Acessibilidade / Reportar erro

Gasto energético em ventilação mecânica: existe concordância entre a equação de Ireton-Jones e a calorimetria indireta?

Resumos

OBJETIVO: Avaliar a concordância entre o gasto energético mensurado pela calorimetria indireta e o estimado pela fórmula de Ireton-Jones de pacientes críticos em ventilação mecânica assistida. MÉTODOS: Participaram do estudo indivíduos aptos a interromper o suporte ventilatório, internados entre agosto de 2006 e janeiro de 2007, no centro de terapia intensiva do Hospital de Clínicas de Porto Alegre - RS. O gasto energético foi mensurado pela calorimetria indireta usando monitor específico, assim como calculado pela fórmula de Ireton-Jones. Os valores encontrados foram analisados por meio do teste t de Student e pelo método de Bland and Altman, e expressos pela média ± desvio padrão, com nível de significância p<0,05. RESULTADOS: Foram incluídos no estudo quarenta pacientes, com idade média de 56±16 anos e índice APACHE II 23±8. O gasto energético mensurado pela calorimetria indireta foi de 1558±304kcal/24h, enquanto o estimado por Ireton-Jones foi de 1689±246kcal/24h. Houve diferença estatisticamente significativa entre as médias do gasto energético mensurado e estimado para o mesmo indivíduo (p<0,004). Os limites de concordância entre a calorimetria indireta e a equação de Ireton-Jones foram de -680,51 a 417,81 kcal. CONCLUSÃO: O gasto energético estimado pela fórmula de Ireton-Jones não apresentou boa concordância com o medido pela calorimetria indireta, entretanto, considerando aspectos relacionados à disponibilidade do aparelho, esta equação pode auxiliar no planejamento nutricional dos pacientes críticos.

Calorimetria indireta; Valor preditivo dos testes; Metabolismo energético; Respiração artificial


OBJECTIVE: Assess the agreement between the energy expenditure measured by indirect calorimetry and that estimated by the Ireton-Jones formula of critically ill patients under assisted mechanical ventilation. METHODS: Participated in the study individuals able to interrupt ventilation support, admitted at the center of intensive care of the Hospital de Clínicas de Porto Alegre - RS, between August 2006 and January 2007. Energy expenditure was measured by indirect calorimetry using a specific monitor, as well as estimated by the Ireton-Jones formula. Values found were analyzed using the Student's t test and the Bland and Altman method and expressed in mean, ± standard deviation with a significance level of p<0.05. RESULTS: The study included forty patients with a mean age of 56±16 years and APACHE II score of 23±8. Energy expenditure measured by indirect calorimetry was of 1558±304kcal/24h, while that estimated by Ireton-Jones was of 1689±246kcal/24h. There was a significant statistical difference between means of energy expenditure measured and estimated of the same individual (p<0.004). The agreement thresholds between indirect calorimetry and the Ireton-Jones equation were of -680.51 to 417.81 kcal. CONCLUSION: Energy expenditure estimated by the Ireton-Jones formula did not present good agreement with that measured by indirect calorimetry, however, considering aspects related to availability of the equipment, this equation may be useful in the nutritional planning for critically ill patients.

Calorimetry, indirect; Predictive value of tests; Energy metabolism; Respiration, artificial


ARTIGO ORIGINAL

Gasto energético em ventilação mecânica: existe concordância entre a equação de Ireton-Jones e a calorimetria indireta?

Laura Jurema dos SantosI; Laíse BalbinottiII; Anne y Castro MarquesIII; Sônia AlscherIV; Sílvia Regina Rios VieiraV

IMestre, Professora do Curso de Fisioterapia da Universidade Luterana do Brasil - ULBRA - Torres (RS), Brasil

IIResidente de Nutrição em Terapia Intensiva do Programa de Residência Multiprofissional em Saúde (PREMUS) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS - Porto Alegre (RS), Brasil

IIIPós-graduanda (Doutorado) Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP - Campinas (SP), Brasil

IVMestre, Professora Titular da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul - PUCRS - Porto Alegre (RS), Brasil

VPós-Doutora, Professora do Departamento de Medicina Interna FAMED Universidade Federal do Rio Grande do Sul - UFRGS - Porto Alegre (RS), Brasil

Autor para correspondência Autor para correspondência: Laura Jurema dos Santos Rua Silva Jardim, 509 - apto. 303 CEP: 90450-071 - Porto Alegre (RS), Brasil Fone: (51) 9978 1067 E-mail: laurafisio@terra.com.br

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar a concordância entre o gasto energético mensurado pela calorimetria indireta e o estimado pela fórmula de Ireton-Jones de pacientes críticos em ventilação mecânica assistida.

MÉTODOS: Participaram do estudo indivíduos aptos a interromper o suporte ventilatório, internados entre agosto de 2006 e janeiro de 2007, no centro de terapia intensiva do Hospital de Clínicas de Porto Alegre - RS. O gasto energético foi mensurado pela calorimetria indireta usando monitor específico, assim como calculado pela fórmula de Ireton-Jones. Os valores encontrados foram analisados por meio do teste t de Student e pelo método de Bland and Altman, e expressos pela média ± desvio padrão, com nível de significância p<0,05.

RESULTADOS: Foram incluídos no estudo quarenta pacientes, com idade média de 56±16 anos e índice APACHE II 23±8. O gasto energético mensurado pela calorimetria indireta foi de 1558±304kcal/24h, enquanto o estimado por Ireton-Jones foi de 1689±246kcal/24h. Houve diferença estatisticamente significativa entre as médias do gasto energético mensurado e estimado para o mesmo indivíduo (p<0,004). Os limites de concordância entre a calorimetria indireta e a equação de Ireton-Jones foram de -680,51 a 417,81 kcal.

CONCLUSÃO: O gasto energético estimado pela fórmula de Ireton-Jones não apresentou boa concordância com o medido pela calorimetria indireta, entretanto, considerando aspectos relacionados à disponibilidade do aparelho, esta equação pode auxiliar no planejamento nutricional dos pacientes críticos.

Descritores: Calorimetria indireta; Valor preditivo dos testes; Metabolismo energético; Respiração artificial

INTRODUÇÃO

O cálculo das necessidades energéticas é parte integrante do cuidado nutricional dos pacientes críticos, sendo a determinação do número exato de calorias uma das grandes dificuldades na prática clínica. A doença aguda e seu tratamento alteram o metabolismo do paciente crítico, aumentando ou diminuindo seu gasto energético.(1) A inacurácia das equações teóricas, método amplamente utilizado para estimar as necessidades energéticas dos indivíduos, é ainda mais significativa nos pacientes graves, por estarem suscetíveis a evoluir para a síndrome de disfunção de múltiplos órgãos e sistemas e de terem uma deterioração do estado nutricional, pela persistência do estado hipermetabólico. Essas equações, portanto, talvez sejam eficazes para pacientes com valores metabólicos normais, mas é provável que não sejam indicadores tão confiáveis para pacientes críticos em ventilação mecânica.(2,3)

Uma alternativa para diminuir os riscos de estimar erroneamente o gasto energético em pacientes criticamente enfermos é por meio da calorimetria indireta (CI), considerada um método seguro, não invasivo, preciso e quase isento de complicações, sendo classificado como método de referência na determinação do gasto energético.(4)

Brandi et al. observaram que a CI pode ser usada para calcular a energia consumida em pacientes que não respondem adequadamente às necessidades nutricionais estimadas, com falência única ou disfunção de múltiplos órgãos e sistemas, para avaliar os efeitos da terapia nutricional em pacientes com falência respiratória ventilados mecanicamente e monitorar o consumo de oxigênio (VO2) durante o desmame da ventilação mecânica,(5) assim como para controlar o gasto energético durante a resposta hipermetabólica.(6) Entretanto, sabe-se que ainda não é de rotina a aplicação desse método para avaliar pacientes nos hospitais brasileiros, já que o equipamento possui custo elevado e necessita mão-de-obra especializada para ser manejado adequadamente.

Como citado anteriormente, um método alternativo, prático e menos oneroso para estimar o gasto energético é composto pelas fórmulas matemáticas. Atualmente, diversas equações vêm sendo alvo de estudos, entre elas podemos citar a de Ireton-Jones (IJ).(7) Apesar de ter sido elaborada para pacientes críticos, autores têm mostrado que a fórmula de IJ, assim como a de Harris Benedict, uma fórmula ainda em grande uso pelos profissionais da terapia nutricional, também pode apresentar falhas em relação à estimativa do gasto energético.(3)

As necessidades energéticas são afetadas por vários fatores não incluídos em equações preditoras, como infecções, sepse, cirurgia cardíaca, estado metabólico e nutricional, sedação e analgesia, modo ventilatório, entre outros.(8) Equações que incluem mais variáveis podem proporcionar um resultado mais preciso na determinação do gasto energético.(9)

É necessário estudar a população e, diante da realidade vivida nos países subdesenvolvidos, escolher métodos pouco onerosos, de fácil aplicação e que permitam ao profissional obter uma estimativa aproximada do gasto energético dos pacientes críticos, para que se possa fornecer um tratamento nutricional sem agravar o quadro patológico. Sendo assim, este trabalho teve como objetivo avaliar a concordância entre o gasto energético mensurado pela CI e o estimado pela fórmula de IJ de pacientes em ventilação mecânica assistida.

MÉTODOS

Este estudo observacional prospectivo foi composto por 40 pacientes adultos, de ambos os sexos, internados na Unidade de terapia intensiva (UTI) do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, que estavam em ventilação mecânica assistida no modo ventilação com pressão suporte (PSV), com indicação de retirada do suporte ventilatório.

Foram excluídos do estudo gestantes, pacientes apresentando temperatura axilar > 38ºC, instabilidade hemodinâmica, insuficiência renal, fração inspirada de oxigênio (FiO2) > 0,6, alteração do sensório, agitação, sudorese ou taquicardia.(10)

O projeto do presente estudo foi submetido e aprovado pelos Comitês de Ética em Pesquisa da PUCRS e do HCPA. Apenas participaram do estudo os pacientes ou familiares que assinaram voluntariamente o Termo de Consentimento Livre e Informado. Os mesmos receberam uma cópia do documento, por ocasião da coleta de dados da pesquisa de origem.

Coleta de dados

Para a coleta de dados referentes à calorimetria indireta, utilizou-se um monitor da marca Datex Ohmeda S/5 - Compact Airway Module modelo MCAIOVX®, Finlândia. O software iCollect foi usado para a coleta dos dados medidos pelo monitor, armazenando as médias dos valores obtidos minuto a minuto, para posterior análise no computador.

Os pacientes em ventilação mecânica assistida no modo PSV foram mantidos com a cabeceira a 45º, em repouso por 30 minutos. Verificou-se a temperatura do paciente e realizou-se aspiração do tubo endotraqueal ou traqueostomia 5 minutos antes de iniciar a coleta de dados. O gasto energético foi mensurado durante 30 minutos, sendo descartados para análise os primeiros 10 minutos. No período basal, os pacientes estavam em ventilação mecânica (Servo 300 e Servo 900C; Siemens-Elema, Solna, Sweden), com pressão suporte (PS) variando entre 10-15 cmH2O. Durante a avaliação, os pacientes ventilaram com PS de 10 cmH2O, 5 cmH2O de pressão expiratória positiva final, sensibilidade de -1cmH2O e fração inspirada de oxigênio (FiO2) de 0,4. A coleta foi interrompida em casos de tosse intensa, vômito incoercível, instabilidade dos sinais vitais (freqüência cardíaca > 110bpm, freqüência respiratória > 30rpm ou Spo2< 90%) ou hemodinâmica (pressão arterial sistólica < 90mmHg), alteração do sensório, arritmia cardíaca, parada respiratória ou cardíaca.(10)

Os dados de peso seco e estatura foram retirados do prontuário do paciente e da ficha de avaliação nutricional. O peso dos pacientes foi aferido em balança digital quando os pacientes foram avaliados na emergência ou em cama-balança quando pesados na UTI.(11,12) A estatura foi mensurada a partir da estatura recumbente, na qual o indivíduo é colocado em posição supina e com o leito horizontal completo, fazendo-se a medição da extremidade da cabeça à base do pé no lado direito do corpo(13) ou no estadiômetro, quando avaliados previamente na unidade de procedência.

O gasto energético foi estimado pela fórmula de Ireton-Jones revisada,(7) conforme quadro 1.


O indice de massa corporal (IMC) foi calculado a partir da fórmula peso/estatura(2) e classificado segundo os valores estabelecidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS), 1999.(14) Os resultados obtidos foram transcritos para uma ficha de coleta de dados. Todos os pacientes foram submetidos ao mesmo procedimento.(3,12)

Análise dos dados

Os dados foram expressos por média ± desvio padrão, com um nível de significância p<0,05. As diferenças entre os valores encontrados para o gasto energético mensurado pela calorimetria indireta e para o estimado pela fórmula preditiva de Ireton-Jones foram calculadas utilizando o teste t de Student para amostras pareadas.

O método de Bland and Altman foi utilizado para avaliar a concordância entre as duas técnicas (intervalo de confiança de 95%).(15) Para a análise estatística dos dados foi utilizado o programa estatístico Statistical Packpage for Social Science (SPSS) 15.0.

RESULTADOS

Foram incluídos 40 pacientes no estudo, com idade média de 56±16 anos e o valor médio do índice APACHE II de 23±8. As características clínicas dos pacientes são mostradas na tabela 1.

Em relação ao estado nutricional, avaliado a partir do IMC, a maioria dos indivíduos (60%) foi classificada como eutrófico, 5% baixo peso, 20% pré-obesos, 10% obesos grau I, 2,5% obesos grau II e 2,5% obesos grau III, segundo a Organização Mundial de Saúde. Observou-se uma grande prevalência de pacientes com sobrepeso e obesidade, totalizando 35%.

A média do gasto energético mensurado por CI foi de 1558 ± 304kcal/24h e a média de gasto energético estimada pela fórmula de IJ foi 1911±246 kcal/24h (p<0,004). Na figura 1 é possível observar os valores obtidos por CI e por IJ para os 40 indivíduos. Também é possível verificar que o gasto energético estimado pela fórmula de IJ superestima o gasto energético mensurado pela CI. Verificou-se que a média das diferenças entre a CI e a equação de IJ foi de -353,83Kcal, variando entre -904,77Kcal e 197,11Kcal. Os valores mostram que há diferença significativa entre o gasto energético mensurado e estimado, para o mesmo indivíduo.


Quando os dados foram analisados por meio do método de Bland and Altman (Figura 2), verificou-se que a diferença média entre os resultados individuais obtidos na mensuração realizada pela CI e a estimada pela fórmula de IJ (linha central) foi significativa, com a maioria dos escores bastante dispersos no espaço compreendido entre os limites de concordância recomendados (linhas superior e inferior). Foi possível constatar, portanto, que não houve uma boa concordância entre os valores obtidos nos dois testes.


Avaliando-se os pacientes em relação a grupo etário e sexo, foi observado o menor coeficiente de variação entre os valores obtidos por CI nas mulheres acima de 60 anos de idade (1418±37,5 kcal/dia). Por sua vez, o grupo composto por homens acima de 60 anos apresentou o maior coeficiente de variação do gasto energético mensurado (1467±429kcal/dia). Todos os grupos, homens adultos e idosos e mulheres, adultas e idosas, mostraram valores discrepantes de gasto energético estimado por IJ e mensurado por CI, sendo que os homens adultos apresentaram a maior diferença entre as médias (160,6) nos dois métodos. Esses dados sugerem que as variações dos valores encontrados por CI e por IJ, apesar de mais marcantes no grupo formado por homens adultos, independem de sexo ou grupo etário do indivíduo avaliado.

DISCUSSÃO

O gasto energético estimado pela fórmula de Ireton-Jones não apresentou boa concordância com o medido pela calorimetria indireta Entretanto, sendo o calorímetro um equipamento de alto custo, não disponível na maioria dos serviços, esta equação permite estimar as necessidades nutricionais dos pacientes críticos.

Cheng et al.(3) analisaram cinco equações em 46 pacientes em ventilação mecânica, sendo que os resultados demonstraram que o gasto energético pode ser estimado na maioria dos pacientes críticos utilizando as fórmulas de Harris-Benedict, Kleiber e Liu, desde que seja utilizado um fator de injúria. Faisy et al.,(16) no ano seguinte, compararam o gasto energético mensurado pela CI e estimado pela equação de Harris-Benedict, observando um gasto 25% maior na CI, entretanto ao utilizar um fator de correção para injúria, esta diferença não foi estatisticamente significativa. Estes achados foram demonstrados em outro estudo no mesmo ano.(17)

Os resultados encontrados neste trabalho mostram haver diferença significativa entre o gasto energético mensurado e estimado, para o mesmo indivíduo. Segundo Boullata et al.(18)as equações que estimam a taxa metabólica em pacientes hospitalizados têm erros acima de 10% em 1/3 dos casos.

Esta discrepância de resultados pode ter sido influenciada por vieses, como por exemplo, a obtenção dos dados antropométricos dos pacientes. O peso, apesar de aferido conforme a metodologia pré-estabelecida, não foi mensurado, obrigatoriamente, no mesmo dia ou semana de realização da CI. Como o paciente crítico é muito instável e por estar geralmente em estado catabólico, é propenso a rápidas alterações do peso corporal. Alterações na composição corporal, incluindo o teor de água ou a quantidade metabolicamente ativa de massa, ou simplesmente a dificuldade de avaliar o peso corporal nos pacientes críticos, introduzem novas incertezas nas estimativas baseadas nas características antropométricas.(6)

Além disto, a acurácia das equações utilizadas para estimar o gasto energético em pacientes críticos é freqüentemente comparada com períodos curtos de mensuração da CI, que muitas vezes não representa o gasto energético total destes pacientes.(19)

Outro importante fator que pode ter interferido na diferença encontrada entre os valores de gasto energético obtidos por CI e IJ foi a diferença entre as condições clínicas e o diagnóstico dos pacientes, além da grande variação de idade entre os participantes do estudo. Se o grupo fosse composto por pessoas de mesma faixa etária, talvez os valores encontrados fossem mais homogêneos. Além disso, é relevante destacar que um número maior de pacientes avaliados também poderia modificar os resultados deste estudo.

Em um estudo com 50 pacientes críticos, Dvir et al.(20) encontraram um valor médio de 1512 kcal/24h através da CI. Os resultados foram equiparados e confirmados com outro método avaliativo, o Bedside (um sistema de informações computadorizado), mostrando a eficácia da calorimetria para mensurar gasto energético. Estes resultados corroboram os achados de nossa pesquisa, cuja estimativa de gasto calórico entre os pacientes foi semelhante.

Em relação aos indivíduos obesos, embora a resposta metabólica à injúria não tenha sido especificamente investigada, suspeita-se que os efeitos sejam similares àqueles observados em pacientes não obesos.(7) Ainda não se tem especificado qual o melhor método para mensurar o metabolismo energético de pacientes obesos enfermos, principalmente para aqueles com IMC superior a 40kg/m2.(21) Em um estudo com pacientes criticamente enfermos com IMC abaixo de 25kg/m2 e entre 25 e 30 kg/m2 recebendo nutrição enteral e/ou parenteral e em ventilação mecânica, IJ subestimou as necessidades energéticas.(22) O paciente desnutrido também apresenta comportamento semelhante: uma meta-análise sobre pacientes críticos desnutridos em UTI mostrou que os valores obtidos a partir de IJ, apesar de não significativamente distinto (p>0,05) ao gasto energético encontrado através do padrão de referência, teve como tendência superestimar as necessidades de energia dos indivíduos analisados.(23) Os estudos referidos, no entanto, foram realizados com amostras pequenas e em populações com características próprias. Além disso, as causas de internação na UTI foram avaliadas uniformemente, fato que poderia causar viés nos resultados.

A atenção na determinação das necessidades energéticas deve estar incluída entre os primeiros cuidados ao paciente em estado grave, uma vez que as alterações metabólicas provocadas pela doença aguda tornam a avaliação nutricional um difícil exercício clínico. (2)

Os benefícios ocasionados pelo adequado aporte nutricional na recuperação de doenças e controle de estados crônicos têm sido bastante documentados.(21) Um crescimento na utilização da calorimetria indireta, por ser considerado o melhor método para se estabelecer às necessidades nutricionais, facilitaria os cuidados com o paciente, permitindo alcançar melhores resultados no tratamento, pois nem sempre as necessidades energéticas são iguais às necessidades requeridas. Necessidades requeridas devem ser determinadas levando em consideração o quadro clínico do paciente, o estado nutricional e a tolerabilidade dos nutrientes que serão ofertados na dieta.(8)

CONCLUSÃO

O uso rotineiro da calorimetria indireta para guiar o aporte calórico adequado nestes pacientes parece ser a técnica mais adequada na avaliação do gasto energético real, apesar das limitações técnicas, como a exigência de pessoal treinado com disponibilidade de tempo, necessidade de uma FiO2 < 0,6 e o custo elevado do equipamento. Considerando que a calorimetria indireta não é rotina nas unidades de terapia intensiva, as fórmulas preditoras, embora com algumas discrepâncias, podem auxiliar o planejamento nutricional dos pacientes graves.

Sugerimos que estudos com populações maiores e mais homogêneas, maior tempo de registro e controle da ingestão calórica sejam realizados a fim de se obter resultados mais consistentes.

Submetido em 26 de Agosto de 2008

Aceito em 7 de Maio de 2009

Recebido do Centro de Terapia Intensiva do Hospital de Clínicas de Porto Alegre - (RS), Brasil.

Declaração de Conflitos de Interesse: O monitor utilizado nesta pesquisa foi gentilmente cedido pela empresa Medicalway, sem qualquer ônus financeiro aos pacientes, pesquisadores e instituição envolvida.

  • 1. Basile-Filho A, Martins MA, Bastiston MT, Vinha PP. Gasto energético em pacientes sépticos: correlação entre a calorimetria indireta e as equações preditivas derivadas a partir de dados hemodinâmicos. Rev Bras Ter Intensiva. 2003;15(3):101-7.
  • 2. Coletto FA, Marson F, Campos AD, Marchini JS, Basile-Filho A. Análise comparativa do gasto energético entre as equações de Harris-Benedict e de Long e a calorimetria indireta em pacientes sépticos. Rev Bras Ter Intensiva. 2003;15(3):93-100.
  • 3. Cheng CH, Chen CH, Wong Y, Lee BJ, Kan MN, Huang YC. Measured versus estimated energy expenditure in mechanically ventilated critically ill patients. Clin Nutr. 2002;21(2):165-72.
  • 4. Basile-Filho A, Martins MA, Antoniazzi P, Marchini JS. Calorimetria indireta no paciente em estado crítico. Rev Bras Ter Intensiva. 2003;15(1):29-33.
  • 5. Brandi LS, Bertolini R, Calafà M. Indirect calorimetry in critically ill patients: clinical applications and practical advice. Nutrition. 1997;13(4):349-58.
  • 6. Battezzati A, Viganò R. Indirect calorimetry and nutritional problems in clinical practice. Acta Diabetol. 2001;38(1):1-5.
  • 7. Ireton-Jones C, Jones JD. Improved equations for predicting energy expenditure in patients: the Ireton-Jones Equations. Nutr Clin Pract. 2002;17(1):29-31.
  • 8. Elizabeth Weekes C. Controversies in the determination of energy requirements. Proc Nutr Soc. 2007;66(3):367-77.
  • 9. Ireton-Jones C. Clinical dilemma: which energy expenditure equation to use? JPEN J Parenter Enteral Nutr. 2004;28(4):282-3. Comment in: JPEN J Parenter Enteral Nutr. 2005 Jan-Feb;29(1):59; author reply 59-60. Comment on: JPEN J Parenter Enteral Nutr. 2004 Jul-Aug;28(4):259-64.
  • 10. Santos LJ. Avaliação do gasto energético durante o desmame da ventilação mecânica nos modos pressão suporte e tubo T. [Dissertação]. Porto Alegre: Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2008.
  • 11. Schreen D, Caramelli B. A instabilidade hemodinâmica no transplante de fígado: um desafio para o intensivista. Rev Assoc Med Bras (1992). 2006;52(2):113-7.
  • 12. Hoher JA, Zimermann Teixeira PJ, Hertz F, da S Moreira J. A comparison between ventilation modes: how does activity level affect energy expenditure estimates? JPEN J Parenter Enteral Nutr. 2008;32(2):176-83.
  • 13. Kamimura MA, Baxmann A, Sampaio LR, et al. Avaliação nutricional. In: Cuppari L, coordenadora. Guia de nutrição: nutrição clínica no adulto. São Paulo: Manole; 2002.
  • 14. Coutinho W. Consenso Latino-Americano de Obesidade. Arq Bras Endocrinol Metab. 1999;43(1):21-67.
  • 15. Bland JM, Altman DG. Statistical methods for assessing agreement between two methods of clinical measurement. Lancet. 1986;1(8476):307-10.
  • 16. Faisy C, Guerot E, Diehl JL, Labrousse J, Fagon JY. Assessment of resting energy expenditure in mechanically ventilated patients. Am J Clin Nutr. 2003;78(2):241-9.
  • 17. Weissman C, Kemper M, Hyman AI. Variation in the resting metabolic rate of mechanically ventilated critically ill patients. Anesth Analg. 1989;68(4):457-61.
  • 18. Boullata J, Williams J, Cottrell F, Hudson L, Compher C. Accurate determination of energy needs in hospitalized patients. J Am Diet Assoc. 2007;107(3):393-401. Comment in: J Am Diet Assoc. 2007;107(3):390-2.
  • 19. Reid CL. Poor agreement between continuous measurements of energy expenditure and routinely used prediction equations in intensive care unit patients. Clin Nutr. 2007;26(5):649-57.
  • 20. Dvir D, Cohen J, Singer P. Computerized energy balance and complications in critically ill patients: an observational study. Clin Nutr. 2006;25(1):37-44.
  • 21. Haugen HA, Chan LN, Li F. Indirect calorimetry: a practical guide for clinicians. Nutr Clin Pract. 2007;22(4):377-88.
  • 22. MacDonald A, Hildebrandt L. Comparison on formulaic equations to determine energy expenditure in the critically ill patient. Nutrition. 2003;19(3):233-9.
  • 23. Campbell CG, Zander E, Thorland W. Predicted vs measured energy expenditure in critically ill, underweight patients. Nutr Clin Pract. 2005;20(2):276-80.
  • Autor para correspondência:
    Laura Jurema dos Santos
    Rua Silva Jardim, 509 - apto. 303
    CEP: 90450-071 - Porto Alegre (RS), Brasil
    Fone: (51) 9978 1067
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      24 Jul 2009
    • Data do Fascículo
      Jun 2009

    Histórico

    • Recebido
      26 Ago 2008
    • Aceito
      07 Maio 2009
    Associação de Medicina Intensiva Brasileira - AMIB Rua Arminda, 93 - Vila Olímpia, CEP 04545-100 - São Paulo - SP - Brasil, Tel.: (11) 5089-2642 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: rbti.artigos@amib.com.br