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Aleitamento materno exclusivo, alimentação complementar e associação com excesso de gordura corporal em escolares de Florianópolis, SC, Brasil

Resumo

Objetivos:

analisar a associação da duração do aleitamento materno exclusivo (AME) e idade de introdução da alimentação complementar (AC) com o excesso de gordura corporal (EGC) em escolares de Florianópolis/SC.

Métodos:

estudo transversal com amostra probabilística de 1.531 escolares de 7-10 anos de escolas públicas/privadas de Florianópolis/SC. O EGC foi avaliado pela aferição de dobras cutânaeas tricipital e subescapular. Dados sobre AME, AC e variáveis de confusão foram obtidos por entrevista. Regressão de Poisson foi empregada nas análises ajustadas.

Resultados:

a prevalência de excesso de EGC e AME foi 37,9% (IC95%: 32,4-43,6) e 30,6% (IC95%: 17,3-48,2), respectivamente. O AME por um período menor que 4 meses e maior que 6 meses se manteve associado ao EGC após ajuste pelas variáveis confundidoras. A introdução dos grupos de alimentos na AC não esteve associação ao EGC.

Conclusões:

a associação do EGC com a AME por menos de quatro meses deve-se possivelmente à oferta precoce de outros tipos de leite como complemento ao materno, enquanto que a associação com AME por mais de seis meses pode ser devido ao fenômeno de aceleração do crescimento.

Palavras-chave:
Nutrição da criança; Obesidade pediátrica; Estudos transversais

Abstract

Objectives:

to analyze the association between exclusive breastfeeding duration (EBF) and the age at which complementary feeding was introduced (CF) with the excess of body fat (BF) in schoolchildren from Florianópolis/SC, southern of Brazil.

Methods:

cross sectional study, with probability sample of 1,531 schoolchildren aged 7-10 years from Florianópolis/SC. The percentage of BF was defined based on triceps and subscapular skinfolds. Information about EBF, CF and confounders variables were obtained through a questionnaire sent to parents or guardians. Multivariate analyzes were performed using Poisson.

Results:

the prevalence of BF excess was 37.9% (CI95%: 32.4; 43.6), and 30.6% of children received EBF for 4-6 months (CI95%: 17, 3; 48, 2). The duration of EBF less than 4 or more than 6 months was associated with higher prevalence of BF excess, even after adjustment (p=0.015). Introduction of food groups had no association with BF excess.

Conclusions:

the association between EBF and the excess of body fat for less than 4 months and higher prevalence of BF excess is probably a consequence of early introduction of others milk types, whilst association between EBF for more than 6 months and higher prevalence of BF excess is because of a catch-up growth situation.

Key words
Child nutrition; Pediatric obesity; Cross-sectional studies

Introdução

O padrão alimentar nos primeiros meses de vida desempenha papel importante na definição da composição corporal ao longo da vida.11 Orlandi SP, Schneider BC, Gonzalez MC, González-Chica DA, Assunção MCF. Determinantes nutricionais precoces da massa livre de gordura no início da vida adulta: revisão sistemática da literatura. CadSaúdePública. 2013;29: 639-53. Assim, com o aumento da prevalência da obesidade em crianças, cresce o interesse em investigar se o aleitamento materno (AM) e o manejo da introdução da alimentação complementar (AC) estão associados com o risco de sobrepeso e obesidade em etapas posteriores da vida.22 Woo JG, Martin LJ. Does Breastfeeding Protect Against Childhood Obesity? Moving Beyond Observational Evidence.CurrObes Rep. 2015; 4:207-16.,33 Durmus B, Heppe DH, Gishti O, Manniesing R, Abrahamse-Berkeveld M, van der Beek EM, et al. General and abdominal fat outcomes in school-age children associated with infant breastfeeding patterns. Am J ClinNutr. 2014:1-8.

O aleitamento materno exclusivo (AME) esteve associado ao menor risco de obesidade em alguns estudos.22 Woo JG, Martin LJ. Does Breastfeeding Protect Against Childhood Obesity? Moving Beyond Observational Evidence.CurrObes Rep. 2015; 4:207-16. Revisão sistemática que compilou os achados de mais de 80 pesquisas sugere que o aleitamento materno está associado à redução de 10-20% na prevalência de obesidade na infância.22 Woo JG, Martin LJ. Does Breastfeeding Protect Against Childhood Obesity? Moving Beyond Observational Evidence.CurrObes Rep. 2015; 4:207-16. No entanto, os estudos que compuseram essa revisão apresentam desenhos heterogêneos e aplicaram métodos distintos para avaliar a obesidade.

Ao contrário do AME, a introdução inadequada da AC parece aumentar o risco de desenvolvimento de obesidade.33 Durmus B, Heppe DH, Gishti O, Manniesing R, Abrahamse-Berkeveld M, van der Beek EM, et al. General and abdominal fat outcomes in school-age children associated with infant breastfeeding patterns. Am J ClinNutr. 2014:1-8. Por isso, identificar práticas alimentares na infância que predisponham o desenvolvimento de obesidade é tarefa importante para determinar quais fatores podem ser modificados e para o planejamento de intervenções.

O índice de massa corporal (IMC) é uma medida indireta da gordura corporal33 Durmus B, Heppe DH, Gishti O, Manniesing R, Abrahamse-Berkeveld M, van der Beek EM, et al. General and abdominal fat outcomes in school-age children associated with infant breastfeeding patterns. Am J ClinNutr. 2014:1-8. e constitui uma ferramenta útil para avaliação do estado nutricional em estudos epidemiológicos. Entretanto, apresenta importantes limitações. Durante a infância e adolescência, o IMC parece estar mais relacionado com o crescimento do que com mudanças relacionadas à gordura corporal,44 Moreno LA, Moliner-Urdiales D, Ruiz JR, Mesana MI, Vicente-Rodríguez G, Rodríguez G, et al. Five year trends on total and abdominal adiposity in Spanish adolescents. NutrHosp. 2012;27:731-8. e poucos estudos avaliaram a relação entre medidas de dobras cutâneas em crianças com a duração do AME e a idade de introdução da AC.55 Tulldahl J, Pettersson K, Andersson SW, Hulthén L. Mode of Infant Feeding and Achieved Growth in Adolescence: Early Feeding Patterns in Relation to Growth and Body Composition in Adolescence. Obes Res. 1999;7:413-7.

6 Kramer MS, Matush L, Vanilovich I, Platt RW, Bogdanovich N, Sevkovskaya Z, et al. Effects of prolonged and exclusive breastfeeding on child height, weight, adiposity, and blood pressure at age 6.5 y: evidence from a large randomized trial. Am J ClinNutr. 2007;86:1717-21.

7 Caleyachetty A, Krishnaveni GV, Veena SR, Hill J, Karat SC, Fall CH, et al. Breastfeeding duration, age of starting solids and high BMI risk and adiposity in Indian children. Matern Child Nutr. 2011;9: 199-216.

8 Moraes JFVN, Giugliano R. Exclusive breastfeeding and adiposity. RevPaul Pediatr. 2011;29:152-6.
-99 Victora CBF, Lima RC, Horta BL, Wells J. Anthropometry in body composition of 18 year old men according to duration of breastfeeding: birth cohort study from Brazil. BMJ 2003;327:901.

Assim, o objetivo deste artigo foi analisar a associação da duração do AME e idade de introdução da AC com prevalência de excesso de gordura corporal (EGC) em escolares de Florianópolis/SC.

Métodos

Estudo transversal de base escolar realizado no município de Florianópolis, capital do Estado de Santa Catarina, Sul do Brasil, com uma amostra probabilística da população de escolares de 7 a 10 anos de idade matriculada nas redes de ensino fundamental público e privado do município. De acordo com o censo escolar do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas (http://portal.inep.gov.br/basica-censo), a população de escolares nessa faixa etária incluía um total de 19.172 escolares em 2011. O cálculo do tamanho da amostra foi realizado considerando a prevalência esperada do desfecho (excesso de peso) de 38%, margem de erro de 5,0 pontos percentuais e nível de significância de 95%. Considerando o efeito de delineamento (Deff) de 1,8 (estimado com base em pesquisa anterior na mesma cidade, realizada em 2007),1010 Bernardo CO, Fernandes PS, Campos RMMB, Adami F, Vasconcelos FAG. Associação entre o índice de massa corporal de pais e de escolares de 7 a 14 anos de Florianópolis, SC, Brasil. Rev. BrasSaúdeMaternInfant. 2010;10: 183-90. e acréscimo de 10% por possíveis recusas, o tamanho calculado para amostra foi de 1.440 escolares de 7 a 10 anos de idade.

Uma vez que o presente estudo procurou testar as variáveis associadas com o excesso de gordura corporal, cálculos a posteriori foram realizados para estimar as mínimas diferenças detectáveis. Com base nas prevalências das variáveis de exposição (AME e AC) e desfecho (excesso de gordura corporal), considerando-se ainda poder do estudo de 80%, nível de confiança de 95%, desconto de 15% no tamanho de amostra pelo ajuste para fatores de confusão, e Deff de 3,1 para o desfecho, este estudo tem poder suficiente para detectar razões de prevalência de 0,52 a 0,64 como proteção e de 1,56 a 1,83 como fator de risco.

O processo de amostragem foi realizado por conglomerados. Com base nas regiões administrativas do município de Florianópolis (Centro, Continente, Norte, Leste e Sul) e o tipo de administração (Pública ou Privada), as escolas foram divididas em 10 estratos. As escolas a serem incluídas no estudo foram aleatoriamente sorteadas em cada estrato, totalizando 19 públicas e 11 privadas. Posteriormente, realizou-se a seleção das turmas a serem avaliadas em cada escola, por meio das listas de escolares disponibilizadas pelas instituições de ensino. Considerando uma média de 25 alunos por turma, e que em cada escola seriam avaliados aproximadamente 50 alunos de 7 a 10 anos, optou-se por realizar o sorteio de duas turmas nas 30 escolas, uma do turno matutino e outra do vespertino.

Foram excluídos os escolares com alguma deficiência física que impossibilitasse a avaliação antropométrica, além de adolescentes grávidas. Foram consideradas recusas e/ou perdas os escolares que não retornaram com os Termos de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) devidamente assinados pelos pais e aqueles que, mesmo com o consentimento dos pais, não quiseram participar do estudo.

O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Santa Catarina sob o parecer nº 120341/2012 conforme as normas estabelecidas pela Resolução nº 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde.

A coleta de dados aconteceu entre setembro de 2012 e junho de 2013. Os avaliadores foram previamente treinados para a aferição das medidas antropométricas, conforme protocolo de pesquisa. O erro técnico de medida (ETM) do padrão ouro para as dobras cutâneas tricipital e subescapular foi de 1,08 e 1,06 mm, respectivamente. O ETM intra-avaliador máximo aceitável foi de até duas vezes o ETM do padrão ouro, enquanto que para o ETM inter-avaliador foi considerado aceitável até três vezes esse valor.1111 Habicht JP. Estandarizacion de Metodos Epidemiologicos Cuantitativos sobre el Terreno. Bol Ofic Sanit Panamer. 1974; 76: 375-84. Foi ainda conduzido estudo piloto, com a aplicação de todos os procedimentos da pesquisa em uma escola do município de Florianópolis que não fez parte da amostragem do estudo para adaptação dos instrumentos e do TCLE. A tomada das medidas antropométricas foi realizada segundo procedimentos recomendados na literatura.1212 Lohman TG. Advances in body composition assessment.Champaign (IL): Human Kinetics Publishers; 1991.

As dobras cutâneas tricipital e subescapular foram aferidas utilizando adipômetro da marca Lange® (Califórnia) com escala de 1 mm. O excesso de gordura corporal (variável desfecho) foi avaliada por meio das medidas das dobras tricipital (TR) e subescapular (SE) e o percentual de gordura corporal foi estimado pela equação preditiva de Lohman,13a qual usa o somatório dessas dobras cutâneas na fórmula %GC = 1,35 (TR + SE) - 0,012 (TR+ SE) 2 - C (Onde C = constante para sexo, raça e idade).

As informações sociodemográficas, de aleitamento materno e de alimentação complementar foram obtidas por meio da aplicação de um questionário padronizado que foi enviado aos pais/responsáveis e devolvido no momento da coleta das medidas antropométricas.

Os dados foram digitados em dupla entrada e processados utilizando o software EpiData®3.0. A análise dos dados foi realizada utilizando o comando survey(svy) do programa STATA® versão 11.0 (StataCorp, Texas, USA), para considerar o processo de amostragem por conglomerados, com o qual se considera o estrato e o peso amostral.

A idade de introdução de cada um dos grupos alimentares (variáveis de exposição sobre AC) foi categorizada em introduzida: antes dos 6 meses, entre 6 e 11 meses e com 12 meses ou mais.

As variáveis maternas analisadas como possíveis fatores de confusão foram: IMC (construída com base nos dados de peso e altura autorreferidos e categorizada conforme as Diretrizes brasileiras de obesidade 2009/2010), idade (menor do que 15 anos, 15 a 19 anos, 20 a 39 anos e 40 anos ou mais) e escolaridade (nunca estudou, ensino fundamental, ensino médio e ensino superior). A renda familiar total mensal foi coletada em reais como variável contínua e categorizada em tercis para análise. Os pais/responsáveis também forneceram dados sobre o peso ao nascer (kg) e a idade gestacional ao nascer (semanas) do escolar, ambas coletadas como variáveis contínuas e analisadas como categóricas, de acordo com pontos de corte da Sociedade Brasileira de Pediatria. O sexo e a idade da criança (calculada com base na data de nascimento) foram obtidos a partir dos registros escolares. A idade foi categorizada para análises em 7-8 anos e 9-10 anos. O excesso de gordura corporal foi definido com base no percentual de gordura corporal (%GC): moderadamente alto, alto ou muito alto (% GC ≥ 20,1% para meninos e ≥ 25,1% para meninas).1313 Lohman TG. Applicability of body composition techniques and constants for children and youth. Exerc Sport Sci Rev. 1986;14:325-57.

Dados sobre aleitamento foram levantados com base em duas perguntas: "O escolar mamou no peito?"e "Até quando o aluno mamou leite materno?". Dados sobre a introdução alimentar foram levantados com base em questões sobre a idade na qual a criança começou a consumir outros alimentos, além do leite materno. Esses alimentos foram divididos em 11 grupos: água ou chás, sucos naturais de fruta, outros tipos de leite (de vaca ou fórmula), frutas, legumes, cereais, leguminosas, carnes, bebidas açucaradas (refrigerantes, sucos de caixinha ou em pó), guloseimas (doces, balas, bolachas recheadas) e lanches (pizza, lanches, cachorro quente, hambúrguer, salgadinho de pacote).

Todas as variáveis relativas à alimentação e ao aleitamento materno tiveram 14 opções de resposta: menos de um mês, mais de doze meses e outras doze opções, de um a doze meses. O AME (variável de exposição principal) foi definido como a alimentação da criança exclusivamente com leite materno, sem nenhum outro alimento ou líquido1414 WHO (World Health Organization). Infant and young child feeding: model chapter for textbooks for medical students and allied health professionals.Geneva: WHO Press; 2009. [acesso em 08 mar2016]. Disponível em: http://goo.gl/DcQWtZ
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e classificado em: nunca mamou (amamentado por menos de 1 mês), de 1 a 3 meses, de 4 a 6 meses, e por 7 meses.

Na análise bivariada, a associação entre a gordura corporal e as variáveis independentes foi analisada utilizando o teste qui-quadrado com correção de Rao-Scott de heterogeneidade ou tendência, segundo a direção das associações. Após a análise bivariada, foi realizada a análise multivariada utilizando a regressão de Poisson. As variáveis socioeconômicas e demográficas que obtiveram p<0,20 no teste do qui-quadrado foram inseridas no modelo multivariado. Foram estimadas as razões de prevalência (RP) e seus respectivos intervalos de confiança (IC95%). O nível de significância estatística utilizado nas análises foi de 5%.

Resultados

Participaram deste estudo 1.531 escolares de 7 a 10 anos de idade (68,5% dos elegíveis). Entre aqueles não avaliados por perda e/ou recusa, houve maior percentual de meninos, pertencentes à rede privada de ensino e matriculados nas séries iniciais do ensino fundamental. Não houve diferença em relação à faixa etária (Tabela 1).

Tabela 1
Comparação dos escolares de 7 a 10 anos avaliados e não avaliados no estudo. Florianópolis, SC, 2012/2013.

Na Tabela 2 é apresentada a distribuição das principais características maternas e dos escolares da população de estudo e sua associação com excesso de gordura corporal pelo teste do qui-quadrado. A média de idade das mães foi 36,2 anos (±6,9) e 42,3% delas havia cursado o ensino superior. Quanto às características de nascimento dos escolares, 9,7% haviam tido baixo peso ao nascer (menor do que 2,5kg) e 17,1% haviam sido prematuros (IC95%: 14,8-19,4). A prevalência de excesso de gordura corporal nos escolares foi de 37,9% (IC95%: 32,4-43,6). Quanto à duração do aleitamento materno exclusivo, 36,6% das crianças foram amamentadas exclusivamente por período de um a três meses de idade, 27,5% foram amamentadas exclusivamente ao seio por menos de um mês ou nunca foram exclusivamente amamentadas, e 30,6% foram exclusivamente amamentadas por um período de quatro a seis meses.

Tabela 2
Distribuição das características maternas e de escolares de 7 a 10 anos e associação com excesso de gordura corporal. Florianópolis, SC, 2012/2013.

A Tabela 3 apresenta a prevalência de EGC e sua associação com AME nos escolares participantes do estudo. A prevalência de excesso de gordura corporal foi maior entre os escolares que receberam AME por sete meses (64,71%) e entre aqueles amamentados por período de um a três meses (39,63%), quando comparado aos nunca amamentados. Na análise ajustada, a prevalência de excesso de gordura corporal foi cerca de duas vezes maior entre os que haviam recebido AME por sete meses em comparação com os nunca amamentados (RP=2,34; IC95%: 1,44-3,81), e cerca de 1,6 vez maior entre os que receberam AME por menos de um mês (RP=1,61; IC95%: 1,07-2,42) e por período de um a três meses (RP=1,66; IC95%: 1,16-2,37), quando comparado aos escolares nunca amamentados (p=0,015).

Tabela 3
Prevalência de excesso de gordura corporal por tempo de duração do aleitamento materno exclusivo e associação em escolares de 7 a 10 anos de idade. Florianópolis, SC, 2012/2013.

A Tabela 4 apresenta a prevalência de EGC de acordo com o tipo de alimento e a idade de introdução na alimentação complementar. Água e/ou chás foram os mais frequentemente introduzidos antes dos seis meses de idade (63,6%). Em relação à oferta de outros alimentos líquidos como complemento ao leite materno, 43,5% dos escolares foram alimentados com outro tipo de leite e 50,9%, com sucos de frutas antes dos seis meses de vida. A maior parte dos escolares foi alimentada com legumes (63,8%), cereais (79,5%), leguminosas (89,8%) e carnes (90,4%) apenas após os seis meses de idade. Alimentos considerados não saudáveis, como bebidas açucaradas, guloseimas e lanches, foram introduzidos na alimentação da criança após os seus 12 meses de vida para 75,6% dos participantes. Na análise do qui-quadrado, a introdução de cereais esteve associada com excesso de gordura corporal (p=0,033). Para os outros grupos alimentares, não foram encontradas diferenças significativas entre a idade de sua introdução e excesso de gordura corporal.

Tabela 4
Prevalência de excesso de gordura corporal de acordo com o tipo de alimento e a idade de introdução na alimentação complementar. Florianópolis, SC, 2012/2013.

A Tabela 5 apresenta a prevalência de excesso de gordura corporal e sua associação com a idade de introdução de cereais na AC. A prevalência de excesso de gordura corporal foi maior entre as crianças cuja introdução de cereais na dieta ocorreu antes dos seis meses, mas não houve diferença significativa entre os grupos, mesmo após análise ajustada (p=0,076).

Tabela 5
Análise da prevalência de excesso de gordura corporal e Regressão de Poisson para idade de introdução de cereais na alimentação complementar e excesso de gordura em escolares de 7 a 10 anos de idade. Florianópolis, SC, 2012/2013.

Discussão

Esse estudo teve como objetivo analisar a associação de duração do AME e idade de introdução da AC com prevalência de excesso de gordura corporal em escolares de Florianópolis/SC. AME por menos de um mês, por período de 1 a 3 meses ou por 7 meses foi associado à maior prevalência de excesso de gordura corporal (p=0,015). A introdução dos grupos de alimentos na alimentação complementar das crianças não apresentou associação com excesso de gordura corporal.

A prevalência de excesso de gordura corporal nos escolares estudados (37,9%) é comparável à observada em outros estudos conduzidos no Brasil.1515 Coelho LG, Cândido AP, Machado-Coelho GL, Freitas SN. Association between nutritional status, food habits and physical activity level in schoolchildren.JPediatr.(Rio J). 2012;88:406-12.,1616 Barbosa L, Chaves OC, Ribeiro RCL. Parâmetros antropométricos e de composição corporal na predição do percentual de gordura e perfil lipídico em escolares. Rev Paul Pediatr. 2012;30: 520-8. Considerando que o IMC pode subestimar a gordura corporal,44 Moreno LA, Moliner-Urdiales D, Ruiz JR, Mesana MI, Vicente-Rodríguez G, Rodríguez G, et al. Five year trends on total and abdominal adiposity in Spanish adolescents. NutrHosp. 2012;27:731-8. acredita-se que as medidas de dobras cutâneas da presente pesquisa tenham encontrado maior número de escolares com excesso de gordura corporal.

No Brasil, os escolares de sete a dez anos de idade vêm acompanhando a transição nutricional,1717 IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Pesquisa de orçamentos familiares: 2008-2009: antropometria e estado nutricional de crianças e adolescentes e adultos no Brasil. Rio de Janeiro; 2010. substituindo rapidamente o problema de escassez pelo excesso. As taxas de desnutrição vêm diminuindo e as de obesidade, aumentando. Portanto, a alta prevalência de excesso de gordura corporal evidenciada por este trabalho aponta para a necessidade de intervenções para mudança desse quadro, pois crianças obesas apresentam maior risco de permanecer com essa condição na vida adulta, quando comparadas às não obesas.1818 Must A, Jacques PF, Dallal GE, Bajema CJ, Dietz WH. Long-term morbidity and mortality of overweight adolescents: a follow-up of the Harvard Growth Study 1922 to 1935. N Engl J Med. 1992;327:1350-5. De acordo com um estudo realizado em Boston (Estados Unidos), que analisou adolescentes do Harvard Growth Study, 52% dos indivíduos que apresentaram excesso de peso corporal na adolescência mantiveram esse estado nutricional na vida adulta, com risco relativo duas vezes maior para todas as causas de doenças coronarianas.1818 Must A, Jacques PF, Dallal GE, Bajema CJ, Dietz WH. Long-term morbidity and mortality of overweight adolescents: a follow-up of the Harvard Growth Study 1922 to 1935. N Engl J Med. 1992;327:1350-5.

Um percentual de 64,1% dos escolares do estudo foi amamentado exclusivamente por menos de quatro meses ou nunca foram amamentados. Esse tempo de AME é inferior ao recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS)1414 WHO (World Health Organization). Infant and young child feeding: model chapter for textbooks for medical students and allied health professionals.Geneva: WHO Press; 2009. [acesso em 08 mar2016]. Disponível em: http://goo.gl/DcQWtZ
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e pelo Ministério da Saúde.1919 Brasil. Ministério da Saúde. II Pesquisa de Prevalência de Aleitamento Materno nas Capitais Brasileiras e Distrito Federal. Brasília: Ministério da Saúde; 2009. Disponível em: https://goo.gl/Y0PswY.
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Ressalta-se que a OMS e o Ministério da Saúde do Brasil recomendam que o AME seja realizado até o sexto mês de idade, e consideram que o leite materno sozinho não é suficiente para suprir as necessidades nutricionais do bebê após essa idade. Portanto, recomenda-se que a AC seja introduzida a partir dos seis meses, constituída por alimentos in natura, seguros, culturalmente aceitos, economicamente acessíveis e que sejam agradáveis à criança.1919 Brasil. Ministério da Saúde. II Pesquisa de Prevalência de Aleitamento Materno nas Capitais Brasileiras e Distrito Federal. Brasília: Ministério da Saúde; 2009. Disponível em: https://goo.gl/Y0PswY.
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A prevalência de AME encontrada também pode estar relacionada à alta prevalência de prematuridade na amostra estudada (17%), já que as taxas de amamentação são menores em prematuros.2020 Demirci JR, Sereika SM, Bogen D. Prevalence and predictors ofearly breastfeedingamong late preterm mother-infant dyads. Breastfeed Med. 2013;8: 277-85. Destaca-se que as taxas de prematuridade para Santa Catarina no período de 2003-2012, conforme informação disponível no Sistema de Informação de Nascidos Vivos (SINASC), apresentaram pouca variação até o ano de 2010 (6,1%-7,2%), iniciando a tendência a taxas mais elevadas a partir de 2011-2012 (9,1%-10,6%).2121 Freitas PF, AraújoRR.Premature birth and associated factors in the Brazilian State of Santa Catarina: an analysis after alteration of the gestational age section of the Live Birth Declarations. Rev Bras SaúdeMatern Infant. 2015;15(3):309-16.

A duração do AME por menos de 1 mês ou por período de 1 a 3 meses, neste estudo, esteve associada a excesso de gordura corporal. Há uma hipótese de que essa associação pode se dar por conta da utilização de leite de vaca ou de fórmulas infantis como complementação ao leite materno precocemente. No questionário de introdução da AC, 43,5% dos pais relataram que ofereceram outros tipos de leite antes das crianças completarem seis meses de idade. As fórmulas infantis apresentam maior densidade energética e maior quantidade de proteína/nitrogênio, o que pode ocasionar aumento da secreção de insulina e Insulin Growth Factor 1 (IGF-1), levando ao ganho de peso excessivo precocemente.2222 Gillman MW, Rifas-Shiman SL, Camargo CA Jr, Berkey CS,Frazier AL,Rockett HR,Field AE,Colditz GA. Risk of overweight among adolescents who were breastfed as infants. JAMA. 2001;285(19):2461-7.

AME por mais de seis meses também esteve associado ao excesso de gordura corporal, mesmo após ajuste para fatores de confusão. Esse resultado pode ser explicado pelo fato de que crianças em AME após os seis meses podem não ter suas necessidades nutricionais atendidas, situação que poderia gerar carência nutricional e ganho de peso insuficiente. Com a introdução de alimentos complementares e adequação da oferta nutricional, levanta-se a hipótese de que essas crianças poderiam estar desenvolvendo o chamado catch-up growth, resultando em acúmulo excessivo de gordura corporal.2323 Dulloo AG. Regulation of fat storage via suppressed thermogenesis: a thrifty phenotype that predisposes individuals with catch-up growth to insulin resistance and obesity. Horm Res. 2006;65 (Suppl 3):90-97.

A hipótese de que o AM pode ter um efeito protetor contra a obesidade vem sendo investigada em diversos estudos. Revisões sistemáticas fornecem evidências do efeito protetor do AM sobre a obesidade,22 Woo JG, Martin LJ. Does Breastfeeding Protect Against Childhood Obesity? Moving Beyond Observational Evidence.CurrObes Rep. 2015; 4:207-16. porém também sugerem efeito nulo nesta associação,2424 Harder T, Schellong K, Plagemann A. Differences between meta-analyses on breastfeeding and obesity support causality of the association. Pediatrics. 2006;117: 987-8. gerando resultados contraditórios. As divergências nos resultados das pesquisas podem ser explicadas por diferenças no delineamento dos protocolos, nas variáveis utilizadas para controlar vieses de confusão e também da faixa etária do desfecho, no caso, a obesidade. Woo et al.,22 Woo JG, Martin LJ. Does Breastfeeding Protect Against Childhood Obesity? Moving Beyond Observational Evidence.CurrObes Rep. 2015; 4:207-16. analisando dados de seis revisões sistemáticas (totalizando 81 artigos), concluíram que além de desenhos e métodos distintos, as variáveis de ajuste foram diferentes2525 Owen CG, Martin RM, Whincup PH, Smith GD, Cook DG. Effect of infant feeding on the risk of obesity across the life course: a quantitative review of published evidence. Pediatrics. 2005;115(5): 1367-77. ou não foram controlados na maioria dos estudos incluídos. Do mesmo modo, a idade média dos sujeitos das pesquisas na aferição do desfecho variou de 4 meses a 62 anos de idade.

Outros motivos podem ser apontados para a divergência de resultados encontrados na literatura, dentre eles a heterogeneidade dos estudos, com diferenças na idade dos indivíduos avaliados, local de realização da pesquisa, critérios para avaliação do AME e do excesso de gordura corporal,22 Woo JG, Martin LJ. Does Breastfeeding Protect Against Childhood Obesity? Moving Beyond Observational Evidence.CurrObes Rep. 2015; 4:207-16. bem como a forma de questionamento aplicada. Foram encontrados cinco trabalhos que avaliaram esta associação e que utilizaram outros parâmetros para aferição da gordura corporal que não o IMC.55 Tulldahl J, Pettersson K, Andersson SW, Hulthén L. Mode of Infant Feeding and Achieved Growth in Adolescence: Early Feeding Patterns in Relation to Growth and Body Composition in Adolescence. Obes Res. 1999;7:413-7.

6 Kramer MS, Matush L, Vanilovich I, Platt RW, Bogdanovich N, Sevkovskaya Z, et al. Effects of prolonged and exclusive breastfeeding on child height, weight, adiposity, and blood pressure at age 6.5 y: evidence from a large randomized trial. Am J ClinNutr. 2007;86:1717-21.

7 Caleyachetty A, Krishnaveni GV, Veena SR, Hill J, Karat SC, Fall CH, et al. Breastfeeding duration, age of starting solids and high BMI risk and adiposity in Indian children. Matern Child Nutr. 2011;9: 199-216.

8 Moraes JFVN, Giugliano R. Exclusive breastfeeding and adiposity. RevPaul Pediatr. 2011;29:152-6.
-99 Victora CBF, Lima RC, Horta BL, Wells J. Anthropometry in body composition of 18 year old men according to duration of breastfeeding: birth cohort study from Brazil. BMJ 2003;327:901. Apenas dois deles55 Tulldahl J, Pettersson K, Andersson SW, Hulthén L. Mode of Infant Feeding and Achieved Growth in Adolescence: Early Feeding Patterns in Relation to Growth and Body Composition in Adolescence. Obes Res. 1999;7:413-7.,88 Moraes JFVN, Giugliano R. Exclusive breastfeeding and adiposity. RevPaul Pediatr. 2011;29:152-6. encontraram associação entre o tempo de AM e menores valores de gordura corporal.

A situação socioeconômica também vem sendo apontada como responsável por confusão residual nas associações entre aleitamento materno e estado nutricional. Em estudo que comparou os resultados de duas coortes de nascimento, uma na Inglaterra e outra em Pelotas, no sul do Brasil, a duração do aleitamento materno esteve inversamente associada com o IMC no primeiro estudo, enquanto no segundo não houve associação.2626 Brion MJ, Lawlor DA, Matijasevich A, Horta B, Anselmi L, Araujo CL, et al. What are the causal effects of breastfeeding on IQ, obesity and blood pressure? Evidence from comparing high-income with middle-income cohorts.Int J Epidemiol.2011; 40: 670-80. Na presente pesquisa, visando reduzir os efeitos de confusão residual nos resultados, mais de uma variável socioeconômica foram consideradas como possíveis fatores de confusão: idade materna, renda familiar e variáveis do escolar (peso ao nascer, sexo e idade). O AME esteve diretamente associado com a renda familiar (valores correspondentes passaram de dois meses no quartil inferior para cinco meses no quartil superior; p de tendência <0,001) e com a escolaridade materna (mediana de AME passou de 1,5 meses entre as que nunca estudaram para cinco meses entre as mães com ensino superior; p de tendência <0,001), o que também vem sendo observado em outros estudos.2727 Boccolini CS, Carvalho ML, Oliveira MIC. Fatores associados ao aleitamento materno exclusivo nos primeiros seis meses de vida no Brasil: revisão sistemática. Rev Saúde Públ. 2015; 49:1-16. Revisão sistemática que procurou fatores associados ao AME observou que todos os estudos que investigaram associação entre escolaridade materna e AME concluíram que baixa escolaridade da mãe está associada com interrupção do AME.2727 Boccolini CS, Carvalho ML, Oliveira MIC. Fatores associados ao aleitamento materno exclusivo nos primeiros seis meses de vida no Brasil: revisão sistemática. Rev Saúde Públ. 2015; 49:1-16.

A frequência de introdução de outros tipos de leite antes dos seis meses na população de estudo (43,5%) foi menor do que a encontrada em um estudo realizado com pré-escolares em São Paulo (53,2%),28 no qual a prevalência de introdução precoce de frutas também foi maior (66,4%) do que a observada neste trabalho (47,6%).

Observou-se que 24,4% dos pais já haviam introduzido alimentos não saudáveis na alimentação de seus filhos antes dos 12 meses de idade, como doces ou guloseimas (39,1%), refrigerantes e sucos artificiais (30,5%) e lanches(16,9%). Embora a introdução destes alimentos não tenha sido associada com o excesso de gordura corporal na amostra, eles apresentam alta quantidade de carboidratos simples, gordura e/ou sal. Além disso, a introdução precoce de sólidos na alimentação das crianças também é uma prática indesejável. As preferências alimentares são definidas nos primeiros anos de vida e tendem a formar padrões alimentares que podem se manter na vida adulta.2929 Saavedra JM, Deming D, Dattilo A, Reidy K. Lessons from the Feeding Infants and Toddlers Study in North America: What Children Eat, and Implications for Obesity Prevention. Ann NutrMetab. 2013;62(Suppl. 3): 27-36. Desta maneira, oferecer alimentos considerados não saudáveis precocemente para a criança pode propiciar a formação de hábitos alimentares não saudáveis.

No presente estudo, a prevalência de excesso de gordura corporal foi maior no grupo de crianças que teve introdução de cereais antes dos seis meses de idade, contrariando as recomendações da OMS,1414 WHO (World Health Organization). Infant and young child feeding: model chapter for textbooks for medical students and allied health professionals.Geneva: WHO Press; 2009. [acesso em 08 mar2016]. Disponível em: http://goo.gl/DcQWtZ
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mas não apresentou diferença significativa na regressão de Poisson. No entanto, merece atenção o fato de que a introdução de alimentos está ocorrendo precocemente, o que aponta para a necessidade de aperfeiçoamento de políticas públicas de promoção, proteção e apoio ao aleitamento materno exclusivo até os seis meses de idade.Vale ressaltar, ainda, que o instrumento utilizado para coleta de dados de consumo alimentar não permite a diferenciação entre cereais integrais e processados e/ou açucarados.

Limites e potencialidades do estudo

Apesar de o presente estudo ter utilizado um longo período de recordatório para coletar os dados sobre aleitamento e idade de introdução da AC (podendo chegar a até dez anos, tendo em vista a faixa etária das crianças), a mediana de AME encontrada (90 dias) foi similar à da II Pesquisa de Prevalência de Aleitamento Materno, realizada em 2008, que mostrou que em Florianópolis a mediana de AME foi de 86,5 dias (IC95% 79,4-93,2).1919 Brasil. Ministério da Saúde. II Pesquisa de Prevalência de Aleitamento Materno nas Capitais Brasileiras e Distrito Federal. Brasília: Ministério da Saúde; 2009. Disponível em: https://goo.gl/Y0PswY.
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Desta forma, acredita-se que o erro de recordatório não tenha afetado os resultados, uma vez que o questionário utilizado para coleta de dados foi composto por questões detalhadas de 11 grupos de alimentos, além de duas perguntas sobre aleitamento materno, todas com opções de resposta que facilitavam o registro das informações. Adicionalmente, comparando as prevalências de baixo peso ao nascer e prematuridade com base nas respostas dos pais com os dados de uma coorte de nascimento realizada no sul do Brasil em 2004, os valores são similares.3030 Barros AJ, Santos IS, Victora CG, Albernaz EP, Domingues MR, Timm IK, et al. Coorte de Nascimentos de Pelotas, 2004: metodologia e descrição. RevSaúde Pública. 2006;40:402-13. Isso sugere confiabilidade também para os dados relacionados ao aleitamento materno e introdução de alimentos, sujeitos ao mesmo período de recordatório. A ausência de informações sobre quantidade de consumo alimentar e prática de atividade física entre as crianças também pode ser apontada como uma limitação, levando em consideração a multicausalidade do desfecho investigado (excesso de gordura corporal). Ainda, o instrumento utilizado para coletar dados de introdução da AC não permite identificar o tipo de cereal introduzido na alimentação das crianças.

Como pontos fortes do trabalho pode ser citado, primeiramente, o tamanho da amostra com dados representativos da população de escolares de Florianópolis. Isso possibilita que as conclusões sejam extrapoladas para a população, observando o poder do estudo. A avaliação antropométrica também é um ponto relevante, pois houve padronização dos avaliadores para medição da população investigada, com o intuito de minimizar o viés de aferição. Juntamente com a dupla digitação dos dados, para evitar o viés de compilação, essas são vantagens metodológicas que indicam rigor e confiabilidade dos resultados, da maneira que são expostos.

O processo de seleção amostral e o cuidadoso critério de coleta de dados permite uma validade externa do estudo. Assim, esses resultados podem ser estendidos para outras populações com a mesma faixa etária. No entanto, a realização de estudos prospectivos é desejável a fim de reduzir os vieses relacionados aos instrumentos da presente pesquisa. A prevalência de 37,9% de excesso de gordura corporal, identificada em escolares do município, é preocupante devido à sua forte relação com os fatores de risco para doenças crônicas não transmissíveis. Os resultados deste estudo apontam ainda que a prevalência de AME até os seis meses é baixa (30,6%), mostrando assim que as metas da OMS ainda não são cumpridas.

Acredita-se que associação de AME por menos de 4 meses à maior prevalência de excesso de GC se justifique pela oferta de outros tipos de leite precocemente como complementação ao materno. A associação de AME por mais de seis meses de idade à maior prevalência de excesso de GC pode ser uma consequência do catchup growth.

A introdução dos diversos grupos de alimentos na alimentação complementar não apresenta associação com excesso de gordura corporal.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jan-Mar 2017

Histórico

  • Recebido
    14 Abr 2016
  • Aceito
    26 Jan 2017
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