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Associação da deficiência de vitamina D com mortalidade e marcha pós-operatória em paciente com fratura de fêmur proximal ☆ Trabalho desenvolvido no Grupo de Cirurgia do Quadril, Departamento de Cirurgia e Ortopedia, Faculdade de Medicina de Botucatu (Unesp), Botucatu, SP, Brasil.

Resumos

OBJETIVO:

Avaliar se a concentração sérica de vitamina D está associada ao status de marcha e à mortalidade em pacientes com fratura de fêmur proximal seis meses após a fratura.

MÉTODOS:

Avaliados prospectivamente pacientes consecutivos com fratura de fêmur proximal, com idade ≥ 65 anos, internados na enfermaria de ortopedia e traumatologia do serviço, entre janeiro a dezembro de 2011. Foram feitas análises clínica, radiológica, epidemiológica e laboratorial, incluindo vitamina D. Foram submetidos à cirurgia e acompanhados ambulatorialmente em retornos 15, 30, 60 e 180 dias após a alta, quando foram avaliados os desfechos de marcha e mortalidade.

RESULTADOS:

Avaliados 88 pacientes. Dois foram excluídos por causa de fratura patológica. Oitenta e seis pacientes com idade média de 80,2 ± 7,3 anos foram estudados. Em relação à vitamina D sérica a média foi de 27,8 ± 14,5 ng/mL e 33,7% dos pacientes apresentavam deficiência dessa vitamina. Em relação à marcha, a análise de regressão logística uni e multivariada mostrou que a deficiência de vitamina D não esteve associada a sua recuperação, mesmo após ajuste por gênero, idade e tipo de fratura (OR 1,463; 95% IC 0,524-4,088; p = 0,469). Considerando a mortalidade, a análise de regressão de Cox mostrou que a deficiência de vitamina D também não esteve relacionada à sua ocorrência em seis meses, mesmo na análise multivariada (HR 0,627; 95% IC 0,180-2,191; p = 0,465).

CONCLUSÃO:

A concentração de vitamina D sérica não esteve relacionada ao status de marcha e/ou à mortalidade em paciente com fratura de fêmur proximal seis meses depois dela.

Vitamina D; Mortalidade; Marcha; Fraturas do fêmur


OBJECTIVE:

To assess whether serum vitamin D concentration is associated with gait status and mortality among patients with fractures of the proximal femur, six months after suffering the fracture.

METHODS:

Consecutive patients aged ≥65 years with fractures of the proximal femur, who were admitted to the orthopedics and traumatology ward of our service between January and December 2011, were prospectively evaluated. Clinical, radiological, epidemiological and laboratory analyses were performed, including vitamin D. The patients underwent surgery and were followed up as outpatients, with return visits 15, 30, 60 and 180 days after discharge, at which the outcomes of gait and mortality were evaluated.

RESULTS:

Eighty-eight patients were evaluated. Two of them were excluded because they presented oncological fractures. Thus, 86 patients of mean age 80.2 ± 7.3 years were studied. In relation to serum vitamin D, the mean was 27.8 ± 14.5 ng/mL, and 33.7% of the patients presented deficiency of this vitamin. In relation to gait, univariate and multivariate logistic regression showed that vitamin D deficiency was not associated with gait recovery, even after adjustment for gender, age and type of fracture (OR: 1.463; 95% CI: 0.524-4.088; p = 0.469). Regarding mortality, Cox regression analysis showed that vitamin D deficiency was not related to its occurrence within six months, even in multivariate analysis (HR: 0.627; 95% CI: 0.180-2.191; p = 0.465).

CONCLUSION:

Serum vitamin D concentration was not related to gait status and/or mortality among patients with fractures of the proximal femur, six months after suffering the fracture.

Vitamin D; Mortality; Gait; Femoral fractures


Introdução

A incidência das fraturas de fêmur proximal tem aumentado nas últimas décadas e existe uma expectativa de que continue a aumentar por causa do envelhecimento da população.11. Kim SM, Moon YW, Lim SJ, Yoon BK, Min YK, Lee DY, et al. Prediction of survival, second fracture, and functional recovery following the first hip fracture surgery in elderly patients. Bone. 2012;50(6):1343-50. and 22. Dunbar MJ, Howard A, Bogoch ER, Parvizi J, Kreder HJ.Orthopaedics in 2020: predictors of musculoskeletal need. J Bone Joint Surg Am. 2009;91(9):2276-86. Espera-se que em 2020 16,3% da população americana e 25% da população canadense estejam acima dos 65 anos.2 Esse aumento dos indivíduos idosos provavelmente acarretará uma elevação de incidência e prevalência de doenças do sistema musculoesquelético, como fraturas secundárias a osteoporose e osteoartrose. Segundo Thorngren, nos últimos 20 anos o número de fraturas de quadril dobrou em pacientes com mais de 80 anos.33. Thorngren KG. Fractures in older persons. Disabil Rehabil. 1994;16(3):119-26. Segundo Hu et al.,44. Hu F, Jiang C, Shen J, Tang P, Wang Y. Preoperative predictors for mortality following hip fracture surgery: a systematic review and meta-analysis. Injury. 2012;43(6):676-85. 1,5 milhão de fraturas de quadril ocorrem no mundo e esse número pode alcançar 2,6 milhões em 2025 e 4,5 milhões em 2050.

As fraturas secundárias à fragilidade óssea, principalmente as que ocorrem no fêmur proximal, estão relacionadas à importante diminuição da independência e ao aumento da morbidade e da mortalidade.55. Hartholt KA, Oudshoorn C, Zielinski SM, Burgers PT, Panneman MJ, van Beeck EF, et al. The epidemic of hip fractures: are we on the right track? PLoS One. 2011;6(7):e22227. Segundo Holt et al.,66. Holt G, Smith R, Duncan K, Hutchison JD, Gregori A. Outcome after surgery for the treatment of hip fracture in the extremely elderly. J Bone Joint Surg Am. 2008;90(9): 1899-905. apenas 22% dos pacientes que antes da fratura deambulavam sem apoio e desacompanhados recuperaram esse nível de independência nos primeiros 120 dias após a fratura. A perda de independência é ainda mais grave nos pacientes acima de 95 anos, grupo em que apenas 2% conseguiram recuperar a marcha pré-operatória no mesmo prazo. Além disso, as taxas de mortalidade relacionadas às fraturas de fêmur proximal são bastante altas e podem variar de 14% a 47% no primeiro ano após a sua ocorrência. Todos esses aspectos ressaltam a importância e o interesse em recuperar a marcha e melhorar o prognóstico de pacientes com esse tipo de fratura.66. Holt G, Smith R, Duncan K, Hutchison JD, Gregori A. Outcome after surgery for the treatment of hip fracture in the extremely elderly. J Bone Joint Surg Am. 2008;90(9): 1899-905.

Entre os micronutrientes relacionados ao risco de fraturas e quedas em idosos destaca-se a vitamina D. Trata-se de um micronutriente lipossolúvel cuja função classicamente relacionada ao aumento da absorção intestinal de cálcio, participando do transporte ativo deste íon nos enterócitos. Participa também da mobilização do cálcio dos ossos, na presença do PTH, e aumenta a reabsorção renal de cálcio no túbulo distal.77. Houwing RH, Rozendaal M, Wouters-Wesseling W, Beulens JW, Buskens E, Haalboom JR. A randomised, double-blind assessment of the effect of nutritional supplementation on the prevention of pressure ulcers in hip-fracture patients. Clin Nutr. 2003;22(4):401-5. Atualmente, entretanto, novas funções têm sido atribuídas a ela. Estudos mostraram papel importante na modulação de processos inflamatórios e imunológicos, além de possivelmente estar relacionada com a cicatrização das feridas e as alterações na massa e na força musculares.88. Hengstermann S, Fischer A, Steinhagen-Thiessen E, Schulz RJ. Nutrition status and pressure ulcer: what we need for nutrition screening. JPEN J Parenter Enteral Nutr. 2007;31(4):288-94. and 99. Patterson BM, Cornell CN, Carbone B, Levine B, Chapman D. Protein depletion and metabolic stress in elderly patients who have a fracture of the hip. J Bone Joint Surg Am. 1992;74(2):251-60. As concentrações mais altas de vitamina D estariam relacionadas a um menor índice de quedas em pacientes idosos. Consequentemente, diminuiriam o risco de novas fraturas.1010. Pedrosa MA, Castro ML. Role of vitamin D in the neuro-muscular function. Arq Bras Endocrinol Metabol. 2005;49(4):495-502.

Os objetivos deste estudo foram avaliar as características demográficas, clínicas e bioquímicas de pacientes com insuficiência ou não de vitamina D e se a concentração sérica desse nutriente está associada ao status da marcha e à mortalidade em pacientes com fratura de fêmur proximal seis meses após a mesma.

Casuística e métodos

O presente estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética de nossa instituição e todos os pacientes ou seus responsáveis legais assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. Foram avaliados prospectivamente pacientes consecutivos com fratura de fêmur proximal, com idade ≥ 65 anos, internados na enfermaria de ortopedia e traumatologia do serviço, de janeiro a dezembro de 2011. O critério de exclusão foi presença de fratura patológica (secundária a neoplasia). Todos os pacientes foram submetidos ao procedimento cirúrgico para correção da fratura.

Na admissão, foram registrados dados demográficos. Nas primeiras 72 horas de internação, foi coletado sangue para dosagem dos exames laboratoriais e da 25(OH) vitamina D3 sérica. Os dados referentes ao tipo de fratura de fêmur proximal (colo de fêmur, intertrocanteriana ou subtrocanteriana), tempo de espera entre a internação e a cirurgia e o tempo cirúrgico também foram registrados. Os pacientes foram acompanhados por até seis meses após a ocorrência da fratura e avaliados em relação ao status de marcha pós-operatório e à mortalidade. Para isso, foram reavaliados no primeiro dia após o procedimento cirúrgico, na alta hospitalar e em retornos com 15, 30, 60 e 180 dias após a alta. Para os pacientes que morreram antes de 180 dias, foi considerada a avaliação do status de marcha do último retorno.

A deficiência de vitamina D foi caracterizada por concentrações séricas inferiores a 20 ng/mL.1111. Holick MF. Vitamin D deficiency. N Engl J Med. 2007;357(3):266-81. Em relação ao status da marcha, os pacientes foram classificados em deambuladores (que andavam com ou sem apoio = 1) e não deambuladores (que não andavam = 0).

Avaliação laboratorial

As amostras de sangue coletadas nas primeiras 72 horas após admissão do paciente foram usadas para dosagem laboratorial e de vitamina D.

Para o hemograma foi usado método de automação em auto-analisador Coulter STKS, seguido de confirmação dos achados morfológicos de contagem de plaquetas, leucometria e diferenciais leucocitários por método convencional de hematoscopia. Para a dosagem de sódio, potássio, magnésio, cálcio total, glicemia, ureia, creatinina, proteína C reativa e albumina foi usado o método de química seca (Ortho-Clinical Diagnostics Vitros 950(r), Johnson & Johnson). O tempo de protrombina (TP) e o tempo de tromboplastina parcial ativado (TTPA) foram obtidos por métodos manuais.

Determinação de 25(OH) vitamina D3 no soro

As concentrações de 25(OH) vitamina D3 no soro foram analisadas por cromatografia líquida de alta eficiência (HPLC). Inicialmente foram pipetados 150 µL de soro em frasco de vidro. Foram adicionados 200 µL de reagente precipitador e agitado em vortex por 30 segundos. Após foram adicionados 400 µL de reagente de extração e novamente agitado em vortex por mais 30 segundos. Posteriormente centrifugou-se por 10 minutos a 13.000 rpm. O sobrenadante foi então transferido para outro frasco de vidro, evaporado com nitrogênio, ressuspendido com 300 µL de etanol e agitado por mais um minuto. Depois foram injetados 20 µL no aparelho de HPLC. Após corrida de 20 minutos, aguardou-se estabilização da coluna para nova leitura.

O equipamento usado foi o HPLC isocrático, com injetor manual Rheodyne com loop de 20 µL. A análise foi feita em coluna de sílica de 4 µm, com dimensão de 125 mm × 4 mm (KC 3420RP - Immundiagnostik). O comprimento do detector de onda ultravioleta foi fixado em 264 nm e fluxo em 0,75 mL/min. A fase móvel foi fornecida pelo fabricante Immundiagnostik. O padrão interno usado foi o da Sigma-Aldrich (C9774) e o controle da Chromsystems (25 [OH] vitamina D3serumcontrol, bi-level I + II). A sensibilidade do teste foi de 2,5 µg/L e o coeficiente de variação de < 7%. 1212. Merke J, Ritz E, Schettler G. New viewpoints on the role of vitamin D. Current knowledge and outlook. Dtsch Med Wochenschr. 1986;111(9):345-9. and 1313. Wicherts IS, van Schoor NM, Boeke AJ, Visser M, Deeg DJ, Smit J, et al. Vitamin D status predicts physical performance and its decline in olderpersons. J Clin Endocrinol Metab. 2007;92(6):2058-65.

Análise estatística

Os dados foram apresentados em média e desvio padrão ou mediana e percentis 25% e 75%. As variáveis categóricas foram analisadas pelo teste de χ2 ou de Fisher. As variáveis contínuas foram analisadas pelo teste t de Student quando apresentaram distribuição paramétrica e pelo teste de Mann-Whitney quando apresentaram distribuição não paramétrica. Para avaliar se a 25(OH) vitamina D3 está associada à recuperação da marcha 180 dias após a fratura usamos a regressão logística uni e multivariada. Para avaliação da mortalidade usamos o modelo de risco proporcional de Cox. Nas análises multivariadas, as variáveis foram ajustadas por gênero, idade e tipo de fratura. O nível de significância adotado foi de 5%.

Resultados

Foram avaliados 88 pacientes consecutivos com fratura de fêmur proximal. Desses, dois foram excluídos por causa de fratura patológica. Foram então estudados 86 pacientes, com idade média de 80,2 ± 7,3 anos. Dentre esses, 77% eram mulheres, 70% apresentaram recuperação da marcha e 12,8% morreram seis meses após a fratura. Em relação à vitamina D sérica, a média foi de 27,8 ± 14,5 ng/mL; e 33,7% dos pacientes apresentavam deficiência dessa vitamina.

Os dados demográficos e clínicos dos pacientes segundo a concentração sérica de vitamina D estão apresentados na tabela 1. A maioria dos pacientes internados apresentou fratura transtrocanteriana (55%) e fratura de colo de fêmur (38%). Não houve influência da concentração de vitamina D no tipo de fratura. Além disso, a deficiência de vitamina D não esteve associada aos dados clínicos e demográficos dos pacientes avaliados (tabela 1). Os dados bioquímicos estão apresentados na tabela 2. Não houve diferenças, em relação aos exames laboratoriais, entre o grupo com e sem deficiência de vitamina D.

Tabela 1 -
Variáveis clínicas e demográficas dos pacientes com fratura de fêmur proximal segundo a concentração sérica de vitamina D

Tabela 2 -
Variáveis laboratoriais dos pacientes com fratura de fêmur proximal segundo a concentração sérica de vitamina D

Em relação à marcha, a análise de regressão logística uni e multivariada mostrou que a deficiência de vitamina D não esteve associada a sua recuperação (OR 1,212; 95% IC 0,451-3,252; p = 0,703), mesmo após ajuste por gênero, idade e tipo de fratura (OR 1,463; 95% IC 0,524-4,088; p = 0,469) (tabela 3).

Tabela 3 -
Regressões logísticas para predição da recuperação da marcha nos pacientes com fratura de fêmur proximal

Considerando a mortalidade, a análise de regressão de Cox mostrou que a deficiência de vitamina D também não esteve relacionada à sua ocorrência em seis meses (HR 0,565; 95%IC 0,172-1,853; p = 0,346), mesmo na análise multivariada (HR 0,627; 95%IC 0,180-2,191; p = 0,465) (tabela 4).

Tabela 4 -
Regressões de Cox para predição de mortalidade nos pacientes com fratura de fêmur proximal

Discussão

O aumento da população idosa é acompanhado pela presença de doenças como a fratura de fêmur proximal. Após sua ocorrência, a mortalidade e a perda de independência, principalmente no que diz respeito ao retorno do status de marcha pré-fratura, são complicações frequentes e trazem consequências muito vezes devastadoras para a qualidade de vida tanto do paciente quanto de seus cuidadores.66. Holt G, Smith R, Duncan K, Hutchison JD, Gregori A. Outcome after surgery for the treatment of hip fracture in the extremely elderly. J Bone Joint Surg Am. 2008;90(9): 1899-905. Dessa forma, torna-se importante a identificação de fatores que possam se associar à recuperação da marcha e à mortalidade. A vitamina D tem sido aventada como micronutriente com potenciais efeitos sobre força muscular e mortalidade. Sendo assim, este estudo comparou parâmetros demográficos, clínicos e bioquímicos em pacientes com e sem deficiência de vitamina D. Adicionalmente, analisou as concentrações séricas de vitamina D como potenciais preditores de recuperação da marcha e de mortalidade.

Considerando a deficiência de vitamina D, foram comparados pacientes que apresentaram concentrações menores que 20 ng/mL com pacientes que apresentavam concentrações maiores. Ambos exibiram as mesmas características demográficas, clínicas e bioquímicas. Na realidade, não se sabe se essas concentrações refletem concentrações suficientes para as ações não clássicas da vitamina D. Não há consenso na literatura sobre quais seriam as concentrações séricas normais de vitamina D, nem sobre os valores que caracterizariam a deficiência e a insuficiência desse micronutriente.1414. Patton CM, Powell AP, Patel AA. Vitamin D in orthopaedics. J Am Acad Orthop Surg. 2012;20(3):123-9. Esses valores sempre foram baseados na relação entre as concentrações de vitamina D e os distúrbios que envolvem a homeostase do cálcio e a ocorrência de fraturas. Pensando nas novas funções descritas, a concentração de vitamina D suficiente para sua atuação nesses diferentes sítios ainda não foi estabelecida.

A International Osteoporosis Foundation, no Canadá, recomenda uma concentração de vitamina D sérica acima de 30 ng/mL.1515. Hanley DA, Cranney A, Jones G, Whiting SJ, Leslie WD. Guidelines Committee of the Scientific Advisory Council of Osteoporosis Canada. Vitamin D in adult health and disease: a review and guideline statement from Osteoporosis Canada (summary). CMAJ. 2010;182(12):1315-9. and 1616. Dawson-Hughes B, Mithal A, Bonjour JP, Boonen S, Burckhardt P, Fuleihan GE, et al. IOF position statement: vitamin D recommendations for older adults. Osteoporos Int. 2010;21(7):1151-4. Por outro lado, o Institute of Medicine of the National Academies americano caracteriza a deficiência de vitamina D por concentração sérica abaixo de 12 ng/mL e sua insuficiência por concentrações entre 12 e 20 ng/mL.1717. Ross CA, Taylor CL, Yaktine AL, Del Valle HB. Consensus report: dietary reference intakes for calcium and vitamin D. Washington DC: Institute of Medicine of the National Academies; 2010.

Em relação à recuperação da marcha, Cooper afirma que a fratura está relacionada a uma taxa de incapacidade permanente nas atividades de vida diária de 30% e incapacidade de deambular de maneira independente de 40%.1818. Cooper C. The crippling consequences of fractures and their impact on quality of life. Am J Med. 1997;103(2A):12S-7S. Larson et al.1919. Larsson S, Friberg S, Hansson LI. Trochanteric fractures. Mobility, complications, and mortality in 607 cases treated with the sliding-screw technique. Clin Orthop Relat Res. 1990;(260):232-41.observaram a recuperação funcional dos pacientes com fratura de fêmur proximal. Participaram do estudo 607 pacientes. Desses, 446 conseguiam deambular de forma independente e sem apoio antes da cirurgia e 80% recuperaram o status de marcha pré-operatório após um ano da cirurgia. Ekstrom et al.2020. Ekström W, Miedel R, Ponzer S, Hedström M, Samnegård E, Tidermark J. Quality of life after a stable trochanteric fracture - a prospective cohort study on 148 patients. J Orthop Trauma. 2009;23(1):39-44. encontraram que apenas 55% dos pacientes com fratura de fêmur proximal recuperaram seu status de marcha pré-operatória e 66% recuperaram seu nível de desempenho pré-cirurgia em atividades de vida diária. Fizemos a hipótese de que a concentração sérica de vitamina D poderia influenciar esse status de marcha pós-operatório. Ela é baseada nas funções mais recentemente atribuídas à vitamina D. Classicamente, ela está relacionada à manutenção da homeostase do cálcio, mas recentemente tem sido vinculada à contração muscular por meio da captação intracelular de cálcio e diferenciação de mioblastos. Isso diminuiria a incidência de quedas e, consequentemente, o número de fraturas.10 Nos pacientes com a fratura, aumentaria a chance de um melhor status de marcha pós-operatório. Em nosso estudo, a concentração sérica de vitamina D não esteve relacionada ao status de marcha pós-operatório, mesmo na análise corrigida.

Sobre a mortalidade, o advento da fixação cirúrgica das fraturas do fêmur proximal reduziu-a. Entretanto, permaneceu estável em 25% a 30% desde então.2121. Abrahamsen B, van Staa T, Ariely R, Olson M, Cooper C. Excess mortality following hip fracture: a systematic epidemiological review. Osteoporos Int. 2009;20(10):1633-50. Em nosso estudo, o índice em seis meses foi de 12,8%. A relação entre concentração sérica de vitamina D e a mortalidade é pouco estudada. Alguns estudos mostraram que sua baixa concentração sérica está associada ao aumento da mortalidade na população geral e em idosos.2222. Visser M, Deeg DJ, Puts MT, Seidell JC, Lips P. Low serum concentrations of 25-hydroxyvitamin D in older persons and the risk of nursing home admission. Am J Clin Nutr. 2006;84(3):616-22. , 2323. Ginde AA, Scragg R, Schwartz RS, Camargo CA Jr. Prospective study of serum 25-hydroxyvitamin D level, cardiovascular disease mortality, and all-cause mortality in older U.S. adults. J Am Geriatr Soc. 2009;57(9):1595-603. , 2424. Fiscella K, Franks P. Vitamin D, race, and cardiovascular mortality: findings from a national US sample. Ann Fam Med. 2010;8(1):11-8. , 2525. Virtanen JK, Nurmi T, Voutilainen S, Mursu J, Tuomainen TP. Association of serum 25-hydroxyvitamin D with the risk of death in a general older population in Finland. Eur J Nutr. 2011;50(5):305-12. , 26 26. Ford ES, Zhao G, Tsai J, Li C. Vitamin D and all-cause mortality among adults in USA: findings from the National Health and Nutrition Examination Survey Linked Mortality Study. Int J Epidemiol. 2011;40(4):998-1005. and 2727. Freedman DM, Looker AC, Chang SC, Graubard BI. Prospective study of serum vitamin D and cancer mortality in the United States. J Natl Cancer Inst. 2007;99(21):1594-602. Saliba et al.,2828. Saliba W, Barnett O, Rennert HS, Rennert G. The risk of all-cause mortality is inversely related to serum 25(OH)D levels. J Clin Endocrinol Metab. 2012;97(8):2792-8. em um estudo com mais de 180 mil participantes, mostraram que o risco de morte por todas as causas é significativamente maior em pacientes com baixa concentração sérica de vitamina D (abaixo de 50 nmoL/L). Em pacientes cujas concentrações são inferiores a 30 nmoL/L (deficiência), esse risco chega a dobrar. Thomas et al. mostraram que concentrações adequadas de vitamina D reduzem em 75% e 69% a mortalidade por todas as causas e por causas cardiovasculares, respectivamente, em pacientes com síndrome metabólica.2929. Thomas GN, Hartaigh B, Bosch JA, Pilz S, Loerbroks A, Kleber ME, et al. Vitamin D levels predict all-cause and cardiovascular disease mortality in subjects with the metabolic syndrome: the Ludwigshafen Risk and Cardiovascular Health (Luric) Study. Diabetes Care. 2012;35(5):1158-64.

Encontramos na literatura poucos trabalhos que avaliaram a concentração sérica de vitamina D e a mortalidade em pacientes com fratura do fêmur proximal. Madsen et al.,3030. Madsen CM, Jørgensen HL, Lind B, Ogarrio HW, Riis T, Schwarz P, et al. Secondary hyperparathyroidism and mortality in hip fracture patients compared to a control group from general practice. Injury. 2012;43(7):1052-7. em estudo que incluiu 562 pacientes com mais de 70 anos com essa fratura, concluíram que o PTH e o cálcio sérico estavam significativamente associados com a mortalidade, mas não a concentração de vitamina D. Do mesmo modo, em nosso estudo as concentrações séricas de vitamina D não estiveram associadas à mortalidade seis meses após a fratura de fêmur proximal.

Conclusão

Em conclusão, em nosso estudo, a concentração de vitamina D sérica não esteve relacionada ao status de marcha e à mortalidade em paciente com fratura de fêmur proximal seis meses depois dela. Os achados do trabalho reforçam a necessidade de novos estudos que possam identificar fatorespreditores de complicações pós-fratura de fêmur proximal.

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  • ☆ Trabalho desenvolvido no Grupo de Cirurgia do Quadril, Departamento de Cirurgia e Ortopedia, Faculdade de Medicina de Botucatu (Unesp), Botucatu, SP, Brasil.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Mar-Apr 2015

Histórico

  • Recebido
    23 Abr 2014
  • Aceito
    04 Maio 2014
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