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Avaliação da deglutição em lactentes com cardiopatia congênita e síndrome de Down: estudo de casos

Resumos

O presente estudo teve por objetivo realizar avaliação fonoaudiológica da deglutição em lactentes com diagnóstico de síndrome de Down e cardiopatia congênita (DSAV tipo A de Rastelli) internados na unidade 2A e Unidade de Tratamento Intensivo Pediátrica da instituição de origem, com suspeita de dificuldade de deglutição, encaminhados ao serviço de fonoaudiologia. Trata-se de uma pesquisa de caráter descritivo-qualitativo, nessa foi possível avaliar dois lactentes durante o período de janeiro a outubro de 2012. Utilizou-se um protocolo de perfil da amostra para a coleta de dados sobre histórico clínico e diagnósticos dos prontuários dos pacientes, além do instrumento de avaliação para prontidão do prematuro para alimentação oral proposto por Fujinaga (2002) para avaliação clínica da deglutição. Os pacientes apresentaram como resultados a presença de disfagia orofaríngea e escores baixos inviabilizando a alimentação exclusivamente por via oral. A conduta terapêutica foi de estimulação oral e volume de alimentação controlado para alimentação oral. Os achados corroboram a literatura no que diz respeito à relação entre disfagia, cardiopatia congênita, síndromes genéticas e alterações miofuncionais orofaciais. Conclui-se que a disfagia apresentou-se como um sintoma dificultante para a alimentação por via oral de forma segura e eficaz para todos os lactentes estudados. Estudos prospectivos com um número maior de sujeitos são necessários para contribuir com a série de casos e, desta forma, identificar outros fatores de risco para disfagia bem como condutas terapêuticas específicas para crianças com síndrome de Down e distúrbios da deglutição associados.

Transtornos da Deglutição; Síndrome de Down; Cardiopatias Congênitas; Lactente; Deglutição; Avaliação


This study had the aim to perform clinical swallowing evaluation in infants diagnosed with Down syndrome and congenital heart disease (complete atrioventricular canal) suspected to have swallowing disorders hospitalized in unit 2A and Pediatric ICU of instituition.It is a descriptive and qualitative study in which was possible to assess two infants during the proposed period. It was used a sample profile protocol to collect data about clinical history and diagnoses from patients records and the Instrumento de avaliação para prontidão do prematuro para alimentação oral by Fujinaga (2002) for clinical swallowing evaluation. The pacients presented results of oropharyngeal dysphagia and low scores invalidating exclusively oral feed. The treatment was oral stimulation and oral feeding volume controlled. The findings contribute to the literature regarding the correlation between dysphagia, congenital heart defects, genetic syndromes and myofunctional disorders. It is concluded that dysphagia was presented as a difficulty symptom to safe and effective oral feed for all infants studied. Prospective larger researches are needed to contribute with this clinical cases study and thus identify other risk factors for dysphagia and specific treatment for children with Down syndrome and swallowing disorders associated.

Deglutition Disorders; Down Syndrome; Heart Defects, Congenital; Infant; Deglutition; Evaluation


Introdução

Nos últimos anos, tem se dado grande importância aos estudos relacionados à disfagia orofaríngea em decorrência da alta prevalência deste sintoma na população adulta e pediátrica. A disfagia ou distúrbio da deglutição refere-se à dificuldade na passagem do bolo alimentar desde a cavidade oral até o estômago que por vezes impossibilita ou dificulta a ingesta segura dos alimentos. São poucos os estudos e pesquisas publicados que mensuram a incidência e prevalência da disfagia na população pediátrica de pacientes com cardiopatia congênita. Os distúrbios de deglutição normalmente apresentam-se em quadros de diagnósticos múltiplos, síndromes e associados a outras comorbidades, sofrendo influência das condições de desenvolvimento global da criança11. Lefton-Greif MA. Pediatric Dysphagia.Phys Med RehabilClin N Am. 2008;19(4): 837-51..

A síndrome de Down é uma das alterações cromossômicas mais frequentes, sendo descrita em 1866, por John Langdon Down, como microgenia, macroglossia, epicanto, fissuras palpebrais oblíquas, membros mais curtos, uma única prega palmar transversal, tônus muscular pobre, retardo mental e dificuldades de aprendizagem, o que veio a caracterizar a trissomia do cromossomo 21. É verificada em um a cada 800 nascidos vivos e o risco para ocorrência aumenta significantemente na presença de idade materna avançada22. Irving CA, Milind PC. Cardiovascular abnormalities in Down's syndrome: spectrum, management and survival over 22 years. Archives of disease in childhood. 2012;97(4):326-30. , 33. Rodman R, Pine HS. The otolaryngologist's approach to the patient with Down syndrome. OtolaryngolClin North Am. 2012;45(3):599-629.. Além das características fenotípicas que incluem alterações estruturais de face, o lactente com Síndrome de Down, em 43% dos casos, apresenta cardiopatia congênita que frequentemente é corrigida cirurgicamente33. Rodman R, Pine HS. The otolaryngologist's approach to the patient with Down syndrome. OtolaryngolClin North Am. 2012;45(3):599-629..

A cardiopatia congênita refere-se às anormalidades que surgem antes do nascimento na estrutura ou na função do coração, estima-se que a cada 1000 nascimentos quatro a 50 lactentes possuirão essa alteração, a qual ainda representa a maior causa de mortalidade infantil nos Estados Unidos e a segunda maior no Brasil44. Haydar TF, Reeves RH. Trisomy 21 and early brain development. Trends in neurosciences. 2012;35(2):81-91.

5. Bruneau BG. The developmental genetics of congenital heart disease. Nature. 2008;451(7181):943-8.
- 66. Leite DL, Miziara H, Veloso M. Malformações cardíacas congênitas em necropsias pediátricas: características, associações e prevalência. Arq. Bras. Cardiol. 2010;94(3):294-9.. As intervenções cirúrgicas necessárias normalmente debilitam o estado de saúde geral bem como a qualidade de vida dos pacientes55. Bruneau BG. The developmental genetics of congenital heart disease. Nature. 2008;451(7181):943-8. , 66. Leite DL, Miziara H, Veloso M. Malformações cardíacas congênitas em necropsias pediátricas: características, associações e prevalência. Arq. Bras. Cardiol. 2010;94(3):294-9..

A criança com síndrome de Down apresenta acometimentos motores e funcionais graves em regiões relacionadas ao processo da deglutição em decorrência das características morfológicas descritas anteriormente. Outro fator que se pode citar é a exposição frequente a cirurgias corretivas de defeito cardíaco congênito com suas complicações (ventilação, internação por período prolongado, uso de sonda para alimentação, entre outros). Essas podem ser condições de risco importantes para o sintoma de disfagia que acometem crianças com esta síndrome específica, frequentemente, podendo causar déficits nutricionais, desidratação, comprometimento sensório-motor e aspiração traqueal, a qual representa risco para o estado de saúde geral do paciente11. Lefton-Greif MA. Pediatric Dysphagia.Phys Med RehabilClin N Am. 2008;19(4): 837-51. , 77. Cooper-Brown L, Copelan S, Dailey S, Downey D, Peterson MC, Stimson C et al. Feeding and swallowing dysfunction in genetic syndromes. DevDisabil Res Rev. 2008;14(2):147-57. , 88. Fujinaga CI. Prontidão do prematuro para início da alimentação oral: confiabilidade e validação clínica de um instrumento de avaliação [tese]. Ribeirão Preto (SP): Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo; 2005..

No sentido de contribuir para este campo de pesquisa, o presente estudo teve como objetivo investigar o processo de deglutição e suas possíveis alterações por meio da avaliação clínica da deglutição em dois lactentes com síndrome de Down e cardiopatia congênita.

Apresentação do caso

Trata-se de uma pesquisa descritivo-qualitativa aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa do Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul (IC/FUC) sob o número 4603/11.

O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) foi devidamente assinado pelos responsáveis legais de cada sujeito previamente à realização da avaliação fonoaudiológica.

Foram incluídos todos os lactentes com suspeita de dificuldade de deglutição, encaminhados ao serviço de fonoaudiologia, com diagnósticos de cardiopatia congênita e síndrome de Down, internados no IC/FUC-RS durante os meses de janeiro a outubro de 2012.

Casuística

S1 - NBC, gênero feminino, seis meses e 27 dias, diagnóstico de síndrome de Down com cardiopatia congênita (Defeito do Septo Atrioventricular tipo A de Rastelli), histórico de sepse, prematuridade (32 semanas gestacionais), hipotireoidismo, insuficiência renal, síndrome de baixo débito cardíaco e hipertensão arterial, sendo que a insuficiência renal estava resolvida e a hipertensão arterial controlada no momento da avaliação. Aos três meses e 21 dias foi submetido a procedimento de correção total da cardiopatia. Precisou de intubação por 90 dias (Figura 1). Quanto à alimentação, a paciente estava, desde o nascimento recebendo dieta via sonda nasogástrica, sem estimulação oral.

S2- JPLC, gênero masculino, seis meses e14 dias, diagnóstico de síndrome de Down com cardiopatia congênita (Defeito do Septo Atrioventricular tipo A de Rastelli), histórico de sepse, pneumonia, bronquiolite, desnutrição e disfunção respiratória. Aos seis meses, realizou procedimento de correção total da cardiopatia. Precisou de intubação por três dias. Quanto à alimentação, foi oferecido o seio materno desde o nascimento até em torno dos cinco meses, quando foi preconizada a alimentação por mamadeira em função das dessaturações múltiplas e recorrentes ao seio materno, em virtude do esforço para ordenha. Ainda assim, o paciente apresentava baixo ganho de peso, com sinais de aversão alimentar, configurando um quadro de desnutrição, desta forma, o mesmo passou a receber dieta exclusiva por sonda nasogástrica (Figura 1).

Figura 1:
Dados referentes à casuística, coletados por meio de protocolo de caracterização da amostra com pesquisa nos prontuários durante período de internação no Instituto de Cardiologia do Rio Grande do Sul IC/FUC-RS

Procedimentos:

Os procedimentos foram realizados sempre pela mesma fonoaudióloga, seguindo a conduta do hospital.

A investigação do processo de deglutição em dois lactentes com síndrome de Down e cardiopatia congênita envolveu as seguintes atividades:

1) Pesquisa nos prontuários utilizando protocolo de caracterização da amostra para colher os dados referentes à idade, gênero, diagnóstico cardiológico, diagnósticos associados, número de cirurgias corretivas, tempo de intubação, tempo pós-extubação para avaliação clínica e histórico de alimentação.

Figura 2:
Protocolo de caracterização da amostra utilizado para coleta de dados nos prontuários

2) Avaliação clínica da deglutição por meio do Instrumento para avaliação da prontidão do prematuro para o início da alimentação oral - adaptado (Fujinaga, 2002) 99. Fujinaga CI . Prontidão do prematuro para início da alimentação oral: proposta de um instrumento de avaliação [dissertação]. Ribeirão Preto (SP): Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo; 2002. Figura 3.

Figura 3:
Instrumento para Avaliação do Prontuário do Prematuro para o Início da Alimentação Oral (Fujinaga, 2002) - Adaptado

Resultados

O sujeito 1 foi encaminhado ao serviço de fonoaudiologia, realizou-se avaliação clínica da deglutição por meio do Instrumento para a avaliação da prontidão do prematuro para o início da alimentação oral - adaptado (Fujinaga, 2002) 99. Fujinaga CI . Prontidão do prematuro para início da alimentação oral: proposta de um instrumento de avaliação [dissertação]. Ribeirão Preto (SP): Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo; 2002. após seis dias de extubação. A avaliação foi realizada por meio de dedo enluvado e chupeta com e sem estímulo gustativo. Quanto ao estado de consciência, o paciente estava alerta, postura global de semifexão, tônus global hipotônico; quanto à postura de lábios, estavam entreabertos, postura de língua plana; reflexo de procura e sucção ausentes, reflexos de mordida e vômito presentes; movimentação de língua, canolamento de língua e movimentação de mandíbula ausentes; força de sucção ausente; manteve estado de alerta durante a avaliação; não apresentou sinais de estresse; apresentando escore 14 (Figura 4).

Figura 4:
Resultados da avaliação clínica da deglutição por meio do Instrumento para Avaliação da Prontidão do Prematuro para o início da Alimentação Oral (Fujinaga, 2002) - Adaptado

O sujeito 2 foi encaminhado ao serviço de fonoaudiologia, realizou-se avaliação clínica da deglutição por meio do Instrumento para a avaliação da prontidão do prematuro para o início da alimentação oral - adaptado(Fujinaga, 2002) 99. Fujinaga CI . Prontidão do prematuro para início da alimentação oral: proposta de um instrumento de avaliação [dissertação]. Ribeirão Preto (SP): Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo; 2002. após 11 dias de extubação. A avaliação foi realizada por meio da chupeta sem estímulo gustativo. Quanto ao estado de consciência, o paciente estava alerta, postura global de flexão, tônus global normotenso; quanto à postura de lábios, estavam entreabertos, postura de língua plana; reflexo de procura, sucção, mordida e vômito presentes; movimentação de língua alterada; canolamento de língua e movimentação de mandíbula ausentes; sucção forte; manteve as sucções de forma arrítmica; manteve estado de alerta durante a avaliação; apresentou um sinal de estresse: tiragem; apresentando escore 25 (Figura 2). Foi possível iniciar com treino de via oral com mamadeira fluxo leite com bico comum, sendo o liquido espessado a 3%, estabelecendo-se pausas a cada 3 a 4 sucções.

Discussão

Crianças com síndromes genéticas, frequentemente, apresentam algum tipo de dificuldade ou disfunção relacionada à alimentação e deglutição, normalmente são resultantes da interação dos fatores de condições anatômicas, fisiológicas, diagnósticas e comportamentais, tornando o processo alimentar por muitas vezes, dificultoso, cansativo e negativo. Essas questões propiciam o desenvolvimento de comportamentos que dificultam a alimentação, tais como a recusa ou aversão oral, o que limita as experiências motoras-orais e compromete a aquisição de habilidades nesse aspecto11. Lefton-Greif MA. Pediatric Dysphagia.Phys Med RehabilClin N Am. 2008;19(4): 837-51. , 77. Cooper-Brown L, Copelan S, Dailey S, Downey D, Peterson MC, Stimson C et al. Feeding and swallowing dysfunction in genetic syndromes. DevDisabil Res Rev. 2008;14(2):147-57.. As características fenotípicas faciais e o desenvolvimento motor-oral na síndrome de Down evidenciam a possibilidade de distúrbios no processo de deglutição. O histórico dos dois lactentes em estudo demonstra a dificuldade com a experiência alimentar, na qual as condições anátomo-funcionais, para que o processo de deglutição fosse realizado de forma segura e eficaz, apresentavam-se alteradas. O déficit que essa experiência negativa causa pode ter sido refletido nos resultados da avaliação clínica da deglutição por meio dos baixos escores e no aporte nutricional do sujeito 2, configurado como "desnutrição". Anteriormente à avaliação clínica da deglutição, o sujeito 2 estava sendo alimentado com dieta exclusiva por SNG para que fosse possível a oferta do aporte calórico necessário ao desenvolvimento do lactente e à estabilização do quadro clínico, após a avaliação foi possível iniciar o treino de via oral com controle do volume e consistência utilizada, sendo o líquido engrossado na padronização de espessamento de 3%. Verificou-se padrão de sucção nutritiva arrítimico, necessitando de pausas a cada grupo de 3 a 4 sucções.

A escolha do protocolo para avaliação clínica da deglutição se deu em virtude de ser o único instrumento na língua portuguesa que é validado e que possui confiabilidade adequada entre seus observadores em uma população semelhante - lactentes pré-termo e a termo 88. Fujinaga CI. Prontidão do prematuro para início da alimentação oral: confiabilidade e validação clínica de um instrumento de avaliação [tese]. Ribeirão Preto (SP): Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo; 2005.

9. Fujinaga CI . Prontidão do prematuro para início da alimentação oral: proposta de um instrumento de avaliação [dissertação]. Ribeirão Preto (SP): Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo; 2002.
- 1010. Mizuno K, Ueda A. The maturation and coordination of sucking swallowing, and respiration in preterm infants. J Pediatr. 2003;142:36-40.. Em sua validade clínica, foi recomendado para os recém-nascidos estudados ponto de corte de 28 pontos, numa escala de zero a 36 para iniciar o processo de transição para alimentação oral. Os lactentes com síndrome de Down e cardiopatia congênita com idades entre seis meses e 14 dias e seis meses e 27 dias assemelharam-se aos recém-nascidos prematuros em escores baixos para prontidão da alimentação por via oral e na conduta clínica indicada, relacionada ao treino das funções motoras-orais ou restrição do volume por via oral11. Lefton-Greif MA. Pediatric Dysphagia.Phys Med RehabilClin N Am. 2008;19(4): 837-51. , 88. Fujinaga CI. Prontidão do prematuro para início da alimentação oral: confiabilidade e validação clínica de um instrumento de avaliação [tese]. Ribeirão Preto (SP): Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo; 2005.

9. Fujinaga CI . Prontidão do prematuro para início da alimentação oral: proposta de um instrumento de avaliação [dissertação]. Ribeirão Preto (SP): Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo; 2002.
- 1010. Mizuno K, Ueda A. The maturation and coordination of sucking swallowing, and respiration in preterm infants. J Pediatr. 2003;142:36-40..

O presente estudo demonstrou que em ambos os sujeitos as características de movimento, posicionamento e tensão muscular estavam alteradas, apresentando lábios entreabertos como postura habitual, movimentos de língua ausentes ou alterados, canolamento de língua ausente e ausência de movimentação de mandíbula durante a avaliação clínica. Estudos pregressos realizados com eletromiografia de superfície em crianças com síndrome de Down mostraram que eles podem apresentar características específicas relacionadas ao desenvolvimento motor-oral, dentre elas estão: hipotonia intra e extra-oral, vedamento labial ineficiente e controle dos movimentos de língua alterado, sendo os movimentos de língua e mandíbula fundamentais para a ordenha e coordenação da sucção, deglutição e respiração e o vedamento labial indispensável para que haja a pressão intra-oral essencial à sucção efetiva1010. Mizuno K, Ueda A. The maturation and coordination of sucking swallowing, and respiration in preterm infants. J Pediatr. 2003;142:36-40. , 1111. Iderilha PN, Limongi SCO. Avaliação eletromiográfica da sucção em bebês com síndrome de Down. Rev. Soc.Bras.Fonoaudiol. 2007;12(3):174-83..

Na população cardíaca pediátrica, são considerados fatores de risco para disfagia orofaríngea: idade inferior a três anos, intubação maior que sete dias, intubação pré-operatória e operações para lesões obstrutivas do lado esquerdo66. Leite DL, Miziara H, Veloso M. Malformações cardíacas congênitas em necropsias pediátricas: características, associações e prevalência. Arq. Bras. Cardiol. 2010;94(3):294-9., corroborando ao presente estudo, em que ambos os lactentes apresentaram o sintoma e pelo menos, dois dos fatores de risco citados anteriormente.

É relevante mencionar que existem diversos estudos que referem a existência de dificuldades na alimentação em crianças com diagnóstico de cardiopatia congênita e que, normalmente, essas dificuldades se caracterizam por recusa, comportamento aversivo, preferência e falta de competência alimentar para seu nível de desenvolvimento11. Lefton-Greif MA. Pediatric Dysphagia.Phys Med RehabilClin N Am. 2008;19(4): 837-51. , 55. Bruneau BG. The developmental genetics of congenital heart disease. Nature. 2008;451(7181):943-8. , 1212. Sachdeva R, Hussain E, Moss MM, Schmitz ML, Pay RM, Imanura M et al. Vocal Cord dysfunction and feeding difficulties after pediatric cardiovascular surgery. J Pediatr. 2007;151(3):312-5.

13. Jadcherla SR, Vijayapal AS, Leuthener S. Feeding abilities in neonates with congenital heart disease: a retrospective study. J. Perionatol. 2009;29(2):112-8.

14. Sables-Baus S, Kaufman J, Cook P, Cruz EM. Oral feeding outcomes in neonates with congenital cardiac disease undergoing cardiac surgery. Cardiol Young. 2011;4:1-7.

15. Sanches MTC. Manejo clínico das disfunções orais na amamentação. J Pediatr. 2004;80(5):155-62.
- 1616. Arvedson JC. Assessment of pediatric dysphagia and feeding disorders: Clinical and Instrumental Approaches. Dev Disabil Res Rev. 2008;14(2):118-27.. De semelhante modo, alterações miofuncionais orofaciais também podem ser responsáveis por distúrbios alimentares caracterizados por disfunções orais1515. Sanches MTC. Manejo clínico das disfunções orais na amamentação. J Pediatr. 2004;80(5):155-62.. No presente estudo de casos, os lactentes apresentaram sinais de dificuldades de deglutição característicos de lactentes com cardiopatia congênita e sinais de disfunções orais que representam alterações miofuncionais, descritas anteriormente na síndrome de Down. De forma a corroborar a literatura prévia, os dois lactentes apresentam o sintoma disfagia que pode estar associado a inúmeros fatores predisponentes: às dificuldades de deglutição dentro de síndromes que comprometem as habilidades motoras, às alterações miofuncionais na síndrome de Down, à cardiopatia congênita, a cirurgias corretivas bem como ventilação mecânica e período de internação prolongada11. Lefton-Greif MA. Pediatric Dysphagia.Phys Med RehabilClin N Am. 2008;19(4): 837-51. , 77. Cooper-Brown L, Copelan S, Dailey S, Downey D, Peterson MC, Stimson C et al. Feeding and swallowing dysfunction in genetic syndromes. DevDisabil Res Rev. 2008;14(2):147-57. , 88. Fujinaga CI. Prontidão do prematuro para início da alimentação oral: confiabilidade e validação clínica de um instrumento de avaliação [tese]. Ribeirão Preto (SP): Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo; 2005. , 1212. Sachdeva R, Hussain E, Moss MM, Schmitz ML, Pay RM, Imanura M et al. Vocal Cord dysfunction and feeding difficulties after pediatric cardiovascular surgery. J Pediatr. 2007;151(3):312-5.

13. Jadcherla SR, Vijayapal AS, Leuthener S. Feeding abilities in neonates with congenital heart disease: a retrospective study. J. Perionatol. 2009;29(2):112-8.

14. Sables-Baus S, Kaufman J, Cook P, Cruz EM. Oral feeding outcomes in neonates with congenital cardiac disease undergoing cardiac surgery. Cardiol Young. 2011;4:1-7.

15. Sanches MTC. Manejo clínico das disfunções orais na amamentação. J Pediatr. 2004;80(5):155-62.

16. Arvedson JC. Assessment of pediatric dysphagia and feeding disorders: Clinical and Instrumental Approaches. Dev Disabil Res Rev. 2008;14(2):118-27.
- 1717. O'Neill AC, Richter GT. Pharyngeal Dysphagia in Children with Down Syndrome. Otolaryngol Head Neck Surg. 2013 Mar;22. [Epub ahead of print]..

O presente estudo apresentou algumas dificuldades relacionadas à logística das avaliações da deglutição, tendo em vista que os lactentes com síndrome de Down e cardiopatia congênita podem apresentar quadro clínico instável e intubação por período prolongado. Essas condições podem inviabilizar a realização da avaliação clínica da deglutição em um número maior de lactentes durante o período e idade propostos pelo estudo. Outra limitação a ser mencionada é a dificuldade de realizar avaliações clínicas da deglutição prévias à cirurgia corretiva do defeito cardíaco, a fim de verificar a presença de disfagia e sintomas predisponentes a mesma no pré-cirúrgico. Isso ocorreu, pois frequentemente os lactentes estão intubados durante a internação ou porque lactentes provenientes de outras cidades chegam ao hospital apenas para a intervenção cirúrgica, uma vez que o IC-FUC/RS é hospital de referência para cardiopatias, além do fato de que os pacientes precisam ser encaminhados ao serviço de fonoaudiologia, o que normalmente ocorre no pós-cirúrgico. Ainda, o estudo apresentou dificuldade em oferecer avaliação instrumental da deglutição para descrever os sintomas de dificuldade de deglutição de forma objetiva, uma vez que esse exame é realizado mediante encaminhamento médico e não é de rotina assistencial em um hospital cardiológico.

Finalmente, ressaltamos que embora a síndrome de Down seja uma condição amplamente conhecida, merece estudos aprofundados na área de deglutição com ênfase pediátrica, pois ainda são escassos. A necessidade evidencia-se principalmente ao verificar as características fenotípicas, anatômicas, funcionais e de quadro clínico que normalmente acometem esses lactentes. A avaliação e intervenção precoce podem ser fundamentais para proporcionar um melhor desenvolvimento das funções motoras-orais, melhor desenvolvimento global e qualidade de vida para lactentes com cardiopatia congênita e disfagia.

Comentários Finais

Desta maneira, conclui-se que mesmo lactentes com síndrome de Down em idade avançada podem apresentar incoordenação da sucção, deglutição e respiração no período pós-operatório.

A avaliação clínica da deglutição demonstrou a presença de disfagia orofaríngea em ambos os casos estudados. A disfagia apresentou-se nos dois casos descritos como um fator dificultante para a alimentação por via oral.

O estudo sugere a importância da atuação fonoaudiológica na população pediátrica cardíaca e sindrômica por meio dos baixos escores apresentados, semelhantes aos de lactentes pré-termo em estudos que utilizaram o mesmo protocolo de avaliação clínica da deglutição, e principalmente pela necessidade do desenvolvimento das habilidades orais e alimentares a fim de proporcionar estabilidade clínica e qualidade de vida aos mesmos.

Tendo em vista a importância desta experiência para o desenvolvimento global dos lactentes, estudos prospectivos futuros com um número maior de sujeitos são necessários para contribuir com a série de casos, bem como verificar a presença de disfagia no pré-cirúrgico ou demonstrar a influência dos fatores predisponentes à disfagia.

  • 1
    Lefton-Greif MA. Pediatric Dysphagia.Phys Med RehabilClin N Am. 2008;19(4): 837-51.
  • 2
    Irving CA, Milind PC. Cardiovascular abnormalities in Down's syndrome: spectrum, management and survival over 22 years. Archives of disease in childhood. 2012;97(4):326-30.
  • 3
    Rodman R, Pine HS. The otolaryngologist's approach to the patient with Down syndrome. OtolaryngolClin North Am. 2012;45(3):599-629.
  • 4
    Haydar TF, Reeves RH. Trisomy 21 and early brain development. Trends in neurosciences. 2012;35(2):81-91.
  • 5
    Bruneau BG. The developmental genetics of congenital heart disease. Nature. 2008;451(7181):943-8.
  • 6
    Leite DL, Miziara H, Veloso M. Malformações cardíacas congênitas em necropsias pediátricas: características, associações e prevalência. Arq. Bras. Cardiol. 2010;94(3):294-9.
  • 7
    Cooper-Brown L, Copelan S, Dailey S, Downey D, Peterson MC, Stimson C et al. Feeding and swallowing dysfunction in genetic syndromes. DevDisabil Res Rev. 2008;14(2):147-57.
  • 8
    Fujinaga CI. Prontidão do prematuro para início da alimentação oral: confiabilidade e validação clínica de um instrumento de avaliação [tese]. Ribeirão Preto (SP): Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo; 2005.
  • 9
    Fujinaga CI . Prontidão do prematuro para início da alimentação oral: proposta de um instrumento de avaliação [dissertação]. Ribeirão Preto (SP): Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo; 2002.
  • 10
    Mizuno K, Ueda A. The maturation and coordination of sucking swallowing, and respiration in preterm infants. J Pediatr. 2003;142:36-40.
  • 11
    Iderilha PN, Limongi SCO. Avaliação eletromiográfica da sucção em bebês com síndrome de Down. Rev. Soc.Bras.Fonoaudiol. 2007;12(3):174-83.
  • 12
    Sachdeva R, Hussain E, Moss MM, Schmitz ML, Pay RM, Imanura M et al. Vocal Cord dysfunction and feeding difficulties after pediatric cardiovascular surgery. J Pediatr. 2007;151(3):312-5.
  • 13
    Jadcherla SR, Vijayapal AS, Leuthener S. Feeding abilities in neonates with congenital heart disease: a retrospective study. J. Perionatol. 2009;29(2):112-8.
  • 14
    Sables-Baus S, Kaufman J, Cook P, Cruz EM. Oral feeding outcomes in neonates with congenital cardiac disease undergoing cardiac surgery. Cardiol Young. 2011;4:1-7.
  • 15
    Sanches MTC. Manejo clínico das disfunções orais na amamentação. J Pediatr. 2004;80(5):155-62.
  • 16
    Arvedson JC. Assessment of pediatric dysphagia and feeding disorders: Clinical and Instrumental Approaches. Dev Disabil Res Rev. 2008;14(2):118-27.
  • 17
    O'Neill AC, Richter GT. Pharyngeal Dysphagia in Children with Down Syndrome. Otolaryngol Head Neck Surg. 2013 Mar;22. [Epub ahead of print].

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Fev 2015

Histórico

  • Recebido
    01 Ago 2013
  • Aceito
    01 Mar 2014
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