Resumos
Objetivou-se avaliar o efeito de teores crescentes de PB na MS total da dieta (11,5; 13,0; 14,5 e 16,0%) sobre os consumos e a digestibilidade total dos nutrientes e a produção e composição do leite de vacas leiteiras no terço inicial da lactação. O experimento foi constituído de quatro períodos experimentais de 15 dias, sete para adaptação dos animais à dieta e oito para coleta de dados. Foram utilizadas oito vacas, manejadas em cochos individuais, distribuídas em dois quadrados latinos balanceados 4 × 4. Utilizou-se concentrado à base de farelo de algodão e fubá de milho (40%) e, como volumoso, cana-de-açúcar corrigida com 1% de uréia + sulfato de amônio (9:1), na proporção de 60% (% MS). Os consumos médios diários de nutrientes, exceto EE e CNF, diferiram à medida que os teores de PB da dieta aumentaram. Os teores de PB na dieta não afetaram os coeficientes de digestibilidade aparente total dos nutrientes. A produção de leite corrigida ou não para 3,5% de gordura e seus componentes (gordura, PB e lactose), expressa em g/dia, e o nitrogênio uréico no leite (NUL) tiveram efeito linear crescente, enquanto a eficiência de utilização de N sofreu efeito linear negativo dos teores de PB da dieta. A dieta com 16% PB resultou em valores numericamente maiores de consumo e produção do leite e de seus componentes se comparada às dietas com menores teores de PB.
farelo de algodão; proteína não-degradável no rúmen; terço inicial da lactação
The objective of this research was to evaluate the effect of increasing levels of CP in the total DM of diet (11.5, 13.0, 14.5 and 16.0%) on the intakes and the total digestibility of nutrients and the milk production and composition of dairy cows in initial third of lactation. The research was constituted by four experimental periods of 15 days each, seven for adaptation of the animals to the diet and eight for data collection. Eight cows, individually fed, were distributed to two balanced 4 × 4 Latin squares. A cottonseed meal, ground corn-based concentrate (40%) was used and, as forage, sugar cane corrected with 1% of urea + ammonium sulfate (9:1), in the proportion of 60% (%DM). The daily average intakes of nutrients, except for EE and NFC, differed as the levels of CP increased in the diet. The protein levels in the diet did not affected the coefficients of total apparent digestibility of the nutrients. Production of fat corrected milk, 3.5% or not and its components (fat, CP and lactose), expressed in g/day, and milk urea nitrogen showed increased linear effect, while the N efficiency showed negative linear effect of the CP levels in the diet. The diet with 16% CP provided values numerically greater for intake and milk production and its components as compared to diets with lower levels of CP.
cottonseed meal; early lactation; rumen undegradable protein
RUMINANTES
Consumo e digestibilidade total dos nutrientes e produção e composição do leite de vacas alimentadas com teores crescentes de proteína bruta na dieta contendo cana-de-açúcar e concentados1 1 Parte da Dissertação de Mestrado apresentada pela primeira autora à UESB.
Intake and total digestibility of nutrients and milk production and composition in dairy cows fed with increasing crude protein levels in the diet with sugar cane and concentrates
Carla Fabrícia de Araujo CordeiroI; Mara Lúcia Albuquerque PereiraII; Sandro de Souza MendonçaIII; Paulo José Presidio AlmeidaIV; Luzyanne Varjão AguiarV; Mauro Pereira de FigueiredoVI
IMestre em Zootecnia (Produção de Ruminantes) pela UESB
IIDEBI/UESB
IIIDoutorando pela UNESP/Jaboticabal
IVGraduando e bolsista de Iniciação Científica da FAPESB
VGraduando e bolsista de Apoio Técnico da FAPESB
VIDFZ/UESB
RESUMO
Objetivou-se avaliar o efeito de teores crescentes de PB na MS total da dieta (11,5; 13,0; 14,5 e 16,0%) sobre os consumos e a digestibilidade total dos nutrientes e a produção e composição do leite de vacas leiteiras no terço inicial da lactação. O experimento foi constituído de quatro períodos experimentais de 15 dias, sete para adaptação dos animais à dieta e oito para coleta de dados. Foram utilizadas oito vacas, manejadas em cochos individuais, distribuídas em dois quadrados latinos balanceados 4 × 4. Utilizou-se concentrado à base de farelo de algodão e fubá de milho (40%) e, como volumoso, cana-de-açúcar corrigida com 1% de uréia + sulfato de amônio (9:1), na proporção de 60% (% MS). Os consumos médios diários de nutrientes, exceto EE e CNF, diferiram à medida que os teores de PB da dieta aumentaram. Os teores de PB na dieta não afetaram os coeficientes de digestibilidade aparente total dos nutrientes. A produção de leite corrigida ou não para 3,5% de gordura e seus componentes (gordura, PB e lactose), expressa em g/dia, e o nitrogênio uréico no leite (NUL) tiveram efeito linear crescente, enquanto a eficiência de utilização de N sofreu efeito linear negativo dos teores de PB da dieta. A dieta com 16% PB resultou em valores numericamente maiores de consumo e produção do leite e de seus componentes se comparada às dietas com menores teores de PB.
Palavras-chave: farelo de algodão, proteína não-degradável no rúmen, terço inicial da lactação
ABSTRACT
The objective of this research was to evaluate the effect of increasing levels of CP in the total DM of diet (11.5, 13.0, 14.5 and 16.0%) on the intakes and the total digestibility of nutrients and the milk production and composition of dairy cows in initial third of lactation. The research was constituted by four experimental periods of 15 days each, seven for adaptation of the animals to the diet and eight for data collection. Eight cows, individually fed, were distributed to two balanced 4 × 4 Latin squares. A cottonseed meal, ground corn-based concentrate (40%) was used and, as forage, sugar cane corrected with 1% of urea + ammonium sulfate (9:1), in the proportion of 60% (%DM). The daily average intakes of nutrients, except for EE and NFC, differed as the levels of CP increased in the diet. The protein levels in the diet did not affected the coefficients of total apparent digestibility of the nutrients. Production of fat corrected milk, 3.5% or not and its components (fat, CP and lactose), expressed in g/day, and milk urea nitrogen showed increased linear effect, while the N efficiency showed negative linear effect of the CP levels in the diet. The diet with 16% CP provided values numerically greater for intake and milk production and its components as compared to diets with lower levels of CP.
Key Words: cottonseed meal, early lactation, rumen undegradable protein
Introdução
No início da lactação, as exigências nutricionais podem não ser completamente supridas, em razão da quantidade de leite produzida, pois ocorre redução na taxa de ingestão, resultando em balanço energético negativo, que limita a capacidade de suprimento das demandas energéticas, uma vez que, em níveis de produção mais elevados, a vaca mobiliza suas reservas corporais para mantença e produção. É também nessa fase inicial da lactação que a produção de leite atinge seu pico, tornando necessária atenção máxima à dieta fornecida.
O consumo de MS, além de determinar a quantidade de nutrientes disponíveis para mantença e produção de um animal (NRC, 2001), é importante na formulação de dietas para evitar super ou subfornecimento de nutrientes, que poderiam causar efeitos adversos à saúde dos animais ou onerar os custos. Portanto, quando se refere ao sistema de produção de leite, deve-se considerar os custos com alimentação, o potencial genético dos animais e o ambiente no qual o animal está inserido. Os volumosos também têm efetiva participação na alimentação dos ruminantes.
Em comparação a outras forrageiras tropicais, a cana-de-açúcar conserva seu valor nutritivo por períodos relativamente prolongados, com aumento do conteúdo celular, em razão de seu maior teor de sacarose, o que compensa a redução na digestibilidade dos outros nutrientes e favorece o aumento da digestibilidade da MS em geral (Lima & Mattos, 1993; Borges & Pereira, 2003).
Preston & Leng (1978), citados por Borges & Pereira (2003), conduziram vários estudos com a utilização da cana-de-açúcar e apontaram o fornecimento ruminal de amido e proteína insatisfatório e, como principal causa do baixo consumo de MS, a baixa digestibilidade da fibra. Dietas à base de cana-de-açúcar possuem ainda grande quantidade de carboidratos solúveis e oferece condições favoráveis ao crescimento de protozoários, que, em alta população, prejudicam o crescimento de bactérias em virtude da maior predação, tornando necessária a adição de uma fonte de compostos nitrogenados não-protéicos (NNP), como a uréia, a fim de elevar o teor de PB e maximizar a produção bacteriana.
De acordo com Huber (1978), citado por Sucupira (1998), aproximadamente 80% das bactérias ruminais, particularmente as celulolíticas, utilizam melhor a amônia como forma de nitrogênio para a síntese de proteína microbiana e, portanto, é necessária disponibilidade adequada deste composto para que ocorra o crescimento desses microrganismos. Todavia, Stacchini (1998) relatou que a eficiência da síntese microbiana pode ser limitada em dietas com cana-de-açúcar e uréia pela ausência ou pequena disponibilidade de formas orgânicas de nitrogênio (proteína verdadeira).
Paiva et al. (1991), em pesquisa com vacas no terço inicial da lactação, verificaram que, mesmo com o uso de alto nível de uréia, no intuito de corrigir a deficiência de nitrogênio da cana-de-açúcar e utilizando-se uma fonte moderada de concentrado, esse volumoso, quando fornecido na forma exclusiva, não se mostrou como alimento adequado para vacas mestiças leiteiras com produção média de leite de 12 kg/dia.
Os farelos são bastante utilizados na suplementação de dietas à base cana-de-açúcar com uréia com a finalidade de fornecer amido e/ou proteína que escapariam à digestão microbiana do rúmen, sendo absorvidos como glicose e aminoácido no intestino delgado (Aroeira et al., 1993). De acordo com Faria (1993), os piores resultados obtidos com a cana-de-açúcar como alimento para os bovinos podem ser conseqüência de resultados obtidos em ensaios de alimentação em que o desbalanceamento das dietas provocou resultados muito desfavoráveis.
Objetivou-se neste trabalho avaliar o consumo, a digestibilidade total dos nutrientes da dieta e a produção e composição do leite em vacas no terço inicial da lactação alimentadas com dietas contendo teores crescentes de PB.
Material e Métodos
O experimento foi conduzido na fazenda Jaíta, em Macarani, BA, no período de maio a agosto de 2005. Foram utilizadas oito vacas leiteiras mestiças, lactantes, com peso médio de 400 kg e produção média de leite de 15,0 kg ao início do experimento, distribuídas em dois quadrados latinos (QL) balanceados 4 × 4, com média de 46 e 54 dias de lactação, respectivamente, ao início do experimento para os QL 1 e 2.
Os tratamentos foram compostos de quatro teores de PB na MS total da dieta: 11,5; 13,0; 14,5 e 16,0%. A dieta foi balanceada para atender às exigências de energia preconizadas pelo NRC (2001). O concentrado (Tabela 1) foi composto de farelo de algodão e fubá de milho e fornecido na proporção de 40% da MS total da dieta. Como volumoso foi utilizada cana-de-açúcar, variedade RB 72454 suplementada com 1% de uréia e sulfato de amônio (SA) na relação 9:1, com base na matéria natural, na proporção de 60% da MS total da dieta.
A composição químico-bromatológica dos concentrados e da cana-de-açúcar é apresentada na Tabela 2 e das dietas experimentadas, na Tabela 3.
O experimento foi constituído de quatro períodos experimentais de 15 dias, os sete primeiros para adaptação à dieta e os demais para coletas. Os animais foram mantidos em baias individuais, onde receberam o alimento na forma de mistura completa ad libitum, duas vezes ao dia, após as ordenhas da manhã e da tarde, de modo a permitir 5 a 10% de sobras na matéria natural. O peso dos animais foi calculado pela média dos pesos ao início e final de cada período experimental e os consumos diários foram determinados pela diferença entre a dieta total oferecida e as sobras, coletadas e pesadas duas vezes ao dia (manhã e tarde).
A cana-de-açúcar foi colhida e despalhada no campo a cada três dias, armazenada próximo ao estábulo e picada com pontas em máquina forrageira no momento do fornecimento. Semanalmente, amostras eram coletadas para determinação da MS e ajuste da relação volumoso:concentrado da dieta. A concentração média de açúcares solúveis (ºBRIX) do material analisado foi de 19,0.
As amostras do alimento oferecido (cana-de-açúcar e concentrado) e das sobras foram coletadas do 8º ao 15º dia, enquanto as de fezes foram feitas diretamente da ampola retal, duas vezes em cada período experimental, uma às 8h do 9º dia e a outra às 15h do 15º dia, de acordo com Vagnoni et al. (1997). Essas amostras foram acondicionadas em sacos plásticos e armazenadas a -20ºC.
Ao término do período de coleta, as amostras de alimentos, sobras e fezes foram descongeladas, pré-secas em estufa de ventilação forçada a 60ºC durante 72 a 96 horas e, posteriormente, trituradas em moinho de facas com peneira de poros de 1 mm. Logo após, foram feitas amostras compostas com base no peso seco das amostras, por animal, em cada período experimental e armazenadas para as análises bromatológicas, segundo procedimentos descritos por Silva & Queiroz (2005).
Para determinação dos coeficientes de digestibilidade total dos nutrientes, utilizou-se a fibra em detergente ácido indigestível (FDAi) como indicador interno, obtida após 144 horas de incubação ruminal dos alimentos, das sobras e fezes, utilizando-se sacos da Ankon® (filter bag F57) (Cochran et al., 1986). Após o período de incubação, os sacos foram retirados dos animais por meio da fístula ruminal e imediatamente lavados em água corrente até se apresentar totalmente límpida. Todos os sacos foram submetidos à fervura em detergente ácido durante 1 hora.
As análises de MS, cinzas e compostos nitrogenados (CN) totais nos alimentos, nas sobras e nas fezes foram realizadas conforme procedimentos descritos por Silva & Queiroz (2005). Para as análises de EE, pesaram-se 1,5 g das amostras de cana, sobras e fezes e 2,0 g das amostras dos concentrados, as quais foram embrulhadas em guardanapos de papel-seda (14,0 cm × 14,0 cm) em forma de cartuchos. As extremidades foram grampeadas e as amostras foram levadas a estufa de ventilação forçada a 55ºC por 12 horas, onde foram mantidas em dessecador até atingir temperatura ambiente e posteriormente pesadas. Em média, dez cartuchos foram colocados em conexões extratoras fracionadas Soxlet e mantidos sob aquecimento por 5 horas para extração da gordura com éter de petróleo (para os concentrados) ou éter etílico (demais amostras), adicionando-se, aproximadamente, 30 mL de éter por cartucho, em balões redondos de fundo chato com capacidade para 500 mL. Após a extração, os cartuchos foram novamente levados à estufa de ventilação forçada a 55ºC, por 12 horas. O teor de gordura foi obtido pela diferença entre os pesos dos cartuchos antes e após a extração e depois foi corrigido para MS.
Foram feitas modificações da metodologia padrão, descrita por Silva & Queiroz (2005), para a realização das análises de FDN e FDA, adotando-se metodologias empregadas por Bier (1982) e Pell & Schofield (1993), para utilização da autoclave. Para isso, foi realizada a validação a fim de se compararem os resultados das análises realizadas em autoclave e em bloco digestor, no entanto, não foram encontradas diferenças entre os métodos analisados (P = 0,12), o que comprovou a eficácia do uso da autoclave por ser mais prático. Uma alíquota (50 mL) da solução de detergente neutro ou ácido, de acordo com a análise em andamento, foi adicionada a 0,5 g da amostra (alimentos, sobras e fezes). Para as análises de FDN com alto teor de amido, adotou-se metodologia de Silva & Queiroz (2005), com adaptações, incubando-se 0,5 g da amostra em 8 mLde uréia 8M à temperatura de 80 a 90ºC por 5 minutos.
A porcentagem de carboidratos totais (CT) foi obtida pela equação: 100(%PB + %EE +%cinzas) e a porcentagem de CNF foi calculada como 100 - (%FDNcp + %PB + %EE + %cinzas) (Sniffen et al., 1992). Para o cálculo de NDT, utilizou-se a equação proposta pelo NRC (2001): NDT = PBd + (EEd × 2,25) + FDNd + CNFd, em que d representa o respectivo nutriente digestível.
Amostras de 3 g de cana-de-açúcar trituradas em moinho de facas com peneira de poros de 5 mm e pré-secas em estufa a 60ºC e amostras de 5 g do fubá de milho e do farelo de algodão moídas a 2 mm foram colocadas em sacos de náilon (6 × 10 cm, com 56 µm de porosidade) para determinação das degradabilidades ruminais da MS e PB. Foram utilizados dois animais machos fistulados no rúmen alimentados com o mesmo concentrado experimental. Consideraram-se nove tempos de incubação (0, 2, 4, 8, 16, 24, 48, 72 e 96 horas) com dois sacos para cada tempo por animal. Antes e após a incubação, os sacos foram pesados para determinação de MS e análise do N total. As equações para estimar os parâmetros da degradabilidade foram ajustadas ao modelo não-linear pelo método iterativo de Gauss-Newton utilizando-se o Sistema de Análises Estatísticas e Genéticas - SAEG (UFV, 1999).
Os coeficientes a, b e Kd para determinação da degradabilidade potencial da MS e PB foram obtidos pela seguinte equação: degradação de MS ou PB = a + b (1-e-Kdt), em que a = fração solúvel; b = fração insolúvel potencialmente degradável; e Kd = taxa de degradação da fração b no tempo t. A degradabilidade efetiva da PB foi calculada utilizando-se a equação PDR = a + b × [Kd/(Kd + Kp)] em que Kp = taxa de passagem (Ørskov & Mcdonald, 1979) e o conteúdo de PNDR foi calculado como 100 PDR.
A taxa de passagem foi calculada de acordo com o NRC (2001) utilizando-se as equações: Kp cana-de-açúcar = 3,054 + 0,614 × CMS e Kp concentrado = 2,904 + 1,375 × CMS 0,020 × % do concentrado na dieta, em que CMS é o consumo de MS expresso em %PC.
A produção de leite foi avaliada do 8º ao 15º dia de cada período experimental. Amostras de leite da 1ª e 2ª ordenhas do 11º dia foram coletadas e formaram uma amostra composta por animal para determinação dos componentes do leite. As amostras compostas foram obtidas pela mistura proporcional à produção de leite da manhã e da tarde (Pereira et al., 2005). As análises qualitativas do leite foram realizadas no Laboratório de Fisiologia da Lactação da Escola Superior de Agricultura Luiz de QueirozPiracicaba/SP. A produção de leite foi corrigida para 3,5% de gordura (PLG), pela equação citada por Sklan et al. (1992): PLG = (0,432 + 0,1625 × G) × kg de leite, em que G = % de gordura do leite.
A eficiência alimentar foi computada para cada vaca, dividindo-se a produção média de leite pela ingestão média de MS de cada período experimental (Valadares Filho et al., 2000). Do mesmo modo, procedeu-se ao cálculo da eficiência de utilização de N, dividindo-se o N-total médio do leite pela ingestão média de N-total da dieta (Broderick, 2003).
Os resultados foram avaliados por meio de análises de variância e regressão, utilizando-se o Sistema de Análises Estatísticas e Genéticas SAEG (UFV, 1999). Os critérios utilizados para escolha do modelo foram o coeficiente de determinação (R2) e a significância observada por meio do teste F, a 5% de significância.
Resultados e Discussão
Os teores de PDR e PNDR, expressos na MS, obtidos nas dietas com 11,5; 13,0; 14,5 e 16,0% de PB foram de 10,21 e 1,10; 11,01 e 2,20; 11,50 e 3,12; 12,10 e 4,09%, respectivamente (Tabela 3). Os maiores teores de PB, PDR e PNDR nas dietas contribuíram para o aumento do consumo de MS (Tabela 4). Quando expressos em porcentagem da PB, os consumos apresentaram efeito linear positivo, com valores de 87,26 e 9,41; 80,97 e 16,11; 76,22 e 20,68; 72,40 e 24,49%, respectivamente, para as dietas com 11,5; 13,0; 14,5 e 16,0% de PB, o que está relacionado aos crescentes níveis de farelo de algodão nas dietas. Assim, os aumentos observados para os consumos de MS e PB contribuíram para a elevação nos consumos de PDR e PNDR.
Os valores recomendados pelo NRC (2001) para vacas com produção média diária de 13 kg de leite, para PDR e PNDR, são de 9,66 e 2,62%, respectivamente. No entanto, os valores obtidos para a dieta com 16,0% de PB foram superiores, 12,09% de PDR e 4,09% de PNDR, indicando que as vacas produziram média de 13,3 kg de leite ao dia.
Segundo Broderick (2003), os fatores que influenciam a utilização da PB da dieta são complexos e relacionados ao suprimento sincronizado de CNF:PDR, para manter as necessidades dos microrganismos ruminais, e de PNDR, com a digestibilidade intestinal adequada, permitindo que os requerimentos das vacas sejam supridos. Neste estudo, não houve diferença para os consumos de EE e CNF entre as dietas, no entanto, o consumo de FDN apresentou variação linear positiva, relacionada ao aumento da fração insolúvel potencialmente degradável da FDN (76,33%, em média) proveniente do farelo de algodão das dietas com maiores teores de PB (Valadares Filho et al., 2002). Mesmo com a redução dos teores de CT das dietas (81,48; 78,57; 76,67 e 74,45, respectivamente, para as dietas com 11,5; 13,0; 14,5 e 16,0% de PB), o consumo desses carboidratos aumentou de acordo com os teores crescentes de PB, o que pode ser explicado pelo aumento da ingestão de FDN, e não pelos teores de CNF. O efeito linear crescente foi constatado também para os consumos de MO, PB e NDT.
Geralmente o consumo aumenta de acordo com a elevação do peso corporal (PC), portanto, é mais conveniente expressar o consumo em relação ao peso corporal do animal.
Entretanto, segundo Mertens (1994), a base para expressar o consumo em relação ao peso metabólico ou em porcentagem do peso corporal depende da limitação da ingestão, se foi decorrente de fator energético ou de enchimento, respectivamente.
Neste experimento, a digestibilidade total da MS (superior a 66% para todas as dietas experimentais) e a variação no teor de CNF de 48,43; 45,44; 42,52 e 40,13% para as dietas com 11,5; 13,0; 14,5 e 16,0% de PB, respectivamente, podem indicar que a limitação do consumo foi fisiológica, em virtude do fator energético. Além disso, o modelo "FDN-consumo de energia", citado por Mertens (1994), prevê que a ingestão é limitada pelo enchimento do rúmen quando o consumo diário de FDN e maior que 11 a 13 g/kg do PC. Nesse experimento, o consumo de FDN situou-se abaixo da capacidade ótima do consumo de fibra, pois variou de 6,9 a 9,8 g/kgPC.
Os resultados indicaram que os menores valores de consumo dos animais estão relacionados à baixa digestibilidade da fibra da cana-de-açúcar associada ao alto teor de carboidratos fermentáveis nas dietas. No entanto, o aumento dos teores de PB das dietas favoreceu o consumo, provavelmente em razão da melhor utilização da fibra proveniente da cana, o que explica as semelhanças nas respostas de consumo em kg/dia, %PC e g/kg0,75. Assim, o aumento dos consumos de MS com a elevação da PB das dietas parece não estar relacionado ao peso corporal e ao tamanho metabólico.
De acordo com Conrad et al. (1964), em dietas com digestibilidade da MS de 52 a 66%, o consumo de MS está diretamente relacionado ao peso corporal, ao resíduo indigestível e à digestibilidade da MS e, em dietas com digestibilidade entre 67 e 80%, ao peso metabólico, à produção e à digestibilidade. A baixa degradabilidade da cana no rúmen limita a taxa de passagem ruminal e, conseqüentemente, resulta em baixo consumo. Ørskov & Hovell (1978) observaram que a taxa de digestão da fibra da cana-de-açúcar é muito baixa no rúmen e que o acúmulo de fibra não digestível limita o consumo voluntário.
Vilela et al. (2003), em pesquisa com vacas 5/8 Holandês-Gir com média de produção de 8 kg/dia, testaram quatro dietas contendo 12,5% de PB, compostas de diferentes suplementos para a cana-de-açúcar (uréia; uréia e farelo de algodão; uréia e milho grão moído; uréia e farelo de trigo) e obtiveram consumos de MS de 5,32; 7,85; 6,07 e 7,60 kg/dia, respectivamente. Apesar do baixo consumo observado, associado à baixa degradabilidade da fibra no rúmen, os resultados comprovaram maior consumo de MS quando as dietas foram compostas exclusivamente de cana-de-açúcar como volumoso e suplementadas com farelo de algodão.
Pereira et al. (2000) verificaram que aproximadamente 72,48% do conteúdo protéico do farelo de algodão apresentou degradação intermediária a lenta e, portanto, pode ser utilizado para proporcionar maior aporte de nitrogênio no intestino.
Apesar do aumento significativo nos consumos de MS, MO e FDN (Tabela 5), não foram observadas alterações nos coeficientes de digestibilidade desses nutrientes, que foram semelhantes (P>0,05) entre as dietas. A digestibilidade da PB não apresentou regressão significativa, mas o valor de 71,52% obtido para a dieta contendo 16,0% de PB foi numericamente superior ao de 64,74% observado para a dieta com 11,5% de PB.
Não houve efeito significativo (P>0,05) dos teores de PB das dietas sobre os coeficientes de digestibilidade dos CNF, provavelmente em virtude da elevada quantidade de carboidratos solúveis da cana-de-açúcar.
As dietas tiveram efeito linear positivo (P<0,05) sobre a produção do leite e de seus componentes (Tabela 6).
Entre os teores de 11,5 e 16,0% de PB na dieta, a produção de leite melhorou 26,41% ou 2,9 kg/dia. Para a produção de leite corrigida para 3,5% de gordura, os acréscimos foram de 29,76% ou 3,05 kg/dia e as produções de gordura e proteína tiveram aumento de 110,75 e 95,89 g/dia, respectivamente, entre os teores de 11,5 e 16,0% de PB na dieta. O teor de 16,0% de PB na dieta com cana-de-açúcar como volumoso exclusivo propiciou as melhores respostas de produção de leite corrigida ou não para 3,5% de gordura.
Mayer et al. (1997), em pesquisa para avaliação de dietas contendo diferentes teores de PDR (70,0; 60,0; 52,0 e 45,0% de degradabilidade da PB) em vacas mestiças na fase inicial da lactação com produção média de leite de 20 kg/dia, observaram que a produção não aumentou com a utilização de concentrado de menor degradabilidade ruminal, portanto, ao atingirem o máximo potencial de produção, as vacas estariam desviando a quantidade de proteína ingerida para o ganho de peso em vez de aumentarem a produção de leite; para isso, as dietas deveriam ser oferecidas a animais com maior potencial genético.
Neste trabalho, a variação de peso dos animais alimentados com a mesma dieta foi negativa para as dietas contendo 11,5; 13,0 e 14,5% de PB e positiva para a dieta com 16% de PB, com valores de -1,53; -0,20; -0,03 e 0,50 kg, respectivamente.
Segundo Lucci (1997), citado por Silva et al. (2001), a composição nitrogenada da dieta pode influenciar a taxa de gordura láctea, percentualmente, de modo que aumentos na concentração protéica de 12-14% para 18% podem reduzir a porcentagem de gordura em até 0,5%, em virtude do aumento da produção de leite, enquanto os teores de proteína sofrem pequenos acréscimos com o aumento dos níveis de proteína dietética.
Entre proteína e gordura, a gordura é mais fortemente influenciada pela nutrição. Em casos extremos, o teor de proteína varia em torno de 0,4%, enquanto a gordura pode variar de 2 a 3%. Assim como a proteína, o teor da lactose do leite dificilmente é alterado (Carvalho, 2000). Os valores observados para o percentual de lactose do leite nas dietas experimentais foram semelhantes aos relatados por Carvalho (2000), com média de 4,57%, e não diferiram (P>0,05) entre as dietas, assim como os valores percentuais de PB, que não sofreram aumento linear com os acréscimos nos teores de PB das dietas (2,9; 3,0; 3,0 e 3,0% para as dietas com 11,5; 13,0; 14,5 e 16,0% de PB, respectivamente).
Os teores crescentes de PB na dieta não afetaram os teores percentuais de gordura e proteína do leite. O aumento na produção de leite pode estar associado ao crescente consumo da MS promovido pelos níveis de farelo de algodão nas dietas, uma vez que esse alimento também oferece maior aporte intestinal de proteína não-degradável no rúmen (PNDR).
Cunninghan et al. (1996) concluíram que dietas contendo maiores quantidades de PB e PNDR melhoram a produção e a composição do leite, como conseqüência dos altos fluxos de N e aminoácidos essenciais para o intestino. Nesta pesquisa, a eficiência de N foi significativa (P<0,05), com variação decrescente, à medida que aumentaram os teores de PB da dieta, resultado semelhante ao observado por Pereira et al.(2005). No entanto, exceto para a dieta contendo 11,5% de PB, os teores de NUL mantiveram-se dentro dos parâmetros estabelecidos por Jonker et al.(1999), que relataram que a concentração de NUL deve variar de 10 a 16 mg/dL dependendo do nível de produção, pois valores superiores podem indicar excesso no consumo de N ou de proteína degradável no rúmen. Assim, a menor eficiência de utilização de N pode estar associada ao perfil de aminoácidos requeridos para a lactação, pois, a partir do momento que não satisfazem as exigências para produção do leite, os aminoácidos fornecidos pela dieta e/ou pelos microrganismos ruminais são utilizados em outras rotas metabólicas.
Neste estudo, vários fatores relacionados à eficiência de utilização de nutrientes para a produção de leite e ganho de peso foram favoráveis quando a PB dietética aumentou com a substituição do fubá de milho pelo farelo de algodão na suplementação da cana-de-açúcar, incluindo a utilização de MS, FDN e NDT da dieta.
Conclusões
Os consumos médios diários dos nutrientes foram significativamente maiores para a dieta com 16,0% de PB, uma vez que os maiores níveis de farelo de algodão promoveram maior aporte de PDR e PNDR e foram suficientes para manter as necessidades dos microrganismos ruminais e promover a utilização adequada da proteína no intestino, permitindo que os requerimentos das vacas fossem supridos.
Os crescentes teores de proteína na dieta não influenciaram a porcentagem de proteína, gordura e lactose do leite, mas favoreceram a produção de leite, que foi maior nos animais alimentados com a dieta com 16,0% de PB.
Agradecimento
À COOPARDO Cooperativa Mista do Médio Rio Pardo, pelo apoio financeiro, à Fazenda Jaíta, especialmente ao Dr. Paulo Lacerda, pela cessão dos animais e das instalações, e ao setor de transportes da UESB, pela contribuição à realização deste estudo.
Literatura Citada
Recebido: 18/9/2006
Aprovado: 5/7/2007
Correspondências devem ser enviadas para: carlafcordeiro@gmail.com
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Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
20 Dez 2007 -
Data do Fascículo
Dez 2007
Histórico
-
Aceito
05 Jul 2007 -
Recebido
18 Set 2006