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A Comparabilidade das Escolhas Contábeis na Avaliação Posterior de Propriedades para Investimento: Uma Análise das Companhias Abertas Brasileiras e Portuguesas* * Artigo apresentado no 8º Congresso da Associação Nacional de Programas de Pós-Graduação em Ciências Contábeis (ANPCONT), Rio de Janeiro, RJ, agosto de 2014.

Resumos

Um dos principais objetivos da adoção das Normas Internacionais de Contabilidade (International Financial Reporting Standards - IFRS) é a busca da comparabilidade entre as demonstrações financeiras dentro de um mesmo país, ao longo do tempo, e entre países diferentes. As IFRS têm a característica de permitir escolhas contábeis na maioria de suas normas. Entretanto, a existência dessa flexibilidade no processo de reconhecimento, mensuração e divulgação de ativos e passivos pode impactar a comparabilidade. As IFRS foram criticadas tanto pelas escolhas contábeis que contêm como pela introdução do paradigma do valor justo. Este artigo analisa essas duas questões, investigando a escolha do modelo de custos versus a escolha do modelo de valor justo para propriedades para investimento (PPI), uma opção assegurada por força da Norma Internacional de Contabilidade (International Accounting Standard - IAS) 40. O objetivo desta pesquisa foi identificar o grau de comparabilidade e os fatores que determinaram as escolhas contábeis feitas pelos gestores de PPI, de companhias abertas brasileiras e portuguesas, nos períodos de 2010 a 2012. A comparabilidade, dentro dos e entre os países, foi identificada pelo índice T e a busca pelos fatores determinantes das escolhas contábeis feitas pelos gestores foi realizada por meio de uma análise de regressão logística. Como resultado, constatou-se que, apesar das escolhas contábeis permitidas pela IAS 40, houve uma comparabilidade média entre as práticas contábeis das entidades desses países, porém, com decréscimo do índice ao longo dos anos. Os fatores explicativos identificados foram a auditoria por uma das big four (PricewaterhouseCoopers, Deloitte Touche Tohmatsu, KPMG ou Ernst & Young), o endividamento das empresas, a relevância relativa do saldo de PPI, o lucro líquido e a menor experiência do Brasil na utilização do método do valor justo para avaliação das PPI.

comparabilidade; escolhas contábeis; IAS 40; propriedades para investimento; índice T


One of the main purposes for adopting the International Financial Reporting Standards (IFRS) is the quest for comparability between financial statements within the same country, over time, and between different countries. IFRS have the feature of allowing accounting choices in most of their standards. However, the existence of such flexibility in the process for recognizing, measuring, and disclosing as sets and liabilities may impact on comparability. IFRS have been criticized both due to their accounting choices and the adoption of the fair value paradigm. This article examines these two issues, investigating the choice of the cost model versus the choice of the fair value model for investment properties (IPs), an option guaranteed under the terms of the International Accounting Standard (IAS) 40. This research aimed to identify the comparability degree and the factors that determine the accounting choices made by managers of IPs, in Brazilian and Portuguese listed companies, within the periods from 2010 to 2012. Comparability, within and between countries, was identified by the T-index and the search for the determining factors of accounting choices made by managers was performed by means of a logistic re gression analysis. As a result, it was found that, despite the accounting choices allowed by IAS 40, there was a mean comparability between the accounting practices of firms in these countries, but showing a decrease in the index over the years. The explanatory factors identified were auditing by one of the big four (PricewaterhouseCoopers, Deloitte Touche Tohmatsu, KPMG, or Ernst & Young), companies' indeb tedness, relative importance of IPs' balance, net profit, and less experience of Brazil in using the fair value method to appraise IPs.

comparability; accounting choices; IAS 40; investment properties; T-index


1 INTRODUÇÃO

As Normas Internacionais de Contabilidade (International Financial Reporting Standards - IFRS), emitidas pelo International Accounting Standards Board (IASB), surgiram para sanar a necessidade de informações confiáveis, de qualidade, transparentes (Oliveira & Lemes, 2011), assim como "os problemas de divergência de informações geradas pelos relatórios contábeis" (Lemes & Carvalho, 2009, p. 26).

O processo de convergência contábil apresenta, como uma de suas características principais, a busca da comparabilidade entre os relatórios financeiros dentro de um país, ao longo do tempo, e entre países diferentes (Cairns, Massoudi, Taplin, & Tarca, 2011Cairns, D., Massoudi, D., Taplin, R., & Tarca, A. (2011). IFRS fair value measurement and accounting policy choice in the United Kingdom and Australia. The British Accounting Review, 43, 1-21.). A fim de possibilitar essa comparabilidade, ou seja, que eventos iguais pareçam iguais e eventos diferentes pareçam diferentes (International Accounting Standards Board, 2013, item QC 23), as IFRS dispõem de algumas escolhas acerca das várias etapas de contabilização de um elemento patrimonial, aqui denominadas escolhas contábeis.

Uma das escolhas contábeis possíveis, quando da aplicação das IFRS, é a mensuração após o reconhecimento inicial (avaliação posterior) das propriedades para investimento (PPI), que podem ser avaliadas segundo o valor justo ou o custo de aquisição, como dispõe a Norma Internacional de Contabilidade (International Accounting Standard - IAS) 40. A partir dessa escolha, surge uma dúvida acerca da existência (ou não) de comparabilidade entre os relatórios financeiros de entidades que reconhecem as PPI, já que estas podem ser avaliadas de duas formas distintas.

As IFRS foram criticadas tanto pela flexibilidade (escolhas contábeis) que proporcionam como pela introdução do paradigma do valor justo (Muller, Riedl, & Sellhorn, 2008Muller, K. A., Riedl, E. J., & Sellhorn, T. (2008). Causes and consequences of choosing historical cost versus fair value. Recuperado de http://nd.edu/~carecob/May2008Conference/Papers/RiedlMRS03062008.pdf
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). Nesse sentido, este artigo analisa essas duas questões, investigando a escolha do modelo de custos versus a escolha do modelo de valor justo para PPI, uma opção assegurada por força da IAS 40. Em virtude disso, almeja-se responder ao seguinte questionamento: "Qual é o grau de comparabilidade e quais são os fatores que determinam as escolhas contábeis feitas pelos gestores das PPI, de companhias abertas brasileiras e portuguesas, no que tange à mensuração após o reconhecimento inicial?".

Para fazer frente ao objetivo desta pesquisa, foram analisadas as demonstrações financeiras de 50 entidades brasileiras listadas na Bolsa de Valores, Mercadorias e Futuros de São Paulo (BM&FBOVESPA) e 23 entidades portuguesas listadas na Bolsa de Valores de Lisboa (NYSE Euronext Lisbon), entre os exercícios de 2010 a 2012.

Esses períodos foram selecionados porque, para analisar a comparabilidade das escolhas contábeis entre os dois países, entendeu-se necessário considerar os últimos exercícios sociais, a contar do ano em que o uso das IFRS se tornou obrigatório em ambos. Em Portugal, a adoção compulsória das Normas Internacionais de Contabilidade ocorreu para os exercícios findos a partir de 2005 (Regulamento n. 1.606/2002, do Parlamento Europeu), e no Brasil, a partir dos exercícios findos em 2010 (Instrução da CVM n. 457/2007).

A seleção de companhias abertas pertencentes ao Brasil e a Portugal deveu-se ao fato de que Macedo, Machado e Machado (2013)Macedo, M. A. S., Machado, M. A. V., & Machado, M. R. (2013). Análise da relevância da informação contábil no Brasil num contexto de convergência às normas internacionais de contabilidade. Revista Universo Contábil, 9(1), 65-85. salientaram que a tentativa de aproximar a contabilidade brasileira da contabilidade de países anglo-saxônicos, com a adoção das IFRS, não obteve sucesso, permanecendo a contabilidade da maioria das empresas baseada em práticas influenciadas pelo direito romano - o regime Code Law. Em países regidos por esse sistema jurídico, a exemplo de Portugal e de países que foram colônias na América do Sul, como o caso do Brasil, as leis tendem a ser a base normativa para a prática contábil.

Dessa forma, o modelo jurídico brasileiro traz consigo uma herança do processo de colonização português, principalmente durante a vigência de princípios fundamentais de contabilidade (generally accepted accounting principles - GAAP) locais, marcados por um sistema romano que preza que a lei deve ser aplicada em observância aos instrumentos normativos, apresentando uma quantidade reduzida (ou mínima) de práticas de subjetivismo contábil. Com a adoção das IFRS, a contabilidade baseada em princípios e marcada pelo subjetivismo contábil passou a ter seu espaço. Essas Normas Internacionais, por sua origem anglo-saxônica, são consideradas legítimas representantes do modelo contábil baseado no sistema Common Law (Nobes, 1998Nobes, C. (1998). Towards a general model of the reasons for international differences in financial reporting. Abacus, 34(2), 162-187.; Carmo, Ribeiro, & Carvalho, 2011Carmo, C. H. S., Ribeiro, A. M., & Carvalho, L. N. G. (2011). Convergência de fato ou de direito? A influência do sistema jurídico na aceitação das normas internacionais para pequenas e médias empresas. Revista Contabilidade & Finanças, 22(57), 242-262.), distinto, portanto, do sistema dos países estudados nesta pesquisa.

Levando em consideração as similaridades entre Brasil e Portugal, o impacto desses fatores na adoção das IFRS, bem como a recente introdução, em ambos os países, de um conceito característico de um sistema Common Law - o de valor justo -, a seguinte hipótese fundamentou o estudo:

Ho: As escolhas contábeis feitas pelos gestores das PPI, de companhias abertas brasileiras e portuguesas, no que tange à avaliação posterior, são altamente comparáveis, em função das similaridades ambientais dos dois países.

Este estudo contribui com a literatura ao identificar possíveis diferenças nas demonstrações financeiras, dentro dos e entre os países, ao longo do tempo, em relação às escolhas contábeis contidas na IAS 40. A variação entre a avaliação das PPI pelo método de custo ou pelo método do valor justo pode afetar a comparabilidade dos relatórios e é sugestiva de implicações de que a flexibilidade, nas decisões acerca de demonstrações financeiras, pode resultar em escolhas altamente divergentes por parte das entidades (Muller et al., 2008).

Além das contribuições apresentadas, o estudo cobre uma lacuna existente de pesquisas sobre escolhas contábeis, apontada por Fields, Lys e Vincent (2001)Fields, T. D., Lys, T. Z., & Vincent, L. (2001). Empirical research on accounting choice. Journal of Accounting and Economics, 31, 255-307., visto que tem por foco um tema relativamente novo - o valor justo - no cenário contábil brasileiro, tem o diferencial de analisar as escolhas feitas por dois países historicamente ligados, ao longo de três anos, bem como busca possíveis explicações para as escolhas feitas pelas empresas em relação à avaliação posterior das PPI.

Esta pesquisa está estruturada em quatro partes, além desta introdução. Na seção dois é apresentado o referencial teórico; na seção três, os procedimentos metodológicos adotados na pesquisa; na seção quatro, os resultados são descritos e analisados; por fim, tecemos as considerações finais sobre os resultados obtidos.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 Comparabilidade

Segundo Van der Tas (1988Van Der Tas, L. G. (1988). Measuring harmonization of financial reporting practice. Accounting and Business Research, 18, 157-169., p. 158), "dois relatórios são comparáveis em relação a um caso específico, se nas mesmas circunstâncias deste evento, ambos os relatórios ou múltiplos relatórios, forem contabilizados da mesma forma". Segundo o autor, um modo eficaz de possibilitar a comparabilidade seria por meio do estabelecimento de normas, que criariam limites às diferenças entre eles.

Do ponto de vista normativo, as IFRS frisam a necessidade da comparabilidade entre relatórios, períodos e países, para tornar a informação contábil mais útil à tomada de decisões dos usuários. Tanto é assim que as IFRS trouxeram, entre as características qualitativas de melhoria elencadas para a elaboração das demonstrações contábeis, a comparabilidade, que, somada a outras características (verificabilidade, tempestividade e compreensibilidade), proporciona uma informação contábil de qualidade (International Accounting Standards Board, 2013).

Dessa forma, um dos objetivos primários da adoção das IFRS consiste em melhorar a comparabilidade das demonstrações financeiras (Cairns et al., 2011), que nada mais é que fazer com que fenômenos econômicos iguais pareçam iguais e fenômenos econômicos diferentes pareçam diferentes, e não que fenômenos diferentes pareçam iguais, e vice-versa (International Accounting Standards Board, 2013). Surge, assim, a justificativa para a existência e permanência das escolhas contábeis nas IFRS: oferecer alternativas para que os gestores registrem os fatos contábeis de modo a emitir relatórios financeiros comparáveis.

A comparabilidade pode ser considerada sob diferentes perspectivas. Uma delas é a distinção entre a comparabilidade de jure (ou formal) e a de facto (ou informal). Outra distinção tem sido feita entre a comparabilidade ao longo do tempo e entre diferentes companhias de um mesmo país ou de mais de um país. Uma terceira perspectiva trata da comparabilidade entre números contábeis, disclosure voluntário, comunicados à imprensa, e assim por diante (Cole, Branson, & Breesch, 2009Cole, V., Branson, J., & Breesch, D. (2009). How to measure the comparability of financial statements? International Journal of Managerial and Financial Accounting, 1(4), 379-397.).

Esta pesquisa teve por foco a mensuração da comparabilidade dos números contábeis por meio da análise das demonstrações financeiras. Para tanto, foram utilizados os denominados índices de comparabilidade, que são mecanismos matemáticos criados com o intuito de mensurar o grau de comparabilidade entre os relatórios contábeis das entidades ao longo do tempo, e entre países. Van der Tas (1988), o precursor da criação desses índices, propôs os índices H, C e I, todos com a finalidade de mensurar o grau de comparabilidade entre os relatórios contábeis, porém, cada um com peculiaridades específicas. Taplin (2004), por sua vez, desenvolveu o índice T, que abrange, em um único índice, todas as especificidades dos anteriores, além de corrigir suas limitações.

O índice H é utilizado quando se almeja investigar a comparabilidade das demonstrações financeiras de empresas pertencentes a um único país, quando as entidades têm a possibilidade de utilizar apenas um método contábil. O índice C apresenta-se como uma evolução do índice H, pois, além de possibilitar o cálculo da comparabilidade nacional, considera múltiplas escolhas contábeis. O índice I foi criado com a finalidade de mensurar a comparabilidade internacional (mais de um país), porém, não pondera o número de empresas ou o tamanho dos países investigados.

O índice T, o mais completo de todos, apresenta as seguintes propriedades: (i) a comparação entre países com número de empresas diferentes; (ii) a análise dentro do país, entre países e geral (foco internacional); (iii) a análise de múltiplas políticas contábeis; e (iv) o tratamento específico quando da não divulgação da escolha contábil pela entidade (Taplin, 2004). Esse indicador, portanto, é o mais apropriado para esta pesquisa.

2.2 Escolhas Contábeis

No caminho rumo à adoção das IFRS, a contabilidade inicia um processo de transição, de uma contabilidade baseada em regras para uma contabilidade baseada em princípios e regras, a fim de melhor representar a situação econômico-financeira das empresas, o que fez com que se acentuasse o subjetivismo contábil advindo do julgamento profissional (Bennett, Bradbury, & Prangnell, 2006Bennett, B., Bradbury, M. E., & Prangnell, H. (2006). Rules, principles and judgments in accounting standards. Abacus, 42(2), 189-204.; Barth, 2008Barth, M. E. (2008). Global financial reporting: implications for U.S. academics. American Accounting Association, 83(5), 1159-1179.; Gabriel & Corrar, 2010Gabriel, F., & Corrar, L. J. (2010). Gerenciamento de resultados e de capital no sistema bancário brasileiro: uma investigação empírica nas aplicações em títulos e valores mobiliários. Revista de Contabilidade do Mestrado em Ciências Contábeis da UERJ, 15(2), 49-62.).

Esse subjetivismo contábil presente nas IFRS é proporcionado pela discricionariedade permitida em seu escopo, por meio das escolhas contábeis. Watts (1992)Watts, R. L. (1992). Accounting choice theory and market-based research in accounting. British Accounting Review, 24, 235-267. define escolhas contábeis como uma escolha do gestor por um método em detrimento de outro. Fields et al. (2001, p. 256), por sua vez, definem escolhas contábeis como:

[...] qualquer decisão, cujo objetivo principal é influenciar (seja na forma ou substância) a saída do sistema de contabilidade de uma forma particular, incluindo não apenas as demonstrações financeiras publicadas de acordo com o GAAP, mas também declarações fiscais e arquivamentos regulatórios.

Cabe ressaltar, no entanto, que tal subjetivismo profissional proporcionado pelas escolhas contábeis surgiu não em detrimento da flexibilização das práticas contábeis sob as demonstrações financeiras, mas, segundo Fields et al. (2001), com vistas a atender ao mercado incompleto e imperfeito, que exige um sistema de normas contábeis que proteja os diversos usuários das informações contábeis, ante os interesses dos agentes.

Contudo, a teoria da contabilidade não apresenta uma regra que direcione os gestores na escolha deste ou daquele método contábil. Ela apenas fornece explicações acerca dos motivos que levaram determinadas empresas a utilizar um método e não outro, bem como os reflexos de escolhas específicas, o que se torna importante para os profissionais contábeis, uma vez que fornece instrumentos para uma melhor tomada de decisões ante as diversas situações propiciadas pelo cenário de constantes mudanças (Watts & Zimmerman, 1986).

Em função de contundentes críticas, no passado, ao seu processo de emitir documentos com dois tratamentos permitidos para várias de suas normas (um tratamento benchmark e um alternativo), o IASB empreendeu esforços com o firme propósito de reduzi-los. Foi, de certa forma, bem-sucedido. Contudo, escolhas em níveis distintos ainda permanecem. A eliminação total de tais escolhas poderia gerar relatórios contábeis mais comparáveis? A resposta é sim. Isso geraria relatórios contábeis que não representam adequadamente os eventos econômicos a que se dispõem representar? Provavelmente, não.

Assim, a existência de escolhas contábeis nas IFRS é uma característica implícita e necessária à geração de relatórios contábeis úteis para a tomada de decisão. Ponderar e equalizar seu uso, sem comprometer a comparabilidade almejada desses relatórios, ainda é um assunto controverso e que carece de mais discussões.

2.3 Propriedades para Investimento

Propriedade para investimento, disciplinada pela IAS 40 (item 5), emitida pelo IASB, é definida como "a propriedade (terreno ou edifício - ou parte de edifício - ou ambos) mantida (pelo proprietário ou pelo arrendatário em arrendamento financeiro) para auferir aluguel ou para valorização do capital ou para ambas [...]".

A IAS 40 proporcionou mudanças significativas na contabilidade internacional, como elencado por Muller et al. (2008). Primeiro, foi eliminado o modelo de reavaliação, opção permitida para contabilizar PPI, na qual, segundo o autor, era consideravelmente apoiado como tratamento contábil apropriado para mensuração de PPI. Em segundo lugar, foi a primeira vez que o IASB introduziu o modelo do valor justo para ativos não financeiros de longa duração. Por último, a norma proporcionou às entidades escolher entre o custo e valor justo, como política contábil para avaliação posterior de PPI.

As PPI, no entanto, devem ser mensuradas, inicialmente, pelo seu custo, incluindo os custos de transação (IAS 40, item 20). Após o reconhecimento, na avaliação posterior, a IAS 40 (item 30) dispõe que a entidade deve optar, como sua política contábil, pelo método do custo ou pelo método do valor justo, devendo aplicar essa política a todas as suas PPI reconhecidas.

Antes da adoção das IFRS, "os ativos de propriedades para investimento eram contabilizados de acordo com as normas contábeis nacionais aplicadas ao país de domicílio da empresa" (Muller et al., 2008, p. 7). Quanto ao Brasil e a Portugal, as principais diferenças entre a Norma Internacional e os normativos contábeis locais sobre PPI, antes da adoção da IAS 40, são apresentadas na Tabela 1.

Tabela 1
Diferenças entre as legislações brasileira e portuguesa anteriores e a IAS 40

É oportuno salientar que o modelo do valor justo introduzido pela IAS 40 para a avaliação de PPI não foi permitido pelas normas locais pré-IFRS, na maioria dos países europeus (Muller et al., 2008), nem em outros países, como o Brasil. De acordo com o modelo do valor justo, as PPI são contabilizadas no balanço patrimonial pelo seu valor justo e todas as alterações em seu valor são diretamente reconhecidas na demonstração do resultado do exercício (Muller et al., 2008). Segundo os autores, esse reconhecimento diretamente no resultado, provavelmente, introduziu volatilidade substancial no lucro líquido reportado, motivo pelo qual não era permitido em muitos países.

2.4 Método do Valor Justo versus Método de Custo

Define-se valor justo como "o preço que seria recebido pela venda de um ativo ou que seria pago pela transferência de um passivo em uma transação não forçada entre participantes do mercado na data de mensuração" (IFRS 13, item 9). A escolha entre os modelos de valor justo e de custo histórico é uma das questões mais amplamente debatidas na literatura contábil (Christensen & Nikolaev, 2013Christensen, H. B., & Nikolaev, V. V. (2013). Does fair value accounting for non-financial assets pass the market test? Review of Accounting Studies, 18, 734-775.).

A aplicação das IFRS na Europa, por exemplo, introduziu muitas mudanças nas práticas contábeis continentais tradicionais (Demaria & Dufour, 2007Demaria, S., & Dufour, D. (2007). First time adoption of IFRS, fair value option, conservatism: evidences from French listed companies. Recuperado de http://hal.archives-ouvertes.fr/docs/00/26/61/89/PDF/First_adoption_and_fair_value_ Demaria_Dufour.pdf
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). Os países europeus apresentam uma contabilidade conservadora e a adoção das IFRS, notadamente no reconhecimento ao valor justo de certos ativos e passivos, representa uma mudança radical de perspectivas para os preparadores e os usuários (Bertoni & Derosa, 2005Bertoni, M., & Derosa, B. (2005). Comprehensive income, fair value and conservatism: a conceptual framework for reporting financial performance. In 5th International Conference on European Integrations, Competition and Cooperation, Lovran. Recuperado de http://ssrn.com/abstract=2239303
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; Demaria & Dufour, 2007).

Quanto aos benefícios da utilização de um método em vez de outro, para Christensen e Nikolaev (2013), a avaliação pelo valor justo parece ser superior ao custo histórico na maioria das características qualitativas descritas no Conceptual Framework for Financial Reporting (International Accounting Standards Board, 2013). "A única exceção é, sem dúvida, o critério da confiabilidade, em que é provável que o custo histórico receba a pontuação mais elevada" (Christensen & Nikolaev, 2013, p. 736). Embora as estimativas a valor justo tendam a ser mais relevantes, é menos provável que sejam confiáveis (Dietrich, Harris, & Muller, 2001Dietrich, J. R., Harris, M. S., & Muller, K. A. (2001). The reliability of investment property fair value estimates. Journal of Accounting and Economics, 30, 125-158.).

A comparabilidade, por exemplo, proporciona melhor qualidade da informação contábil, no sentido de possibilitar aos usuários identificar semelhanças e diferenças entre dois conjuntos de fenômenos econômicos (Herrmann, Saudagaran, & Thomas, 2006Herrmann, D., Saudagaran, S. M., & Thomas, W. B. (2006). The quality of fair value measures for property, plant, and equipment. Accounting Forum, 30, 43-59.). Para Herrmann et al. (2006), o método do valor justo, quando mensurado com segurança, melhora a comparabilidade dos relatórios financeiros, enquanto o método do custo pode dificultar a comparabilidade, tanto ao não identificar semelhanças entre itens semelhantes como ao não distinguir diferenças entre itens diferentes.

Segundo Shaffer (2010)Shaffer, S. (2010). Fair value accounting: villain or innocent victim. Exploring the links between fair value accounting, bank regulatory capital and the recent financial crisis. The quantitative analysis unit of the Federal Reserve Bank of Boston (Working paper QAU10-01). Recuperado de http://bostonfed.org/bankinfo/qau/wp/2010/qau1001.pdf
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, os defensores do uso do valor justo, inclusive os membros do Financial Accounting Standards Board (FASB), do IASB e da Securities and Exchange Commission (SEC), argumentam que esse método proporciona informações mais transparentes, oportunas e precisas aos stakeholders. Eles defendem que o modelo do valor justo majora a disciplina do mercado, ensejando mercados mais eficientes, e que "os modelos de mensuração alternativos (menor entre o modelo de custo ou de mercado ou modelo de custo histórico) ocultam ou retardam a divulgação de informações importantes e produzem decisões de mercado ineficientes" (Shaffer, 2010, p. 4).

Não obstante os benefícios atribuídos ao valor justo, seu uso é relativamente limitado, pois é utilizado somente quando estimativas confiáveis estão disponíveis a um custo reduzido e quando transmitem informações sobre o desempenho operacional da entidade (Christensen & Nikolaev, 2013). Os críticos do valor justo afirmam que sua utilização "pode aumentar a volatilidade do lucro, minar a confiança pública e afetar a estabilidade econômica" (Shaffer, 2010, p. 4). Segundo Shaffer (2010), os críticos afirmam, também, que os valores justos podem não ter nenhuma relação com os fluxos de caixa esperados ou com a economia; podem conter determinantes advindos do sentimento do mercado e não de fundamentos ou condições econômicas.

Ademais, normalmente, as PPI são avaliadas anualmente por avaliadores externos e esses valores são refletidos nos relatórios contábeis das entidades (Nellessen & Zuelch, 2011Nellessen, T., Zuelch, H. (2011). The reliability of investment property fair values under. Journal of Property Investment and Finance, 29(1), 59-73.). Para Nellessen e Zuelch (2011), esse processo de avaliação a valor justo das PPI faz surgir, na comunidade profissional e acadêmica, um considerável ceticismo sobre a confiabilidade da avaliação desses imóveis. Segundo esses autores, a literatura indica que as avaliações são propensas a incertezas e inseguranças devido a uma série de características do avaliador.

Para Freri e Salotti (2013)Freri, M. R., & Salotti, B. M. (2013). Comparabilidade de empresas administradoras de shopping centers do mercado de capitais brasileiro. Revista de Contabilidade do Mestrado em Ciências Contábeis da UERJ, 18(1), 28-45., fatores como a flutuação do mercado, especialmente em períodos de crise, a necessidade de conhecimentos específicos (como os de engenharia civil) e o subjetivismo no julgamento do avaliador são alguns dos fatores que podem levar a uma mensuração inadequada do valor justo das PPI. A própria natureza humana dos avaliadores externos, a maneira como é conduzido o processo de avaliação e a essência e funcionamento do mercado imobiliário colaboram para o aumento da probabilidade de obtenção de valores justos tendenciosos (Nellessen & Zuelch, 2011).

2.5 Estudos Anteriores

Dietrich et al. (2001) investigaram 76 entidades do Reino Unido, nos períodos de 1988 a 1996, visando a identificar a confiabilidade das estimativas anuais de valor justo em PPI. Constataram que as estimativas de valor justo têm valores, em média, 6% menores que os preços reais de venda dos imóveis, indicando uma tendência conservadora nos julgamentos dos avaliadores. Todavia, os autores afirmam que as estimativas de valor justo são medidas de preço de venda consideravelmente menos tendenciosas e mais precisas que seus respectivos custos históricos. Ao investigar os critérios gerenciais, verificaram que a existência de escolhas contábeis permite que os gestores optem por métodos que proporcionem, por exemplo, lucros mais elevados, o que enseja oportunidades para gerenciamento de resultados. Descobriram, também, que a confiabilidade da estimativa de valor justo aumenta quando monitorada por auditoria externa, especialmente se essa auditoria for realizada por empresas conhecidas na ocasião como "big six": Arthur Andersen, Coopers & Lybrand, Deloitte & Touche, Ernst & Young, KPMG Peat Marwick e Price Waterhouse.

Também com foco na confiabilidade de mensuração, Muller III e Riedl (2002) buscaram evidências de que as diferenças de confiabilidade de estimativas de avaliadores profissionais, devido ao uso de monitores externos, afetaram a assimetria informacional de investidores e, portanto, o custo de capital. Utilizando uma amostra de 64 empresas do Reino Unido, no período de 1990 a 1999, os autores apontam que os agentes de mercado percebem menor assimetria informacional por meio dos investidores para empresas que utilizam avaliadores externos em comparação àquelas que utilizam avaliadores internos para avaliação posterior de PPI.

Demaria e Dufour (2007) estudaram a adoção pela primeira vez das IFRS, em 107 entidades francesas, em 2005, sob a perspectiva das escolhas contábeis relativas à avaliação ao valor justo. Quanto às PPI (IAS 40), das 33 entidades que as reconheciam, 9 optaram pelo método do valor justo e 24 pelo método de custo, constatando uma forte tendência conservadora nos relatórios contábeis das entidades francesas. Por meio de uma regressão logística, os autores verificaram que, para as empresas estudadas, a adoção do valor justo não está relacionada a nenhuma das características analisadas, sendo elas: tamanho da entidade, alavancagem financeira, remuneração dos gestores e estrutura de ações ordinárias detidas por bancos, seguradoras ou fundos de investimentos.

Muller et al. (2008) examinaram as causas e consequências da escolha dos gestores entre o método do valor justo e do custo em PPI, de 133 entidades de 15 países europeus, em 2005. Das entidades analisadas, 27 optaram pelo método de custo e 106 pelo do valor justo. Os autores encontraram evidências de que as entidades que escolheram o valor justo são aquelas cujas: (i) normas locais (pré-IFRS) permitiam ou exigiam esse método de avaliação no balanço patrimonial; (ii) propriedades eram mais dispersas; e/ou (iii) entidades buscavam maior transparência nas demonstrações contábeis. Notaram, também, evidências de oportunismo por parte das entidades que avaliaram suas PPI a valores justos, pois estas apresentaram lucros mais altos, menor assimetria informacional e liquidez mais elevada, quando comparadas às entidades que avaliaram esses ativos pelo método do custo.

Com foco no poder informativo e utilizando uma amostra de 446 empresas do setor imobiliário e 915 fundos de investimento, nos períodos de 1993 a 2002, Danbolt e Rees (2008)Danbolt, J., & Rees, W. (2008). An experiment in fair value accounting: UK investment vehicles. European Accounting Review, 17(2), 271-303. constataram que o lucro ao valor justo é consideravelmente mais relevante que o lucro ao custo histórico, embora essa relevância possa ser transmitida por meio dos valores dos ativos e não necessite que o valor justo seja incorporado à mensuração do lucro. Na mesma linha de investigação da relevância da informação do valor justo vis-à-vis o custo histórico, Lourenço (2009) apontou que os números contábeis foram mais relevantes para as empresas europeias do setor imobiliário componentes da amostra que mensuraram os investimentos em propriedades ao valor justo do que aquelas que utilizaram o modelo de custo.

Nellessen e Zuelch (2011) analisaram a confiabilidade das estimativas de valor justo na avaliação de PPI, em 76 empresas europeias, nos períodos de 2005 a 2007. Para tanto, examinaram a associação entre o patrimônio líquido e o valor de mercado dessas entidades. Os resultados mostraram que há divergência entre esses valores e que esses desvios podem advir: (i) da falta de confiança na estimativa dos valores justos das PPI em virtude das limitações na avaliação; (ii) da diversidade de abordagens aplicadas na avaliação das PPI; e (iii) de problema de confiabilidade nas abordagens de modelos geralmente aplicados na determinação do valor justo das PPI.

Cairns et al. (2011) investigaram o uso da mensuração a valor justo em 228 empresas listadas no Reino Unido e na Austrália, na época da adoção inicial das IFRS, em 2005. Quanto às PPI (IAS 40), das 23 entidades que as reconheciam, 17 optaram pelo método do valor justo e 6 pelo método de custo. Os autores constataram que, em relação à IAS 40, a comparabilidade dentro e entre os países diminuiu significativamente, pois algumas empresas do Reino Unido utilizaram a opção disponível nessa norma.

Christensen e Nikolaev (2013) estudaram a escolha contábil valor justo versus custo histórico em ativos não financeiros (intangível, imobilizado e PPI) de entidades, em conformidade com as IFRS, em 2005 ou em 2006, sendo 703 companhias abertas do Reino Unido e 605 da Alemanha. No geral, constataram um uso muito limitado de avaliação pelo método do valor justo, indicando que "apesar de seus méritos conceituais, é improvável que o valor justo se torne o método de avaliação primário para ativos não financeiros ilíquidos em uma base voluntária" (Christensen & Nikolaev, 2013, p. 734).

Freri e Salotti (2013) analisaram a comparabilidade de 6 companhias abertas brasileiras, administradoras de shopping centers, que possuíam saldo de PPI, nos períodos de 2010 e 2011. Buscaram verificar quais entidades avaliaram esses ativos pelo método de custo e quais pelo método do valor justo, além de verificar se essas empresas seguiram as divulgações obrigatórias contidas na IAS 40. Os autores constataram que apenas 2 entidades avaliaram suas PPI pelo método do valor justo nos 2 anos analisados e que nenhuma empresa obedeceu, completamente, aos requisitos de divulgação obrigatória contidos na norma.

Por fim, Andrade, Silva e Malaquias (2013)Andrade, M. E. M. C., Silva, D. M., & Malaquias, R. F. (2013). Escolhas contábeis em propriedades para investimento. Revista Universo Contábil, 9(3), 22-37. investigaram as escolhas contábeis em PPI de 39 companhias abertas brasileiras listadas na BM&FBOVESPA, em 2009 e 2010. Identificaram que, das entidades que compuseram a amostra, 44% adotaram o método do valor justo e 56% o método de custo. Ficou evidenciado, também, que nenhuma das variáveis selecionadas para o estudo - tamanho do ativo, endividamento, nível de governança corporativa e rentabilidade sobre o patrimônio líquido (return on equity - ROE) - apresentou relação estatisticamente significativa com o método de avaliação escolhido pelas entidades.

De modo geral, os estudos sobre valor justo apontam uma melhor capacidade informativa em relação ao custo histórico. Apesar desses benefícios, os pesquisadores identificam uso limitado do valor justo e certo nível de desconfiança quanto à forma de mensuração, provavelmente em função dos estudos focarem o primeiro ano de adoção das IFRS. Fatores explicativos para a opção pelo valor justo também sinalizam o gerenciamento de resultados por meio do maior poder de discricionariedade dos gestores em sua escolha. Entretanto as pesquisas não são conclusivas e mais estudos são necessários, principalmente contemplando períodos maiores e mais distantes da primeira adoção das IFRS.

3 ASPECTOS METODOLÓGICOS

3.1 Definição da Amostra e Coleta de Dados

A amostra da pesquisa foi composta por 73 companhias abertas, sendo 50 brasileiras e 23 portuguesas, para os exercícios de 2010 a 2012. A identificação das entidades brasileiras e seus respectivos saldos de PPI foi realizada por meio do programa Economática (r) e a busca pelas notas explicativas se deu no site da BM&FBOVESPA. Por outro lado, a identificação das entidades portuguesas foi realizada por meio do site da NYSE Euronext Lisbon, e a busca dos saldos das contas de PPI e das notas explicativas deu-se no site da Comissão de Mercado de Valores Mobiliários (CMVM) de Portugal.

Em 2013, foram arroladas 378 companhias abertas brasileiras, das quais 328 não possuíam saldos de PPI em 2010, 2011 e/ou 2012. Assim, 50 entidades do Brasil compuseram a amostra do estudo. Em relação a Portugal, em 2013, foram identificadas 54 entidades listadas em bolsa. Destas, 31 não possuíam saldo de PPI em 2010, 2011 e/ou 2012, o que fez com que a amostra de empresas portuguesas fosse constituída por 23 companhias abertas.

3.2 Cálculo do Índice de Comparabilidade

Para medir o grau de comparabilidade das escolhas contábeis entre as entidades e os países, foi utilizado o cálculo do índice T (T index), cuja Equação 1 consta em Taplin (2004, p. 61):

onde T index representa o grau de comparabilidade; αkl é o coeficiente de comparabilidade entre os métodos de contabilidade k e l; βij é a ponderação para a comparação entre empresas dos países i e j; ρki é a proporção de empresas do país i que utilizam o método contábil k; ρlj é a proporção de empresas do país j que utilizam o método contábil l; N é a quantidade de países analisados; e M é a quantidade de métodos contábeis analisados (Taplin, 2004).

O índice varia entre 0 e 1, onde 0 representa uma desarmonia completa entre as demonstrações financeiras das entidades e 1 representa uma completa harmonia (Taplin, 2004). O T index pode ser interpretado como a probabilidade de duas empresas, selecionadas aleatoriamente (com reposição), apresentarem as mesmas práticas contábeis (Taplin, 2004).

A fim de interpretar o grau de comparabilidade nacional (de cada país separadamente) e internacional (dos dois países conjuntamente) das escolhas contábeis em PPI, utilizou-se a escala que consta em Souza, Silva e Costa (2013)Souza, F. E. A., Silva, M. H., & Costa, P. S. (2013). A comparabilidade das escolhas contábeis na avaliação de ativos intangíveis de companhias abertas brasileiras. In 16º Seminários em Administração, São Paulo, SP. Recuperado de http://semead6.tempsite.ws/16semead/resultado/trabalhosPDF/554.pdf
http://semead6.tempsite.ws/16semead/resu...
, ilustrada na Tabela 2.

Tabela 2
Interpretação do índice T

O cálculo dos índices T nacional e T internacional foi realizado por meio do programa T-Index Calculator 1 1 Programa elaborado e cedido pelo criador do índice, o professor Ross H. Taplin, a quem agradecemos. . Foi utilizada a modalidade 1(a)2(a)3(a)4(a), ou seja: (i) ponderação empresa/país: os países foram ponderados, para apresentar pesos iguais, considerando que o país recebe peso proporcional ao número de empresas da amostra de cada país; (ii) foco internacional: as comparações são realizadas entre todas as entidades, independentemente do país ao qual pertencem (foco geral); (iii) várias políticas contábeis: múltiplas políticas contábeis não são permitidas; e (iv) não divulgação: as entidades que não divulgaram o método contábil adotado foram excluídas da amostra e do cálculo do índice (Taplin, 2010).

3.3 Modelo Logit

Com o intuito de examinar empiricamente se características específicas das entidades afetam suas escolhas contábeis, foram levantadas algumas variáveis explicativas, já analisadas, em parte, nos estudos de Demaria e Dufour (2007), Jaafar e Mcleay (2007)Jaafar, A., & Mcleay, S. (2007). Country effects and sector effects on the harmonization of accounting policy choice. Abacus, 43(2), 156-189., Muller et al. (2008), Lourenço (2009), Lorencini e Costa (2012)Lorencini, F. D., & Costa, F. M. (2012). Escolhas contábeis no Brasil: identificação das características das companhias que optaram pela manutenção versus baixa dos saldos do ativo diferido. Revista Contabilidade e Finanças, 23(58), 52-64. e Andrade et al. (2013). As entidades que não divulgaram sua política de avaliação de PPI foram excluídas da amostra, porém, apenas no exercício para o qual não houve evidenciação. Assim, as variáveis que compuseram o modelo são apresentadas na Tabela 3.

Tabela 3
Variáveis do modelo

Note-se que a variável dependente (EC) assume apenas dois valores, o que torna necessária a utilização de modelos de escolha qualitativa binária, como os modelos de probabilidade linear (MPL), Probit e Logit. Optou-se pelo modelo Logit, pois, como afirmam Johnston e DiNardo (2001)Johnston, J., & Dinardo, J. (2001). Métodos econométricos (4a ed.). Lisboa: McGraw-Hill.: (i) aparentemente na prática, existe pouca diferença entre esses três modelos, pelo que seria indiferente suas escolhas; (ii) o MPL tem como deficiência que os valores preditos não estão restritos ao intervalo (0,1), devendo seu uso ser evitado em algumas situações; e (iii) os testes de especificação nos modelos Logit são de aplicação mais prática e fácil. Ademais, foi realizada uma simulação com o método Probit, e constatou-se que os resultados das estatísticas foram praticamente os mesmos.

A estrutura geral dos modelos Logit é baseada na análise de probabilidades. Partindo de uma representação proposta por Johnston e DiNardo (2001), pode-se ilustrar a ideia do modelo adotado, conforme a Equação 2:

onde Y é a escolha das entidades brasileiras e portuguesas quanto ao método de avaliação posterior de PPI, sendo igual a 1 caso a opção exercida seja valor justo e 0 caso seja custo. X representa a matriz de variáveis explicativas elencadas na Tabela 3: SET, LIST, BF, PAIS, TAM, ENDIV, ROE, RELEV, LL e T. β é o conjunto de parâmetros que reflete o impacto das mudanças em X na probabilidade de determinada entidade optar pelo método do valor justo. F é a função de distribuição logística que transforma um modelo adequado Xβ em um intervalo entre 0 e 1. Nesse caso, pode-se reescrever o modelo de acordo com Equação 3:

Considerando uma amostra iid, a estimação dos parâmetros (β) desse modelo é obtida pela maximização da função do logaritmo de verossimilhança (Equação 4):

Os ajustes do modelo foram averiguados por meio de três testes: (i) para avaliar se há diferenças significativas entre as frequências observadas e as previstas, utilizou-se o teste Hosmer-Lemeshow; (ii) para verificar as medidas de sensitividade, especificidade e o percentual de acerto do modelo, foi utilizada a tabela de classificação; e (iii) para medir a capacidade do modelo para discriminar as categorias da variável dependente, recorreu-se à curva Receiver Operating Characteristic (ROC).

4 ANÁLISE DOS DADOS

4.1 Resultados para o Cálculo da Comparabilidade

Para o cálculo do grau de comparabilidade entre empresas do Brasil, de Portugal e entre os dois países, primeiro, foram analisadas as notas explicativas de cada empresa de cada país, identificando as escolhas contábeis quanto à mensuração após o reconhecimento inicial de PPI, cujo resultado é ilustrado na Tabela 4.

Tabela 4
Escolhas contábeis em PPI

Quanto ao Brasil, percebeu-se que as entidades ainda não têm evidenciado as informações obrigatórias sobre PPI em suas notas explicativas, apesar dessa não divulgação ter-se reduzido com o passar dos exercícios sociais verificados. Os resultados desta pesquisa corroboram os achados do estudo de Freri e Salotti (2013), que constataram que, entre todas as empresas brasileiras analisadas por eles em 2010 e 2011, nenhuma cumpriu completamente os requisitos de divulgação obrigatórios contidos na IAS 40. Em relação a Portugal, apenas uma entidade não divulgou sua política de avaliação posterior de PPI, e somente em 2010 e 2011. Em 2012, todas as entidades portuguesas evidenciaram se optaram pelo método de custo ou valor justo na avaliação de suas PPI reconhecidas.

Em relação às escolhas contábeis divulgadas, embora se perceba um aumento no número de entidades que optaram pelo método do valor justo, ao longo dos períodos em análise, as empresas brasileiras ainda mantêm preferência pelo método do custo. Esse resultado confirma as evidências encontradas nos estudos de Freri e Salotti (2013) e Andrade et al. (2013), que, ao examinar empresas brasileiras, identificaram, respectivamente, que 66,67% e 56% das entidades analisadas escolheram o método de custo para avaliação posterior de PPI.

Nas entidades pertencentes a Portugal, averiguou-se certo equilíbrio entre os dois métodos possíveis para avaliação posterior de PPI. As entidades portuguesas têm optado tanto pelo método do valor justo como pelo método do custo, de modo equivalente, e essa escolha tem permanecido com o passar do tempo. Esses achados contrariam os resultados da pesquisa de Christensen e Nikolaev (2013), que, ao observar as escolhas contábeis em ativos não financeiros de entidades europeias em 2005 e 2006, constataram que, de forma voluntária, é improvável que o valor justo se torne o método de avaliação primário para ativos não financeiros ilíquidos, a exemplo das PPI.

Partindo para a análise do grau de comparabilidade dos países internamente e entre eles, calculou-se o índice T nacional para Brasil e para Portugal, isoladamente, e, depois, calculou-se o índice T internacional para os dois países, como demonstrado na Tabela 5.

Tabela 5
Grau de comparabilidade (Índice T) em PPI

Para o caso brasileiro, percebe-se uma comparabilidade média (quase baixa) das demonstrações contábeis e com valores decrescentes ao longo dos períodos analisados. Isso evidencia que, em relação às PPI, a comparabilidade das informações contábeis das entidades brasileiras tem diminuído a cada exercício social. Por exemplo, em 2010, se duas entidades do Brasil forem selecionadas aleatoriamente, há 52,25% de chance de que elas tenham optado pelo mesmo método contábil quanto à avaliação posterior em PPI; em 2011, 51,02% de chance; e em 2012, 50,55%.

Assim como no Brasil, Portugal também apresentou uma comparabilidade média em relação às PPI, com valores bem próximos a uma comparabilidade baixa, porém, com valores praticamente estáveis ao longo do tempo. A comparabilidade média (quase baixa) das demonstrações contábeis se deu em virtude das entidades portuguesas optarem tanto pelo método do custo como pelo método do valor justo de forma equitativa. Por exemplo, em 2010 e/ou em 2011, se duas entidades de Portugal forem selecionadas de modo aleatório, há 50,00% de chance de que elas tenham optado pelo mesmo método contábil para avaliação posterior de PPI.

Quanto à comparabilidade entre as demonstrações contábeis de companhias do Brasil e de Portugal (comparabilidade internacional), identificou-se que esta é média, também com valores próximos a uma comparabilidade baixa. Isso ocorreu devido ao fato de que, internamente, esses dois países se dividem entre as duas políticas contábeis válidas, o que, em consequência, faz com que essa diversidade persista quando a comparação é realizada entre suas entidades, conjuntamente.

4.2 Resultados para a Análise do Modelo Logit

Apresentar apenas os coeficientes da regressão não é útil, exceto se se estiver interessado apenas em seu sinal e em sua significância (Hosmer & Lemeshow, 2000Hosmer, D. W., & Lemeshow, S. (2000). Applied logistic regression (2a ed.) . New York: John Wiley & Sons.). Nesse sentido, é interessante, a partir dos coeficientes do modelo final, computar seus efeitos marginais, que, no caso em questão, possibilitam avaliar o impacto na probabilidade das entidades optarem pelo método do valor justo (Y = 1), em virtude de alterações nas variáveis independentes. A Tabela 6 apresenta o resumo dos resultados.

Tabela 6
Resumo do modelo Logit com efeitos marginais

Quanto à verificação se o setor de atuação da entidade interfere na escolha do método de avaliação posterior em PPI, tem-se que os parâmetros dos setores de consumo não cíclico, materiais básicos, telecomunicações e utilidade pública não foram estimados, em virtude das escolhas contábeis para cada setor terem sido as mesmas para ambos os países. Ou seja, todas as entidades dos setores de consumo não cíclico e utilidade pública escolheram o método do valor justo e todas as entidades dos setores de materiais básicos e telecomunicações optaram pelo método de custo.

Ainda em relação aos setores de atuação das entidades da amostra, percebeu-se que apenas dois setores influenciam as decisões dos gestores: consumo cíclico e imobiliário. Pela análise de seu efeito marginal, tem-se que o fato da entidade pertencer a esses setores reduz em 34,74% (para o setor de consumo cíclico) e 35,28% (para o setor imobiliário) a probabilidade de opção pelo método do valor justo.

Ao examinar se as variáveis status de listagem, big four, país, tamanho da entidade, endividamento, ROE, relevância, lucro líquido e tempo interferem nas decisões dos gestores, constatou-se que apenas as variáveis status de listagem, tamanho da empresa, ROE e tempo não são estatisticamente significativas. Esses achados confirmam as constatações de Demaria e Dufour (2007) e Andrade et al. (2013), de que a adoção do valor justo não está relacionada com o tamanho da entidade e com o ROE, e de Jaafar e Mcleay (2007), de que o tempo não interfere no uso do método do valor justo. Entretanto, esses achados confrontam os resultados dos estudos de Jaafar e Mcleay (2007), que identificaram que o status de listagem é um fator determinante para o uso do valor justo.

Em relação à variável BF, verificou-se que o fato da entidade ser auditada por uma big four reduz em 18,67% a probabilidade de optar pelo método do valor justo. Para a variável país, tem-se que o fato da entidade pertencer ao Brasil reduz em 60,9% a probabilidade de que a empresa opte pelo método do valor justo. É importante salientar que, além dos fatores internos de cada país, o fato do Brasil, antes da adoção das IFRS, não permitir a avaliação de PPI pelo valor justo, pode ter sido um dos fatores explicativos para tal resultado. Essa provável explicação tem por base o estudo de Muller et al. (2008), que encontraram evidências de que as entidades que optam pela utilização do valor justo tendem a ser aquelas cujas normas locais permitiam ou exigiam esse método de avaliação.

Quanto à variável endividamento, constatou-se que o fato da empresa estar endividada aumenta em 22,58% a probabilidade de que escolha o método do valor justo para avaliação posterior de PPI. Esses resultados corroboram os achados da pesquisa de Christensen e Nikolaev (2013) que encontraram que o endividamento da empresa está positivamente associado à escolha pelo método do valor justo.

No que tange à variável relevância, constatou-se que quanto maior a importância das PPI em relação ao ativo total, maior é a probabilidade de que a empresa opte pelo método do valor justo. Verificou-se, também, que o fato da entidade apresentar prejuízo no período reduz em 19,71% a probabilidade de opção pelo método do valor justo na avaliação posterior de PPI. Esse resultado pode indicar que, para as empresas brasileiras e portuguesas, a escolha do método do valor justo pode ser justificada por inúmeros motivos, mas não o de, diretamente, melhorar seus resultados.

A fim de detectar se existe associação entre os valores observados e estimados, recorreu-se ao teste de Hosmer-Lemeshow. No nível nominal de significância de 5%, verifica-se que existe associação entre os valores observados e previstos, ou seja, o modelo Logit, proposto conforme a Tabela 6, pode ser considerado de bom ajuste (valor p > 0,05). Para analisar o percentual de acerto do modelo aplicado, foi elaborada sua tabela de classificação (Tabela 7).

Tabela 7
Classificação do modelo

No que tange à sensitividade, ou seja, o total de acertos que o modelo tem em relação ao evento de interesse (escolha do gestor por avaliar suas PPI pelo método do valor justo), constata-se que o modelo classifica corretamente 70% das entidades que optaram pelo valor justo. Todavia, em relação à especificidade, isto é, o total de acertos que o modelo tem em relação ao não evento de interesse (escolha do gestor em avaliar suas PPI pelo método do custo), tem-se que o modelo classifica corretamente 78,38% das entidades que optaram pelo método do custo. Por conseguinte, tem-se que, de modo geral, o modelo Logit aplicado conseguiu classificar corretamente 74,31% das observações analisadas.

Por fim, para medir a capacidade do modelo logístico para discriminar as categorias da variável dependente, utilizou-se a curva ROC, cuja área foi 0,8197. Portanto, como a área do modelo possui valor entre 0,8 e 0,9, pode-se inferir que o modelo em questão apresenta um poder discricionário excelente (Hosmer & Lemeshow, 2000).

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este estudo teve por objetivo verificar o grau de comparabilidade das escolhas contábeis dos gestores em relação à mensuração após o reconhecimento inicial das PPI prevista na IAS 40, assim como identificar quais características das empresas poderiam ser consideradas fatores explicativos para o nível de comparabilidade encontrado.

Para alcançar o objetivo proposto, foram analisadas as companhias abertas listadas na BM&FBOVESPA e na NYSE Euronext Lisbon, em 2013, no horizonte temporal de 2010 a 2012. Para identificar o grau de comparabilidade, foi utilizado o índice T de Taplin e para a identificação das características das empresas como fatores explicativos foi estimado um modelo Logit.

Na etapa de identificação do grau de comparabilidade das demonstrações contábeis do Brasil e de Portugal, verificou-se uma comparabilidade internacional média, com valores próximos a uma comparabilidade baixa, motivada pelo fato de que ambos os países se dividem entre as duas políticas contábeis válidas, o que impacta a comparabilidade desses países. Além disso, o grau de comparabilidade entre os dois países tem diminuído ao longo dos exercícios sociais analisados. Desse modo, não se aceita H0, pois as companhias abertas brasileiras e portuguesas, no que tange à avaliação posterior de PPI, não são altamente comparáveis, mesmo com as similaridades ambientais entre os dois países.

Quanto à comparabilidade nacional, constatou-se que as entidades brasileiras ainda não evidenciam, de modo completo, as informações obrigatórias sobre PPI, embora essa deficiência tenha melhorado levemente com o passar dos anos observados. Percebeu-se, também, que houve uma comparabilidade média (próximo à baixa) entre suas demonstrações contábeis, com valores decrescentes ao longo dos períodos, com uma preferência pela escolha do método de custo, entretanto, com tendência para adoção do método do valor justo.

Em relação a Portugal, diferentemente do caso brasileiro, observou-se melhor nível de disclosure sobre a avaliação posterior de PPI, bem como certo equilíbrio entre os dois métodos válidos de avaliação posterior. Este último fato fez com que, de modo semelhante ao caso brasileiro, Portugal apresentasse uma comparabilidade média, com valores próximos a uma comparabilidade baixa.

Dessa maneira, os resultados obtidos indicam que, mesmo diante das escolhas contábeis permitidas pela IAS 40, há comparabilidade entre as práticas contábeis de empresas brasileiras e portuguesas, em todos os períodos observados nesta pesquisa. Outro ponto importante a ser relatado é que, apesar de possuir maior experiência com as IFRS, Portugal apresentou índices de comparabilidade menores que os expostos pelo Brasil. Nesse sentido, infere-se que a experiência com as IFRS não necessariamente garante uma maior comparabilidade das práticas contábeis.

Em referência às características das empresas percebidas como fatores explicativos às escolhas contábeis dos gestores, identificou-se que big four, país, endividamento, relevância do saldo de PPI e lucro líquido apresentaram índices estatisticamente significativos, ou seja, influenciam a escolha dos gestores em relação à avaliação posterior de PPI. Assim, constatou-se que o fato da entidade ser auditada por uma big four reduz a probabilidade de optar pelo método do valor justo em 18,67%, o que denota que os auditores das consideradas big four podem influenciar de modo conservador seus clientes no reporte de PPI.

Em relação à variável país, verificou-se que o fato da entidade pertencer ao Brasil reduz a probabilidade de que a empresa opte pelo método do valor justo em 60,90%. Além dos fatores intrínsecos de cada nação ou de cada empresa, o fato do Brasil não ter permitido o uso do método do valor justo antes da adoção das IFRS (mas Portugal, sim) pode ser um dos fatores que justificam esse resultado.

Quanto ao endividamento, o fato da empresa estar endividada aumenta em 22,58% a probabilidade de que ela escolha o método do valor justo. Esse resultado sugere que o interesse em saldar dívidas influencia a escolha contábil dos gestores por utilizar o valor justo como método de avaliação de PPI. Contrariamente, quando se verifica o lucro líquido, tem-se que o fato da empresa ter apresentado prejuízo no exercício não influencia a escolha contábil dos gestores pelo método do valor justo. Nesse caso, reduz-se em 19,71% a probabilidade de que essas entidades optem por esse método.

Para a variável relevância constatou-se que quanto maior o saldo de PPI em relação ao ativo total, maior a probabilidade da entidade escolher o método do valor justo em sua avaliação posterior. No que diz respeito aos setores de atuação, constatou-se que todas as entidades pertencentes aos setores de consumo não cíclico e utilidade pública escolheram o método do valor justo e todas as entidades pertencentes aos setores de materiais básicos e telecomunicações optaram pelo método de custo. Em decorrência disso, esses setores não tiveram seus parâmetros estimados pelo modelo.

Ademais, identificou-se que os únicos setores que apresentaram influência significativa sobre as decisões dos gestores foram o de consumo cíclico e o imobiliário. Os resultados denotaram que o fato da entidade pertencer ao setor de consumo cíclico reduz em 34,74% as chances de opção pelo método do valor justo e que as empresas pertencentes ao setor imobiliário reduzem em 35,28% a probabilidade de opção pelo método do valor justo.

Os resultados encontrados nesta pesquisa contribuem com a literatura internacional, ao complementar estudos anteriores (Muller et al., 2008; Cairns et al., 2011; Andrade et al., 2013; Christensen & Nikolaev, 2013; Freri & Salotti, 2013; Haller & Wehrfritz, 2013Haller, A., & Wehrfritz, M. (2013). The impact of national GAAP and accounting traditions on IFRS policy selection: evidence from Germany and the UK. Journal of International Accounting, Auditing and Taxation, 22, 39-56.; Souza et al., 2013), identificando que, mesmo com a existência de escolhas contábeis na IAS 40, há comparabilidade entre as demonstrações contábeis das entidades do Brasil e de Portugal.

O estudo também contribui com a literatura ao se valer do Índice T, pouco explorado em pesquisas contábeis, assim como ao apresentar fatores explicativos às escolhas contábeis dos gestores, remetendo a futuras possibilidades de pesquisas acerca da comparabilidade das informações financeiras. Com a prática contábil, a pesquisa colabora ao sinalizar aos usuários o nível de comparabilidade das práticas contábeis entre empresas ao longo do tempo, bem como entre países. Aos órgãos à frente do processo de convergência contábil, espera-se remeter evidências de que há um grau médio de comparabilidade entre as demonstrações contábeis em relação às PPI, bem como alertá-los quanto ao fato de haver uma redução dessa comparabilidade ao longo dos períodos analisados.

Esta pesquisa é limitada quanto à generalização dos resultados, uma vez que a investigação empírica ocorreu apenas em dois países e exclusivamente com PPI. Para futuras pesquisas, sugere-se ampliar o número de países analisados, com vistas a verificar se, de fato, a comparabilidade aqui encontrada se aplica a um número maior de países. Ampliar o número de normas contábeis a ser observadas também se torna oportuno, a fim de identificar a comparabilidade das demonstrações financeiras a partir de um número maior de escolhas contábeis válidas.

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  • *
    Artigo apresentado no 8º Congresso da Associação Nacional de Programas de Pós-Graduação em Ciências Contábeis (ANPCONT), Rio de Janeiro, RJ, agosto de 2014.
  • 1
    Programa elaborado e cedido pelo criador do índice, o professor Ross H. Taplin, a quem agradecemos.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Jul 2015
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2015

Histórico

  • Recebido
    13 Maio 2014
  • Aceito
    19 Jan 2015
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