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Comparação de eficácia entre as sondas monocanalicular e bicanalicular no tratamento da obstrução congênita das vias lacrimais

Resumo

Objetivo:

Avaliar e comparar a taxa de sucesso da intubação monocanalicular ou bicanalicular em pacientes com obstrução congênita do ducto lacrimonasal (OCDLN), levando-se em consideração a taxa de sucesso, a dificuldade do procedimento e o custo dos tubos.

Métodos:

Foram analisados retrospectivamente 54 prontuários, totalizando 58 vias lacrimais com diagnóstico de OCDLN, que realizaram intubação das vias lacrimais monocanalicular ou bicanalicular com tubos de silicone. Anamnese, exame oftalmológico geral, testes específicos, como o Teste do Desaparecimento do Corante (TDC) e Teste de Observação de Fluoresceína na Orofaringe (TOFO), e, caso necessário, exames complementares como a dacriocistografia, foram utilizados para diagnóstico e inclusão na pesquisa. Foram tratados com intubação os pacientes sem resposta adequada ao tratamento prévio, ou seja, que permaneceram com sintomas de secreção e epífora contínua após a realização de massagem de Crigler e sondagem.

Resultados:

A intubação monocanalicular foi realizada em 27 vias lacrimais e a intubação bicanalicular, em 31 vias lacrimais. A taxa de sucesso foi alta em ambos os métodos, com melhora em 26 (96,3%) vias lacrimais com sonda monocanalicular e em 30 (96,8%), com sonda bicanalicular (p=0,718). As duas técnicas apresentaram 100% de sucesso nos pacientes com até 2 anos e acima de 4 anos de idade (p=1). A taxa de sucesso entre os 2 e 4 anos de idade foi de 91,5% para as monocanaliculares e 87,5% para as bicanaliculares, (p=0,652).

Conclusão:

o presente estudo não mostrou diferença significativa no sucesso da intubação quando utilizando sondas mono ou bicanaliculares. A intubação monocanalicular mostrou-se de mais fácil execução, ao passo que o tubo bicanalicular possui menor custo.

Descritores:
Obstrução dos Ductos Lacrimais/cirurgia; Obstrução dos Ductos Lacrimais/congênito; Anormalidades Congênitas; Doenças do Aparelho Lacrimal; Ducto Nasolacrimal

Abstract

Objective:

to evaluate and to compare the success rate of monocanalicular or bicanalicular intubation in congenital nasolacrimal duct obstruction (CNDO) carriers in terms of success rate, difficulty of the procedure, and cost of the tubes.

Methods:

fifty-four CNDO carriers with 58 obstructed lacrimal vies (LV) who were submitted to lacrimal system intubation using mono or bicanalicular stent had their medical records analyzed. A clinical history, a general ophthalmologic examination, specific tests such as the fluorescein dye disappearance test (FDDT) and observation test of fluorescein in the oropharynx (OTFO) were used for diagnosis and inclusion in the study. Patients who continued exhibiting discharge and continuous epiphora after previous treatment, Crigler massage and probing, were treated surgically with intubation.

Results:

Monocanalicular intubation was performed on 27 LV and bicanalicular intubation was performed on 31 LV. High success rates were observed, with improvement in 26 (96.3%) with monocanalicular intubation and in 30 LV (96.8%) with bicanalicular intubation (p=0.718). Furthermore, both techniques were 100% successful in patients up to 2 and over 4 years of age (p=1). The success rates between 2-4 years of age were 91.6% in monocanalicular intubation and 87.5% in bicanalicular intubation (p=0.652).

Conclusion:

The success rate using monocanalicular or bicanalicular intubation to treat CNDO had no significant difference in the studied children. Furthermore, the monocanalicular tube was easier to use, while the bicanalicular tube had a lower cost.

Keywords:
Nasolacrimal duct obstruction/surgery; Nasolacrimal duct obstruction/ congenital; Congenital abnormalities; Diseases of the lacrimal drainage system; Nasolacrimal duct

Introdução

A obstrução congênita das vias lacrimais (OCVL) é uma afecção frequente nos consultórios oftalmológicos e representa em torno de 5% das consultas.(11 Lunardelli P, Aoki L, Jervásio AC, Zagui RM, Matayoshi S. Implante de ducto nasolacrimal de poliuretano: relato de caso. Arq Bras Oftalmol. 2008;71(1):110-4.) Acomete 5 a 20% dos recém-nascidos,(22 Eustis HS, Nguyen AH. The Treatment of Congenital Nasolacrimal Duct Obstruction in Children: A Retrospective Review. J Pediatr Ophthalmol Strabismus. 2018;55(1):65-7.,33 Eshraghi B, Jamshidian-Tehrani M, Mirmohammadsadeghi A. Comparison of the success rate between monocanalicular and bicanalicular intubations in incomplete complex congenital nasolacrimal duct obstruction. Orbit. 2017;36(4):215-7.) sendo que cerca de 90% das OCVL ocorrem por imperfuração da válvula de Hasner. Epífora contínua, em um ou em ambos os olhos, associada a secreção mucóide de leve à intensa são as queixas mais comuns.(44 Lin AE, Chang YC, Lin MY, Tam KW, Shen YD. Comparison of treatment for congenital nasolacrimal duct obstruction: a systematic review and meta-analysis. Can J Ophthalmol. 2016;51(1):34-40.)

O diagnóstico de OCVL é feito por meio de anamnese e exame oftalmológico. Os principais testes utilizados são o teste de desaparecimento do corante (TDC) e o teste de observação da fluoresceína na orofaringe (TOFO). Exames complementares, como a dacriocistografia, devem ser utilizados em casos singulares.(55 MacEwen CJ, Young JD, Barras CW, Ram B, White PS. Value of nasal endoscopy and probing in the diagnosis and management of children with congenital epiphora. Br J Ophthalmol. 2001;85(3):314-8.

6 Carvalho RM, Seronni LB, Avila M. Dilatação por cateter-balão (dacrioplastia) para tratamento das obstruções congênitas do ducto lacrimonasal. Arq Bras Oftalmol. 2009 Sep;72(5):669-72.

7 Young JD, MacEwen CJ. Managing congenital lacrimal obstruction in general practice. BMJ. 1997;315(7103):293-6.

8 Schellini SA. Obstrução nasolacrimal congênita - diagnóstico e tratamento. Rev Bras Oftalmol. 2005;64(2):128-32.

9 Lorena SH, Silva JA. Estudo retrospectivo da obstrução congênita do ducto lácrimonasal. Rev Bras Oftalmol. 2011;70(2):104-8.
-1010 Dantas RR. Lacrimal drainage system obstruction. Semin Ophthalmol. 2010;25(3):98-103.)

Uma vez diagnosticados, a conduta nos portadores de OCVL é usualmente o tratamento clínico conservador, usando higiene do olho acometido com água filtrada ou soro fisiológico 0,9% e massagens de Crigler(88 Schellini SA. Obstrução nasolacrimal congênita - diagnóstico e tratamento. Rev Bras Oftalmol. 2005;64(2):128-32.) ou a esvaziadora. Cerca de aproximadamente 90% destas crianças apresentarão resolução espontânea até o primeiro ano de vida, sem necessitar de procedimento cirúrgico.(1010 Dantas RR. Lacrimal drainage system obstruction. Semin Ophthalmol. 2010;25(3):98-103.,1111 Lee H, Ahn J, Lee JM, Park M, Baek S. Clinical effectiveness of monocanalicular and bicanalicular silicone intubation for congenital nasolacrimal duct obstruction. J Craniofac Surg. 2012;23(4):1010-4.)

Contudo, para aqueles que não apresentam melhora até os 12 meses de idade, está indicada a sondagem das vias lacrimais.(66 Carvalho RM, Seronni LB, Avila M. Dilatação por cateter-balão (dacrioplastia) para tratamento das obstruções congênitas do ducto lacrimonasal. Arq Bras Oftalmol. 2009 Sep;72(5):669-72.,88 Schellini SA. Obstrução nasolacrimal congênita - diagnóstico e tratamento. Rev Bras Oftalmol. 2005;64(2):128-32.) Em caso de falha da sondagem, indica-se a intubação das vias lacrimais.

Esta sequência no tratamento depende de fatores como: início dos sinais, quantidade de secreção à expressão do saco lacrimal, idade da criança e história de cirurgia prévia ou não.(22 Eustis HS, Nguyen AH. The Treatment of Congenital Nasolacrimal Duct Obstruction in Children: A Retrospective Review. J Pediatr Ophthalmol Strabismus. 2018;55(1):65-7.

3 Eshraghi B, Jamshidian-Tehrani M, Mirmohammadsadeghi A. Comparison of the success rate between monocanalicular and bicanalicular intubations in incomplete complex congenital nasolacrimal duct obstruction. Orbit. 2017;36(4):215-7.
-44 Lin AE, Chang YC, Lin MY, Tam KW, Shen YD. Comparison of treatment for congenital nasolacrimal duct obstruction: a systematic review and meta-analysis. Can J Ophthalmol. 2016;51(1):34-40.)

A intubação pode ser feita usando vários tipos de tubos, sendo o tubo de silicone de aplicação bicanalicular (Crawford® - FCI, Paris, França) o mais empregado.(1212 Cervenka S, Matousek P, Komínek P. [Comparing of Treatment Results of Monocanalicular and Bicanalicular Intubation in Inborn Lacrimal Duct Obstruction]. Cesk Slov Oftalmol. 2016;72(5):178-81.) O tubo de silicone de aplicação monocanalicular (Monoka® - FCI, Paris, França) também é empregado para o tratamento da OCVL.(1111 Lee H, Ahn J, Lee JM, Park M, Baek S. Clinical effectiveness of monocanalicular and bicanalicular silicone intubation for congenital nasolacrimal duct obstruction. J Craniofac Surg. 2012;23(4):1010-4.,1212 Cervenka S, Matousek P, Komínek P. [Comparing of Treatment Results of Monocanalicular and Bicanalicular Intubation in Inborn Lacrimal Duct Obstruction]. Cesk Slov Oftalmol. 2016;72(5):178-81.)A técnica consiste em fazer sondagem da via lacrimal com introdução de um tubo de silicone dentro da via lacrimal.(1313 Fernandes JB, Matayoshi S, Komatsu W, Kikuta HS, Moura EM. Circuito elétrico auxiliar para intubação das vias lacrimais. Arq Bras Oftalmol. 2000;63(5):375-7.) A escolha do tubo depende da rotina do serviço, da experiência do médico e do custo de cada tubo.(44 Lin AE, Chang YC, Lin MY, Tam KW, Shen YD. Comparison of treatment for congenital nasolacrimal duct obstruction: a systematic review and meta-analysis. Can J Ophthalmol. 2016;51(1):34-40.,1212 Cervenka S, Matousek P, Komínek P. [Comparing of Treatment Results of Monocanalicular and Bicanalicular Intubation in Inborn Lacrimal Duct Obstruction]. Cesk Slov Oftalmol. 2016;72(5):178-81.)

Até o momento, não existe consenso sobre qual método de intubação - bicanalicular ou monocanalicular, apresenta melhores resultados para o tratamento da OCVL. Desse modo, o presente trabalho visa contribuir para os estudos já existentes e aperfeiçoar o manejo da OCVL.

O objetivo do presente estudo é avaliar comparativamente a intubação monocanalicular e bicanalicular para o tratamento da OCVL, levando-se em consideração a taxa de sucesso, a dificuldade do procedimento e o custo dos tubos.

Métodos

Este é um estudo retrospectivo, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de Estudos Superiores Positivo Ltda sob o nº CAAE 88080318.7.0000.0093 e da Sociedade Evangélica Beneficente de Curitiba com o CAAE nº 88080318.7.3001.0103.

Foram revisados os prontuários de pacientes com o diagnóstico de OCVL atendidos no Setor de Oculoplástica da do Hospital de Olhos do Paraná (HOP), no período de janeiro de 2013 até abril de 2018. Foram coletados os seguintes dados: idade, gênero, início dos sintomas, presença de epífora e/ou secreção, olho acometido, data e idade no início do tratamento, tipo de tubo utilizado na intubação das vias lacrimais, melhora ou não de sintomas no pós-operatório, necessidade de nova cirurgia e comorbidades.

Foram incluídos portadores de OCVL que não melhoraram com o tratamento clínico conservador baseado em massagens e com a sondagem das vias lacrimais e que, depois disso, realizaram intubação mono ou bicanalicular das vias lacrimais, cujo acompanhamento clínico e retirada dos tubos se deu no mesmo serviço. Os pacientes que não retornaram para a remoção do tubo e aqueles com dados incompletos foram excluídos da pesquisa.

Foram utilizados dois métodos de intubação: bicanalicular, utilizando a sonda de Crawford® (FCI, Paris, França) ou monocanalicular, utilizando o tubo Monoka® (FCI, Paris, França), a depender do protocolo da equipe e rotina do serviço, de modo que uma equipe recebeu treinamento para intubação monocanalicular com permanência do tubo na via lacrimal, e seguimento pós-retirada, próxima à 90 dias, e a outra recebeu treinamento para intubação bicanalicular com permanência do tubo na via lacrimal, e seguimento pós-retirada, próxima à 30 dias. Ambos os procedimentos foram realizados sob anestesia geral.

Para o diagnóstico foram anotados dados sobre a anamnese, o exame oftalmológico geral e o específico (TDC e TOFO). O TDC foi realizado instilando-se uma gota de colírio com fluoresceína no olho afetado e, após um período entre 3 a 5 minutos, aceitou-se como obstrução testes em que o menisco lacrimal excedia 1-2 milímetros de espessura sob a luz de cobalto, significando provável obstrução de vias lacrimais. O TOFO foi realizado pesquisando-se o colírio de fluoresceína sódica 1% (Ophthalmos, São Paulo, Brasil) instilado no olho do lado afetado na orofaringe, usando uma luz de cobalto e um abaixador de língua, 30 minutos após a instilação do colírio, sendo considerado resultado de via lacrimal pérvia quando a fluoresceína era visibilizada na orofaringe. Em caso de resultados inconclusivos, optou-se pela dacriocistografia como método diagnóstico, contudo, não foi necessária sua utilização nos pacientes estudados

Em relação a fixação dos tubos, a sonda monocanalicular fica na cavidade nasal sem a necessidade de sutura ou outro método de fixação, visto que a sonda apresenta um plugue que se encaixa no ponto lacrimal impedindo sua progressão. A sonda bicanalicular, por outro lado, é presa dentro da cavidade nasal dando-se um nó com ambas as extremidades da sonda e fixando-a através de sutura na região interna da columela nasal.

Após a realização da intubação, os resultados foram avaliados quanto a melhora ou não dos sintomas, a partir dos dados dos testes específicos supracitados, que avaliaram a funcionalidade da via lacrimal. Foi considerado tratamento eficaz quando, nas consultas de acompanhamento, houve melhora persistente dos sinais e sintomas, com TDC negativo (menisco lacrimal normal) e TOFO positivo (presença da fluoresceína na orofaringe com luz de cobalto).

Os retornos pós-operatórios foram realizados a cada 7 dias durante as primeiras duas semanas e, então, estendia-se o prazo de acordo com cada caso em específico.

A escolha do momento de retirada do tubo da via lacrimal, para ambas as equipes nesse estudo, baseou-se na melhora clínica dos sinais e sintomas de OCVL, aliada aos testes específicos (TDC e TOFO) favoráveis a resolução dos casos. Em casos de dúvida sobre a melhora com a intubação, optava-se pelo adiamento da retirada do tubo, mantendo-se acompanhamento periódico. Após a retirada do tubo, os pacientes mantiveram acompanhamento no serviço, conforme protocolo de cada equipe, para reavaliações regulares da perviedade das vias lacrimais.

As taxas de sucesso foram analisadas de acordo com o tipo de intubação utilizada, considerando-se duas categorias: sucesso ou falha da intubação. A avaliação de sucesso também foi feita de acordo com a idade, considerando-se três grupos: intubação das vias lacrimais até os 24 meses (Grupo 1), dos 24 meses até os 48 meses de idade (Grupo 2) e, finalmente, intubações realizadas com pacientes maiores que 48 meses de idade (Grupo 3).

Os dados obtidos foram analisados estatisticamente, utilizando-se o teste do Qui-quadrado com correção de Yates, o teste Exato de Fisher, teste t para amostras independentes. Foi adotado o nível de significância de 5%. Os dados foram analisados usando o programa computacional BioEstat v.5.3.0. (Belém, Brasil).

Resultados

Dos prontuários analisados, 23 (42,6%) pacientes eram do gênero feminino e 31 (57,4%) do masculino (p=0,116). A intubação monocanalicular foi realizada em pacientes com mediana de idade de 33 meses (IIQ 15 - 45 meses), sendo a idade mínima e máxima de 4 meses e 110 meses, respectivamente. Na intubação bicanalicular, observou-se pacientes com mediana de idade de 25 meses (IIQ 13 - 59 meses), sendo a idade mínima e máxima de 4 meses e 133 meses, respectivamente (p=0,864). Quanto a vias lacrimais, 34 (58,6%) pacientes apresentaram sintomas à esquerda e 24 (41,4%), à direita (p=0,79) (Tabela 1).

Tabela 1
Características clínicas dos pacientes.

No geral, das 58 vias lacrimais analisadas, 56 (96,5%) apresentaram melhora dos sintomas após intubação e duas vias lacrimais (3,5%) não tiveram melhora (p=0.718). Em relação ao tempo de permanência das intubações, a permanência da intubação monocanalicular teve uma mediana de 90 dias (IIQ 80 - 123 dias) e a intubação bicanalicular teve uma mediana de 30 dias (IIQ 30 - 46 dias). Em relação ao tempo de seguimento pós-retirada dos tubos, o seguimento da intubação monocanalicular teve uma mediana de 90 dias (IIQ 57 - 158 dias) e o da intubação bicanalicular teve mediana de 30 dias (IIQ 30 - 60 dias) (Tabela 2).

Tabela 2
Taxa de melhora pós-operatória nos dois grupos de pacientes

No Grupo 1, foram observadas 22 vias lacrimais (9 com monocanalicular e 13 com bicanalicular) com 100% de melhora (p=1). No grupo 2, foram observadas 20 vias lacrimais (12 com monocanalicular e 8 com bicanalicular) com 2 (10%) vias lacrimais sem melhora (p=0,652), sendo 1 destas com monocanalicular e 1, com bicanalicular. No grupo 3, foram observadas 16 vias lacrimais (6 com monocanalicular e 10 com bicanalicular) com 100% de melhora (p=1) - (Figura 1).

Figura 1
Sucesso e falha da intubação por faixas etárias.

Valores de p calculados com o teste Exato de Fisher.


Não ocorreram, nesse trabalho, complicações pre-operatórias. Porém, no período pós-operatório foram observados dois casos de extrusão dos tubos, sendo um tubo bicanalicular 30 dias após a colocação e um tubo monocanalicular, 23 dias após. Além disso, observou-se cinco casos de estenose de ponto lacrimal (três em pacientes do grupo bicanalicular e dois no grupo monocanalicular). A falha que ocorreu no grupo bicanalicular, cujo paciente apresentava estenose de canalículo superior, foi corrigida com tubo monocanalicular. Não foram observados casos de ruptura do canalículo em decorrência dos tubos.

Discussão

O presente trabalho demonstrou que a intubação mono ou bicanalicular apresentaram 100% de sucesso no grupo até os 2 anos e no acima dos 4 anos de idade, sendo maiores que os divulgados pela literatura, que encontraram 86,1% de sucesso até 2 anos,(1414 Smaniotto AP, Gazim CC, Moreira H, Kormann RB, Bezerra VL. Obstrução congênita de vias lacrimais: série de casos de sondagem e intubação. Rev Bras Oftalmol. 2016;75(1):30-3.) 91,3% até 2 anos e 79,6% acima de 4 anos,(1111 Lee H, Ahn J, Lee JM, Park M, Baek S. Clinical effectiveness of monocanalicular and bicanalicular silicone intubation for congenital nasolacrimal duct obstruction. J Craniofac Surg. 2012;23(4):1010-4.) e 81,8% até 2 anos e 81,2% acima dos 4 anos.(1515 Lim CS, Martin F, Beckenham T, Cumming RG. Nasolacrimal duct obstruction in children: outcome of intubation. J AAPOS. 2004;8(5):466-72.) Entre os 2 e 4 anos de idade as taxas de sucesso corroboraram com a literatura, que encontraram 95,4% de sucesso entre 2 e 3 anos,(1414 Smaniotto AP, Gazim CC, Moreira H, Kormann RB, Bezerra VL. Obstrução congênita de vias lacrimais: série de casos de sondagem e intubação. Rev Bras Oftalmol. 2016;75(1):30-3.) 85,5% entre 2 e 4 anos(1111 Lee H, Ahn J, Lee JM, Park M, Baek S. Clinical effectiveness of monocanalicular and bicanalicular silicone intubation for congenital nasolacrimal duct obstruction. J Craniofac Surg. 2012;23(4):1010-4.) e 92,3% entre 2 e 4 anos.(1616 Zhang C, Yu G, Cui Y, Wu Q, Wei W. Anatomical Characterization of the Nasolacrimal Canal Based on Computed Tomography in Children With Complex Congenital Nasolacrimal Duct Obstruction. J Pediatr Ophthalmol Strabismus. 2017;54(4):238-43.) Neste trabalho, não se pode demonstrar a correlação entre a idade e o resultado do tratamento, como já observado em outro estudo brasileiro.(1313 Fernandes JB, Matayoshi S, Komatsu W, Kikuta HS, Moura EM. Circuito elétrico auxiliar para intubação das vias lacrimais. Arq Bras Oftalmol. 2000;63(5):375-7.)

Não houve diferença significativa em relação ao predomínio de gênero, concordando com estudos prévios, que encontraram 52,1% de pacientes femininos e 47,9% masculinos,(1414 Smaniotto AP, Gazim CC, Moreira H, Kormann RB, Bezerra VL. Obstrução congênita de vias lacrimais: série de casos de sondagem e intubação. Rev Bras Oftalmol. 2016;75(1):30-3.) 42,4% femininos e 57,6% masculinos,(33 Eshraghi B, Jamshidian-Tehrani M, Mirmohammadsadeghi A. Comparison of the success rate between monocanalicular and bicanalicular intubations in incomplete complex congenital nasolacrimal duct obstruction. Orbit. 2017;36(4):215-7.) e 55,6% femininos e 44,4% masculinos.(1111 Lee H, Ahn J, Lee JM, Park M, Baek S. Clinical effectiveness of monocanalicular and bicanalicular silicone intubation for congenital nasolacrimal duct obstruction. J Craniofac Surg. 2012;23(4):1010-4.)

Em relação a facilidade do procedimento, a sonda monocanalicular é de mais fácil colocação pois, dentro da cavidade nasal, seu fio forma um enovelado que é de mais fácil visibilização e recuperação, não necessitando de sutura e facilitando sua retirada pelo médico. Por outro lado, a sonda bicanalicular apresenta ponteiras metálicas, em cada extremidade do fio de silicone, que devem ser capturadas e conectadas usando um gancho específico para essa técnica. O uso do endoscópio pode facilitar o procedimento. Sobre o conforto, a sonda monocanalicular é mais cômoda para o paciente, pois passa apenas por um canal lacrimal ficando livre dentro da cavidade nasal, não necessitando de nós ou sutura para ser fixada, como a bicanalicular.(22 Eustis HS, Nguyen AH. The Treatment of Congenital Nasolacrimal Duct Obstruction in Children: A Retrospective Review. J Pediatr Ophthalmol Strabismus. 2018;55(1):65-7.,1616 Zhang C, Yu G, Cui Y, Wu Q, Wei W. Anatomical Characterization of the Nasolacrimal Canal Based on Computed Tomography in Children With Complex Congenital Nasolacrimal Duct Obstruction. J Pediatr Ophthalmol Strabismus. 2017;54(4):238-43.)

Observou-se 12% de complicações pós-operatórias (8,6% de estenose de ponto lacrimal e 3,4% de extrusão acidental da sonda) e nenhuma per-operatória em pacientes submetidos a intubação, corroborando com os achados de 25% de extrusão acidental da sonda,(1616 Zhang C, Yu G, Cui Y, Wu Q, Wei W. Anatomical Characterization of the Nasolacrimal Canal Based on Computed Tomography in Children With Complex Congenital Nasolacrimal Duct Obstruction. J Pediatr Ophthalmol Strabismus. 2017;54(4):238-43.) 5% de estenose de ponto lacrimal(1616 Zhang C, Yu G, Cui Y, Wu Q, Wei W. Anatomical Characterization of the Nasolacrimal Canal Based on Computed Tomography in Children With Complex Congenital Nasolacrimal Duct Obstruction. J Pediatr Ophthalmol Strabismus. 2017;54(4):238-43.) e 20% de sangramento de ponto lacrimal associado a estenose.(77 Young JD, MacEwen CJ. Managing congenital lacrimal obstruction in general practice. BMJ. 1997;315(7103):293-6.)

No presente estudo, um grupo de médicos oftalmologistas realizou os procedimentos com a sonda monocanalicular enquanto outro grupo realizou os procedimentos com a sonda bicanalicular seguindo os mesmos métodos diagnósticos, contudo, utilizando protocolos próprios para a escolha do momento de retirada dos tubos. Porém, houve diferença estatística significativa entre os tempos de permanência das intubações monocanaliculares em relação às bicanaliculares (p<0,001) e no tempo de seguimento pós-retirada dos tubos monocanaliculares e bicanaliculares das vias lacrimais dos pacientes (p=0,03).

No que tange a diferença de tempo de permanência dos tubos, ambas as equipes seguiram protocolos próprios sobre a permanência dos tubos na via lacrimal, visando a melhora clínica dos sinais e sintomas e dos testes específicos para então realizar a retirada dos tubos.

É importante comentar sobre o custo dos tubos para o paciente, sendo o tubo monocanalicular, em média, 1,6 vezes mais caro que o tubo bicanalicular, segundo dados informados pela FCI em setembro de 2019, não sendo levado em consideração custos hospitalares ou demais despesas. Ademais, no Brasil, o tubo bicanalicular tem seu valor coberto pelos planos de saúde e Sistema Único de Saúde (SUS), ao passo que o tubo monocanalicular não. Assim, é possível que o tubo monocanalicular tenha maior custo final quando se considera mais deslocamentos, assim como para os serviços de assistência, visto que houve maior número de consultas para os pacientes que tiveram o uso deste tubo.

Existem algumas limitações no presente estudo. Primeiramente relacionada com o desenho retrospectivo do estudo, com coleta de dados baseada na análise de prontuários, o fato de serem cirurgiões diferentes para cada técnica e pela diferença observada entre os tempos de permanência e seguimento dos dois métodos de intubação. Contudo, nossos resultados basearam-se em uma amostra com grupos homogêneos e de tamanho razoável para o tema, obtendo-se assim dados mais fidedignos.

Conclusão

Observou-se que a chance de sucesso no tratamento da OCVL com intubação da via lacrimal foi estatisticamente igual com a técnica monocanalicular ou bicanalicular.

Ambos métodos se mostraram seguros e sem graves complicações. A intubação bicanalicular é mais barata, porém, a monocanalicular oferece maior facilidade para a introdução e remoção do tubo, assim como maior conforto ao paciente.

  • Institution: Hospital de Olhos do Paraná, São Paulo, SP, Brasil.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Fev 2020
  • Data do Fascículo
    Jan-Feb 2020

Histórico

  • Recebido
    14 Jan 2019
  • Aceito
    17 Out 2019
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