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Desafios na política pública de mensuração dos ativos para a formação das tarifas no setor elétrico: alguém deve ser beneficiado e alguém deve ser sacrificado?

RESUMO

Este artigo contribui para fomentar a discussão sobre a política pública de tarifação de serviços públicos quando baseada no valor do investimento feito pelos geradores desses serviços. O objetivo deste estudo foi, de forma pioneira, e reunindo as teorias da avaliação patrimonial e de finanças, identificar o método de avaliação de ativo que pode conduzir ao justo valor para o equilíbrio entre a modicidade tarifária para o consumidor e o retorno adequado dos investimentos às concessionárias. O valor atribuído a esses ativos influi duplamente no valor da tarifa: (i) via sua depreciação/amortização, influi no custo do serviço; (ii) via remuneração sobre esse investimento, na parcela correspondente ao lucro do investidor. Analisou-se o setor de energia elétrica brasileiro, em que as tarifas determinadas pela Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) atualmente utilizam a abordagem do valor novo de reposição (VNR). Efetuaram-se testes empíricos a partir de dados disponibilizados no site da ANEEL no 2º Ciclo de Revisão Tarifária Periódica (CRTP) e de informações obtidas nas demonstrações financeiras a partir de 1995. A análise contemplou os métodos do VNR e custo histórico corrigido (CHC), sendo esse último atualizado pelo índice de preços ao consumidor amplo (IPCA). Após as análises descritiva e estatística, aplicou-se o teste de médias para verificar as diferenças das variáveis quanto aos métodos VNR x CHC. A primeira conclusão foi a não existência de diferença significativa entre os métodos do VNR e CHC, ou seja, na média, o preço de reposição não apresentou diferença significativa com relação ao que seria a utilização da pura e simples correção monetária dos ativos. Mas verificou-se que isso esconde algo relevante, o fato de que essa média deriva de dois grandes blocos: o dos consumidores que estão pagando mais do que deveriam pelos serviços de energia, o que constitui benefício visível aos investidores e prejuízo a esses consumidores, e o dos consumidores que estão pagando menos do que deveriam, o que os beneficia, mas prejudica os investidores.

Palavras-chave
mensuração de ativos; setor elétrico; tarifas; concessões; justo valor

ABSTRACT

This paper contributes by encouraging discussions about the public policy of setting tariffs for public services based on the value of the investment made by the providers of these services. The purpose of this study was, in an unprecedented way and by combining theories of equity valuation and finance, to identify the asset valuation method that can lead to a fair value and balance between an affordable price for the consumer and an adequate return on investment for the concessionaires. The value assigned to these assets affects the tariff in two ways: (i) via depreciation/amortization, which affects the cost of service; (ii) via the return on investment, which is the portion that corresponds to the investor’s profit. We analyzed the Brazilian electricity sector, in which the rates set by the Brazilian Electricity Regulatory Agency (ANEEL) currently use the new replacement value (NRV) approach. We carried out empirical tests using data available on the ANEEL website from the second cycle periodic tariff review and information obtained in financial statements from 1995 onwards. The analysis included the NVR and restated historical cost (RHC) methods, the latter being updated by the extended consumer price index (IPCA). After the descriptive and statistical analyses, we used the test of means to verify the differences between the variables in terms of NRV vs. RHC. The first conclusion was the absence of a significant difference between the NRV and RHC methods; that is, on average, the replacement price showed no significant difference to what would be the pure and simple restatement of assets. But this was found to hide something relevant, the fact that this average is derived from two main groups: that of the consumers who are paying more for energy services than they should, which constitutes a visible benefit to investors and loss for these consumers, and that of the consumers who are paying less than they should, which benefits them but harms investors.

Keywords
measuring assets; electricity sector; tariffs; concessions; fair value

1. INTRODUÇÃO

Este artigo contribui para a reflexão crítica acerca dos diversos métodos e abordagens de mensuração da base de remuneração dos ativos no setor elétrico brasileiro, discute a metodologia atualmente empregada pelo regulador e levanta as consequências da manutenção ou não do critério adotado, tendo em vista que esses componentes impactam diretamente na formação das tarifas de energia elétrica. O trabalho procura reduzir a lacuna existente na literatura contábil, não só quanto à mensuração dos ativos, mas também sobre a contabilidade aplicada à regulação de serviços públicos.

No Brasil, no início na década de 1990, ocorreram as primeiras privatizações de monopólios naturais. Assim, a determinação das tarifas assume papel preponderante nesse processo. Quando há monopólio natural, os consumidores não possuem alternativas para a substituição do serviço, por isso a intervenção do Estado é necessária para buscar, com a regulação, preço justo e qualidade na prestação dos serviços.

Por isso, em dezembro 1996, criou-se a Agência Nacional de Energia Elétrica ( ANEEL, s.n.Agência Nacional de Energia Elétrica - (s.n.). ANEEL. Retrieved from http://www.aneel.gov.br.
http://www.aneel.gov.br...
), com a função de regular e fiscalizar o setor. Em vista disso, a ANEEL ficou responsável por buscar o equilíbrio entre o governo, consumidores e investidores, por meio de políticas públicas que proporcionassem a sustentabilidade do setor, com justa remuneração ao investidor, modicidade tarifária para o consumidor, com inclusão social e qualidade de vida. Após as privatizações e ao longo desses 20 anos, as tarifas, bem como a regulação como um todo, vêm sendo aperfeiçoadas.

Até a década de 1990, a tarifa era única em todo o país, sendo que, a partir de 1993, passaram a ser diferenciadas de acordo com a região e a concessionária e determinadas pela ANEEL. Em 2014, a tarifa média do país (ou seja, a média das tarifas cobradas) foi de R$ 276,93 e, até agosto de 2015, a tarifa média do país foi de R$ 365,42, ambas sem adição dos tributos. Percebe-se a variação média de 32% em relação a 2014, reflexo do aumento do custo da energia em 2015 e dos preços represados pelo governo nos anos anteriores.

As tarifas são determinadas pela ANEEL de acordo com o modelo de regulação adotado (regulação por incentivos), que atualmente se utiliza da abordagem do valor novo de reposição (VNR) para mensurar os investimentos realizados pelas concessionárias, o que impacta diretamente no valor das tarifas aos usuários finais. Entretanto, existem abordagens alternativas que podem ser utilizadas pelo regulador, como, por exemplo, custo histórico corrigido (CHC), custo de reposição otimizado e depreciado (CROD), entre outros. E há o caso das que não estão expostas à tarifa definida pelo regulador.

Assim, considerando-se o contexto apresentado, e com base nas teorias da avaliação patrimonial e de finanças, esta pesquisa buscará responder à seguinte questão a ser investigada: qual critério de avaliação de ativo, quando utilizado para o cálculo da tarifa de energia elétrica, pode conduzir ao justo valor para o equilíbrio entre a modicidade tarifária para o consumidor e o retorno adequado dos investimentos às concessionárias?

O justo valor é aquele que remunera adequadamente os investimentos e atende à modicidade tarifária.

Como será demonstrado na revisão conceitual, cada método levará a diferentes valores patrimoniais, todos precisando ter como objetivo a proteção e a manutenção do capital financeiro (ou monetário) de longo prazo, a remuneração dos proprietários que investiram em busca de um retorno adequado e a modicidade tarifária. Esse argumento serve de alicerce para desenvolver a primeira hipótese deste artigo: em um ambiente regulatório, a mensuração dos ativos pelo método do CHC pode contribuir para alcançar o justo valor para o investidor e consumidor.

Segundo Beesley e Littlechild (1989Beesley, M., & Littlechild, S. (1989). The regulation of privatized monopolies in the UK. Rand Journal of Economics, 20, 454-472., p. 455), o regulador tem que equilibrar os interesses dos consumidores atuais e futuros, tanto uns contra os outros e contra os interesses dos produtores presentes e futuros. Assim, com base nesse argumento, a segunda hipótese levantada é que o VNR faz com que os consumidores atuais arquem com os custos de um bem que será adquirido futuramente e não pela prestação de serviços já realizada.

Diante do suporte teórico apresentado na próxima seção, algumas reflexões são necessárias: é justo que a tarifa proporcione, como receitas para a empresa, valores que excedem o capital investido e o retorno sobre este com o objetivo de repor o ativo que, no futuro, pode vir a custar mais caro? E pode ser que, ainda, quando da efetiva reposição, o valor seja diverso daquele projetado, tanto para cima quanto para baixo? Em outras palavras, é justo que, quando um ativo de concessão tem seu valor de reposição alterado para maior, mas ainda tem vida útil, ocorra um aumento do seu valor para fins de depreciação e as tarifas aumentem para recuperação de um capital que ainda não foi desembolsado? E quando o VNR for menor que o CHC, é justo que o investidor receba menor remuneração que não recupera o capital já investido? São essas as inquietudes que motivaram o desenvolvimento desta pesquisa.

A população pesquisada neste trabalho compreende as 63 empresas concessionárias do setor de distribuição de energia. Após a coleta dos dados, as demonstrações contábeis de cada empresa foram atualizadas monetariamente até dezembro de 2009 pelo índice de preços ao consumidor amplo (IPCA). Os valores constantes nas notas técnicas, que estão calculados pelo método do VNR, são comparados com o CHC. Também é aplicado o teste de médias para verificar as diferenças das variáveis quanto ao método de mensuração (VNR x CHC) para o ano em que ocorreram as revisões tarifárias, realizando-se a análise conjunta das empresas.

Os resultados demonstraram que não há diferença significativa entre os métodos do CHC e VNR na mensuração dos ativos do setor elétrico, tomando-se o Brasil como um todo, ou seja, o uso do VNR praticamente se igualou ao que seria obtido com o CHC. Porém, dada a dispersão, essa média esconde o seguinte: grande parte dos consumidores foi prejudicada e outra grande parte beneficiada; consequentemente, grande parte dos investidores foi beneficiada e outra grande parte foi prejudicada. O uso do VNR, portanto, não é o mais justo à sociedade. O modelo baseado no CHC considerado é o que não introduz esse desequilíbrio.

Nas seções 2 e 3 apresentam-se o desenvolvimento do tema e o desenho da pesquisa. Segue-se com a apresentação e discussão dos resultados e, por fim, as considerações finais.

2. REVISÃO CONCEITUAL

A mensuração dos ativos do setor elétrico é um insumo fundamental para a determinação das tarifas e pode afetar o retorno aos investidores no futuro, bem como os preços pagos pelo consumidor. Foster e Antmann (2004Foster, V., & Antmann, P. (2004). The regulatory challenge of asset valuation: a case study from the Brazilian electricity distribution sector. Retrieved from http://documents.worldbank.org/curated/en/316591468744268475/The-regulatory-challenge-of-asset-valuation-a-case-study-from-the-Brazilian-electricity-distribution-sector.
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) destacam que a avaliação dos ativos é um dos aspectos mais difíceis e controversos da regulação no setor de distribuição de energia elétrica, devido a não ser relacionada a um mercado competitivo.

É consenso que as concessionárias de serviço público devem receber o retorno justo sobre o capital investido e que sejam cobradas tarifas também justas dos consumidores, com prestação de serviços de qualidade. O que se discute é o que se entende por “justo”, ou seja, qual o justo valor que o investidor deve receber sobre os investimentos realizados e que, ainda, proporcione a modicidade tarifária. E o regulador tem que buscar meios para alcançar o justo valor no mercado monopolista, não sendo o justo valor tarifário o valor justo utilizado pelas normas contábeis. Para o consumidor, tarifa justa é aquela que não possui valor abusivo ou desproporcional aos custos e retorno aos investidores sem que haja baixa qualidade de serviços, ou seja, padrões socialmente desejáveis de qualidade de serviços a um preço justo.

Neste estudo, o termo “justo valor” corresponde ao valor que engloba o pagamento dos custos, a recuperação do capital investido e a remuneração sobre o capital investido (investidor), bem como as tarifas acessíveis (consumidor). O justo valor é imposto pelo mercado quando há livre concorrência, pois depende da disposição do consumidor em pagar o preço determinado. No entanto, nos setores que possuem monopólio natural, é necessária a intervenção do Estado para arbitrar o preço, pois os usuários não possuem alternativas de substituição do produto. Por isso, para se chegar ao justo valor nos setores regulados, é preciso alterar as premissas, tendo em vista satisfazer as necessidades dos investidores e consumidores.

Portanto, a contabilidade é de suma importância no sentido de fornecer informações referentes à situação econômico-financeira das empresas. Entretanto, a contabilidade, por si só, não assegura o justo valor das tarifas, mas pode contribuir para uma mensuração mais justa dos investimentos realizados e, consequentemente, para alcançar o justo valor para o contribuinte. Como a maioria dos insumos adquiridos se constitui em commodities, como o alumínio, o cobre, entre outros, com grande volatilidade no mercado, podem tanto o investidor quanto o consumidor ser prejudicados ( Pedell, 2006Pedell, B. (2006). Regulatory risk and the cost of capital: determinants and implication for rate regulation. Berlin: Springer.), ou seja, o risco é de ambos. Entretanto, quando há a perda, ela é suportada por uma das partes envolvidas, com aumento de tarifas ou redução do retorno do investimento.

2.1 Base de Remuneração Regulatória

O principal componente da base de remuneração regulatória (BRR) é o valor dos ativos relacionados com a prestação de serviços de energia elétrica, que são os maiores investimentos realizados pela empresa. Dentre os diversos critérios de avaliação de ativo, a ANEEL utiliza atualmente dois métodos: (i) método do custo de reposição (CR) e (ii) método do CHC. Há os que defendem a utilização do valor contábil ( book value), pois esse representa o valor pago pelo investidor, sendo assim o justo valor sobre o qual o retorno “justo” deve ser pago ( Greenwald, 1980Greenwald, B. (1980). Admissible rate bases, fair rates of return and the structure of regulation. The Journal of Finance, 35(2), 359-368.).

É importante ressaltar que este estudo se atém à mensuração dos ativos, que é parte da remuneração do capital para o investidor, não discute os demais riscos regulatórios e custo de oportunidade que compõem as tarifas, mas, como já citado, o valor dos ativos é o principal componente da tarifa.

Segundo Foster e Antmann (2004Foster, V., & Antmann, P. (2004). The regulatory challenge of asset valuation: a case study from the Brazilian electricity distribution sector. Retrieved from http://documents.worldbank.org/curated/en/316591468744268475/The-regulatory-challenge-of-asset-valuation-a-case-study-from-the-Brazilian-electricity-distribution-sector.
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), as diversas metodologias de avaliação disponíveis proporcionam resultados bastante divergentes quando aplicadas nas empresas reguladas. São muitas as abordagens para a mensuração dos ativos com a finalidade de determinação da tarifa. Com base na literatura existente, este artigo discute os métodos baseados nos custos dos ativos: CH, CHC, CROD e VNR.

Entende-se que os métodos selecionados englobam grande parte dos existentes e alguns, até mesmo, diferenciam-se somente na nomenclatura, haja vista que os conceitos são os mesmos. Ademais, independentemente do método adotado, o requisito primordial é a consistência na valoração dos ativos ao longo do tempo, pois isso auxilia na redução da incerteza e na percepção de risco por parte dos investidores. A seguir, discute-se cada abordagem, demonstrando as vantagens e desvantagens.

2.1.1 Custo histórico.

O CH tem por função propiciar a contabilização baseada no conceito de que lucro é o resultado obtido devido a investimentos realizados no passado. Ele confronta entradas de recursos (receitas) com saídas de recursos (despesas) ocorridas ou ainda a ocorrer para dimensionamento do resultado. Seu foco é a mensuração do lucro por confronto dos fluxos de caixa entrados ou a entrar (receitas reconhecidas a receber) contra os fluxos de caixa saídos ou a sair (despesas reconhecidas a pagar) ao longo do tempo (demonstração do resultado) e não do valor do patrimônio em um determinado momento. Os investimentos em ativos imobilizados e intangíveis têm o valor do caixa neles investido distribuído ao longo do tempo via depreciação (ou amortização) e por isso existe total amarração entre lucro e caixa “nominal” ao longo do tempo.

Esse tipo de custo tem sido a base de mensuração mais utilizada na contabilidade ( Dameda, Alves & Ott, 2011Dameda, A. N., Alves, T. W., & Ott, E. (2011). Uso do custo corrente na avaliação de ativos de empresas de tecnolgia de informação. Revista Universo Contábil, 7(3), 25-40.; Iudícibus, 2010Iudícibus, S. (2010). Teoria da contabilidade (8a. ed.) São Paulo, SP: Atlas.), pois tem a vantagem de ser baseado em dados contábeis de fácil confirmação, ou seja, reduz a necessidade de julgamentos para avaliação dos ativos. Entretanto, para fins de remensuração do valor econômico de um patrimônio, é relevante somente no momento da aquisição ou produção do bem, visto que, logo após, esse montante começa a perder a substância econômica devido a diversos fatores, como a inflação e/ou alteração dos preços específicos devido à tecnologia, por exemplo.

Em contrapartida, o ativo registrado a CH em tempos de grandes mudanças tecnológicas e muito baixa inflação pode estar superestimado nas demonstrações contábeis, pois, nesse caso, a tendência é que o ativo moderno seja mais barato, podendo, inclusive, obrigar ao registro de seu impairment, ou seja, de perda da parcela não recuperável no futuro. Parte do lucro apurado por esse método pode ser ilusório, pois, nesse aspecto, para a apuração do lucro, não é levada em consideração a data de formação, ou seja, a data da efetiva saída do caixa. Esse lucro é calculado com valores de moeda em diversas datas e, portanto, não representa a realidade econômica. Por isso, parte desse lucro não se constitui em genuíno acréscimo patrimonial, que só existe pelo excedente ao efeito inflacionário. O CH possui pouca representatividade como medida de valor, tanto para mensuração de patrimônio quanto de resultado.

Trazendo a discussão para o setor elétrico, não há muito a se discutir sobre esse método para a determinação da tarifa, pois os custos são, e precisam ser, atualizados por algum índice geral ou específico de variação de preços. Apesar de esse método apresentar praticidade e não dar margem a julgamentos, acaba por ser invalidado total ou parcialmente, na prática, pela persistente inflação, maior ou menor em longo prazo, em qualquer país.

2.1.2 Custo histórico corrigido.

O CHC é o valor pelo qual um bem, uma receita ou uma despesa é registrado pelo seu valor original atualizado por determinado índice de variação geral de preços, ou seja, fica possibilitada a manutenção do custo original em data posterior. Não se trata de custo corrente, sendo apenas o CH recalculado em função de variações do poder aquisitivo geral da moeda. Assim, não representa o novo valor de venda no mercado do ativo, mas sim o investimento feito no ativo atualizado monetariamente ou o valor de uma despesa ou de uma receita também atualizado pelos efeitos inflacionários. Seu objetivo é somente refletir os efeitos da inflação e não produzir valores de mercado.

Segundo Martins (1972Martins, E. (1972). Contribuição à avaliação do ativo intangível (Doctoral Thesis). Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Universidade de São Paulo, São Paulo., p. 2), é possível, com esse método, colocar vários custos ocorridos em datas distintas em valores de capacidade aquisitiva de mesma data, proporcionando melhor comparabilidade. Essa comparação é uma das grandes vantagens desse método, ou seja, trazer os valores das transações para uma mesma data e para uma moeda de mesmo poder aquisitivo. Permite, assim, a aplicação do conceito de lucro à base da manutenção do capital monetário, ou seja, de que lucro é o valor excedente ao capital monetário originariamente investido, só que melhorado por considerar esse investimento corrigido monetariamente.

No Brasil, a correção monetária dos balanços passou a ser obrigatória em 1964, com a sanção da Lei nº 4.537/1964 ( Brasil, 1964Brasil (1964). Lei nº 4.537, de 16 de julho de 1964. Autoriza a emissão de Obrigações do Tesouro Nacional, altera a legislação do imposto sobre a renda, e dá outras providências. Brasília, DF: Diário Oficial da União.), mas já era facultativa desde 1944. No entanto, em 1995, essa lei foi extinta, devido à promulgação da Lei nº 9.249/1995 ( Brasil, 1995Brasil (1995). Lei nº 9.249, de 26 de dezembro de 1995. Altera a legislação do imposto de renda das pessoas jurídicas, bem como da contribuição social sobre o lucro líquido, e dá outras providências. Brasília, DF: Diário Oficial da União.). O tema foi bastante debatido por Barbieri (1996Barbieri, G. (1996). Lucro inflacionário e fluxo de caixa. Caderno de Estudos, 13(jan.-jun). ), Martins (1982Martins, E. (1982). O significado da correção monetária patrimonial. Boletim IOB, Temática Contábil e Balanços, 3, 82., 1984aMartins, E. (1984a). Análise da correção monetária das demonstrações financeiras - implicações no lucro e na alavancagem financeira (2a. ed.). São Paulo, SP: Atlas ., 1984bMartins, E. (1984b). Contabilidade e inflação - como entender um pouco mais. Boletim IOB, Temática Contábil e Balanços, 22, 251. , 1985Martins, E. (1985). Correção integral de balanço. Revista da CVM, 3(7), 9-15., 2002Martins, E. (2002). A posição do Conselho Federal de Contabilidade com relação à atualização monetária dos balanços: decepção! Boletim IOB, Temática Contábil e Balanços, 15, 1-6., 2004Martins, E. (2004). Um pouco da história dos juros sobre o capital próprio. Boletim IOB, Temática Contábil e Balanços, 49, 1-7.), Santos (2001aSantos, A. (2001a). Avaliação da falta de reconhecimento dos efeitos inflacionários no Brasil no período de 1966-2000 (1ª parte). Boletim IOB, Temática Contábil e Balanços, 27, 1-6., 2001bSantos, A. (2001b). Avaliação da falta de reconhecimento dos efeitos inflacionários no Brasil no período de 1966-2000 (2ª parte). Boletim IOB, Temática Contábil e Balanços, 28, 1-6., 2002Santos, A. (2002). Pior que decepção! Dá para entender os resultados publicados pelas empresas? Boletim IOB, Temática Contábil e Balanços, 36, 1-7.) e Santos e Barbieri (1990Santos, A., & Barbieri, G. (1990). Os bancos ganham ou não com a inflação? Boletim IOB, Temática Contábil e Balanços, 17, 168-169.). Outros estudos nacionais, como os de Brunéli (1987Brunéli, T. C. (1987). Os bancos comerciais sob o efeito da inflação - reflexo nas suas demonstrações contábeis: um estudo de caso (Master’s Degree). Fundação Getúlio Vargas, Rio de Janeiro.), Feitosa (2002Feitosa, A. (2002). Uma análise dos efeitos inflacionários sobre demonstrações contábeis de empresas brasileiras traduzidas para apresentação no exterior (Master’s Degree). Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de São Paulo, Universidade de São Paulo, São Paulo.), Gabriel, Assaf e Corrar (2003Gabriel, F., Assaf, A., Neto, & Corrar, L. J. (2003). O impacto do fim da correção monetária no retorno do patrimônio líquido dos bancos no Brasil. Retrieved from http://www.institutoassaf.com.br/downloads/Impacto_Fim_Corre%C3%A7%C3%A3o_Monet%C3%A1ria_%20Retorno_Patrim%C3%B4nio_L%C3%ADquidodos_Bancos_Brasileiros.pdf.
http://www.institutoassaf.com.br/downloa...
), Salotti, Lima, Corrar, Yamamoto e Malacrida (2006Salotti, B. M., Lima, G. S., Corrar, J. L., Yamamoto, M. M., & Malacrida, M. C. (2006). Um estudo empírico sobre o fim da correção monetária integral e seu impacto na análise das demonstrações contábeis: uma análise setorial. UnB Contábil, 9(2). ) e Szuster (1985Szuster, N. (1985). Análise do lucro passível de distribuição: uma abordagem reconhecendo a manutenção do capital da empresa (Doctoral Thesis). Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Universidade de São Paulo, São Paulo.), e internacionais, como os de Baran, Lakonishok e Ofer (1980Baran, A., Lakonishok, J., & Ofer, A. R. (1980). The information content of general price level adjusted earnings: some empirical evidence. The Accounting Review, 15(1), 22-35.), Davis-Friday (2001Davis-Friday, P. Y. (2001). Equity valuation and current cost disclosures: the case of Mexico. Journal of International Financial Management and Accounting 12(3), 260-285.) e Gordon (2001Gordon, E. A. (2001). Accounting for changing prices: the value relevance of historical cost, price level, and replacement cost accounting in Mexico. Journal of Accounting Research, 39(1), 177-200.), demonstram a importância do reconhecimento da inflação nas demonstrações contábeis.

Vale destacar que, devido à longa convivência com a inflação, desenvolveram-se técnicas de correção monetária com objetivo de gerar informações úteis para a tomada de decisão, como a correção monetária do balanço (CMB) e a correção monetária integral (CMI). A principal diferença entre elas é que a CMB atualiza somente os valores dos ativos “permanentes” e patrimônio líquido (itens não monetários de longa vida), registrando seus efeitos em uma única conta na demonstração de resultados, ou seja, trata-se de uma simplificação. Já a CMI, que teve origem segundo os moldes da contabilidade em nível geral de preços ( price level accounting), atualiza todas as contas patrimoniais e de resultados, sendo os valores das demonstrações contábeis evidenciados em moeda de poder aquisitivo constante. Embora a CMB leve a valores de resultado líquido e de balanços aceitáveis, a CMI apresenta aperfeiçoamentos que possibilitam a avaliação mais exata do patrimônio, pois identifica os itens que geraram perdas ou ganhos devido à inflação.

Trazendo essa discussão para o setor elétrico, a mensuração da BRR segundo o CHC pode provocar um valor de investimento que onere as tarifas no longo prazo, comparativamente ao que ocorreria pelo CR se esse fosse inferior à evolução da inflação. Porém, o monopolista pode não ter incentivos para realizar investimentos prudentes, mas sim manter ativos redundantes com objetivo de receber remuneração sobre eles; entretanto, uma estrutura de governança com fiscalização eficiente pode resolver essa questão.

Divergências podem ocorrer, também, na escolha do índice a ser utilizado ( Souza, 2004Souza, J. Â. (2004). Para entender os índices de preços - uma visão moderna. Revista de Economia Mackenzie, 2(2), 141-168.) ou serem os índices manipulados pelo governo (como já ocorreu no Brasil e parece ter ocorrido em país vizinho, ultimamente) e, como consequência, distorcer os relatórios, sendo essa uma desvantagem do método CHC. Só que esses índices gerais de preços têm sua qualidade determinada pela estrutura, pelas amostras e pela qualidade das captações das informações e a maior parte desses problemas também existe quando se procura os valores de reposição dos ativos. Cada índice possui uma metodologia diferente, sendo também calculado por vários órgãos diferentes.

Neste artigo, defende-se o IPCA por refletir a inflação oficial. No setor elétrico, a tarifa tem por objetivo permitir a recuperação do investimento realizado no passado e que permita também uma taxa de retorno pactuada. Este estudo defende que o CHC atende a esse objetivo porque propicia tarifa capaz de recuperar o capital efetivamente investido no passado e obter uma taxa de retorno sobre esse montante. E, quando a vida útil do ativo chega ao fim e for necessária sua substituição, o investidor terá obrigação de buscar o capital para realizar o novo investimento, maior ou menor do que o anterior, e esse novo capital será recuperado no futuro à medida que o bem for utilizado e obtenha uma taxa de retorno contratada com base nesse novo investimento. Isso posto, o CHC demonstra ser uma opção para a determinação da tarifa, principalmente pelo equilíbrio entre custos e benefícios e, ainda, por considerar o contexto histórico e não variáveis incertas e discricionárias. Importante, todavia, mencionar que mesmo no valor de origem podem ocorrer algumas distorções ou imperfeições na sua mensuração, principalmente no setor analisado.

2.1.3 Custo de reposição otimizado e depreciado.

Esse método é visto como um refinamento do CR, pois envolve o custo atual de reposição de um ativo moderno, supondo-se que serão substituídos por ativos mais eficientes, e é adotado na Austrália e Nova Zelândia. Segundo o Economic Insights (2009Economic Insights. (2009). Asset valuation and productivity-based regulation taking account of sunk costs and financial capital maintenance. Report by Erwin Diewert, Denis Lawrence and John Fallon. Retrieved from http://econ.sites.olt.ubc.ca/files/2013/06/pdf_paper_erwin-diewert-asset-valuation-productivity.pdf.
http://econ.sites.olt.ubc.ca/files/2013/...
, p. 8),

Custo de reposição otimizado e depreciado (CROD) é definido como o custo depreciado de um mesmo ativo equivalente e moderno, com os valores na forma mais eficiente possível a partir de uma perspectiva de engenharia dada a capacidade de cobertura da rede, com a depreciação na base da idade dos ativos existentes.

Porém, em um estudo de Spence (2004Spence, C. (2004). The regulation of energy utilities based on depreciated optimised replacement cost (DORC), valuation of assets (Doctoral Thesis). Departamenting of Accounting and Finance, University of Wollongong, Wollongong.), analisou-se a utilização dessa metodologia no setor elétrico e concluiu-se que é um conceito fraco e não resolve os problemas da regulação das tarifas. Assim, os autores defendem a utilização do custo atual ou uma avaliação, com acordo prévio, para um melhor resultado regulatório e preços mais justos aos consumidores.

Esse método pode levar a empresa a receber tarifas como se sua infraestrutura fosse nova, eficiente e a preços de hoje, enquanto, na verdade, esses podem ser ativos antigos com vida útil econômica de longa duração. Isso significa que o consumidor estaria financiando um investimento realizado há muito tempo, como se ele estivesse sendo construído hoje, ou seja, o desempenho atual sendo mensurado com base em investimentos estimados para o futuro e não por investimentos passados, como no CHC.

A ANEEL, no 1º CRTP, utilizou esse método, pois ainda não havia um banco de dados de referência disponível para as concessionárias. Entretanto, conforme expõe Teixeira (2005Teixeira, D. (2005). Regulators’ challenge in the price ceiling - the valuation of regulatory assets in the Brazil’s electricity ratemaking [Working Paper]. The George Washington University. Retrieved from https://www2.gwu.edu/~ibi/minerva/Spring2005/Denise.Teixeira.pdf.
https://www2.gwu.edu/~ibi/minerva/Spring...
), a experiência brasileira com a aplicação do CROD foi um processo difícil, com consequências indesejáveis para os reguladores e a sociedade, como tarifas temporárias mais elevadas, desincentivos ao investidor para novos investimentos e metodologia complexa, proporcionando falta de transparência e menor credibilidade ao órgão regulador.

2.1.4 Valor novo de reposição.

Esse método estabelece o preço de reposição de cada ativo, tendo como base uma empresa referência, sendo essa a principal diferença do CROD que, por sua vez, tem por base um ativo equivalente moderno ( modern equivalent asset - MEA). A ANEEL estabeleceu, na Resolução Normativa nº 457/2011 ( ANEEL, 2011Agência Nacional de Energia Elétrica (2011). Resolução Normativa nº 457 de 08 de novembro de 2011. Retrieved from http://www2.aneel.gov.br/cedoc/ren2011457.pdf
http://www2.aneel.gov.br/cedoc/ren201145...
), que o valor novo de reposição (VNR) “refere-se ao valor do bem novo, idêntico ou similar ao avaliado, obtido a partir do banco de preços da concessionária, ou do banco de preços referenciais, quando homologado, ou do custo contábil atualizado”. Anuatti, Pelin e Peano (2004Anuatti, F., Neto, Pelin, E. P., & Peano, C. R. (2004). O papel do fator X na regulação por incentivos e a consolidação com a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro. Contribuição enviada para ANEEL referente à AP nº 43/2003. São Paulo, SP: Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas/Universidade de São Paulo). ) citam que esse método é defensável por não se ater aos registros contábeis, buscando retratar o custo de oportunidade do capital utilizado, embora seja pouco difundido entre as empresas brasileiras, o que pode dificultar sua aplicação.

Entretanto, se o valor do bem novo é utilizado como base para a determinação da tarifa, o investidor recebe uma quantia diferente daquela inicialmente investida. Por exemplo, se o custo do bem é R$ 100,00, corrigido pela inflação seria R$ 110,00 e, se quando da revisão tarifária, a avaliação pelo ativo novo está em R$ 120,00, o investidor recebe sobre os R$ 120,00 e não sobre os R$ 110,00 realmente desembolsados, ou seja, o investidor é remunerado acima do capital investido e pelo valor de um bem que ainda será reposto, podendo seu preço ser bem diferente à época. Se ocorrer o contrário, o VNR estiver abaixo do investido, por exemplo, em R$ 80,00, a empresa estará sendo expropriada, pois desembolsou R$ 100,00 em termos nominais e R$ 110,00 em termos corrigidos. Nesse caso, o consumidor é beneficiado e esse risco pode levar também o investidor a só entrar no negócio mediante taxa adicional de retorno que compense tal novo risco.

2.1.5 Vantagens e desvantagens do CHC e CR (CROD e VNR).

Este tópico tem por objetivo confrontar as duas metodologias (CHC e CR), por serem a base deste estudo, demonstrando os pontos fortes e fracos de cada uma. A Tabela 1 apresenta as vantagens e desvantagens do CHC e do CR e suas consequências da aplicação. O CHC apresenta mais vantagens do que o CR, ao ver destes autores. A desvantagem do CHC para o consumidor ocorre quando há um avanço tecnológico significativo que proporcione a diminuição do valor de reposição. Entretanto, para a determinação da tarifa, o investidor deve ser remunerado pelo capital que foi investido e não pelo que irá repor no futuro. E, ainda, quando da realização do investimento, era o que tinha de mais eficiente naquele momento, não podendo o investidor ser penalizado por esse fato. O CHC é mais transparente e auditável e traz, em termos reais, o valor do ativo que foi adquirido anteriormente. E é esse valor que deve ser a base para sua remuneração, permitindo a recuperação do investimento em termos reais consistentes, dessa forma, com o conceito de justo valor adotado neste artigo.

Tabela 1
Vantagens e desvantagens do custo histórico corrigido e do custo de reposição

Uma grande desvantagem do CR é seu grau de subjetividade que impede o acompanhamento maior pelo regulador e pela sociedade, sendo, portanto, menos transparente. E como os valores ainda estão por se concretizar, por um longo período de tempo, pode ser que esse montante seja bem diverso daquele efetivo valor no futuro. Como já citado, alguns insumos utilizados nos investimentos são commodities com grande volatilidade e, dependendo da data do laudo de avaliação, esses preços podem estar em alta ou em baixa, prejudicando a mensuração justa. Essa variação pode expor os investidores a riscos inesperados e, para cobrir esses riscos, tem que haver compensação, como, por exemplo, ajuste da taxa de remuneração acordada previamente.

Para tomada de decisão e planejamento estratégico de novos investidores, o CR é vantajoso, pois traz o valor do ativo próximo ao seu valor econômico, mas, para a determinação da tarifa, pode ser prejudicial para o investidor e/ou consumidor. Quando no laudo de avaliação realizado para a revisão tarifária ocorre um CR maior que o CHC (ou seja, maior que a inflação do período), ocasionando uma tarifa mais alta do que o necessário, nesse caso o consumidor estará “financiando” um excedente para reposição de um ativo no futuro. Caso contrário, se o CR for menor que o CHC, o consumidor será beneficiado, mas coloca em risco a prestação do serviço no futuro. O investidor não recupera o capital investido anteriormente, em que existia outra realidade, ou seja, outra tecnologia era disponível naquele momento e considerada a mais eficiente.

3. DESENHO DA PESQUISA

A população pesquisada neste trabalho compreende as 63 empresas concessionárias do setor de distribuição de energia. Coletaram-se as demonstrações contábeis exigidas pela legislação societária, de 1995 a 2009, disponíveis no site ( http://www.cvm.gov.br) da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e/ou site das distribuidoras. No endereço eletrônico da ANEEL, também foram coletadas as informações disponibilizadas nas audiências públicas realizadas para cada CRTP das distribuidoras, principalmente as notas técnicas (NT), as quais trazem o resultado definitivo, do qual constam os valores aprovados para a determinação das tarifas.

As demonstrações contábeis de cada empresa foram atualizadas monetariamente até dezembro de 2009 pelo IPCA. Cada distribuidora tem sua data de revisão tarifária e o laudo de avaliação dos ativos é realizado seis meses antes; assim, quando a data de revisão foi, por exemplo, em abril de 2008, o laudo foi realizado em novembro de 2007 - a demonstração contábil utilizada para fins de comparação é a anual de 2007.

A Tabela 2 apresenta a relação final das empresas (das 63 empresas, somente 44 são analisadas, por indisponibilidade de dados) e o período em que as demonstrações foram atualizadas monetariamente. Vale ressaltar que as empresas analisadas para o 2º CRTP correspondem a 96,55% do total de unidades consumidoras do país, ou seja, representam quase a totalidade das mesmas; portanto, a amostra é representativa.

Tabela 2
Amostra final da pesquisa

3.1 Tratamento da Amostra

Inicialmente realizou-se a atualização monetária dos dados, utilizando-se o modelo desenvolvido por Martins, Salotti, Amaral, Nagai e Melo (2012Martins, E., Salotti, B., Amaral, J. V., Nagai, C., & Melo, S. (2012). Demonstrações contábeis sem efeitos inflacionários: uma abordagem relativa às empresas distribuidoras de energia elétrica. Contabilidade, Gestão e Governança, 15(2), 21-35.). Os passos foram os descritos a seguir. Procedeu-se à separação dos ativos imobilizados em serviço (AIS) dos ativos imobilizados em curso, pois estes últimos não entram para o cálculo da tarifa, por não estarem em funcionamento; as operações especiais (OE) não foram subtraídas do AIS, tendo em vista que inicialmente utiliza-se o valor bruto do imobilizado. As OE foram subtraídas quando do cálculo da base de remuneração, ao mesmo tempo em que foram adicionadas ao patrimônio líquido. A depreciação acumulada é referente somente ao AIS em serviço. Coletaram-se as taxas anuais do IPCA, de 1996 a 2009, bem como as alíquotas do imposto de renda e contribuição social. Nas notas explicativas (NE), averiguaram-se quais empresas realizaram reavaliação no período, que foram: Ampla Energia e Serviços S.A. (Ampla), Empresa Elétrica Bragantina S.A. (EEB), Caiuá Distribuição de Energia S.A. (Caiuá), Celg Distribuição S.A. (Celg-D), Centrais Elétricas do Pará (Celpa), Cia. de Energia Elétrica do Estado de Tocantins (Celtins), Centrais Elétricas Matogrossenses S.A. (Cemat), Cia. Força e Luz do Oeste (CFLO), Cia. Nacional de Energia Elétrica (CNEE), Centrais Elétricas de Carazinho S.A. (Eletrocar), AES Eletropaulo S.A. (Eletropaulo) e Rio Grande Energia S.A. (Rio Grande). Os valores da reavaliação foram subtraídos do AIS, da depreciação acumulada e das despesas com depreciação do período, bem como do PL. Esse ajuste foi feito desde o ano em que a reavaliação foi contabilizada até a baixa definitiva da mesma, tendo por objetivo retirar qualquer atualização do ativo que não fosse pela inflação. Os dados foram transferidos para uma planilha no Excel. Em seguida, aplicou-se o modelo de Martins et al. (2012Martins, E., Salotti, B., Amaral, J. V., Nagai, C., & Melo, S. (2012). Demonstrações contábeis sem efeitos inflacionários: uma abordagem relativa às empresas distribuidoras de energia elétrica. Contabilidade, Gestão e Governança, 15(2), 21-35.). Em primeiro lugar, as variações anuais do AIS bruto (baixas, aquisições e/ou transferências do AIS em curso) foram apuradas, por diferença, com base nos dados publicados, o mesmo ocorrendo com o AIS em curso, depreciação e patrimônio líquido. Em seguida, fez-se a atualização pela inflação do AIS em serviço e em curso inicial e pelas variações de cada período.

Os mesmos procedimentos foram adotados em relação à depreciação, ao lucro e ao patrimônio líquido e, por conseguinte, os impostos diferidos foram calculados, bem como seus efeitos no AIS em serviço e em curso. Os impostos diferidos foram calculados sobre a diferença do AIS corrigido e o histórico em cada período, que gera também um passivo pelo diferimento dos tributos devido ao patrimônio líquido corrigido maior que o patrimônio líquido nominal. A diferença entre o saldo final e inicial dos tributos diferidos é um ajuste às despesas tributárias do período, diminuindo o lucro líquido corrigido. Por fim, foi possível comparar os valores históricos e corrigidos do AIS em serviço e em curso, o lucro líquido, o patrimônio líquido e, ainda, calcular o retorno sobre o patrimônio líquido (ROE) histórico e corrigido, que será utilizado posteriormente.

Após esses passos, com os dados já atualizados pelo IPCA, foi possível refazer a BRR, a partir do AIS corrigido e histórico, para fins de comparação com a BRR a VNR homologado pela ANEEL. A ANEEL publica em NT o resultado definitivo de cada revisão tarifária. Cada NT contém a tabela com resumo da BRR aprovada com valores a VNR. As variáveis AIS, ROE, índice de reposicionamento tarifário (IRT), BRR bruta (BRRb), valor de mercado em uso (VMU), valor base da remuneração (VBR), quota de reintegração regulatória (QRR) e remuneração do capital (RC) foram retiradas dessa tabela e o ROE foi calculado a partir dos dados coletados demonstrações contábeis. Essa tabela foi refeita para cada empresa com valores a CH e CHC para fins de comparação.

É primordial estabelecer que medida pode representar o justo valor para o consumidor e para o investidor. Para o consumidor, entende-se que o melhor é a menor tarifa e, para o investidor, o melhor é o maior retorno. Obviamente o justo valor estará no equilíbrio entre ambas as pretensões, equilíbrio esse que precisa partir de algum pressuposto. Como já afirmado neste trabalho, considera-se como justo valor aquele que propicia a recuperação do capital investido corrigido pela inflação e mais o retorno sobre esse capital que considere o custo efetivo do capital aplicado. O consumidor não seria onerado por pagar por novos investimentos a serem ainda feitos e não se beneficiaria por perdas no capital anteriormente investido pelo investidor. E também não aconteceria o contrário: o investidor se beneficiando porque novos investidos estão sendo financiados pelo consumidor, e não por ele, ou o investidor se prejudicando por conta de não conseguir recuperar o investimento anteriormente realizado. Assim, entende-se que as variáveis principais para a análise são:

  • IRT, sendo que quanto menor o índice, menor a tarifa, ou seja, representa o maior interesse do consumidor;

  • ROE, que se constitui em uma das principais medidas de rentabilidade e relaciona o investimento realizado com o ganho dos sócios, ou seja, representa o interesse do investidor, e quanto maior melhor para o investidor;

  • A manutenção do capital físico, que será representado pelo AIS e, como no ROE, quanto maior melhor para o investidor, que terá maior remuneração sobre os ativos, bem como a realização de novos investimentos.

  • Com os dados coletados, também foi possível analisar outras variáveis:

  • BRRb, que é o montante do AIS subtraído das OE, dos bens totalmente depreciados e do índice de aproveitamento integral;

  • VMU, que é calculado pelo AIS subtraído da depreciação acumulada;

  • VBR, que representa o VMU subtraído do índice de aproveitamento depreciado;

  • QRR, que é o produto da BRRb e a taxa de depreciação;

  • RC, que é o produto entre a BRR líquida e o custo médio ponderado do capital ( weighted average capital cost - WACC) antes do cálculo dos impostos.

Para cada variável, realizou-se a comparação com os métodos de mensuração VNR e CHC. Cabe ressaltar que a escolha dos dois métodos em detrimento de outros deu-se pela viabilidade de analisar empiricamente. A seguir, descreve-se o tratamento estatístico da amostra.

3.2 Tratamento Estatístico

Após a formação da base de dados, realizou-se o teste de comparação de médias. Para definir o teste a ser aplicado, realizou-se o teste de normalidade dos dados Kolmogorov-Smirnov (K-S) indicado para o tamanho da amostra utilizada. Se a distribuição fosse normal ao nível de significância acima de 5% (p > 0,05), seria utilizado o teste paramétrico t de Student; caso contrário (p < 0,05), o teste a ser utilizado seria o de Wilcoxon, que é um teste não paramétrico. O resultado, que será detalhado adiante, mostrou que não há normalidade dos dados, por isso utilizou-se o teste de Wilcoxon, que tem por objetivo principal verificar a direção e a intensidade das diferenças de duas amostras relacionadas.

No caso deste estudo, o objetivo é investigar se há diferenças significativas entre os métodos do VNR e CHC para cada variável. Para tanto, adotou-se o seguinte procedimento:

  • A hipótese nula H0 aponta não haver diferença nas variáveis entre os modelos de mensuração VNR e CHC.

  • A hipótese alternativa H1 aponta haver diferença nas variáveis entre os modelos de mensuração VNR e CHC.

  • Nível de significância de 5%.

4. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Os resultados encontrados para o 2º CRTP são apresentados nas próximas subseções. Na primeira, realizou-se abordagem analítica dos dados atualizados pelo IPCA. Na segunda, promoveu-se análise estatística dos dados. A última foi destinada a expor as conclusões das evidências encontradas.

4.1 Abordagem Analítica para o 2º CRTP - IPCA

Com os dados apurados da BRR, calculou-se, em primeiro lugar, a diferença percentual entre os valores encontrados pelos três métodos de mensuração, com base na demonstração anual utilizada para a 2ª CRTP e na respectiva NT, que traz os resultados definitivos. Essas diferenças foram calculadas com a divisão dos valores do VNR pelos valores corrigidos CHC.

Os resultados das 44 empresas podem ser visualizados na Tabela 3. Como pode ser observado, os valores são bem diversos. Analisando-se as diferenças entre o VNR/CHC para a variável AIS, o resultado mais próximo entre os dois métodos é encontrado na Celesc Distribuição S.A. (Celesc), em que o AIS, com base no VNR, é maior em 1%, e na Energisa Borborema Distribuidora de Energia S.A. (Energisa BO), em que é menor em 1%. Esse resultado demonstra que os ativos a VNR dessas empresas estão refletindo a variação do poder aquisitivo da moeda no período analisado. A Cemig-Distribuição S.A. (Cemig-D) e a Companhia Estadual de Energia Elétrica-Distribuição (CEEE-D) tiveram o maior percentual do VNR/CHC, com o VNR 64% maior que o AIS com base no CHC, demonstrando que os ativos podem estar superestimados. Já a Centrais Elétricas do Pará (Celpa) apresentou o menor percentual, com o VNR 24% menor que o CHC, portanto, subestimado.

Tabela 3
Ativo imobilizado em serviço - 2º Ciclo de Revisão Tarifária Periódica - índice de preços ao consumidor amplo

As mensurações com base no VNR foram menores do que as com base no CHC em 36% das empresas (16 empresas). Como demonstrado na revisão conceitual, um valor com base no VNR menor que um valor com base no CHC beneficia o consumidor com tarifas mais baixas, entretanto o investidor não recupera seu investimento. As 16 concessionárias conseguirão repor seus ativos ao final da vida útil. Entretanto, por não haver recuperação do capital, poderá haver resistência do investidor em realizar investimentos futuros em outros processos licitatórios, estando os investidores de 16 empresas sendo remunerados abaixo da inflação.

E, nas demais empresas (28), o VNR foi maior que o CHC. Nesse caso, quando um valor com base no VNR é maior que um valor com base no CHC, o prejudicado é o consumidor, que está remunerando o investidor acima do que ele investiu anteriormente. Isso significa que esse investidor está financiando um ativo que ainda será construído e não o ativo que está sendo utilizado. Aqui cabe revisitar a afirmativa formulada na introdução: o VNR faz com que os consumidores atuais arquem com os custos de um bem que será adquirido futuramente, e não pela prestação de serviços já realizada.

Em média, o AIS com base no VNR esteve 11% maior que o com base no CHC, ou seja, há indícios de que, em média, o investidor esteja recebendo valores acima da inflação e os consumidores desembolsando mais do que o necessário.

A Tabela 4 evidencia o IRT. O resultado coincide com o da tabela anterior, em que é comparado o AIS com base no VNR e no CHC. Esse resultado já era esperado, haja vista que a remuneração de capital (RC) e a QRR dependem diretamente do valor do AIS. No caso do IRT, quanto menor o percentual, menor a tarifa. Destaca-se que, na 2ª CRTP, das 44 empresas, somente seis tiveram aumento de tarifas, ou seja, o IRT foi positivo [Ampla, EEB, Energisa BO, Escelsa Energia do Brasil, Energisa Nova Friburgo Distribuidora de Energia S.A. (Energisa NF) e Light Serviços de Eletricidade S.A. (Light)]. Nas demais, o IRT foi negativo, provocando queda nas tarifas devido à metodologia atualmente utilizada, ou seja, VNR-VNR.

Tabela 4
Resultado do índice de reposicionamento tarifário a valor novo de reposição e custo histórico corrigido - 2º Ciclo de Revisão Tarifária Periódica - índice de preços ao consumidor amplo

Analisando a Tabela 4, percebe-se que 7 empresas apresentaram o IRT positivo, com base no CHC. O resultado é o mesmo, comparando-se com o resultado quando da utilização do método do VNR, acrescentando-se somente a AES Sul Distribuidora de Energia S.A. (AES Sul), em que o IRT com base no CHC foi de 0,15% positivo. O maior reajuste da 2ª CRTP foi o da Energisa NF, 11,04%, e o menor o da Elektro (Elektro), 20,52% negativo. Se fosse adotada a metodologia do CHC, a Energisa NF também apresentaria o maior reajuste, só que em percentual menor, 7,66%, e a Cemig-D a maior queda de tarifa, de 26,11%. As 16 empresas que apresentaram o AIS menor com base no VNR também tiveram menor tarifa em relação ao CHC. As demais 28 tiveram o IRT com base no VNR maior que o calculado com base no CHC, proporcionando o método do CHC tarifas mais baixas em 64% das empresas. Pode-se inferir que, quando o AIS com base no VNR é menor que o calculado com base no CHC, a tarifa também será menor. O inverso também é verdadeiro, ou seja, AIS com base no VNR maior que o com base no CHC, a tarifa também será maior; entretanto, em percentual, não é proporcional. A Cemig-D, que apresentou AIS-VNR com percentual 64% maior, teve queda de tarifa de aproximadamente 33%, ou seja, o IRT com base no CHC foi 26,11% negativo e, com base no VNR, 19,68%; também o IRT foi negativo. Na Celpa, que apresentou o menor AIS com base no VNR, 24% em relação àquele com base no CHC quanto ao cálculo do IRT, houve queda de 8,38% e, quando mensurado com base no CHC, apresentou queda de 3,89%, ou seja, a diferença entre os dois métodos é de mais de 115%, nesse caso.

Outro ponto importante é que o AIS não determina se o IRT será negativo ou positivo. O que se depreende é que, dependendo do valor do AIS mensurado por meio de cada método, haverá maior ou menor tarifa, mas não se o índice de reajuste será positivo ou negativo. Isso depende de outras variáveis, como a Parcela A (que não é gerenciável) e o montante da empresa referência, entre outros. Em média, as tarifas a CHC foram menores que as calculadas pelo VNR, -9,01% e -8,41%, respectivamente, ou seja, na 2ª CRTP, se fosse utilizado o método do CHC, as tarifas seriam, em média, menores em 0,60% que as autorizadas a VNR, na amostra estudada, o que representa uma diferença de 7,17%.

A Tabela 5 apresenta os resultados quanto à variável ROE. A Eletrobras Distribuição Piauí (Cepisa) foi retirada dessa análise, tendo em vista que a empresa apresentou patrimônio líquido negativo (passivo a descoberto) e prejuízo. Como pode ser visto, cinco empresas [Empresa Energética de Mato Grosso do Sul S.A. (Enersul), Eletrobras Distribuição Alagoas (Ceal), Boa Vista Energia (Boa Vista Energia), Ceron (Ceron) e Celg-D] apresentaram ROE nominal negativo, tendo em vista que, no ano da revisão, apresentaram prejuízo; mas em 38 empresas, o ROE nominal foi positivo. Com a atualização monetária, nas 5 empresas com ROE nominal negativo, o ROE efetivo permaneceu negativo, mas em percentuais diferenciados. A diferença do ROE efetivo da Enersul foi de 13,95%, passando de negativo em 6,31% para negativo em 7,19%. Já nas demais, o ROE efetivo diminui, apesar de continuar negativo. A Celg-D, por exemplo, foi a que apresentou a maior diferença, passando de um ROE nominal negativo de 120,81% para -29,52%, uma diferença de 75,56%. O maior ROE nominal encontrado foi na CPFL Piratininga (CPFL Piratininga), 84,23%, e, quando corrigido pelo IPCA, passou a 55,38%, uma queda na rentabilidade quando descontada a inflação do período. O menor foi na Eletrobras Distribuição Acre (Eletroacre), 0,08%, e, quando atualizado, passa a ser negativo em 2,60%. Nas empresas em que o ROE nominal foi positivo, esse, quando atualizado, passa a ser menor, com exceção do que ocorreu na Caiuá e CEEE-D. A menor diferença foi na Eletrocar, com queda de 6,25%, e a maior foi na Eletropaulo, uma queda de quase 80%. A AES Sul, que apresentou ROE nominal de 5,06%, quando atualizado, passa a ser negativo em 1,97% (-1,97%). Em média, o ROE nominal foi de 12,37% e o ROE efetivo, de 9,38%. Percebe-se que, em relação às médias do AIS e IRT, houve maior diferença entre os dois métodos, quanto ao ROE.

Tabela 5
Retorno sobre o patrimônio líquido a valor novo de reposição e custo histórico corrigido - 2º Ciclo de Revisão Tarifária Periódica - índice de preços ao consumidor amplo

4.2. Análise Estatística do 2º CRTP - IPCA

O próximo passo foi em direção à aplicação do teste de médias para verificar as diferenças das variáveis quanto ao método de mensuração (VNR x CHC) para o ano em que ocorreu a 2ª CRTP, realizando-se a análise conjunta das empresas.

Como já citado, para a definição do teste que seria realizado foi necessário verificar se as variáveis possuíam ou não distribuição normal. Para isso, devido ao tamanho da amostra, realizou-se o teste de K-S. Há indícios que as variáveis não possuem distribuição normal, visto que as probabilidades foram inferiores ao nível de significância de 5%. Conforme explicado anteriormente, não possuindo as variáveis distribuição normal, aplicou-se o teste de Wilcoxon para avaliar a diferença ou não entre esses métodos para cada uma das variáveis. Os resultados desses testes são apresentados na Tabela 6.

Tabela 6
Resultados do teste Wilcoxon - 2º Ciclo de Revisão Tarifária Periódica - índice de preços ao consumidor amplo

De acordo com os resultados do teste de Wilcoxon ( Tabela 6), com exceção da variável ROE, as variáveis calculadas com base no CHC e no VNR foram consideradas estatisticamente iguais. Com probabilidades superiores a 0,14, não foi rejeitada a hipótese nula de igualdade entre os dois métodos analisados nas demais variáveis. Isso quer dizer que não há diferenças significativas nas variáveis quando aplicados os métodos de mensuração VNR e CHC. Todavia, em relação à variável ROE, com uma probabilidade inferior a 0,001, os métodos CHC e VNR foram considerados estatisticamente diferentes, ou seja, rejeita-se a hipótese nula de igualdade. Esse resultado ratifica as inferências anteriores que a rentabilidade das empresas pode estar superestimada e, ainda, confirma a diferença na média entre os dois métodos, na análise descritiva.

4.3 Conclusões das Evidências Encontradas

Apesar de, estatisticamente, não terem sido encontradas diferenças significativas entre os métodos, com exceção para a variável ROE na análise global, na verificação dos casos específicos encontrou-se grande número de “valores não justos”.

  • Constatou-se que, em 64% das empresas, o AIS apresenta indícios de que está superestimado com base no VNR, tendo em vista que o valor com base no CHC foi menor, ou seja, na média o AIS pelo método do VNR foi 11% maior do que o calculado com base no CHC. Nesse caso, pode-se afirmar que o avanço tecnológico não fez com que os custos dos ativos fossem menores. Os números citados acima demonstram que pelo menos 16 empresas estão sendo remuneradas acima do índice de inflação, ou seja, suas receitas excedem o capital investido. Portanto, aceita-se a primeira hipótese de que a mensuração dos ativos pelo método do CHC pode contribuir para alcançar o justo valor para o investidor e o consumidor, pois não é justo algumas distribuidoras serem beneficiadas e outras não.

  • Quanto ao retorno dos investidores, representado pela variável ROE, apesar da limitação de ser utilizado o CH para comparação, ficou evidente que as concessionárias estão apresentando retornos positivos, em sua maioria (38 empresas). Quando a inflação é descontada, os retornos ainda continuaram positivos, mas em percentuais menores (36 empresas).

Pode-se afirmar que as empresas, em média, estão sendo mais adequadamente remuneradas. O CHC atualizado pelo IPCA, conforme afirmamos, proporciona, também, retorno justo aos investidores. O retorno calculado pelo CHC é mais próximo do seu valor econômico. Porém, essa verdade valeu, no Brasil, apenas para a média, mas não para cada um dos consumidores e cada um dos investidores. Muitos consumidores perderam e muitos consumidores ganharam com a substituição do CHC pelo VNR, e o mesmo com os investidores: muitos ganharam e muitos perderam com essa nova base de mensuração.

Em suma, os achados da pesquisa permitem sugerir a alteração do método de mensuração do VNR, atualmente utilizado, para o método do CHC atualizado pelo índice oficial da inflação - IPCA, pois entende-se que esse método proporciona o justo valor para o consumidor e o investidor, pelas seguintes razões: maior transparência e menos subjetividade no cálculo do ativo imobilizado em serviço e, consequentemente, da RC e da QRR, contribuindo para minimizar o problema da assimetria informacional. Entende-se que haverá menos discrepância entre as remunerações das empresas, pois, como visto, algumas estão recebendo acima do capital investido e outras não, e menos discrepâncias entre os consumidores, que hoje estão segregados em dois grandes grupos: o dos perdedores e o dos ganhadores, com distribuições diferenciadas entre eles em cada um dos grupos.

Concluiu-se, portanto, que o uso do VNR é má política pública porque ora beneficia o consumidor, mas desincentiva o investidor, ora prejudica o consumidor e beneficia o investidor. A equidade só ocorre quando o VNR acompanha o índice de inflação. Assim, embora na média não haja diferenças estatísticas entre os métodos CHC e VNR, o referencial teórico e os argumentos apresentados sugerem o método do CHC como o mais indicado para avaliação dos ativos no setor elétrico.

É importante destacar que os resultados e as conclusões encontrados são exclusivos para o setor regulado, em que as tarifas são determinadas por um órgão regulador, pois o método do CR é relevante para as empresas comerciais e industriais (principalmente) de setores concorrenciais quando possuem custos de reposição crescentes e precisam, com suas próprias atividades, angariar recursos para repor seus ativos.

Por exemplo, em uma atividade comercial, é extremamente relevante que, no caso de venda de uma mercadoria que tenha sofrido aumento de CR, a mercadoria estocada, sendo vendida, tenha seu preço ajustado de forma a conseguir produzir recurso suficiente para essa reposição. Caso contrário, poderá o comerciante ter que injetar capital ou pedir empréstimo para essa renovação do estoque.

A discussão em tela neste trabalho, todavia, é a utilização do CR nas empresas concessionárias de serviços públicos em que suas tarifas sejam reguladas, já que a tarifa baseada em um CR de um imobilizado que tenha subido, repassado ao consumidor, atribui a ele, consumidor, a responsabilidade de prover recursos que os investidores deveriam investir nessa reposição; essa responsabilidade não deve ser dos consumidores. E se a tarifa produzir o recurso para essa renovação, por que deveria o investidor ser remunerado sobre esse ativo que não foi ele quem financiou?

No caso de preço de reposição inferior ao do ativo sendo renovado, ocorre algo diferente: se o comerciante precificar a mercadoria sendo vendida com base na reposição que lhe exigirá investimento menor, poderá, na verdade, repor esse produto, mas sofrer perda do capital investido na mercadoria sendo vendida. No caso de um serviço tarifado, se o imobilizado precisar de menor investimento para repor o anterior, e a tarifa acompanhar esse decréscimo, ótimo para o consumidor, mas o investidor poderá não conseguir recuperar seu investimento, o que o desestimularia a continuar no segmento e desestimularia outros a entrarem, a não ser que conseguissem aumentar a taxa de retorno embutida na tarifa para compensar o acréscimo de risco sendo incorrido. Para análises mais profundas dos problemas de variação no preço de reposição, inclusive quando na presença de inflação, veja-se Szuster (1985Szuster, N. (1985). Análise do lucro passível de distribuição: uma abordagem reconhecendo a manutenção do capital da empresa (Doctoral Thesis). Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade, Universidade de São Paulo, São Paulo.).

Finalmente, a conclusão da análise empírica e realista no cenário brasileiro é o que a análise estatística evidencia: na média brasileira, o preço de reposição não apresentou diferença significativa com relação ao que seria a utilização da pura e simples correção monetária dos ativos ao invés dos novos valores de reposição; mas isso simplesmente esconde algo muito relevante, pois a média deriva de dois grandes blocos: (i) o dos consumidores que estão pagando mais pelos serviços de energia do que deveriam, o que constitui benefício visível aos investidores e prejuízo a esses consumidores; e (ii) o dos consumidores que estão pagando menos do que deveriam, o que os beneficia, mas prejudica os investidores.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este artigo buscou demonstrar os efeitos de cada conceito e critério no tratamento da BRR dos ativos e sua influência na determinação da tarifa no setor elétrico brasileiro, com base nas teorias da avaliação patrimonial e de finanças. Analisaram-se, empiricamente, os dois métodos de mensuração mais utilizados no setor elétrico mundialmente (VNR e CHC).

O método do VNR proporciona incertezas quando da avaliação dos ativos, tanto para o consumidor quanto para o investidor, devido à maior parte dos insumos utilizados serem commodities com grande volatilidade no mercado. O valor apurado por esse método pode não ser o mesmo quando à época da realização do investimento, visto que, naquele momento, era o que se tinha de mais eficiente. Como exposto nesta pesquisa, a regulação precisa ser eficiente e com pouco espaço para discricionariedade, com o objetivo de evitar o oportunismo governamental. Além disso, mudanças constantes nas regras trazem instabilidade ao setor. Sugere-se, para os próximos ciclos, que seja refeita a avaliação da totalidade dos ativos de forma simplificada e o mais assertiva possível, considerando os preços à época de sua imobilização, ou seja, a concessionária deve ser remunerada pelo valor do investimento realmente desembolsado e, a partir daí, realizar atualização do mesmo pelo IPCA.

A interpretação desta pesquisa deve ressalvar algumas limitações: a literatura, quanto ao tema, é escassa; não foi possível analisar todas as concessionárias do setor elétrico devido à impossibilidade de acesso aos dados. Entretanto, ressalta-se que a amostra representa 70% das empresas e, como já citado, ultrapassa 95% das unidades consumidoras do país; o modelo adotado para calcular os efeitos inflacionários foi realizado com valores aproximados, por não ser possível a correção dos estoques, bem como as datas exatas de aquisição ou baixa de cada ativo, por exemplo.

Defende-se, a partir da análise empreendida, a mensuração dos ativos do setor elétrico brasileiro pelo CHC devido às evidências apresentadas ao longo deste artigo, haja vista que ficou demonstrado que o CHC diminui o risco e as incertezas do investidor quanto ao retorno do capital investido, pois ele receberá o que realmente desembolsou na época do investimento atualizado monetariamente pelo IPCA (que é considerado o índice oficial da inflação brasileira). Pelo método do VNR, esse risco é inerente, pois os investimentos são remunerados pelo valor que será reposto, no momento do laudo de avaliação, o que poderá apresentar valores diversificados (a maior ou a menor) devido, principalmente, à volatilidade das commodities e ao avanço tecnológico. É interessante que o teste de média não tenha detectado diferença estatística ao nível de significância de 5% entre os métodos CHC e VNR, tomando-se o país como um todo. Houve, na média, uma compensação entre ganhos e perdas de investidores e consumidores, o que não caracteriza uma tarifa justa.

Outro ponto que merece destaque é que, como já exposto ao longo deste estudo, os consumidores, pela aplicação do CHC, arcam com as despesas realmente desembolsadas pelo investidor e não por um montante que pode estar financiando os investimentos futuros, ou seja, as concessionárias podem estar sendo remuneradas por investimentos não realizados, expropriando os consumidores. Ainda pode ocorrer o inverso, se adotado o método do VNR, tendo em vista que o investidor pode receber aquém do que foi custeado, podendo ocorrer expropriação de riqueza pelo regulador e ausência de incentivos para novos empreendimentos. Portanto chega-se à conclusão de que o preço de reposição tende a sempre trazer prejuízo para o consumidor e benefício ao investidor, ou exatamente o inverso, dependendo da evolução desse preço face à inflação. Mais uma vez, esses fatos acontecem na análise individual, pois na média não há diferença estatística.

Acredita-se, portanto, que a mensuração dos ativos pelo CHC é uma política pública justa para a fixação das tarifas com vistas a beneficiar as partes envolvidas.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Jul 2017
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2017

Histórico

  • Recebido
    02 Fev 2016
  • Aceito
    14 Mar 2017
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