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Caracterização da dor em pacientes onco-hematológicos e sua associação com a analgesia

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

Entende-se que diante da crescente incidência no diagnóstico de câncer, deve-se intensificar a qualidade da assistência oferecida a esses pacientes, com o intuito de melhorar a qualidade de vida e amenizar o sofrimento dos pacientes e dos familiares. A assistência de enfermagem deve ser aprimorada e focada na avaliação da dor do paciente oncológico, para facilitar a caracterização da dor e, consequentemente, melhorar o tratamento multiprofissional. O objetivo deste estudo foi caracterizar a dor dos pacientes onco-hematológicos e associar com a analgesia ofertada.

MÉTODOS:

Estudo descritivo, prospectivo, longitudinal, desenvolvido com 20 pacientes que apresentaram diagnóstico de doença onco-hematológica e que estivesse internado na unidade de hematologia do Hospital Universitário Walter Cantídeo. Foram aplicadas as escalas analógicas visual e numérica da dor, multidimensional de avaliação de dor e o questionário de McGill.

RESULTADOS:

A principal causa de dor foi por infecção intestinal. Prevaleceu a dor aguda e que durava o dia todo. Pela escala multidimensional de avaliação de dor o descritor agudo mais relatado foi profundo e do crônico persistente. A palavra mais citada no McGill foi insuportável, com a categoria avaliativa sendo a mais utilizada. Na avaliação da analgesia, percebeu-se que 13 das 20 prescrições médicas estavam incompatíveis com as recomendações da Organização Mundial da Saúde.

CONCLUSÃO:

As escalas são de extrema importância na mensuração e caracterização da dor. A enfermagem deve estar à frente na sua implantação e utilização nas unidades hospitalares, de maneira especial nas oncológicas pela alta incidência desse sintoma.

Descritores:
Analgesia; Dor; Enfermagem; Escalas; Oncologia

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

It is understood that in light of the increasing number of cancer diagnoses, one should intensify the quality of assistance offered to those patients, aiming at improving quality of life and minimizing suffering of patients and their relatives. Nursing assistance should be enhanced and focused on cancer patients' pain evaluation, to help pain characterization and, as a consequence, to improve multiprofessional assistance. This study aimed at characterizing onco-hematologic patients' pain and at associating it to offered analgesia.

METHODS:

This is a descriptive, prospective and longitudinal study developed with 20 patients with onco-hematologic disease admitted to the hematology unit, Hospital Universitário Walter Cantídeo. Visual analog scale and pain numerical scale were applied, in addition to multidimensional pain evaluation scale and McGil questionnaire.

RESULTS:

Primary cause of pain was intestinal infection. Acute pain lasting the whole day has prevailed. According to multidimensional pain evaluation scale, most commonly reported acute descriptor was deep, and of chronic persistent. Most commonly mentioned word of McGill questionnaire was unbearable, being the evaluative category the most commonly used. When evaluating analgesia, it was noted that 12 out of 20 medical prescriptions were incompatible with World Health Organization recommendations.

CONCLUSION:

Scales are extremely important to measure and characterize pain. The nursing team should be at the front for its implementation and use in hospital units, especially in cancer units due to the high incidence of this symptom.

Keywords:
Analgesia; Nursing; Oncology; Pain; Scales

INTRODUÇÃO

Dor é uma experiência sensorial e emocional indesejada associada com lesão real ou potencial do tecido, ou descrita em termos de tal lesão. Tem características subjetivas, pois aquilo que a pessoa que a sente diz que é, e existindo sempre que a pessoa assim afirmar. No entanto, a impossibilidade de o individuo expressar-se verbalmente não nega a possibilidade de estar vivenciando a dor e necessitar de tratamento e alívio11 Merskey H, Bogduk DN. A current list with definitions and notes on usage. In: Classification of Chronic Pain. Seattle: IASP Press; 2012. 207-214p..

Uma das maiores causas de incapacidade e sofrimento para pacientes com câncer em progressão é a dor, constatando que cerca de 80% desses casos experimentarão algum tipo de dor. Em aproximadamente 20% de pacientes com doença oncológica a dor pode ser relacionada ao tratamento, sendo este cirúrgico, quimioterápico ou radioterápico, mas também pode ser causada diretamente pelo tumor, ou por motivos não relacionados ao câncer como as alterações metabólicas, infecciosas, carenciais e degenerativas22 Rabelo ML, Borella ML. Papel do farmacêutico no seguimento farmacoterapêutico para o controle da dor de origem oncológica. Rev Dor. 2013;14(1):58-60..

A dor do câncer tem características de aguda e crônica. Como dor aguda, a dor de câncer está diretamente relacionada com lesão de tecido. A dor crônica também está associada a estimulações nociceptivas repetitivas que causam uma variedade de alterações no sistema nervoso central (SNC)33 Sousa FA, Pereira LV, Cardoso R, Hortense P. [Multidimensional pain evaluation scale. Rev Lat Am Enfermagem. 2010;18(1):3-10..

A experiência dolorosa e a sua interpretação são resultado da interrelação entre os componentes sensitivos, com os afetivos, cognitivos, neurovegetativos, neuroendócrinos e neuroimunológicos que se expressa frente à estimulação ou disfunção do sistema nociceptivo44 Teixeira MJ, Siqueira JTT, Alvarez FK. Fisiopatologia da dor/Glossário de Termos para Semiologia da Dor. In: Siqueira, JTT, Teixeira MJ. Organizadores. Dores orofaciais: diagnóstico e tratamento. São Paulo: Artes Médicas; 2012. 61-81p..

Dessa forma, todos os pacientes oncológicos devem ser avaliados quanto à presença e intensidade da dor pela equipe de enfermagem devido à sua proximidade com o paciente22 Rabelo ML, Borella ML. Papel do farmacêutico no seguimento farmacoterapêutico para o controle da dor de origem oncológica. Rev Dor. 2013;14(1):58-60.. Pois, na prática clínica a ausência de instrumentos para aferir a dor pode comprometer a qualidade da assistência, dificultando, assim, o diagnóstico e a conduta terapêutica corretos, além dos erros que podem advir de uma subavaliação55 Sallum, AM, Garcia DM, Sanches M. Dor aguda e crônica: revisão narrativa da literatura. Acta Paul Enferm. 2012;25(n.spe1):150-4..

Atualmente tem-se a escala analógica visual (EAV) ou numérica (EVN) da dor, na qual o paciente deve marcar a posição mais aproximada da intensidade da sua dor66 Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP). Manual de cuidados paliativos. Rio de Janeiro: Diagraphic; 2009. 320p.. Também, o questionário de Mc-Gill é um instrumento com padrão internacionalmente reconhecido e adaptado para o uso na língua portuguesa77 Costa AI, Chaves MD. Dor em pacientes oncológicos sob tratamento quimioterápico. Rev. Dor. 2012;13(1):45-9..

Existem outras maneiras tanto de avaliar, como de acompanhar o padrão da dor, para subsidiar, até mesmo a analgesia. Com essa finalidade, foi elaborada a escala multidimensional de avaliação de dor (EMADOR). A EMADOR é composta pela EVN, por descritores agudos (10) e descritores de dor crônica (10) e pela localização da dor do paciente33 Sousa FA, Pereira LV, Cardoso R, Hortense P. [Multidimensional pain evaluation scale. Rev Lat Am Enfermagem. 2010;18(1):3-10..

O enfermeiro tem papel fundamental na avaliação da dor aguda e crônica, em especial, no paciente oncológico. Normalmente é o primeiro profissional a perceber a dor do paciente, devendo ser o primeiro a buscar solução, junto à equipe multiprofissional. Para a enfermagem, a avaliação e a mensuração da dor são indispensáveis e úteis em todas as etapas do cuidado e da produção do conhecimento que, dentre outros objetivos, além de manuseio e monitoramento do paciente, possa determinar as características metrológicas apropriadas para os diferentes tipos de dor88 Botegga FH, Fontana RT. A dor como quinto sinal vital: utilização da escala de avaliação por enfermeiros de um hospital geral. Texto Contexto Enferm. 2010;19(2):283-90..

Diante da crescente incidência do diagnóstico de câncer, deve-se intensificar a qualidade da assistência, com o intuito de melhorar a qualidade de vida (QV) e amenizar o sofrimento dos pacientes e dos familiares.

Nesse sentido, o objetivo deste estudo foi caracterizar a dor dos pacientes onco-hematológicos e associá-la com a analgesia ofertada.

MÉTODOS

Estudo descritivo, prospectivo desenvolvido com 20 pacientes que apresentaram diagnóstico de doença onco-hematológica e que estivessem internados na unidade de hematologia do Hospital Universitário Walter Cantídio (HUWC), da Universidade Federal do Ceará, no período de agosto a novembro de 2013. A amostra foi de conveniência baseada na média mensal de 7 pacientes internados, dando um total de 28 pacientes no período de 4 meses de coleta. Destes apenas 20 pacientes foram os que se incluíram nos critérios de inclusão e exclusão da pesquisa.

Para inclusão no estudo foram selecionados pacientes adultos admitidos no setor de hematologia e que apresentassem relato verbal de dor, durante o período da coleta dos dados. Foram excluídos os pacientes com diagnóstico não conclusivo de doença onco-hematológica; os que abandonaram o tratamento durante a coleta dos dados ou os que foram transferidos para outro setor ou outro hospital; e aqueles que não possibilitaram ao menos quatro dias de acompanhamento pelas pesquisadoras.

Foi aplicado um instrumento composto por três partes: 1) caracterização da amostra quanto aos dados referentes à identificação, fatores sociais, aspectos clínicos da doença e ocorrência ou não de dor no dia da entrevista; 2) caracterização da dor foi realizada por meio de questionamentos como possível etiologia, quando iniciou a dor, a duração da dor, quais os fatores agravantes e se há interferência nas atividades habituais, além da aplicação da EVN66 Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP). Manual de cuidados paliativos. Rio de Janeiro: Diagraphic; 2009. 320p., EMADOR33 Sousa FA, Pereira LV, Cardoso R, Hortense P. [Multidimensional pain evaluation scale. Rev Lat Am Enfermagem. 2010;18(1):3-10. e do questionário de dor McGill99 Pimenta CAM, Mota DDCF, Cruz DALM. Dor e cuidados paliativos. São Paulo: Manole; 2006. 29-44p.; 3) controle da dor: analgésicos prescritos.

Para avaliação da dor utilizou-se a EVN. A dor é considerada leve quando a intensidade varia de 1 a 3; a intensidade de 4 a 7 é considerada dor moderada; e de 8 a 10, dor intensa66 Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP). Manual de cuidados paliativos. Rio de Janeiro: Diagraphic; 2009. 320p..

Os pacientes foram avaliados diariamente até o dia da alta hospitalar, transferência ou óbito para verificar se havia mudança no escore da escala aplicada e na analgesia ofertada, visto a disponibilidade na unidade e por ser preconizada uma avaliação contínua. Posteriormente, foi realizada uma comparação entre os índices de dor e a analgesia ofertada.

A EMADOR é composta pela EVN da dor, por descritores agudos (10) e descritores de dor crônica (10) e pela localização da dor do paciente33 Sousa FA, Pereira LV, Cardoso R, Hortense P. [Multidimensional pain evaluation scale. Rev Lat Am Enfermagem. 2010;18(1):3-10..

O questionário de dor McGill é um instrumento que compreende quatro categorias, sendo elas: sensitiva, com propriedades mecânicas, térmicas e espaciais da dor; afetiva, dimensão afetivo-psicogênica nos aspectos de tensão, medo, emoções; avaliativa, expressa a avalição global da experiência dolorosa; e miscelânea, uma mistura de diversos fatores. Essas categorias estão divididas em 20 subcategorias que descrevem diferentes qualidades da dor. Cada palavra representa um descritor e receberá uma pontuação, variando de 1 até 6, em algumas subcategorias99 Pimenta CAM, Mota DDCF, Cruz DALM. Dor e cuidados paliativos. São Paulo: Manole; 2006. 29-44p..

O instrumento foi aplicado em sua totalidade no primeiro dia de relato de dor do paciente, dando início ao acompanhamento do caso. As avaliações subsequentes foram realizadas diariamente até a alta hospitalar, transferência ou óbito, para verificar se houve mudanças nas características e controle da dor. Os pacientes foram acompanhados com uma média geral de 8,45 dias. Durante esse período, diariamente, foram avaliadas as características da dor por meio do instrumento.

A EMADOR foi aplicada diariamente, sendo solicitado que o paciente escolhesse um descritor que mais definisse sua dor naquele momento, sendo corroborado com a intensidade de dor encontrada com a aplicação da EVN. A dor do paciente foi classificada em aguda (menos de seis meses) ou crônica (mais de seis meses) e a partir dessa divisão, eram mostrados os descritores para que o mesmo pudesse escolher. Ao final, os pacientes foram divididos naqueles com dor aguda e nos que apresentam dor crônica e foram identificadas as palavras mais escolhidas.

Em relação ao questionário de dor de McGill, foi solicitado que o paciente escolhesse as palavras que mais caracterizassem sua dor, podendo escolher nenhuma ou apenas uma palavra por subgrupo. Ao final, foram identificadas as palavras mais escolhidas pelos pacientes, o número de descritores e o índice de dor.

Todos os participantes do estudo assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), mediante prévia explicação dos objetivos do estudo, antes do início da coleta dos dados, de acordo com a Resolução 466/2012.

Análise estatística

Após a coleta, os dados foram tabulados em planilhas do Excel e analisados estatisticamente utilizando o programa estatístico SPSS, versão 20.0. Foram calculadas frequências absolutas e médias para as variáveis descritivas. Os resultados foram apresentados em formas de tabelas.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do HUWC, com parecer favorável de número 216.276.

RESULTADOS

Com relação à caracterização geral dos 20 pacientes acompanhados, 11 eram do gênero feminino e 9 do masculino. A faixa etária mais prevalente foi entre 18 e 29 anos, com 35% (n=7), seguida por aqueles com idade igual ou maior que 60 anos, com 25% (n=5) e posteriormente com 20% em cada intervalo dos 30 anos aos 49, com 20% (n=4) e pelo intervalo dos 50 anos aos 59 anos.

Quanto ao estado civil, 45% (n=9) eram casados, seguidos por 40% (n=8) solteiros, 10% (n=2) eram viúvos e 5% (n=1) eram divorciados. Com relação à quantidade de filhos, 40% (n=8) não tinham filhos; 35% (n=7) dois filhos e 25% (n=5) três ou mais filhos.

A partir da avaliação do nível instrucional, 55% (n=11) haviam concluído o segundo grau, 35% (n=7) tinham terminado o primeiro grau, e alfabetizado e com superior completo foram evidenciados com 5% (n=1) cada.

Quanto aos aspectos clínicos da doença, realizou-se uma avaliação do tipo de diagnóstico onco-hematológico e do tempo de diagnóstico, tendo sido verificado que o diagnóstico mais prevalente foi a leucemia mieloide aguda (LMA), com 30% dos casos, seguida pelo linfoma Não-Hodgkin (LNH) e mieloma múltiplo com 15% cada.

Quanto ao tempo de diagnóstico, percebeu-se que os pacientes acompanhados, predominantemente, apresentavam tempo de diagnóstico inferior a um ano (70%). Todos os pacientes relataram dor no primeiro dia da coleta dos dados, sendo esse um critério para traçar o perfil da dor.

Na caracterização da dor as perguntas feitas foram: possível etiologia, quando iniciou a dor, a sua duração, quais os fatores agravantes e se há interferência nas atividades habituais como observado na tabela 1.

Tabela 1
Caracterização da dor de pacientes onco-hematológicos. Fortaleza – CE

Com relação à etiologia da dor, notou-se que a infecção intestinal (30%) e a mucosite (20%) foram as mais relatadas. Os pacientes relataram em sua maioria que permaneciam com dor a maior parte do dia (70%). Apresentaram como fatores agravantes para a dor, principalmente a alimentação (40%) e a movimentação (30%). A dor interferiu para a deambulação (35%) e ter uma alimentação adequada (30%).

A intensidade da dor foi avaliada a partir da aplicação da EVN de avaliação da dor. Identificou-se, a partir da EAV inicial, que 15% dos pacientes apresentaram intensidade na faixa entre 1 a 3 (dor leve), 10% no intervalo de 4 a 7 (dor moderada) e 75% no intervalo de 8 a 10 (dor intensa). A média geral de intensidade da dor durante o acompanhamento foi de 6,5.

A avaliação pela EMADOR foi realizada diariamente, sendo solicitado que o paciente escolhesse um descritor que mais caracterizasse sua dor naquele momento. Na tabela 2, encontram-se os descritores mais citados durante o acompanhamento dos pacientes.

Tabela 2
Descritores identificados a partir da escala multidimensional de avaliação de dor. Fortaleza – CE

Houve mais pacientes com relatos de dor aguda, com 80% (n=16), do que pacientes com dor crônica. Para os pacientes com dor aguda, o descritor mais citado foi profundo (35,7%). Para os pacientes com dor crônica, o descritor mais citado foi persistente (31,4%). Observou-se que dentre os descritores para dor aguda, apenas um não foi citado, aniquiladora. Já nos descritores para dor crônica, quatro não foram citados: deprimente, desastrosa, prejudicial, assustadora.

Na aplicação do questionário de McGill, quando solicitado que os pacientes escolhessem as palavras que mais caracterizavam sua dor, as mais escolhidas foram: pontada (80%), que incômoda (75%), forte (75%), desgastante (70%) e penetrante (70%). Dezenove palavras não foram citadas por nenhum dos pacientes, como: vibração, tremor, como batida, como pancada, tiro, em lança, mordida, esmagamento, fervente, em brasa, formigamento, coceira, machucada, dentre outras.

Dos 20 subgrupos, apenas um não teve nenhuma de suas palavras citadas, sendo ele do grupo miscelânea, subgrupo 19, com as palavras: fria, gelada e congelamento.

A partir da aplicação do questionário de McGill, pode ser identificado tanto o número máximo de subcategorias escolhidas, seja por categoria ou no total, como o índice de dor, por categoria ou total, como explicitado na tabela 3.

Tabela 3
Número máximo de descritores e índice máximo de dor evidenciado na população onco hematológica por meio do questionário de McGill. Fortaleza – CE

Na avaliação pelo descritor escolhido em cada categoria, identificou-se que na sensitiva, os mais prevalentes foram: pontada (11,5%), fisgada (8,6%) e latejante (6,5%). Na categoria afetiva, as mais escolhidas foram: exaustiva (25,4%), castigante (16,9%) e cruel (13,5%). Na avaliativa as mais encontradas foram: que incomoda (27,8%), forte (27,8%) e desgastante (25,9%). Na miscelânea as mais evidenciadas foram: penetra (20,3%), aperta (13%) e pavorosa (11,6%).

A avaliação do número de subcategorias pode ser realizada em cada grupo, individualmente, ou pelo total. Na tabela 3, encontra-se o número máximo de subcategorias escolhidas por grupo e o total evidenciado. Optou-se por evidenciar o máximo valor encontrado em cada categoria.

Notou-se que dos 10 subgrupos da categoria sensitiva, o máximo escolhido foram 5 subgrupos para caracterizar a dor, em 35% dos participantes. Na categoria afetiva, o máximo escolhido foram 3 de 5 subgrupos, em 45% dos participantes. Na avaliativa, foi unânime a escolha desse grupo, que é composto por apenas um subgrupo. Na miscelânea, quase todos os subgrupos foram escolhidos, 3 de 4, em 60% dos participantes.

O índice de dor é obtido pela soma do valor correspondente a cada palavra escolhida em cada categoria. Esse índice pode ser obtido por cada categoria ou pela soma total. Na tabela 3, encontra-se o índice máximo de dor verificado em cada categoria individualmente e a máxima pontuação total evidenciada. Na categoria sensitiva, o máximo índice de dor obtido foi de 13, em 15% dos pacientes.

Na categoria afetiva, 5 foi o máximo índice de dor, em 25% dos participantes da pesquisa. Na avaliativa, obteve-se a máxima pontuação (5), em 40% dos participantes. Na miscelânea, encontrou-se 10 como o índice máximo, em 15% dos pacientes onco-hematológicos acompanhados. A pontuação máxima evidenciada foi de 34, em 15% dos pacientes.

A analgesia dos pacientes acompanhados foi avaliada diariamente a partir da prescrição médica. Foi comparada com a intensidade de dor obtida por meio da aplicação da EAV. As prescrições de analgesia foram comparadas de acordo com a escada analgésica preconizada pela Organização Mundial da Saúde (OMS)66 Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP). Manual de cuidados paliativos. Rio de Janeiro: Diagraphic; 2009. 320p., que possui quatro degraus, tendo o último sido incluído mais recentemente.

Percebeu-se que dos 20 pacientes acompanhados, 13 não apresentaram analgesia conforme esquema indicado pela OMS. Todas as dores de intensidade leve foram medicadas com analgesia mais forte do que a necessária para o controle da dor. A dor de intensidade moderada foi a que mais seguiu o que é preconizado pela OMS. Já a dor intensa teve tratamento inadequado em sua maioria. Para a dor refratária, não foi ofertado nenhum tratamento invasivo.

O único analgésico adjuvante identificado foi hioscina associada a um opioide fraco. Não foi observada a utilização de outros analgésicos adjuvantes, como os antidepressivos, anticonvulsivantes e anestésicos locais.

Verificou-se prevalência na utilização de opioides fracos, de horário ou se necessário, independentemente de ser dor de intensidade leve, moderada ou intensa. Outra prática comum é a utilização de analgésicos se necessário, em 45% (n=9) dos pacientes acompanhados.

DISCUSSÃO

No presente estudo, foram evidenciadas como principais causas a infecção intestinal e a mucosite, podendo ser relacionadas como causas associadas ao tratamento antitumoral, pós-quimioterapia antineoplásica. Quando se avaliam os principais efeitos adversos pós-tratamento antineoplásico, a mucosite destaca-se como efeito agudo de maior frequência, sendo uma das principais responsáveis por sintomas como inapetência e infecção do trato gastrointestinal1010 Schirmer EM, Ferrari A, Trindade LC. Evolução da mucosite oral após intervenção nutricional em pacientes oncológicos no serviço de cuidados paliativos. Rev Dor. 2012;13(2):141-6.. O envolvimento direto pelo tumor é a causa mais frequente de dor nos pacientes oncológicos (70%), porém em 17% dos pacientes a dor está relacionada ao próprio tratamento antitumoral1111 Carvalho RT, Parson HA. (Organizadores). Manual de cuidados paliativos. 2ª ed. Porto Alegre: Sulina; 2012..

Evidenciou-se que 75% dos pacientes apresentaram dor intensa (entre 8 e 10), resultado semelhante ao encontrado no estudo de Silva et al.1212 Silva PB, Trindade LC, Gallucci MC, Schirr RA. Prevalência de desnutrição e dor em pacientes admitidos pelo serviço de triagem em hospital oncológico. Rev Dor. 2013;14(4):263-6. no qual foi evidenciado que 63% dos pacientes adultos oncológicos, no primeiro dia da pesquisa, apresentaram relatos de dor moderada.

Na EMADOR em relação à dor aguda, os descritores mais citados foram profunda, intensa, insuportável, desesperadora e enlouquecedora. E na dor crônica foram: persistente, insuportável, dolorosa, angustiante e desconfortável. Outro estudo33 Sousa FA, Pereira LV, Cardoso R, Hortense P. [Multidimensional pain evaluation scale. Rev Lat Am Enfermagem. 2010;18(1):3-10. constatou que os mais prevalentes para dor crônica foram deprimente, persistente, angustiante, desastrosa e prejudicial. Para a dor crônica só houve semelhança em dois descritores (persistente e angustiante). Nota-se que a dor crônica gera desespero no paciente pela sua persistência1313 Morete MC, Minson FP. Instrumentos para a avaliação da dor em pacientes oncológicos. Rev Dor. 2010;1(1):74-80..

A revisão narrativa de Sallum, Garcia e Sanches55 Sallum, AM, Garcia DM, Sanches M. Dor aguda e crônica: revisão narrativa da literatura. Acta Paul Enferm. 2012;25(n.spe1):150-4. consolida que a dor crônica é mais que um sintoma, mas uma doença que persiste, e não desaparece mesmo com a cura da lesão. Sendo uma presença constante e prolongada, pode ser perturbadora e proporcionar alterações em atividades da vida diária, além de modificações no humor, na autoestima, pensamentos negativos ou suicidas, apreciação desesperançada da vida e alterar as relações familiares, de trabalho e de lazer, justificando os descritores da dor encontrados nesse trabalho.

E no questionário de McGill dentre as palavras mais citadas no presente estudo, tem-se pontada, que incomoda, forte, desgastante e penetrante. No estudo de Costa e Chaves77 Costa AI, Chaves MD. Dor em pacientes oncológicos sob tratamento quimioterápico. Rev. Dor. 2012;13(1):45-9., no qual também utilizaram a escala de McGill para caracterizar a dor de pacientes oncológicos, foi evidenciado que as palavras mais citadas foram: enjoada, cansativa, fina, pontada e sensível.

A comparação dos resultados obtidos neste estudo por categoria da escala de McGill foi realizada com o estudo de Silva et al.1414 Silva TO, Silva VR, Martinez MR, Gradim CV. Avaliação da dor em pacientes oncológicos. Rev Enferm UERJ. 2011;19(3):359-63., realizado também com pacientes oncológicos. Na categoria sensitiva os descritores mais escolhidos foram pontada, fisgada e latejante, diferindo do encontrado no estudo de base para comparação, no qual as mais encontradas foram lateja, cólica e ferroa, coincidindo apenas a latejante. As diferenças podem estar associadas ao local da dor, e nesse contexto ao tipo de câncer, pois em pontadas, agulhadas e choques estão bem presentes quando a dor é de origem neuropática. E ao mencionar latejantes podem ser descritas em casos de cefaleia, como exemplo. As dores em fisgadas são comuns na região abdominal e podem ter vários diagnósticos possíveis dependendo da localização.

Na afetiva, as mais prevalentes diferiram em ambos os estudos, sendo os descritores: exaustivo, castigante e cruel os mais encontrados no presente estudo, diferente das encontradas no estudo de base para comparação, que foram incomoda, cansativa e desgastante. O importante nessa categoria é identificar o aspecto emocional da dor e como o paciente se sente diante dela.

Pode-se utilizar o questionário de McGill para encontrar um índice de dor por categoria ou geral e ter um noção de qual categoria é mais acometida em cada paciente ou comparar o índice geral com o valor máximo possível e perceber se a dor do paciente envolve vários aspectos desde físico, psicológico ou comportamental.

Dentre as categorias, a que mais foi selecionada pelos pacientes acompanhados, foi a avaliativa, em sua totalidade, mostrando que eles utilizaram palavras para relatar sua experiência dolorosa. As categorias sensitiva e afetiva foram, proporcionalmente, pouco escolhidas, apresentando ambas, baixos índice de dor, mostrando que os pacientes utilizam pouco os aspectos sensitivo e emocional para caracterizar suas dores. Esse resultado contrariou o encontrado no estudo de Costa e Chaves77 Costa AI, Chaves MD. Dor em pacientes oncológicos sob tratamento quimioterápico. Rev. Dor. 2012;13(1):45-9., no qual o maior número de descritores escolhidos foi na categoria sensitiva e os com maior índice foi na categoria afetiva.

O presente estudo realizou uma comparação entre a analgesia ofertada para os pacientes com queixas verbais de dor e a preconizada pela OMS. Essa mesma comparação foi realizada no estudo de Barbosa et al. 1515 Barbosa JA, Belém LF, Sette IM, Carmo ES, Pereira GJ, Silva Júnior ED. Farmacoterapia adjuvante no tratamento da dor oncológica. RBPS. 2008;21(2):112-20.. Em ambos os estudos, observou-se prevalência de não seguimento das normas da OMS. Alguns fatores podem estar envolvidos, como: não utilização da EAV da dor para quantificar esse sintoma e aplicação da escala de maneira inadequada; desconhecimento das técnicas de analgesia indicadas pela OMS. No caso dos pacientes onco-hematológicos, outra limitação encontrada é a restrição quanto ao uso de anti-inflamatório não esteroide para dor, pois poderá inibir uma possível febre e mascarar um sinal indicativo de infecção, ainda mais em pacientes leucopênicos.

A utilização dos analgésicos adjuvantes ainda é muito limitada, sendo os antiespasmódicos a classe mais prescrita1515 Barbosa JA, Belém LF, Sette IM, Carmo ES, Pereira GJ, Silva Júnior ED. Farmacoterapia adjuvante no tratamento da dor oncológica. RBPS. 2008;21(2):112-20.. A OMS tenta divulgar e incentivar a utilização das demais classes dos adjuvantes como importantes para o controle eficaz da dor, como, por exemplo, os antidepressivos (amitriptilina), os anticonvulsivantes (fenitoína, fenobarbital) e os hipnóticos (midazolam).

Observou-se, também, uma prática de analgesia se necessário, não sendo indicada pela OMS. Recomenda-se que na prescrição de analgésicos deve-se conhecer a sua faixa terapêutica, ou seja, o nível de concentração se mantém constante para permanecer na zona de analgesia, pois a dor crônica exige tratamento preventivo, portanto os analgésicos devem ser prescritos em intervalos regulares66 Academia Nacional de Cuidados Paliativos (ANCP). Manual de cuidados paliativos. Rio de Janeiro: Diagraphic; 2009. 320p.. O II Consenso Nacional de Dor Oncológica afirma que no Brasil 24,5 a 46,6% dos pacientes com dor oncológica não têm controle adequado da dor1616 Wiermann EG, Diz MP, Caponero R, Lages PS, Araujo CZ, Bettega RT, et al. Consenso Brasileiro sobre manejo da dor relacionada ao câncer. Rev Bras Oncol Clín. 2014;10(38):132-43..

CONCLUSÃO

As escalas são de extrema importância na mensuração e caracterização da dor. A enfermagem deve estar à frente na sua implantação e utilização nas unidades hospitalares, de maneira especial nas oncológicas pela alta incidência desse sintoma.

  • Fontes de fomento: não há.

REFERENCES

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2016

Histórico

  • Recebido
    22 Mar 2016
  • Aceito
    08 Ago 2016
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