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Fatores Determinantes do Pagamento de Dividendos no Brasil* * Artigo apresentado no 14º Encontro Brasileiro de Finanças, Recife, Brasil, 2014

Resumos

Este estudo busca identificar os fatores que determinam a política de distribuição de proventos das empresas brasileiras de capital aberto listadas na BM&FBOVESPA, no período de 1995 a 2011. Para tanto, investigou-se a relação entre Dividendos/Ativo Total e possíveis determinantes apontados pela literatura como: tamanho da firma, governança corporativa, rentabilidade, alavancagem, market to book, liquidez, investimentos, risco, crescimento dos lucros, assimetria informacional e conflitos de agency. Adotaram-se os métodos econométricos: (1) Tobit, pela natureza dos dados de dividendos, e (2) Generalized Method of Moments (GMM), para controlar por regressores endógenos. Como principais resultados, constatou-se que as variáveis significantes e positivas foram: Tamanho, ROA, Market to Book, Liquidez e Crescimento dos Lucros. Isto é, pode-se inferir que, quanto maior o tamanho da empresa, sua rentabilidade, seu valor de mercado, sua liquidez e o crescimento dos seus lucros, maior será a propensão desta firma em distribuir dinheiro aos acionistas, o que se alinha com a teoria de finanças corporativas. Por outro lado, constatou-se que as variáveis significantes e negativas foram: Leverage, Liquidez elevada ao quadrado, Capex, Beta e Tag Along 100%. Infere-se que empresas mais alavancadas, que investem mais em ativo imobilizado, possuem liquidez muito elevada, maior risco e menor conflito entre controladores e minoritários, terão uma menor propensão a pagar dividendos aos acionistas.

política de dividendos; finanças corporativas; empresas brasileiras


This study identifies factors that shaped cash disbursement distribution policies employed by Brazilian public companies listed on the Brazilian Securities, Commodities and Futures Exchange (BM&FBOVESPA) from 1995 to 2011. Relationships between Dividends/Total Assets and potential determinants discussed in the literature, including firm size, corporate governance, profitability, leverage, market to book, liquidity, investment, risk, profit growth, information asymmetry and agency conflict, are examined. The following econometric methods are employed: (1) Tobit, given the nature of the dividend data, and (2) the Generalized Method of Moments (GMM) to control for endogenous regressors. Significant positive variables found include size, return on assets (ROA), market to book, liquidity and profit growth. It can thus be inferred that larger firm size, profitability, market value, liquidity and profit growth correlate with greater firm pro pensity to distribute money to shareholders, thus supporting the theory of corporate finance. Significant negative variables found include leverage, liquidity squared, capex, beta and tag along 100%. It is thus inferred that more significantly leveraged companies that invest more heavily in fixed assets and that exhibit high liquidity, higher risk and less conflict between controlling and minority shareholders will be less likely to pay dividends to shareholders.

dividend policy; corporate finance; brazilian companies


1 INTRODUÇÃO

A política de dividendos varia amplamente entre empresas e setores da economia e seu efeito sobre o valor das empresas permanece controverso para os pesquisadores de finanças. Em conjunto com a política de investimento e de financiamento, forma os três pilares mais importantes das decisões em finanças corporativas. Entender quais fatores influenciam as empresas em suas decisões de distribuição e retenção de caixa é importante para gestores financeiros, investidores e para os órgãos reguladores de mercado.

Quais fatores determinam a política de distribuição de dividendos das empresas brasileiras de capital aberto listadas na BM&FBOVESPA? Neste artigo, busca-se responder a essa questão, investigando os principais aspectos capazes de influenciar essa importante decisão corporativa. Nesse sentido, o objetivo do presente estudo é avaliar, dentre os fatores determinantes da distribuição de proventos apresentados pela literatura, aqueles que se destacam no contexto brasileiro, analisando o período de 1995 a 2011.

Os estudos sobre política de dividendos no Brasil necessitam de alguns cuidados específicos, uma vez que o sistema tributário incidente sobre dividendos difere do adotado nos países de origem dos estudos mais relevantes sobre o tema como EUA, Inglaterra, Alemanha e Japão. O Brasil possui ainda a figura dos juros sobre o capital próprio, que oferece opções tributárias distintas às empresas para sua distribuição de lucros. Temos também os dividendos mínimos obrigatórios, que podem afetar os níveis de pagamento de dividendos das empresas por imposição legal. Desta forma, a literatura de dividendos no Brasil se desenvolve paralelamente buscando entender o efeito destas especificidades no comportamento das empresas e de seus gestores.

Vale destacar que tais heterogeneidades do cenário brasileiro constituem uma oportunidade de pesquisa, uma vez que é possível identificar variações tributárias e de legislação únicas quando se avalia o panorama de distribuição de caixa aos acionistas. Neste contexto, optou-se pela análise da distribuição de caixa como um todo ao invés de analisar apenas dividendos ou juros sobre o capital próprio, pois a motivação para a distribuição sob uma ou outra forma não faz parte do escopo deste trabalho1 1 Utilizamos a palavra dividendos para representar a distribuição de fluxo de caixa aos acionistas independentemente da forma como foi efetuado o pagamento. O foco está na distribuição do fluxo de caixa e suas motivações. .

A maioria das pesquisas empíricas sobre esse tema no Brasil não avançou no sentido de adotar metodologias econométricas ajustadas à distribuição amostral dos dividendos2 2 Os dividendos possuem uma distribuição com muitos valores iguais a zero e censurada neste valor, pois não existem dividendos negativos. . A partir do estudo de Heineberg e Procianoy (2003)Heineberg, R. & Procianoy, J. L. (2003). Aspectos determinantes do pagamento de proventos em dinheiro das empresas com ações negociadas na BOVESPA. Anais do Encontro da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração (ENANPAD), Atibaia, SP, Brasil, 27., que buscou analisar os fatores determinantes da política de proventos de firmas brasileiras entre os anos de 1994 a 2000, procurou-se avançar na compreensão da política de dividendos das empresas nacionais, adotando um conjunto mais amplo de variáveis, respeitando as características do ambiente legal brasileiro e utilizando abordagens econométricas robustas à amostragem de dividendos.

Utilizando dados da base Economática, da BM&FBOVESPA e da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), foram analisados todos os setores de atividade, exceto o financeiro, por possuir particularidades quanto à natureza da estrutura de capital e por sua regulação restrita e diferenciada.

Dentre os avanços adotados neste trabalho estão: (a) utilização da razão Dividendos/Ativo Total como variável dependente ao invés de Dividendos/Lucro Líquido3 3 Heineberg e Procianoy (2003) utilizaram o valor absoluto dos dividendos como variável dependente. Contudo, diversos estudos sobre fatores de dividendos da literatura internacional utilizam variáveis relativas (ratios) para investigar dividendos como Mayne (1980), Rozeff (1982), Dickens, Casey, e Newman (2002) e Kania e Bacon (2005). , pois o ativo total é mais estável do que os lucros assim como os fluxos de dividendos (Lintner, 1956La Porta, R., Lopez-De-Silanes, F., Shleifer, A. & Vishny, R.W. (2000). Agency problems and dividend policies around the world. The Journal of Finance, 55 (1), 1-33.); (b) ampliação do escopo das variáveis independentes que envolveram: tamanho da firma, governança corporativa, retorno, alavancagem, valor de mercado, liquidez, investimentos, risco, crescimento, concentração de propriedade, conflitos de agency e sinalização; (c) quanto à metodologia adotada, compararam-se os resultados dos métodos Tobit e GMM.

Esta pesquisa justifica-se pela nítida associação observada entre a política de dividendos e a quase totalidade das outras decisões financeiras das organizações. Percebe-se que as decisões sobre o volume de recursos distribuídos influenciam a alavancagem, o volume de investimentos, o volume de caixa disponível, as fusões e aquisições, entre outros. Logo, a compreensão dessa política pode ajudar a entender outras decisões das empresas como a estrutura de capital, o apreçamento dos ativos e o seu orçamento de capital, além de possibilitar um novo olhar sobre as finanças corporativas e a proteção aos acionistas minoritários.

Como resultados desta investigação, constatou-se que a distribuição de recursos aos acionistas por parte das empresas brasileiras investigadas ocorre de acordo com as teorias clássicas de finanças onde: (a) tamanho da firma, retorno, market to book, liquidez, controle e crescimento dos lucros apresentaram relações significantes e positivas com a propensão das empresas em pagar dividendos; e (b) alavancagem, governança corporativa, risco e assimetria informacional apresentaram, por sua vez, relações estatisticamente significantes e negativas com o pagamento de dividendos.

O artigo está estruturado da seguinte forma: na seção 2 é feita uma revisão teórica das literaturas internacional e nacional sobre a política de dividendos das firmas. A seção 3 apresenta a metodologia de pesquisa do estudo. A seção 4 descreve os resultados obtidos. A seção 5 conclui o texto.

2 REVISÃO DA LITERATURA

Dentre os trabalhos precursores sobre o comportamento dos dividendos corporativos, Lintner (1956) divide seus estudos em duas fases: (a) fase inicial envolvendo entrevistas com executivos de alto escalão (Chief Executive Officers - CEOs) de 28 grandes empresas americanas; e (b) fase empírica em que utilizou dados em painel das empresas citadas avaliando o comportamento de seus dividendos através de modelos econométricos.

Dentre os resultados encontrados, Lintner (1956) afirma que os acionistas preferem a estabilidade dos dividendos e que o mercado oferece um prêmio para as ações de empresas que apresentam estabilidade ou taxa crescente (gradual) dos dividendos. Ademais, Lintner (1956) observou que os lucros correntes são invariavelmente o ponto de partida dos gestores para a determinação do momento em que os dividendos devem ser alterados. Além disso, descobriu que os gestores definem primeiramente a política de dividendos e que as outras políticas como investimentos, endividamento e manutenção de caixa seriam definidas a partir de um dado volume de dividendos. Em suma, o autor constatou que os gestores de firmas dos Estados Unidos utilizavam os dividendos como elemento sinalizador da sustentabilidade do crescimento dos lucros.

Alguns anos depois, Miller e Modigliani, em seu artigo de 1961Mayne, L.S. (1980). Bank holding company characteristics and the upstreaming of bank funds. Journal of Money, Credit and Banking, 12 (2), 209-214., demonstraram que a distribuição de dividendos seria irrelevante para a determinação do valor da empresa na ausência de imperfeições de mercado, e que este deveria ser influenciado apenas pelas decisões de investimento da organização. A partir daí, grande parte da literatura sobre dividendos buscou abordar as diversas imperfeições de mercado que afetariam a política de dividendos, como impostos, custos de agência, assimetria informacional, efeito clientela e modelos comportamentais. Os estudos sobre essa temática ficaram conhecidos então pela expressão "Dividend Puzzle" de Black (1976)Black, F. (1976). The dividend puzzle. Journal of Portfolio Management, 2 (1), 5-8..

Desde então, as principais investigações acerca de dividendos são: (a) Efeitos tributários: busca-se por possíveis relações entre a forma de pagamentos e a preferência dos acionistas devido à sua situação tributária (Miller & Scholes, 1982); (b) Efeito risco: defende-se que os dividendos podem alterar o valor da empresa devido à incerteza sobre o recebimento futuro do fluxo de caixa gerado pela firma (Gordon, 1963Gordon, M. J. (1963). Optimal investment and financial policy. The Journal of Finance, 18 (2), 264-272.; Black & Scholes, 1974); (c) Efeito clientela: defende-se que cada empresa pode atrair um tipo diferente de investidor de acordo com a maneira pela qual distribui seus lucros (Miller & Modigliani, 1961; Black & Scholes, 1974); (d) Efeito dos custos de agência: advoga-se que os acionistas deveriam incentivar a distribuição de recursos disponíveis para reduzir o fluxo de caixa livre à disposição dos gestores (Jensen & Meckling, 1976Holanda, A. P. & Coelho, A. C. D. (2012). Dividendos e efeito clientela: evidências no mercado brasileiro. RAE, 52 (4), 448-463.; Moh'd, Perry, & Rimbey, 1995); (e) Efeitos da assimetria informacional: baseia-se na existência de um conteúdo informacional sinalizado pela política de dividendos utilizada pela empresa (Grullon, Michaely, & Swaminathan, 2002Grullon, G., Michaely, R. & Swaminathan, B. (2002). Are dividend changes a sign of firm maturity? The Journal of Business, 75 (3), 287-424.).

Rozeff (1982)Renneboog, L. & Trojanowski, G. (2011). Patterns in payout policy and payout channel choice. Journal of Banking & Finance, 35 (6), 1477-1490. investigou fatores para o pagamento de dividendos e desenvolveu um modelo para payout ratio que se mostrou consistente e robusto tanto para utilização em diferentes períodos de tempo quanto para utilização em diferentes setores da economia. Em seu modelo, Rozeff (1982) encontrou cinco variáveis significantes e com comportamento esperado: (a) beta, (b) percentual de insider ownership, (c) taxa de crescimento dos lucros passados, (d) taxa de crescimento das previsões de lucros e (e) o número de acionistas ordinários. Sob a mesma ótica, Dickens, Casey, e Newman (2002)Dickens, R. N., Casey, K. M. & Newman, J. A. (2002). Bank dividend policy: explanatory factors. Quarterly Journal of Business and Economics, 41 (1), 3-12. argumentam que os fatores explicativos dos dividendos devem ser importantes, pois o modelo intrínseco de avaliação de ativos sustenta que o preço das ações é determinado pelo valor presente de seus dividendos.

Prosseguindo os estudos sobre o tema, Kania e Bacon (2005)John, K. & Knyazeva, A. (2006). Payout policy, agency conflicts and corporate governance. [Working Paper]. New York University. também sugerem que os dividendos servem como um indicador da performance presente e futura da empresa e até mesmo de seu potencial risco. Como resultados, constataram a existência de associações positivas e significantes entre payout e crescimento dos lucros e endividamento. Por outro lado, encontraram relações negativas e significantes entre payout e: risco, Capex, insider ownership e liquidez.

A presença de insider ownership e o número de acionistas ordinários nos modelos de dividendos instigou a investigação do relacionamento entre a política de dividendos e os mecanismos de governança corporativa. Dentre eles, podem-se citar: Dalmácio e Corrar (2007), Setia-Atmaja, Tanewski, e Skully (2009)Rozeff, M. S. (1982). Growth, beta, and agency costs as determinants of dividend payout ratios. The Journal of Financial Research, 5 (1), 249-259., Jo e Pan (2009)Jensen, M. C. & Meckling, W. H. (1976). Theory of the firm: managerial behavior, agency costs and ownership structure. Journal of Financial Economics, 3 (4), 305-360. e Holanda e Coelho (2012)Hermalin, B. E. & Weisbach, M. S. (2003). Board of directors as an endogenously determined institution: a survey of the economic literature. Federal Reserve Bank of New York Economic Policy Review, New York, USA.. Dalmácio e Corrar (2007) investigam a relação entre a concentração do controle acionário e a política de dividendos de 438 empresas brasileiras listadas na BOVESPA, no período de 1998 a 2005. Constataram que um aumento na concentração acionária provoca um aumento no valor dos dividendos pagos por ação.

Setia-Atmaja et al. (2009) analisam se empresas familiares de capital aberto na Austrália utilizam dividendos, dívida e estrutura do conselho para aumentar ou reduzir os problemas de agência entre acionistas controladores e minoritários em um ambiente de mercado de capitais com alta proteção ao investidor e benefícios privados de controle. Constatam que, quando comparadas a empresas não controladas pela família, as empresas familiares utilizam maiores taxas de payout de dividendos e menores níveis de independência do conselho.

Sob a mesma perspectiva, Jo e Pan (2009) examinaram a relação entre entrincheiramento gerencial e política de dividendos para firmas industriais norte-americanas no período de 1990 a 2003. Os autores adotaram estimadores Logit e Tobit para medir o entrincheiramento gerencial por meio do índice G de governança de Gompers, Ishii, e Metrick (2003)Gompers, P. A., Ishii, J. L. & Metrick, A. (2003). Corporate governance and equity prices. Quarterly Journal of Economics, 118 (1), 107-155.. Constataram que as firmas com gestores entrincheirados são mais propensas a pagar dividendos e que pagar dividendos reduz a manutenção de caixa, deixando a firma mais vulnerável a takeovers hostis.

Analisando firmas brasileiras de capital aberto, no período de 1998 a 2010, Holanda e Coelho (2012) investigaram se as características externas à empresa, representativas do Efeito Clientela, diferenciam marginalmente a política de dividendos das empresas. Adotaram regressão logística e Tobit, para testar a hipótese de que existe associação entre a decisão de declarar dividendos e o efeito clientela. Como principais resultados, constataram que a concentração de propriedade foi o fator que mais afetou a política de distribuição de lucros das empresas investigadas.

É importante esclarecer que os EUA - país onde se origina grande parte das teorias e estudos sobre essa temática - apresentam legislação tributária distinta da brasileira no que tange à política de dividendos. As principais heterogeneidades da legislação brasileira sobre essa matéria são: (a) o recebimento de dividendos pelos acionistas não consiste em fato gerador de tributos4 4 Existe tributação sobre os ganhos de capital similar ao que existe nos países de origem dos estudos de dividendos. ; (b) existem dividendos mínimos obrigatórios; (c) existe uma forma adicional de distribuição de recursos chamada juros sobre o capital próprio que é dedutível da base de cálculo de tributos sobre o lucro da empresa que os distribui, mas consiste em fato gerador de tributos para o acionista que os recebe.

Assim, autores estudando política de dividendos de empresas brasileiras se concentram na replicação dos modelos utilizados pelos autores internacionais dentro dos contextos da legislação e ambiente macroeconômico do país. Estes autores investigaram a questão tributária5 5 No Brasil, os dividendos são isentos de tributos para o investidor, existe a figura dos juros sobre o capital próprio que, por sua vez, é tributado pelo investidor, mas provoca redução da carga tributária para a empresa. (Brito & Rietti, 1981Brito, N. R. O. & Rietti, R. C. (1981). Efeito clientela, níveis marginais de taxação e eficiência: o caso de dividendos no mercado acionário brasileiro. In N. R. O. Brito. (Org.). O mercado de capitais e a estrutura empresarial brasileira. Rio de Janeiro: [s.n].), volume e frequência do pagamento de dividendos (Heineberg & Procianoy, 2003), o impacto dos dividendos mínimos obrigatórios (Paiva & Lima, 2001Novis Neto, J. A. & Saito, R. (2003). Pagamentos de dividendos e persistência de retornos anormais das ações: evidência do mercado brasileiro. Revista de Administração da USP, 38 (2), 135-143.; Martins & Novaes, 2012Loss, L. & Sarlo Neto, A. (2003). Política de dividendos, na prática, é importante? Revista Contabilidade & Finanças, São Paulo, Edição Comemorativa, 39-53.), o impacto dos dividendos no investimento (Martins & Novaes, 2012), o efeito clientela (Holanda & Coelho, 2012), a recompra de ações (Gabrielli & Saito, 2003Gabrielli, M. F. & Saito, R. (2003). Recompra de ações no Brasil: regulamentação e impactos sobre minoritários. Anais do Encontro da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Administração (ENANPAD), Atibaia, SP, Brasil, 27.), o efeito do anúncio do pagamento de dividendos (Novis Neto & Saito, 2003), a utilização de pecking order (Brito & Silva, 2005), o efeito da existência de juros sobre capital próprio (Paiva & Lima, 2001), entre outros.

Em relação aos determinantes do pagamento de dividendos, destacam-se Heineberg e Procianoy (2003) e Fonteles, Peixoto, Vasconcelos, e De Luca (2012)Fonteles, I. V., Peixoto Júnior, C. A., Vasconcelos, A. C. & De Luca, M. M. M. (2012). Política de dividendos das empresas participantes do índice dividendos da BM&FBOVESPA. Revista Contabilidade Vista & Revista, 23 (3), 173-204.. Heineberg e Procianoy (2003) buscaram identificar os fatores determinantes da política de proventos6 6 Como comentado, no contexto brasileiro, proventos englobam os dividendos e os juros sobre o capital próprio. de empresas brasileiras de capital aberto no período de 1994 a 2000. Os autores constataram que o valor do lucro e os proventos pagos em dinheiro no ano anterior são as variáveis com maior poder de explicação na determinação dos proventos pagos em dinheiro no ano.

Fonteles et al. (2012) analisam o perfil das firmas integrantes do Índice Dividendos (IDIV) da BM&FBOVESPA, investigando os possíveis determinantes das políticas de dividendos elevados. A amostra do estudo envolveu 35 empresas integrantes da carteira IDIV em outubro de 2011. A fundamentação teórica do trabalho baseou-se na Teoria do Pássaro na Mão e na Teoria da Sinalização. O trabalho avaliou oito variáveis importantes para a política de dividendos elevados, quais sejam: Concentração do controle acionário, Fluxo de caixa, Tamanho da empresa, Setor de atuação, Segmento de listagem, Capital institucional, Lucro distribuído e Crescimento, agrupando-as em quatro componentes principais: 1 - Concentração; 2 - Rentabilidade; 3 - Prosperidade; e 4 - Setor. Ademais, verificaram que a política de dividendos determinada por lei é a mais observada pelas companhias.

A Tabela 1 apresenta, de forma sintética, os principais fatores que podem influenciar no comportamento dos dividendos utilizados pela literatura.

Tabela 1
Resumo dos fatores que influenciam no pagamento de dividendos

Nota-se que ainda permanece incerto quais fatores os gestores utilizam para direcionar sua decisão em iniciar ou modificar a política de dividendos. A partir do mapeamento dos estudos internacionais e nacionais e da percepção de algumas lacunas passíveis de investigação, uma das contribuições deste artigo será adicionar novas evidências empíricas à literatura sobre o tema, utilizando as ferramentas econométricas adequadas para a avaliação dos determinantes da política de dividendos das firmas.

3 ASPECTOS METODOLÓGICOS

A base de dados foi coletada mesclando-se dados da base Economática, da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e na BM&FBOVESPA. A primeira forneceu informações contábeis (Balanço, Demonstração do Resultado do Exercício - DRE, Fluxo de Caixa e Demonstração de Origem e Aplicação de Recursos - DOAR). A segunda e a terceira forneceram informações sobre governança corporativa, e outros dados específicos como a data de fundação das firmas. A amostra consiste em observações anuais de todas as empresas listadas na BM&FBOVESPA entre os anos de 1995 a 2011. O setor financeiro foi excluído sendo que a amostra final ficou composta por 300 empresas e 3.671 observações em um painel não balanceado com média de 12.2 observações para cada empresa.7 7 As observações são reduzidas a 3.242 pois as primeiras observações de cada empresa são perdidas pelo cálculo das variáveis de variação com a taxa de crescimento dos lucros e Capex. Para corrigir possíveis problemas com observações extremas (outliers), os dados foram winsorizados (winsorizing) a 0.025. Conforme abordado no item 1, não será feita distinção entre o valor pago através de dividendos ou através de juros sobre o capital próprio. Usaremos proventos e dividendos para medir o valor total distribuído aos acionistas independente de sua forma de pagamento8 8 Boulton, Braga-Alves e Shastri (2012) afirmam que o payout total da empresa não seria afetado pelo pagamento ou não de juros sobre o capital próprio, e que a empresa apenas faz uma análise sobre qual seria a forma de pagamento mais adequada a seus acionistas diante das necessidades de planejamento tributário da empresa. . A seguir serão apresentadas as variáveis que podem influenciar no pagamento de dividendos utilizadas neste estudo. As fórmulas e formas de cálculo são apresentadas na Tabela 2.

Tabela 2
Descrição das variáveis das regressões
  • Size - Tamanho: Conforme estudos anteriores (Renneboog & Trojanowski, 2011Paiva, J. W. & Lima, A. V. (2001). A influência da tributação e dos juros sobre o capital próprio na política de dividendos das companhias brasileiras. Anais do Encontro Brasileiro de Finanças, SBFin, São Paulo, SP, Brasil, 1.; Moh'd et al., 1995), espera-se que empresas maiores tenham maior propensão a pagar dividendos do que empresas menores.

  • ROA - Retorno sobre o Ativo: Espera-se que as empresas mais rentáveis paguem mais dividendos do que as demais (Kania & Bacon, 2005; John & Knyazeva, 2006Jo, H. & Pan, C. (2009). Why are firms with entrenched managers more likely to pay dividends? Review of Accounting and Finance, 8 (1), 87-116.).

  • Leverage: A literatura de finanças normalmente associa a relação entre dividendos e alavancagem a um efeito de sinalização. Um aumento nos níveis de endividamento da empresa seria um sinal crível de que a empresa espera um fluxo de caixa futuro elevado. Neste contexto, os gestores deveriam pagar mais dividendos para confirmar tal sinal. Devido à relação de causa e efeito entre as variáveis, será usada a alavancagem defasada em um período (Casey & Dickens, 2000; Jensen, Solberg, & Zorn, 1992). No entanto, outros autores argumentam que há relação inversa entre alavancagem e payout. Logo, a princípio, o sinal esperado para leverage é indeterminado.

  • Market to Book: A expectativa é de que o mercado avalie melhor empresas que ofereçam um melhor fluxo de caixa presente e futuro para seus acionistas (Speranzini, 1994Setia-Atmaja, L., Tanewski, G. A. & Skully, M. (2009). The role of dividends, debt and board structure in the governance of family controlled firms. Journal of Business Finance & Accounting, 36 (7-8), 863-898.). Espera-se sinal positivo.

  • Liquidity: Representa a liquidez geral da empresa. Empresas mais líquidas oferecem mais segurança para que seus gestores possam manter ou mesmo aumentar os níveis de pagamento de dividendos e, portanto, espera-se um sinal positivo (Acharya & Viswanathan, 2011Acharya, V. V, & Viswanathan, S. (2011). Leverage, moral hazard, and liquidity. The Journal of Finance, 66 (1), 99-138.).

  • Liquidity2 2 Os dividendos possuem uma distribuição com muitos valores iguais a zero e censurada neste valor, pois não existem dividendos negativos. : Esta variável tem o objetivo de captar um comportamento não linear da liquidez, indicando dois aspectos. Primeiro que empresas com níveis mais elevados de liquidez podem ter alcançado tal nível através da restrição de dividendos e, segundo, que pode haver um limite no qual a manutenção da liquidez passa a restringir a distribuição de dividendos e, portanto, espera-se um sinal negativo (Acharya & Viswanathan, 2011).

  • Capex: Indica a taxa de investimento ou de crescimento do ativo imobilizado da empresa. Empresas com elevados níveis de investimento normalmente são obrigadas a reter seus lucros para financiar tais investimentos sem alterar seus níveis de endividamento. Supõe-se, portanto, um sinal negativo (La Porta, Lopez-De-Silanes, Shleifer, & Vishny, 2000; Mota, 2007Moh'd, M. A., Perry, L. G. & Rimbey, J. N. (1995). An investigation of the dynamic relationship between agency theory and dividend policy. The Financial Review, 30 (2), 367-385.).

  • Beta: indica o risco sistemático da firma. Uma vez que os gestores são relutantes em aumentar os dividendos no presente e ter que reduzi-los no futuro (Lintner, 1956), acredita-se que eles sejam mais relutantes em pagar dividendos elevados em empresas com maior risco. O sinal esperado é negativo (Rozeff, 1982; Bernardo & Ikeda, 2013Bernardo, H. P. & Ikeda, R. H. (2013). O enigma dos dividendos e o risco sistemático. Revista Universo Contábil, 9 (1), 104-120.).

  • ProfitGrowth: Os gestores passam a concordar com o aumento de dividendos diante da certeza de fluxos de caixa futuros maiores dos que os fluxos presentes (Lintner, 1956). Empresas com maior crescimento dos lucros devem reduzir as incertezas dos gestores e, logo, pagar mais dividendos. Espera-se um sinal positivo (Francis, Schipper, & Vicent, 2005Francis, J., Schipper, K. & Vicent, L. (2005). Earnings and dividend informativeness when cash flow rights are separated from voting rights. Journal of Accounting and Economics, 39 (1), 329-360.).

  • Adesão aos Níveis diferenciados de Governança Corporativa (NDGC) da BM&FBOVESPA: As empresas signatárias de níveis diferenciados de governança possuem características como a de emitir apenas ações ordinárias, maior transparência e free float mínimo. Espera-se que estas empresas paguem menos dividendos do que aquelas pertencentes ao mercado tradicional (Fonteles, Peixoto, Vasconcelos & De Luca, 2012; Holanda & Coelho, 2012). A dummy para o segmento "Tradicional" não foi incluída no modelo para ser a base de comparação com as demais variáveis de governança (para evitar o "Dummy trap variable"). Espera-se, portanto, sinal negativo para todos os níveis de governança.

  • Tag Along 100%: Empresas com tal concessão voluntária reduzem os conflitos de agência entre acionistas controladores e minoritários. Essa redução permite uma redução da necessidade do pagamento de dividendos oriunda destes conflitos (Grullon et al., 2002).

  • Poison Pills: Empresas com cláusula de Poison Pills possuem, em geral, capital mais pulverizado. Quanto mais disperso for o capital, menor será o poder dos acionistas sobre os gestores e assim estes devem manter os dividendos em patamares mais baixos para usufruir dos benefícios privados de controle. O sinal esperado é negativo (Vieira, Martins, & Fávero, 2009Speranzini, M. M. (1994). Efeito da política de dividendos sobre o valor das ações no mercado brasileiro de capitais. Dissertação de mestrado, Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.).

  • (Dividendos/Ativo Total): Esta é a variável dependente e é calculada pela soma dos dividendos e dos juros sobre o capital próprio divididos pelo ativo total (Mayne, 1980Martins, T. C. & Novaes, W. (2012). Mandatory dividend rules: do they make it harder for firms to invest? J. Corp. Finance. doi:10.1016/j. jcorpfin.2012.05.002.
    https://doi.org/10.1016/j.jcorpfin.2012....
    ). Representa o tamanho relativo do fluxo de caixa distribuído aos acionistas. A opção pela razão que considera o ativo total (AT) ao invés do lucro líquido se dá pela intensa variação do lucro que nem sempre é acompanhada por uma variação nos dividendos9 9 Some companies distribute dividends even when experiencing losses. In such cases, while dividends are positive, payouts will become negative through division with a negative value, diametrically changing the regression results. Employing total assets as a denominator eliminates this bias. . A escolha do AT como denominador evita variações inexistentes na variável dependente, já que os dividendos se comportam de forma mais linear no tempo (Lintner, 1956)10 10 The coefficient of variation (CV) of the variable (Dividends/Profit) is 35 times greater than the CV of the variable (Dividends/Total Assets) for the sample used in the present study. The CV is a statistical measure of dispersion that is suitable for comparing data dispersion levels over several scales. .

As variáveis apresentadas acima estão disponíveis para todas as empresas da amostra. Algumas variáveis adicionais foram coletadas na busca por características das empresas que pagam mais ou menos dividendos. Contudo, estas variáveis foram obtidas para uma amostra aleatória de 102 empresas dentre as 300 firmas da amostra original. As variáveis adicionais usadas foram:

  • Age (idade): Empresas mais maduras tendem a ter um fluxo de caixa mais estável. A idade também está ligada com produtos e processos mais consolidados e até mesmo com acionistas com demandas mais contundentes pela distribuição de fluxo de caixa. Espera-se sinal positivo (Gu, Lee & Rosett, 2005Gu, Z., Lee, C. J. & Rosett, J. G. (2005). What determines the variability of accounting accruals? Review of Quantitative Finance and Accounting, 24 (1), 313-334.).

  • Controle Majoritário: Empresas que possuem um controlador definido seja por acordo de acionistas seja pela concentração de ações ordinárias suficientes para o controle acionário da empresa. Nesta situação, o acionista majoritário possui maior poder de pressão sobre os gestores na definição dos dividendos. Espera-se sinal positivo (Dalmácio & Corrar, 2007).

  • CEO & CA: Empresas onde CEO e Presidente do Conselho de Administração são a mesma pessoa. Pode indicar dois fatores que ocasionam a possibilidade de maiores dividendos: (a) o CEO e o Presidente são a mesma pessoa normalmente onde este CEO também representa de forma direta o principal acionista da empresa; (b) pode representar baixa qualidade da Governança Corporativa (GC) indicando a necessidade de pagamento de mais dividendos aos acionistas para mitigar conflitos entre acionistas (Hermalin & Weisbach, 2003). Logo, espera-se sinal positivo quando não há separação das funções (Almeida, 2012Almeida, R. S. de. (2012). Governança corporativa: análise da composição do Conselho de Administração no setor de energia elétrica do Brasil. Dissertação de mestrado, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Departamento de Administração, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.).

A partir das variáveis apresentadas, foram montados dois modelos econométricos: o primeiro contemplando as variáveis disponíveis para todas as empresas e um modelo estendido que contempla as variáveis adicionais, mas que tem um número reduzido de observações.

Modelo 1: Dividendos/Ativo Totali,t = α + Sizei,t +ROAi,t + Leveragei,t-1 + Market toBooki,t + Liquidityi,t + Liquidity2 i,t + Capexi,t + Betai,t + Profit Growthi,t + Novo Mercadoi,t + Nivel 1i,t + Nivel 2i,t + BOVESPA Maisi,t + Tag Along100i,t + Poison Pillsi,t + Si +dt + εi,t

Modelo 1 estendido: Dividendos/Ativo Totali,t = α + Sizei,t + ROAi,t + Leveragei,t-1 + Market toBooki,t + Liquidityi,t + Liquidity2 i,t + Capexi,t + Betai,t + Profit Growthi,t + Novo Mercadoi,t + Nivel 1i,t + Nivel 2i,t + BOVESPA Maisi,t + Tag Along100i,t + Agei,t + PoisonPillsi,t + MajControli,t + CEO&CAi,t + Si +dt + εi,t

Onde i e t representam a empresa e o ano, respectivamente, e α, S, d e ε representam o intercepto, dummies de setor, dummies de ano e o termo de erro. A lista das variáveis utilizadas, sua especificação, fórmulas e sinal esperado são apresentados na Tabela 2.

Uma importante característica da amostra, que interfere na metodologia do estudo reside no fato de que o valor dos proventos é igual a zero em 34% das observações. Além disso, seu valor é censurado em zero, ou seja, as empresas em dificuldades financeiras não conseguem captar recursos sob a forma de dividendos negativos. Por essa razão, o principal método utilizado foi o Tobit, seguindo a mesma metodologia de Barclay, Smith, e Watts (1995)Barclay, M. J., Smith, C. W. Jr. & Watts, R. L. (1995). The determinants of corporate leverage and dividend policies. Journal of Applied Corporate Finance, 1 (1), 4-19. e de Dickens et al. (2002).

Os pressupostos de regressão como a heteroscedasticidade, normalidade, multicolinearidade foram tratados da seguinte forma: o primeiro pela matriz de White (1980)Vieira, J., Martins, E. & Fávero, L. P. L. (2009). Poison pills no Brasil: um estudo exploratório. Revista Contabilidade & Finanças, 20 (50), 6-24. obtendo-se erros robustos; o segundo pela análise das variáveis possíveis de correção através de transformação logarítmica, o terceiro pela análise da Inflação de Variância das regressões que não apontou nenhuma variável com valor superior a 5 onde a literatura aponta como limite o valor 10.

Os modelos OLS (Ordinary Least Squares) e Painel (Efeitos Fixos e Efeitos Aleatórios) não se mostram adequados para lidar com muitas observações iguais a zero ou em dados censurados, como são os dividendos. Seu uso pode levar a coeficientes subestimados e inconsistentes. Por sua vez, o método Tobit é adequado para lidar com este tipo de situação (Barclay, Smith & Watts, 1995).

O Tobit é indicado para amostras censuradas em 30% ou mais de suas observações. Na amostra atual com 34%, o método se torna o mais indicado entre os demais. Os testes de especificação do Tobit apresentaram que o modelo é consistente e que os estimadores são estatisticamente diferentes de 0 ao nível de significância de 1%.

Não obstante, um dos maiores problemas econométricos enfrentados nos estudos de finanças corporativas envolve a questão da endogeneidade. Variáveis como ROA, Leverage, Payout, Liquidez e Capex são difíceis de se controlar para os efeitos da causalidade reversa. Tais variáveis são vistas como fruto de decisões simultâneas das empresas, e dificilmente pode-se encontrar uma relação de causa e efeito entre elas (Barros, Junior, Silveira, & Bergmann, 2010Barros, L. A. B. C., Junior, F. H. F. C., Silveira, A. D. M. & Bergmann, D. R. (2010). A questão da endogeneidade nas pesquisas empíricas em finanças corporativas: principais problemas e formas de mitigação. [Working Paper]. Recuperado em 5 agosto, 2013, de http://ssrn.com/ abstract=1593187. .
http://ssrn.com/ abstract=1593187...
). Uma das abordagens para lidar com problemas de endogenia em dados de finanças corporativas é o GMM (Método dos Momentos Generalizados). O GMM permite que todos os regressores do modelo sejam endógenos e mesmo assim é capaz de apresentar coeficientes robustos e eficientes. Entretanto, o GMM não é o método mais indicado para dados com tantas observações com valor igual a zero.

Portanto, entende-se que estes dois métodos (Tobit e GMM) são complementares no cálculo dos coeficientes do modelo de regressão proposto, pois cada um traz uma contribuição específica para maior confiabilidade e robustez dos resultados. Além disso, espera-se que os resultados sejam análogos independentemente do método econométrico utilizado, indicando que o modelo proposto para o pagamento de dividendos é consistente.

Diante do rigor metodológico, do uso de abordagens distintas, do tratamento das variáveis e da busca em não omitir variáveis relevantes, podemos considerar que este estudo contribui com a literatura sobre dividendos no Brasil. Ademais, realizou-se um teste de robustez para a questão dos dividendos obrigatórios que podem causar viés nos resultados caso não sejam adequadamente tratados.

4 RESULTADOS

A Tabela 3 apresenta a estatística descritiva das variáveis do modelo 1 separadas em três grupos: empresas que não pagam dividendos, que pagam dividendos medianos e que pagam altos dividendos. É possível verificar que empresas que não pagam dividendos são menores, menos rentáveis, com valor de mercado menor do que seu valor patrimonial, com baixa liquidez e maior risco enquanto empresas que pagam altos dividendos são maiores, mais alavancadas, com liquidez próxima à média e menor taxa de crescimento dos lucros. O maior valor de mercado está associado com dividendos intermediários, o que sustenta que o mercado paga um prêmio pelo pagamento de dividendos e que dividendos muito elevados podem significar falta de opções de investimento.

Tabela 3
Descrição das variáveis das regressões

A Figura 1 apresenta a estatística descritiva das variáveis categóricas do modelo 1 e do modelo 1 estendido. Verifica-se uma intensa modificação "time-variant", o que indica que estas variáveis podem contribuir na explicação da variância dos dividendos. Destacam-se Tag Along 100% e as variáveis de níveis de governança da BM&FBOVESPA a partir de 2001, ano em que o sistema entrou em vigor.

Figura 1
Estatística descritiva das variáveis categóricas

A Figura 2 apresenta a estatística descritiva das variáveis contínuas. Com objetivo de fornecer mais detalhes sobre as diferenças das empresas frente às políticas de dividendos adotadas, optou-se por separar a amostra em dois subgrupos: as que pagam mais dividendos e as que pagam menos dividendos. Para isso, dividiu-se a amostra em quatro quartis de acordo com a relação Payout/Ativo Total. A figura reporta somente as empresas do primeiro e quarto quartis. Pode-se verificar que empresas que pagam mais dividendos são maiores, mais rentáveis, mais líquidas, possuem maior valor de mercado e maior crescimento de lucros.

Figura 2
Estatística descritiva das variáveis contínuas

Os resultados das regressões são apresentados na Tabela 4. As colunas 1 e 2 apresentam os coeficientes do modelo 1 utilizando os estimadores Tobit e GMM respectivamente. A coluna 3 apresenta os coeficientes do modelo 1 estendido utilizando o Tobit. Os coeficientes apresentam estabilidade entre os estimadores. Nenhum coeficiente estatisticamente significante apresentou sinal diferente em outro método de estimação. Os coeficientes do Tobit, conforme esperado, apresentam valores superiores ao GMM pelo tratamento mais adequado aos valores iguais a zero. Os testes de especificação como o teste F e Chi2 2 Os dividendos possuem uma distribuição com muitos valores iguais a zero e censurada neste valor, pois não existem dividendos negativos. não apontaram resultados que invalidam os resultados, que são analisados a seguir.

Tabela 4
Fatores determinantes do pagamento de dividendos no Brasil

As variáveis Size, ROA, Leverage, Market to Book, Liquidity, Liquidity 2 2 Os dividendos possuem uma distribuição com muitos valores iguais a zero e censurada neste valor, pois não existem dividendos negativos. , Capex, Beta e Profit Growth mostraram-se significantes e com o mesmo sinal em todos os métodos e modelos. Poison Pills e Tag Along 100% foram significantes, mas não em todas as variações. Todas as variáveis com coeficientes significantes também apresentaram seus sinais conforme a expectativa da teoria de finanças, atestando a adequação do modelo teórico. Procedeu-se, então, a uma análise ceteris paribus de cada uma das variáveis: a variável Size possui relação positiva com o pagamento de dividendos indicando que empresas maiores são mais propensas ao pagamento de dividendos (Mota, 2007). Esta variável também é interpretada como um indicativo da maturidade da empresa, indicando que empresas maiores e maduras possuem maior tendência em pagar dividendos por não possuírem tantas possibilidades de novos investimentos ou ainda que estas possuam acesso a outras fontes de financiamento e que não seria necessário reter seus lucros para realizar tais investimentos.

O ROA, confirmando a teoria de Lintner (1956), apresenta sinal positivo com os maiores coeficientes. Os gestores sentem-se mais confortáveis pagando dividendos quando a empresa apresenta maior rentabilidade e retorno sobre os seus investimentos. Além disso, os próprios acionistas esperam dividendos maiores quando a empresa possui maior rentabilidade.

Leverage apresentou uma relação negativa com dividendos, indicando que, quanto maior a alavancagem da empresa no ano anterior, menores serão os dividendos no período seguinte, confirmando que o aumento do endividamento é um sinal crível de que a empresa espera um fluxo de caixa futuro elevado (Jensen et al., 1992).

A relação entre Market to Book e dividendos se mostrou significante e com o sinal indicado pela literatura (positivo). Estes resultados são consistentes com o estudo de Lintner (1956), o qual afirma que o mercado paga um prêmio por ações de empresas que pagam mais dividendos. Por um lado, supõe-se que a empresa que paga mais dividendos é mais bem avaliada pelo mercado, o que elevaria seu Market to Book. De outro ponto de vista, supõe-se que a empresa já possuía um Market to Book elevado por outros motivos (participação de mercado, contratos fechados, patentes, etc.), e que seus gestores, interessados em sinalizar ao mercado a capacidade de fluxo de caixa futuro da empresa, aumentem seus dividendos. Ambas hipóteses são plausíveis e estão relacionadas à sinalização do potencial de geração futura de caixa da empresa ao mercado.

A variável Liquidity apresenta sinal positivo significante indicando que o pagamento de dividendos está relacionado positivamente à disponibilidade de recursos. Uma vez que a rentabilidade está sendo controlada pela variável ROA, pode-se afirmar que Liquidity não está sendo influenciada pela disponibilidade de caixa proporcionada exclusivamente pelas empresas mais rentáveis. Empresas não tão rentáveis, mas com situação financeira confortável (alto volume de disponível) pagam mais dividendos. Esta pode ser a explicação ao que Lintner (1956) sugere como uma resistência dos gestores em reduzir dividendos mesmo quando a empresa não apresenta resultados compatíveis.

A variável Liquidity 2 2 Os dividendos possuem uma distribuição com muitos valores iguais a zero e censurada neste valor, pois não existem dividendos negativos. apresenta sinal negativo e significante indicando que o pagamento de dividendos será reduzido à medida que a liquidez aumentar. Em conjunto, os coeficientes de Liquidity e Liquidity 2 2 Os dividendos possuem uma distribuição com muitos valores iguais a zero e censurada neste valor, pois não existem dividendos negativos. indicam um comportamento não linear da liquidez em relação aos dividendos e o sinal negativo da segunda corresponde a uma curva inclinada para baixo, indicando que, para manter seus altos níveis de liquidez, as empresas sacrificam o volume de dividendos distribuídos a seus acionistas. Este resultado confirma a existência de um ponto ótimo de liquidez para o pagamento de dividendos, a partir do qual os dividendos começam a diminuir quando a liquidez aumenta.

A variável Capex apresenta sinal negativo confirmando a teoria que pressupõe que firmas com maiores níveis de investimento possuam menores níveis de payout. Os coeficientes obtidos são robustos para todas as empresas da amostra, mas podem estar viesados quando avaliados pelos seguintes aspectos: (a) a mistura de vários setores de empresas na amostra que nem sempre necessitam de investimentos em Capex e, neste caso, estas características migram para as variáveis de controle de setor; e (b) a necessidade de investimento constante das empresas brasileiras por se tratar de um país em desenvolvimento.

A variável Beta apresentou-se negativa e significante conforme esperado, indicando que, quanto maior o risco associado ao negócio da empresa, menor será sua propensão a pagar dividendos (Gordon, 1963; Bernardo & Ikeda, 2013). Os coeficientes com valor próximo de zero não indicam que a variável não é significante na relação, apenas indicam que a magnitude do efeito do beta sobre o payout é baixa e/ou que as escalas utilizadas são demasiado pequenas.

ProfitGrowth apresentou sinal positivo e significante indicando que os gestores utilizam dividendos para sinalizar o crescimento dos lucros futuros da empresa, uma vez que a rentabilidade já foi controlada pela variável ROA (La Porta et al., 2000; Mota, 2007).

Poison Pills apresentou coeficiente com sinal negativo conforme esperado, mas sem significância estatística. O resultado pode indicar que: (a) outra variável do modelo está captando a dispersão de capital; ou (b) que, no Brasil, as empresas mais dispersas não possuem diferenças estatisticamente significantes daquelas que não são dispersas em termos de pagamento de dividendos.

TagAlong 100% também se apresentou com sinal negativo conforme o esperado. Sua consistência indica um possível poder de sinalização concorrente à de dividendos. Uma vez que Tag Along 100% para ações ordinárias indica um direito que pode nunca ser exercido pelos acionistas, sua adoção pode indicar uma estratégia importante em mitigar os conflitos de agência sem os custos elevados associados ao pagamento de dividendos.

Os Segmentos de Listagem da BM&FBOVESPA não apresentaram sinais ou significância consistentes em relação ao segmento Tradicional (omitido no modelo para comparação). Este resultado indica que as empresas optantes reduzem a assimetria informacional pela sua adoção, mas que a simples presença nestes segmentos não indica uma governança superior às demais empresas que também podem possuir boa governança sem necessariamente estar presentes nestes segmentos de listagem.

Portanto, de forma geral, o modelo 1 foi capaz de identificar diversos fatores que influenciam o pagamento de dividendos das empresas brasileiras listadas na BM&FBOVESPA. Através de sua análise foi possível mapear quais são as características e quais principais fatores influenciam a propensão das empresas em distribuir mais ou menos dinheiro a seus acionistas.

Os resultados do modelo estendido ao modelo 1 que contém variáveis adicionais são apresentados na coluna 3 da Tabela 4. Conforme mencionado, a adição das variáveis teve como consequência a redução do número de empresas e de observações (de 3.242 observações para 968). Mesmo assim, o modelo Tobit apresentou notável manutenção da significância e dos coeficientes do modelo 1 original. A inclusão das variáveis adicionais neste modelo não comprometeram os resultados obtidos na análise do modelo 1. As variáveis adicionadas fornecem novas informações a respeito dos fatores que influenciam o pagamento de dividendos por empresas no Brasil.

A variável Age não apresentou nenhuma influência na distribuição de dividendos. Um fator que pode influenciar o resultado é o momento em que a empresa começou a revelar maior crescimento. Uma alternativa seria a utilização da data de abertura do capital da firma ao invés de se utilizar a data de fundação.

Maj. Control e CEO&CA apresentaram-se significantes e com seu sinal positivo conforme esperado. O resultado indica que, tanto nas empresas com um controlador majoritário quanto naquelas nas quais o CEO acumula o poder de presidir o conselho de administração, ocorre o pagamento de dividendos mais elevados. As explicações para o resultado podem ser: (1) empresas nesta situação normalmente possuem elevados conflitos entre majoritários e minoritários que podem ser reduzidos com o aumento do pagamento de dividendos; (2) tamanha concentração de poder é sustentada por elevada concentração de controle que também pode resultar em aumento de dividendos, seja pelos conflitos com minoritários ou pela necessidade de fluxo de caixa dos controladores.

Como um teste de robustez para os resultados dos coeficientes encontrados para o modelo 1 e sua versão estendida, elaborou-se uma versão equivalente ao modelo 1 substituindo-se a variável dependente de (Dividendos)/Ativo Total por (Dividendos)/Lucro Líquido. Esta versão encontra-se na Tabela 4, coluna 4 e apresenta grande compatibilidade de resultados com as três colunas anteriores. Nenhuma variável significante da coluna 4 possui sinal discrepante dos coeficientes encontrados nas colunas 1, 2 e 3. Este teste foi realizado para demonstrar que a variável selecionada neste estudo não determina os resultados da pesquisa e não cria um viés nos resultados.

Todavia, uma análise adicional se faz necessária, pois a figura dos dividendos mínimos obrigatórios poderia influenciar os resultados apresentados. Martins e Novaes (2012) afirmam que os dividendos mínimos obrigatórios no Brasil não afetam negativamente os níveis de investimento das empresas e que este mecanismo não seria prejudicial. Para corroborar com os achados de Martins e Novaes (2012), elaborou-se um modelo complementar para analisar empresas que pagam mais do que os dividendos mínimos obrigatórios. A legislação brasileira determina que as empresas distribuam no mínimo 25% de seu lucro ajustado sob a forma de dividendos. O lucro ajustado é de difícil acesso quando se dispõe apenas de informações fornecidas pelos balanços oficiais. Porém, pode-se afirmar com razoável precisão que uma empresa que pagou mais de 40% de seu lucro líquido, pagou mais do que o mínimo obrigatório. A partir desta constatação, verificaram-se os fatores que influenciam no pagamento de dividendos muito elevados, de 70% do lucro líquido. A ideia foi analisar quais fatores influenciaram as empresas a pagar dividendos acima (40%) e muito acima (70%) dos dividendos mínimos obrigatórios. Para isso, criaram-se duas variáveis dummy com valor 1 para payouts acima de 40% e acima de 70% respectivamente. A Tabela 4, em suas colunas 5 e 6, apresenta os resultados da regressão que utilizou um modelo Logit para dados em painel. Os resultados apontam que grandes empresas são mais propensas a pagar dividendos acima do percentual mínimo obrigatório, uma vez que a variável Size se mostrou significante a 1%. A rentabilidade (ROA) também demonstrou ser uma forte influenciadora dos níveis elevados de dividendos, com elevada significância.

Interessante destacar que a variável Market to Book apresentou um resultado alinhado com as teorias de finanças. Empresas que pagam dividendos elevados, sem alcançar 70% do lucro líquido, apresentam um coeficiente positivo e significante a 1%, confirmando as hipóteses de Lintner (1956), enquanto em empresas que pagam dividendos muito elevados, acima de 70% de seu lucro, o coeficiente para Market to Book apresenta um coeficiente com valor menor e com sua significância reduzida a 10%.

As explicações para este resultado estão diretamente ligadas às teorias de finanças em que tais empresas (1) não possuem projetos de investimento adequados disponíveis e estão distribuindo seu caixa ou (2) estão passando por períodos de baixos resultados e mesmo assim mantendo seus níveis de dividendos estáveis, o que não é bem visto pelo mercado quando ocorre de forma recorrente.

A variável que representa a liquidez geral permanece positiva e significante, mostrando que empresas que pagam elevados dividendos, ceteris paribus, mantêm níveis mais elevados de ativos circulantes. De forma oposta ao Market to Book, empresas que distribuem dividendos de 70% possuem maior liquidez, demonstrando que, para pagar dividendos muito elevados, as empresas precisam garantir que tais pagamentos serão mantidos constantes no futuro. A liquidez2 2 Os dividendos possuem uma distribuição com muitos valores iguais a zero e censurada neste valor, pois não existem dividendos negativos. , conforme esperado, apresentou coeficiente negativo indicando que elevados níveis de liquidez não estão relacionados com o pagamento de elevados níveis de dividendos. O coeficiente para dividendos acima de 70% apresenta um coeficiente maior (em termos absolutos) indicando que, quanto maior a liquidez da empresa, menor a propensão da empresa em pagar dividendos muito elevados. O resultado indica a existência de um ponto ótimo de liquidez para o pagamento de dividendos, a partir do qual os dividendos começam a diminuir quando a liquidez aumenta.

ProfitGrowth apresenta coeficiente significante e positivo em ambos os níveis de dividendos, mostrando influência favorável no pagamento de dividendos elevados. Mais uma vez prevalecem as teorias de Lintner (1956) de que os gestores somente aumentam dividendos diante de perspectivas consistentes de crescimento futuro do fluxo de caixa das empresas. As empresas que pagam mais do que 70% de dividendos apresentam taxa de crescimento menor, o que explicaria o pagamento elevado pela provável redução das oportunidades de investimentos.

Poison Pills apresenta sinal negativo e significante com coeficiente maior para empresas que pagam dividendos acima de 70% indicando que esta cláusula que mantém o capital disperso favorece os gestores na retenção de recursos dentro da empresa pela menor propensão ao pagamento de dividendos.

TagAlong 100% também se apresentou conforme o esperado com sinal negativo e significante indicando que esta opção representa uma forte sinalização para os investidores e redução de conflitos entre controladores e minoritários e assim assume uma parte da sinalização que era atribuída aos dividendos.

Portanto, confirmaram-se as constatações de Martins e Novaes (2012), isto é, não se pode inferir que existem diferenças nas políticas de dividendos entre empresas que pagam dividendos elevados daquelas que pagam dividendos próximos aos mínimos obrigatórios.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo desta pesquisa foi investigar os fatores determinantes da política de dividendos em empresas brasileiras de capital aberto, no período de 1995 a 2011. Buscou-se preencher algumas lacunas no cenário da pesquisa sobre dividendos no Brasil. A primeira delas se refere à abordagem do método. Foram comparados os resultados de dois métodos distintos na avaliação dos modelos propostos: Tobit e GMM. O modelo Tobit adequa-se a este trabalho em função de que 34% das observações apresentam dividendos iguais a zero, dado que a estimação por Mínimos Quadrados Ordinários pode resultar em coeficientes subestimados e/ou interceptos superestimados em tal situação. Para lidar com a questão de endogeneidade, aspecto recorrente em estudos de finanças, foi proposto o uso do estimador de GMM, que resulta em coeficientes consistentes mesmo na existência de regressores endógenos.

A segunda lacuna, pela extensão dos modelos econométricos correntemente usados na investigação de determinantes da política de dividendos no Brasil. No presente estudo, portanto, foram acrescentadas variáveis de mercado, de governança e contábeis à análise, ampliando os resultados sumarizados por Martins e Famá (2012), Heineberg e Procianoy (2003) e Fonteles et al. (2012), para os determinantes das políticas de dividendos no Brasil. O modelo proposto inclui variáveis indicadoras de aspectos relacionados a governança corporativa, investimentos, risco, endividamento, sinalização, conflitos de agency, liquidez e resultados no intuito de controlar por elementos característicos do mercado de capitais brasileiro, sendo que algumas dessas variáveis ainda não haviam sido relacionadas às políticas de distribuição de dividendos na literatura brasileira.

As variáveis selecionadas após um mapeamento das literaturas nacional e internacional foram: Dividendos/Ativo Total como variável resposta e os seguintes indicadores como variáveis explicativas: Tamanho, ROA, Leverage, Market to Book, Liquidez, Capex, Beta, Crescimento dos Lucros, Poison Pills, Tag Along 100% e Segmentos de Listagem. Um modelo estendido com variáveis adicionais também foi analisado. As variáveis adicionais foram: Idade, Controle Majoritário e uma dummy para não separação de funções entre CEO e Presidente do Conselho de Administração.

Como principais resultados, na análise geral que considera os fatores determinantes da distribuição de proventos em firmas brasileiras, constatou-se que as variáveis significantes e positivas foram: Tamanho, ROA, Market to Book, Liquidez e Crescimento dos Lucros. Isto é, pode-se inferir da presente investigação que, quanto maior o tamanho da empresa, sua rentabilidade, seu valor de mercado, sua liquidez e o crescimento dos seus lucros, maior será a propensão desta firma em distribuir dinheiro aos acionistas, o que se alinha com a teoria de finanças corporativas. Por outro lado, constatou-se que as variáveis significantes e negativas foram: Alavancagem, Liquidez elevada ao quadrado, Capex, Beta e Tag Along 100%. Também para as negativas pode-se dizer que tal resultado corroborou a literatura de dividendos. Portanto, infere-se deste estudo que empresas que investem mais em ativo imobilizado possuem liquidez muito elevada, maior alavancagem, maior risco e menor conflito entre controladores e minoritários, terão uma menor propensão a pagar dividendos aos acionistas.

No modelo estendido, destacam-se as variáveis não separação de funções entre CEO e Presidente do Conselho e a variável Controle Majoritário com coeficientes positivos sendo que as duas corroboram com as expectativas das teorias de finanças corporativas.

Como contribuição adicional, percebeu-se que certas especificidades da legislação brasileira sobre dividendos poderiam interferir nos resultados obtidos, em especial os dividendos mínimos obrigatórios. Dessa forma, recorreu-se ao método Logit para analisar a relação entre as mesmas variáveis independentes e o payout separado por níveis (percentuais) mais elevados de distribuição de dividendos (maiores que 40% e 70% respectivamente), confirmando os estudos de Martins e Novaes (2012). O questionamento subjacente a esta análise foi: o fato de uma firma distribuir dividendos acima do percentual mínimo obrigatório terá que tipo de associação com as variáveis explicativas previamente selecionadas? Serão confirmados os resultados anteriores quando não se separavam os dividendos por níveis?

Considerando a análise segmentada dos dividendos por níveis, chegou-se aos seguintes resultados: as variáveis significantes e positivas foram Tamanho, ROA, Market to Book, Liquidez e Crescimento dos Lucros e as variáveis significantes e negativas foram a Liquidez 2 2 Os dividendos possuem uma distribuição com muitos valores iguais a zero e censurada neste valor, pois não existem dividendos negativos. , Poison Pills e Tag Along 100%. Novamente, para os indicadores com sinais positivos, comprovou-se a literatura de dividendos. Isto indica que empresas maiores, com maior rentabilidade, maior valor de mercado, maior liquidez e maior crescimento nos lucros estão mais propensas a distribuir mais recursos (acima de 40 e 70% em relação ao mínimo obrigatório). O sinal negativo de Liquidez2 2 Os dividendos possuem uma distribuição com muitos valores iguais a zero e censurada neste valor, pois não existem dividendos negativos. indica a existência de um ponto ótimo ou máximo de liquidez a partir do qual a empresa começa a restringir o pagamento de dividendos para a sua manutenção.

Pode-se concluir que esta pesquisa trouxe diversas contribuições ao estudo dos fatores determinantes da política de dividendos no Brasil, na medida em que comparou os resultados empíricos de duas abordagens econométricas, assumindo um formato metodológico inédito na literatura, e trazendo resultados muito coerentes com os estudos internacionais e nacionais, além de complementar a análise por meio da fragmentação dos níveis mais elevados de distribuição de dividendos, segundo as especificidades da legislação brasileira. Dessa forma, dada a nítida associação percebida entre a política de dividendos e diversas decisões financeiras importantes das organizações - investimentos, financiamentos, volume de caixa disponível, estrutura de capital, apreçamento de ativos, orçamento de capital etc. - este estudo possibilitou um novo olhar sobre os fatores que afetam a política de dividendos no Brasil. Como limitações podemos considerar a necessidade de mais fundamentos teóricos sobre a utilização dos juros sobre o capital próprio juntamente com dividendos para estruturas de propriedade diferentes como os fundos de pensão e famílias.

Como sugestões para pesquisas futuras, pode-se, por exemplo, utilizar uma única variável de governança corporativa agregada em um índice de qualidade da governança, que avalie os diversos mecanismos de GC, corrigindo a possível multicolinearidade entre eles, e não as variáveis separadas como realizado neste estudo. A partir da elaboração deste indicador de GC, ele seria utilizado nos modelos de regressão juntamente com a variável dependente que representa os dividendos, avaliando de forma mais completa a relação entre esses dois constructos.

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    » http://EconPapers.repec.org/RePEc:ecm:emetrp:v:48:y:1980:i:4:p:817-38
  • *
    Artigo apresentado no 14º Encontro Brasileiro de Finanças, Recife, Brasil, 2014
  • 1
    Utilizamos a palavra dividendos para representar a distribuição de fluxo de caixa aos acionistas independentemente da forma como foi efetuado o pagamento. O foco está na distribuição do fluxo de caixa e suas motivações.
  • 2
    Os dividendos possuem uma distribuição com muitos valores iguais a zero e censurada neste valor, pois não existem dividendos negativos.
  • 3
    Heineberg e Procianoy (2003) utilizaram o valor absoluto dos dividendos como variável dependente. Contudo, diversos estudos sobre fatores de dividendos da literatura internacional utilizam variáveis relativas (ratios) para investigar dividendos como Mayne (1980), Rozeff (1982), Dickens, Casey, e Newman (2002) e Kania e Bacon (2005).
  • 4
    Existe tributação sobre os ganhos de capital similar ao que existe nos países de origem dos estudos de dividendos.
  • 5
    No Brasil, os dividendos são isentos de tributos para o investidor, existe a figura dos juros sobre o capital próprio que, por sua vez, é tributado pelo investidor, mas provoca redução da carga tributária para a empresa.
  • 6
    Como comentado, no contexto brasileiro, proventos englobam os dividendos e os juros sobre o capital próprio.
  • 7
    As observações são reduzidas a 3.242 pois as primeiras observações de cada empresa são perdidas pelo cálculo das variáveis de variação com a taxa de crescimento dos lucros e Capex.
  • 8
    Boulton, Braga-Alves e Shastri (2012) afirmam que o payout total da empresa não seria afetado pelo pagamento ou não de juros sobre o capital próprio, e que a empresa apenas faz uma análise sobre qual seria a forma de pagamento mais adequada a seus acionistas diante das necessidades de planejamento tributário da empresa.
  • 9
    Some companies distribute dividends even when experiencing losses. In such cases, while dividends are positive, payouts will become negative through division with a negative value, diametrically changing the regression results. Employing total assets as a denominator eliminates this bias.
  • 10
    The coefficient of variation (CV) of the variable (Dividends/Profit) is 35 times greater than the CV of the variable (Dividends/Total Assets) for the sample used in the present study. The CV is a statistical measure of dispersion that is suitable for comparing data dispersion levels over several scales.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jul 2015
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2015

Histórico

  • Recebido
    12 Nov 2013
  • Aceito
    08 Jan 2015
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