinados pelos métodos analisados e para os valores medidos.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1. Parâmetros de rugosidade da superfície

Na região do Sahel são difíceis de serem observadas condições de neutralidade atmosférica, em função do elevado fluxo de calor sensível, com forte turbulência originada por flutuação térmica e a baixas velocidades do vento, inibindo a geração da energia mecânica turbulenta (DE BRUIN & VERHOEF, 1997). Foram obtidas 600 observações médias de 30 min com medidas simultâneas do perfil da velocidade horizontal do vento e correlação de vórtices turbulentos, mas apenas seis delas (1,0%) tinham condições próximas à neutralidade e bordadura adequada.

A relação entre Uz e ln (z – d) apresentou ajuste estatístico satisfatório do perfil para d calculado a cada observação pelo método convencional (CO), com coeficiente de determinação superior a 0,99, indicado por Takagi et al. (2003) como limite mínimo aceitável. Com esse método obteve-se d = 1,09 ± 0,14 m e z0 = 0,184 ± 0,017 m (Tabela 1). O coeficiente de variação (cv) foi de 13% para d, e 9,5% para z0, sendo similares aos valores observados por Munro & Oke (1973) para a cultura do trigo.

Para o método de Takagi (TA), a regressão linear de Uz em função de ln (z – d) apresentou r2 > 0,99 para todas as observações, enquanto para o convencional-Thom (CT), independente do valor de l, um caso mostrou r2 < 0,99, sendo desconsiderado das análises para este método. Pelo TA obteve-se d = 1,07 ± 0,35 m e z0 = 0,190 ± 0,065 m. Pelo CT, d variou entre 1,12 ± 0,40 m, com l = 0,190, estimado pela relação de MacDonald (CTMD), e 1,40 ± 0,05 m em função de l = 0,166 médio da literatura (CTLT), enquanto z0 variou de 0,179 ± 0,075 m (CTMD) a 0,109 ± 0,009 m (CTLT).

O CTLT apresentou cv para os parâmetros de rugosidade inferiores aos determinados pelo CO e de 3,7% para d e de 7,9% para z0. Nos demais métodos, baseados no convencional, e que utilizaram u* determinado por correlação de vórtices ou l, os valores de cv foram superiores, e entre 32,6% (TA) e 35,4% (CTMD) para d e no intervalo de 34,0% (TA) a 42,2% (CTMD) para z0. Contrário ao CO, nesses métodos os cv para z0 foram superiores aos de d. Takagi et al. (2003) determinaram valor de cv de até 85,7% para z0, não sendo apresentado os resultados para d.

Apesar de empregar duas equações na iteração (CT), ou soluções simples do perfil em função de u* (TA) na estimativa de d e z0, os métodos CT e TA mostraram-se sensíveis a variações em l ou u*, sendo esses fontes potenciais de erro na determinação dos parâmetros de rugosidade. d estimado pelo TA foi menos sensível a variações em u* do que z0. Padrão análogo foi mostrado para l no método convencional-Thom. Porém, os parâmetros de rugosidade tiveram tendência contrária, em que d variou inversamente proporcional a u* ou l e z0 diretamente. Variações de 10% em u* resultaram em diferenças de -21,8% em d e de 40,1% em z0 pelo TA, enquanto a mesma variação em l para CT , proporcionou variações similares e de -22,1% para d e de 43,8% para z0.

No método de Lloyd (LO) utilizaram-se as seis observações consideradas em CO e no TA, pela impossibilidade de avaliação do ajuste do perfil ao valor de d a cada horário. Pelo LO, d é calculado como o intercepto da regressão entre z e (z – d)/z0, sendo igual a 0,95 ± 0,27 m, e z0 = 0,204 ± 0,012 m determinado pela inclinação da regressão (Figura 1). O erro padrão de estimativa de d e z0 padronizados pelos seus valores foram de 0,28 e 0,059, respectivamente, sendo inferior ao determinado por Lloyd et al. (1992) para d (0,38) e o mesmo para z0 (0,059). As diferenças no erro padrão padronizado para d podem estar associadas à extensa faixa de estabilidade atmosférica considerada por esses autores como sendo próxima à neutra (|z| < 0,256), ou a medidas realizadas no interior da subcamada rugosa (DOLMAN et al. 1992).


Pelo CTLT, d foi em média 22,7% superior aos determinados pelos demais métodos que utilizaram medidas do perfil de vento, enquanto z0 foi 69,9% inferior. Quando desconsiderado CTLT das avaliações, os métodos baseados no perfil tiveram extremos para d com diferença de 16,6% e de 15,5% para z0.

A vegetação mostrou baixa densidade de rugosidade ou índice de área frontal (lf = 0,21), sendo desprezível a influência da proteção aerodinâmica entre os elementos rugosos no transporte de momentum. Para este valor de lf, o modelo de Raupach (RP) pode ser aplicado (RAUPACH, 1994). Os métodos que consideram a estrutura física da vegetação apresentaram d de 1,10 e 1,12 m para os métodos de RP e MacDonald (MD), respectivamente e z0 de 0,181 (RP) e 0,180 m (MD). Estes métodos tiveram diferença inferior a 2,0% para d e a 1,0% para z0. Com exceção de CTLT, os parâmetros de rugosidade determinados pelas medidas do perfil foram no mesmo intervalo dos calculados em função da estrutura física da vegetação.

O deslocamento do plano zero normalizado pela altura dos arbustos (d/h) variou entre 0,46 (LO) e 0,68 (CTLT) (Tabela 1). Estes valores foram inferiores ao determinado sobre superfície esparsa, composta por arbustos, eucaliptos e uma camada de grama seca (0,75), na Austrália (GARRATT, 1980). Molion & Moore (1983), utilizando um procedimento analítico baseado na conservação de massa do perfil, determinaram d/h = 0,65 para as mesmas medidas de Garratt (1980), sendo próximo ao estimado pelo CTLT. Lloyd et al. (1992), na região do Sahel, sobre cobertura vegetal similar à do presente trabalho (predominância de Guiera senegalensis L.), porém no período seco, apresentaram valor inferior e de 0,40h. Este valor mostrou concordância com o observado pelo LO.

Dolman et al. (1992) comentam que para superfície esparsa, formada por arbustos e árvores (Tiger Bush) no Sahel, o deslocamento do plano zero de 0,57h mostra-se representativo da superfície subjacente. Para vegetação similar no Sahel, De Bruin & Verhoef (1997) utilizando as relações de similaridade para convecção livre, estimaram deslocamento do plano zero normalizado de 0,53. Baseado nas análises de Shaw & Pereira (1982), e considerando a altura do máximo diâmetro do dossel (hmáx = 1,49 ± 0,47 m) como a de sua máxima densidade, para um índice de área do dossel (L) medido de 0,428, obteve-se d = 0,55h. Esses valores apresentam concordância com os estimados no presente trabalho, com exceção de CTLT e de LO que discordaram do valor obtido por Dolman et al.(1992).

O índice de área frontal das árvores (lf = 0,20) para as condições de Garratt (1980) foi similar ao observado no presente trabalho, ou seja, densidade da vegetação análoga. O valor superior de d/h apresentado por Garratt (1980), e em menor proporção pelo recalculado por Molion & Moore (1983), podem ter sido influenciados pela distribuição vertical da densidade foliar das árvores de eucaliptos, as quais mostram maior densidade próxima ao topo do dossel, o que contribui para o deslocamento de z0 superior (SHAW & PEREIRA, 1982). De qualquer forma, o valor de Garratt (1980) foi considerado elevado por Lloyd et al. (1992) para lf observado.

O inferior determinado por Lloyd et al. (1992) justifica-se, em parte, pelas medidas terem sido realizadas no período seco na região do Sahel, em que o índice de área foliar dos arbustos mostra-se inferior ao observado na estação chuvosa (LEVY & JARVIS, 1999). Considerando-se que d é o nível médio de absorção de momentum (THOM, 1971), e que a diminuição da densidade de folhagem resulta em menor área de sumidouro de momentum, espera-se diminuição de d.

O coeficiente de proporcionalidade l [= z0/(h - d)] foi no intervalo de 0,166 (CTLT) a 0,193 (TA). No CT, as diferenças entre l médio da literatura e os observados para os demais métodos foi em média 14,4%, enquanto que para os valores estimados pelas relações analíticas de MacDonald (0,188) e Raupach (0,190) essas diferenças foram inferiores a 0,4%, ou seja, a determinação de l em função das características físicas da vegetação mostrou-se satisfatória. Para dosséis esparsos (L < 1,0), l apresenta alta variação em função da densidade e distribuição vertical do dossel (SHAW & PEREIRA, 1982). Dessa forma, as diferenças elevadas entre l da literatura e o dos métodos avaliados podem ter sido resultados da variação entre a densidade e a distribuição vertical da vegetação da área em estudo e as avaliadas na literatura, apesar de considerados apenas valores da literatura, determinados para vegetação esparsa de arbustos em região semi-árida (DOLMAN et al., 1992; MOLION & MOORE, 1983; LLOYD et al., 1992).

Para cultura artificial, l mostrou valor de 0,36 (THOM, 1971), sendo de 0,25 para floresta de pinus (MOLION & MOORE, 1983). Para dosséis densos (L > 1), Shaw & Pereira (1982) determinaram relação linear entre z0 e (h – d) e proporcional a 0,29. Contudo, para dosséis esparsos (L < 1,0) essa proporção foi inferior e não constante.

Tendência análoga à observada por Garratt (1980) para d/h foi mostrada por l, com valor superior aos dos métodos analisados, e de 0,38. O valor de l apresentado por Garratt (1980) foi elevado para a densidade de vegetação observada, resultado principalmente da influência das árvores de eucalipto no valor de d.

Dolman et al. (1992) utilizaram o método de Lloyd para estimar o comprimento de rugosidade, obtendo z0 = 0,21 (h – d). O valor de l em função dos resultados de Shaw & Pereira (1982) foi análogo ao de Dolman et al. (1992) e aproximadamente 0,21, enquanto o apresentado por Molion & Moore (1983) foi de 0,169. Esses valores foram próximos aos observados no presente trabalho, com exceção de CTLT, que divergiu dos determinados por Shaw & Pereira (1982) e Dolman et al. (1992). Enquanto l determinado por Lloyd et al. (1992) foi inferior e de 0,124. O menor IAF para as condições de Lloyd et al. (1992) resultou em baixo valor de d/h, como comentado anteriormente, e de z0, que combinados, proporcionaram l inferior ao dos métodos analisados.

3.2. Estimativas de Uz

A média da velocidade do vento observada (

z_obs) nos quatro níveis de medida e nos seis horários considerados foi de 3,32 ± 1,06 m s-1, enquanto que a média da velocidade do vento estimada (z_est) pela lei logarítmica do vento (eq. 1) em função de d e z0 determinados pelos métodos analisados e u* dada por correlação de vórtices variou de 3,29 ± 1,15 m s-1 (LO) a 3,83 ± 1,34 m s-1 (CTLT) (Tabela 2). z_est em função dos parâmetros de rugosidade de TA não apresentou diferença em relação ao valor médio observado. Para os outros métodos, a tendência geral foi de subestimativa de z_est (0,9%) com os parâmetros de rugosidade de LO e superestimativa entre 1,2% (CO) e 15,4% (CTLT). Apenas z_est por CTLT mostrou diferença estatística significativa pelo teste-t (p < 0,05) em relação a z_obs.

A raiz do quadrado médio do erro (RQME) da velocidade do vento estimada (Uz_est) em função de d e z0 dos métodos que utilizaram u* determinada por correlação foi inferior a observada para os demais métodos, sendo de 0,22 m s-1 para LO e de 0,23 m s-1 para TA. O maior RQME foi obtido quando utilizado d e z0 estimados pelo CTLT (0,62 m s-1). RQME representou em torno de 6,7% de z_obs para LO e de 16,2% para CTLT. Com exceção de CTLT, RQME mostrou-se no mesmo intervalo (entre 0,22 e 0,26 m s-1) para d e z0 dos métodos baseados na estrutura física da vegetação e dos que utilizaram medidas do perfil de vento.

As regressões entre a velocidade do vento observada (Uz_obs) e Uz_est mostraram interceptos não significativos estatisticamente (p < 0,05). Assim, utilizaram-se nas avaliações as regressões forçadas a passar pela origem (Figura 2). Os valores de r2 acima de 0,9615 indicaram precisão satisfatória das estimativas. Este resultado diferiu do obtido por Righi (2004), em que r2 < 0,78.





As estimativas de Uz com base nos parâmetros de rugosidade de CO (Figura 2A), CT, independente de l (Figuras 2B, 2C e 2D), TA (Figura 2E) e os baseados na estrutura física da vegetação (Figuras 2G e 2H) mostraram tendência de superestimativa de Uz_est entre 0,9% (TA) e 16,2% (CTLT). Padrão inverso foi apresentado por LO (Figura 2F), com subestimativa de 0,4% de Uz_obs. Esses valores encontram-se no intervalo de incerteza das medidas dos anemômetros de canecas (~ 5%) (WIERINGA, 1980), com exceção de CTLT. Righi (2004) observou subestimativa entre 1 e 7% de Uz_es em função de d e z0 determinados pelo método convencional.

O índice de concordância de Willmott (I) apresentou extremo inferior de 0,9334 para as estimativas em função dos parâmetros de CTLT, sendo os superiores mostrados pelos métodos TA (0,9894) e LO (0,9896). Novamente, as estimativas utilizando os parâmetros de rugosidade da superfície pelo CTLT mostraram padrão divergente do apresentado pelos demais métodos e dos valores observados. Assim, d e z0 desse método não representaram de forma satisfatória a rugosidade da superfície subjacente. Os parâmetros de rugosidade não representativos, determinados pelo CTLT, foram proporcionados pelo baixo valor de l utilizado em sua iteração, aliado a elevada sensibilidade de CT a variações em l. Apesar do valor médio da literatura não ter apresentado resultados satisfatórios para vegetação esparsa, ele deve ser avaliado também para vegetação homogênea (L > 1), visto que, neste caso, l mostra-se constante, e que as relações analíticas baseadas nos modelo de Raupach e MacDonald não se aplicam.

A velocidade do vento apresentou dependência inversamente proporcional a d e a z0. Porém, observou-se sensibilidade superior das estimativas de Uz a mudanças em z0 com relação à observada para d. Na média do perfil, incrementos de 10% em d implicaram em diminuição de Uz ao redor de 1,3%, enquanto para z0 essa variação resultou em diferenças de -3,4%. A diferença (47,2%) observada entre d determinado pelo método que apresentou estimativas de Uz com concordância superior (LO) e o de maior divergência (CTLT) resultou em variações de -6,2% em Uz, enquanto a diferença entre z0 desses métodos (-46,8%) incrementou Uz em 16,1%. Isto indicou que os valores de z0 de CTLT inferior ao dos outros métodos foi o responsável pela superestimativa de Uz.

4. CONCLUSÕES

Baseado nos resultados obtidos para os parâmetros de rugosidade sobre vegetação esparsa e de porte alto em ambiente semi-árido do Sahel, pode-se concluir que:

  • a abordagem convencional proporciona estimativas aceitáveis do deslocamento do plano zero (d) e do comprimento de rugosidade (z0);

  • os valores de d e z0 determinados em função da velocidade de fricção estimada por correlação de vórtices turbulentos na solução da lei logarítmica descrevem melhor a rugosidade da superfície do que aqueles determinados pelos demais métodos que utilizam a lei logarítmica ou os baseados na estrutura física da vegetação;

  • as relações entre as características estruturais da vegetação e o transporte de momentum descrevem apropriadamente a rugosidade da superfície;

  • no método convencional-Thom, o valor de l calculado pelas relações analíticas de MacDonald e Raupach produzem resultados satisfatórios, o que não é observado quando se utiliza o valor médio da literatura. Contudo deve-se avaliar o método para superfície homogênea, considerando l da literatura;

  • os valores dos parâmetros de rugosidade que descrevem melhor à vegetação são d = 0,95 m e z0 = 0,204 m, determinados pelo método de Lloyd. O valor de d representa 46% da altura média da vegetação e z0 10%, sendo l = 0,185;

  • a velocidade horizontal do vento apresenta baixa sensibilidade aos parâmetros de rugosidade, porém é mais sensível a z0 do que a d.

5. AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem ao Departamento de Meteorologia da Universidade de Reading, UK, pela coleta dos dados de correlação de vórtices turbulentos e de perfil de vento. Financiada pela UK Terrestrial Initiative in Global Environmental Research. Ao Instituto de Manejo Ecológico da Universidade de Edinburgh, UK, pelas análises da estrutura física da vegetação. E a equipe do sistema de informação do HAPEX-Sahel por disponibilizar os dados.

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Recebido Novembro 2005

Aceito Setembro 2006

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Nov 2007
  • Data do Fascículo
    Ago 2007

Histórico

  • Aceito
    Set 2006
  • Recebido
    Nov 2005
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