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Contribuições juvenis para os direitos indígenas

Youth contributions for indigenous rights

Resumo

Neste artigo, analiso a perspectiva geracional dos direitos indígenas que emerge com a produção político-discursiva de jovens indígenas no documento de monitoramento dos 10 anos de vigência da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas. Desse modo, procuro discutir a interculturalidade nas categorias geracionais e a problematização juvenil sobre não discriminação, território e saúde.

Palavras-chave:
Juventudes indígenas; Direitos indígenas; Povos indígenas

Abstract

In this article, I analyze the generational perspective of indigenous rights that emerges with the political-discursive production of indigenous youth in the monitoring document of the 10th anniversary of the United Nations Declaration on the Rights of Indigenous People. In this way, I reflect about the interculturality in the generational categories and the juvenile problematization on non-discrimination, territory, and health.

Keywords:
Indigenous youth; Indigenous rights; Indigenous people

Introdução

Nos últimos anos, tem emergido, no cenário internacional e de muitos países, uma perspectiva geracional dos direitos indígenas relacionada ao protagonismo político-organizacional de pessoas que se autoidentificam como jovens e indígenas, entre outros marcadores sociais, para estabelecer novos aportes interculturais aos direitos das juventudes e intergeracionais aos direitos indígenas.

No campo juvenil, estes sujeitos têm tencionado a capacidade dos Estados e de organizações sociais de reconhecimento das especificidades indígenas no delineamento de políticas públicas e ações sociais, de modo a potencializar as diferenças étnicas na representação e no atendimento das juventudes. No âmbito indígena, o movimento é de reforço às pautas estruturais (terra, meio ambiente, etc.) via interpretações e processos mobilizatórios pautados no enfoque geracional, e de interpelar a expansão dos direitos indígenas para a incorporação de temas e demandas até então não compreendidas como “direitos” e/ou “indígenas” (Oliveira, 2017_____. Mobilização social de jovens indígenas e a construção intercultural dos direitos da juventude no Brasil. In: OLIVEIRA, Assis da Costa; RANGEL, Lucia Helena (orgs.). Juventudes indígenas: estudos interdisciplinares, saberes interculturais: conexões entre Brasil e México. Rio de Janeiro: E-papers, p. 53-77, 2017.). Em ambos os casos, os fundamentos da atuação político-organizacional estruturam-se no entendimento de que o processo identitário (como indígenas, jovens, mulheres, migrantes, estudantes, etc.), a participação social e o engajamento militante são valores-direitos manejados por jovens indígenas para desconstruir relações de poder e legitimar a ação política nos cenários de disputa dos direitos humanos.

Uma destas movimentações ocorreu na celebração dos 10 anos de vigência da Declaração sobre os Direitos dos Povos Indígenas (DDPI), da Organização das Nações Unidas (ONU), no ano de 2017, por jovens indígenas organizados na Red de Jóvenes Indígenas de América Latina (RJIAL). A organização é constituída por representações de juventudes indígenas de Brasil, Bolívia, Guatemala, Nicarágua, México e Panamá1 1 A partir das seguintes representações institucionais: Rede de Juventude Indígena (REJUIND/Brasil); Centro de Estudios Multidisciplinarios-Aymara (CEM-Aymara/Bolivia); Asociación de Mujeres Ixq'aniil (Guatemala); Mujeres Indígenas del Wanki Tagni (Nicaragua); Mujeres Indígenas por CIARENA (México); Colectivo Yani Tundavii Dikuintii (México); e, Congreso General Embera de Alto Bayano (Panamá). . Entre 2016 e 2017, a RJIAL promoveu ou participou de atividades2 2 Dentre estes eventos, listam-se: a Asamblea Latinoamérica de Jóvenes Indígenas, realizada na comunidade indígena do Faisán, em Oaxaca/México, entre os dias 6 e 7 de agosto de 2016; o Seminário Virtual Perspectiva Regional de Jóvenes Indígenas a 10 años de la Declaración de la Naciones Unidas sobre los Derechos de los Pueblos Indígenas, ocorrido no dia 27 de março de 2017; a reunião junto à Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e o Global Indigenous Youth Caucus, em Roma/Itália, durante os dias 5 e 8 de abril de 2017; e, por último, a Reunião Latinoamericana de Jovens Indígenas com a Organização Pan-americana de Saúde (OPAS), entre os dias 11 e 12 de abril de 2017, em Brasília/Brasil. relacionadas à temática da avaliação da garantia dos direitos indígenas, com especial atenção ao monitoramento do cumprimento da DDPI.

A compilação das demandas e proposições apresentadas nestes eventos internacionais ocasionou a produção do documento Informe – Perspectiva de Jóvenes Indígenas a los 10 Años de la Adopción de la Declaración de Naciones Unidas sobre los Derechos de los Pueblos Indígenas (doravante Informe), coproduzido pela RJIAL e a Unidade de Juventude Indígena do Fundo para o Desenvolvimento dos Povos Indígenas de América Latina e Caribe (FILAC)3 3 Esta unidade foi criada mediante resolução aprovada na XII Assembleia Geral Ordinária da FILAC, ocorrida entre 16 e 17 de julho de 2015, em Bogotá/Colômbia. Na minuta das resoluções deste evento, consta: “Que, el equipo técnico de la Presidencia del Consejo Directivo presentó una propuesta de Plan Estratégico para el periodo 2015 a 2016 contemplando los ejes de los Programas Emblemáticos que se han venido impulsado hasta la fecha a los que se han sumado dos nuevos programas: el de Juventud y el de Pueblos Indígenas en aislamiento voluntario” (FILAC, 2015, p. 3). . Este documento é o principal subsídio para minha análise no presente trabalho, complementado por pesquisa bibliográfica, documental e entrevista. Assim, objetivo entender a perspectiva geracional dos direitos indígenas que emerge com a produção político-discursiva de jovens indígenas no documento de monitoramento da DDPI.

Desenvolvo análise que inicia pela problematização da categoria juventude no contexto indígena e no âmbito dos documentos jurídicos internacionais, utilizando por referência as críticas e proposições presentes no Informe. Posteriormente, farei uma discussão detida de três dos oito eixos temáticos4 4 “As discussões sistematizam 8 eixos temáticos da avaliação da Declaração: direito a não discriminação, terra e território, cultura, educação, saúde, participação, trabalho e comunicação e informação. Cada tema é analisado en quatro subíndices: (i) desenvolvimento do direito, (ii) situação e dados em relação à implantação do direito, (iii) análise da implantação do direito e (iv) tarefas a realizar” (RJIAL e FILAC, 2017, p. 14. Tradução nossa). Optei por tratar destes três temas por conterem diversos elementos que possibilitam problematizar a perspectiva geracional de jovens indígenas, além de serem assuntos e direitos estruturais para os povos indígenas. presentes no documento: direito à não discriminação; terra e território; e, saúde. Neste ponto, trabalho com algumas questões centrais: de que forma o enfoque geracional aporta novos subsídios para a interpretação dos temas-direitos? Quais ganhos e riscos com os aportes interpretativos presentes? Quais proposições são formuladas? E quais possibilidades de operacionalização?

Ao final, estabeleço reflexões sobre o caráter expansivo do conteúdo dos direitos indígenas, ante os novos postulados das demandas geracionais, em associação com outros marcadores sociais, como gênero e sexualidade, o que contribui para (re)pensar a capacidade de mobilização social, de interpretação e de cumprimento dos direitos.

1. Aberturas da DDPI e a interculturalização do “ser jovem”

A DDPI é central para o debate do marcador juvenil no campo do direito internacional dos povos indígenas. Nos mais de dez documentos jurídicos5 5 Entre os documentos, listo: Convenção para Prevenção e Sanção ao Genocídio, de 1948; Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, ambos de 1966; Convenção para Eliminação da Discriminação Racial, de 1968; Convenção do Patrimônio Mundial Cultural e Natural, de 1972; Convenção nº. 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), de 1989; Convenção da Diversidade Biológica, de 1992; Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural, de 2001; Convenção da Diversidade de Expressões Culturais, de 2005; DDPI, de 2007; e, Declaração Americana dos Direitos dos Povos Indígenas, de 2016. que compõe o direito internacional dos povos indígenas, coube à DDPI a primazia e, até o momento, a exclusividade da inclusão do marcador juvenil como critério de reconhecimento de especificidades geracionais nos direitos indígenas.

Isto ocorreu nos artigos 21, inciso 26 6 “Artigo 21. [...] 2. Os Estados adotarão medidas eficazes e, quando couber, medidas especiais para assegurar a melhora contínua das condições econômicas e sociais dos povos indígenas. Particular atenção será prestada aos direitos e às necessidades especiais de idosos, mulheres, jovens, crianças e portadores de deficiência indígenas” (ONU, 2007, p. 12-13). , e 22, 17 7 “Artigo 22. [...] 1. Particular atenção será prestada aos direitos e às necessidades especiais de idosos, mulheres, jovens, crianças e portadores de deficiência indígenas na aplicação da presente Declaração” (ONU, 2007, p. 13). , da DDPI. No primeiro, o direito de acesso aos serviços estatais para garantia do desenvolvimento socioeconômico. No segundo, a adoção de medidas especificas na aplicação da Declaração. Em ambos, apresentam-se os termos “direitos” e “necessidades especiais” ligados à condição juvenil – em conjunto com mulheres, idosos, crianças e pessoas com deficiência – para indicar o desafio da implantação de prestação estatal e interpretação jurídica que atente à diversidade interna dos povos indígenas. E, com isso, operacionalize os marcadores sociais para a articulação dos direitos indígenas com diplomas jurídicos ligados a estas identidades (os direitos das crianças, os direitos das mulheres, os direitos das juventudes, etc.) e à apreciação das “necessidades especiais” destes sujeitos como critério de expansão do conteúdo dos direitos indígenas.

No entanto, existe uma questão preliminar à presença juvenil no direito internacional dos povos indígenas: a problematização em si da categoria juventude. É este o primeiro ponto de análise do Informe, em conjunto com as categorias infância e adolescência. Trata-se de discutir os critérios valorativos e culturais estabelecidos nas condições de “ser criança, adolescente e jovem” no direito internacional e os efeitos nas realidades dos povos indígenas.

7. Las definiciones de niñez, adolescencia y juventud muestran varios niveles de complejidad. Primero, una definición cerrada de estos conceptos puede llegar a discriminar a un porcentaje de esta población. Otra dificultad se hace evidente al desarrollar los criterios que nos permitan delimitar las definiciones, por ejemplo: la utilización de criterios biológicos como la edad, cambio de voz en los varones o menstruación en las mujeres no reflejan la madurez física, emocional y cognitiva de un individuo en relación a estas etapas. De la misma forma, las sociedades y culturas también construyen imaginarios sociales sobre los significados de la niñez, adolescencia y juventud, es decir, que cada sociedad y cultura definen características, roles y sentidos propios de cada una de estas etapas. Es posible, incluso, que una sociedad otorgue mayor relevancia a otras etapas del individuo (como adultez o vejes), sin desarrollar o interiorizar ideas establecidas de juventud o adolescencia (RJIALRED DE JÓVENES INDÍGENAS DE AMÉRICA LATINA (RJIAL); FUNDO PARA EL DESARROLLO DE LOS PUEBLOS INDÍGENAS DE AMERICA LATINA Y EL CARIBE (FILAC). Informe – Perspectiva de Jóvenes Indígenas a los 10 Años de la Adopción de la Declaración de Naciones Unidas sobre los Derechos de los Pueblos Indígenas. 2017. Disponible en: < http://www.fondoindigena.org/ drupal/sites/default/files/field/archivos/Informe_jo%CC%81venes.pdf>. Acesso em: 14 abr. 2018.
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e FILAC, 2017FONDO PARA EL DESARROLLO DE LOS PUEBLOS INDÍGENAS DE AMÉRICA LATINA Y EL CARIBE (FILAC). Minuta de Resoluciones de la XII Asamblea General Ordinaria. Bogotá: FILAC, 2017. Disponible em: <http://www.filac. org/wp/wp-content/uploads/2017/08/05asamblea.pdf>. Acesso em: 15 mai. 2018.
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, p. 6. Itálico do original).

Para delimitar as bases valorativo-culturais de concepção de infância, adolescência e juventude no direito internacional, o Informe apresenta, no Item 7, três críticas centrais da RJUAL à normatização das categorias geracionais.

Primeiro, a observação das possíveis discriminações passiveis de ocorrer em caso de uso restritivo da conceituação destas categorias. Isto se liga ao que logo em seguida apresenta o Informe, pois nos Itens 8, 9 e 10, há o cuidado de se identificar o entendimento normativo do que se concebe por cada uma das categorias geracionais. Porém, o elemento transversal que percorre toda a produção descritiva e prescritiva das categorias geracionais está alicerçado à delimitação de faixas etárias para estabelecer a entrada e a saída de cada identidade geracional. É este acoplamento das identidades geracionais às idades cronológicas8 8 Infância como as pessoas até 18 anos, adolescência de 10 a 19 anos e juventude de 15 a 24 anos (RJIAL e FILAC, 2017). No Brasil, as definições são diferentes, com a infância até os 12 anos incompletos e a adolescência de 12 até os 18 anos incompletos. Por fim, a juventude dos 15 aos 29 anos. Em ambos os casos, perceba que as delimitações acabam se sobrepondo em determinados períodos etários, o que torna ainda mais complexa a aplicação jurídica dos critérios e dos direitos. o que encerra um potencial de discriminação aos critérios utilizados por sociedades que possuem outros “imaginários sociais” sobre infância, adolescência e juventude – e, até mesmo, de inexistência das categorias adolescência ou juventude entre povos indígenas, como observa a parte final do Item 7 no Informe, implicitamente relevando a presença permanente da infância.

Apesar da naturalização do marcador cronológico na estipulação das identidades geracionais, este é um critério cultural e cientificamente localizado nas sociedades modernas/coloniais, consolidado ao longo dos séculos XIX e XX no âmbito da especificação dos significados de infância, adolescência e juventude, e também dos serviços e direitos destinados a estes grupos (Oliveira, 2014aOLIVEIRA, Assis da Costa. Princípio da pessoa em desenvolvimento: fundamentos, aplicações e tradução intercultural. In: Revista Direito e Práxis, v. 5, p. 60-83, 2014a. Doi: http://dx.doi.org/10.12957/dep.2014.10590
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e 2014b_____. Indígenas Crianças, Crianças Indígenas: perspectivas para a construção da Doutrina da Proteção Plural. 1. ed. Curitiba: Juruá, 2014b.; Turmel, 1998). Apontar os efeitos negativos dos usos restritivos do parâmetro cronológico produz a relativização do próprio critério, assim como a visibilidade de outras bases culturais adotadas pelos povos indígenas.

Desse modo, num segundo momento, e levando em consideração a análise do direito internacional dos povos indígenas, o Informe passa a reordenar a legitimidade dos parâmetros de atribuição valorativa das categorias geracionais pela ótica do reconhecimento da pluralidade cultural de representação dos ciclos de vida.

11. La construcción de los conceptos, sentidos y roles de la niñez, adolescencia y juventud es principalmente una construcción social y cultural. Esta percepción radicaliza la diversidad y riqueza de las diferentes visiones de la juventud, propias de diversas sociedades, culturas y etnias en el mundo... La conceptualización de la niñez, adolescencia y juventud indígena se hace en este marco del reconocimiento de la diversidad cultural de los pueblos indígenas y sus sistemas propios de organización (RJIALRED DE JÓVENES INDÍGENAS DE AMÉRICA LATINA (RJIAL); FUNDO PARA EL DESARROLLO DE LOS PUEBLOS INDÍGENAS DE AMERICA LATINA Y EL CARIBE (FILAC). Informe – Perspectiva de Jóvenes Indígenas a los 10 Años de la Adopción de la Declaración de Naciones Unidas sobre los Derechos de los Pueblos Indígenas. 2017. Disponible en: < http://www.fondoindigena.org/ drupal/sites/default/files/field/archivos/Informe_jo%CC%81venes.pdf>. Acesso em: 14 abr. 2018.
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e FILAC, 2017, p. 8).

Conceber os sentidos e as regras de fundamentação de infância, adolescência e juventude como “construções sociais e culturais”, redireciona as bases valorativas para o plano local. Isto é, para como cada povo indígena passa a concebê-las e de como tais concepções devem ser tratadas em igualdade de condições às definições juridicamente instituídas. Até porque, junto ao reconhecimento fático da diversidade cultural, estão as garantias jurídicas de autodeterminação, autonomia, organização social e sistemas jurídicos que “han dado significado, sentido, responsabilidades, roles, derechos y obligaciones a su niñez, adolescentes y jóvenes” (RJIAL e FILAC, 2017, p. 9).

Assim, o posicionamento da pluralidade de critérios culturais para definição das categorias geracionais gera um vazio hermenêutico de conceituação, pois só é possível atribuir determinada compreensão às identidades geracionais desde o plano local, numa atribuição a posteriori de sentidos, nunca a priori. O problema está em saber lidar com a tentação – e a tensão – de (não) preencher este vazio com novos dispositivos que sejam aparentemente plurais ou positivos, mas potencialmente reprodutores de novas discriminações.

Por isso, soa estranho, depois de toda uma caracterização pluralista da definição de infância, adolescência e juventude, o Informe priorizar a identificação de um novo “critério objetivo” de concepção da juventude indígena, postulando, no Item 12, que “el significado de ser-joven-indígena se encuentra en asumir responsabilidades con la comunidad, su tradición y su identidad” (RJIAL e FILAC, 2017, p. 9).

A pergunta implícita neste posicionamento é justamente a concepção de responsabilidade que se assume para caracterizar a juventude indígena? E, em caso da pessoa não assumir esta responsabilidade, quais graus de exclusão ou discriminação podem ser gerados contra determinados sujeitos, também jovens e indígenas? Por fim, indagar se o critério de responsabilidade seria o mais adequado para recepcionar a diversidade interna de expressões de juventude entre os povos indígenas?

Uma alternativa talvez fosse recorrer à utilização do mesmo recurso descritivo direcionado aos povos indígenas na DDPI ou na Convenção nº. 169 da OIT, que não se pauta numa lógica de conceituação (tentando responder a pergunta de quem são tais sujeitos e grupos), mas sim de estipulação dos critérios sociológicos e históricos para autoidentificação (ou seja, a partir de qual pluralidade de critérios os sujeitos e os grupos podem se autoreconhecer). Em complemento, Perez RuizPEREZ RUÍZ, Maya Lorena. Retos para la investigación de los jóvenes indígenas. In: Alteridades, v. 21, n. 42, p. 65-75, 2011. indica que cabe insistir na

... necesidad de deconstruir la noción de joven en los estudios dedicados a los pueblos indígenas para captar sus especificidades y significados culturales, y atender su construcción según quién clasifica, desde dónde lo hace, y de acuerdo con el sentido del ordenamiento del mundo simbólico y de las relaciones sociales de cada grupo, en un tiempo, un lugar y un contexto determinados (2011, p. 72).

Logo, seria possível estabelecer uma conceituação aberta de juventudes indígenas, com um texto centrado na atenção ao contexto dos sujeitos que se autoidentificam como jovens e são reconhecidos por seus coletivos étnicos como tal, com base em critérios ligados às tradições, à organização social, às concepções étnicas de ciclos de vida e à dinâmica cultural – aqui presente, também, os intercâmbios com a sociedade não-indígena, de maneira individual e/ou coletivo, dentre os quais a influência das instituições educacionais.

No entanto, a ênfase à responsabilidade como critério de identificação das juventudes indígenas será um argumento revisitado em vários momentos do Informe, para estabelecer os sentidos positivos destes sujeitos: de que as e os jovens contribuem (ou podem contribuir) com os povos indígenas e a defesa dos direitos indígenas. Este sentido positivo configura-se como um recurso político-discursivo para enfatizar a capacidade de militância social existente em cada jovem indígena, de modo a conectar os interesses individuais destes sujeitos com as pretensões coletivas de seus grupos étnicos.

Isto pode resultar num saldo positivo para o engajamento político e o reconhecimento social de jovens indígenas e suas organizações, mas também estrutura um modelo de representação da juventude indígena com potencial de invisibilização ou inferiorização de jovens indígenas – e povos indígenas – que se pautam em outros critérios para atribuir a condição juvenil.

2. Avaliação do cumprimento da DDPI pela ótica das juventudes indígenas

A perspectiva geracional dos direitos indígenas desencadeia um conjunto de análises histórico-conjunturais e proposições político-jurídicas sobre temas relacionados aos povos indígenas, seja para aportar novas interpretações – ou formas de compreensão dos temas estruturais pela ótica juvenil – às violações dos direitos indígenas, seja para indicar outros campos dos direitos humanos com o qual os direitos indígenas podem ser articulados e, até mesmo, passar a englobar e inovar como parte de suas pautas jurídicas.

2.1. Não discriminação

O exercício do direito a não discriminação é o fundamento do artigo 2º da DDPI9 9 “Artigo 2º. Os povos e pessoas indígenas são livres e iguais a todos os demais povos e indivíduos e têm o direito de não serem submetidos a nenhuma forma de discriminação no exercício de seus direitos, que esteja fundada, em particular, em sua origem ou identidade indígena” (ONU, 2007, p. 5). e compõe um dos principais direitos assegurados aos povos indígenas, no âmbito individual e coletivo. Este direito está presente em diversos documentos jurídicos ligados ao direito internacional dos povos indígenas e outros tratados internacionais de direitos humanos.

No Informe, este arcabouço normativo é complementado pela referência de aplicação dos documentos jurídicos ligados às categorias geracionais, especificamente a Convenção sobre os Direitos da Criança (CDC), de 1989, e a Convenção Iberoamericana de Direitos dos Jovens, de 2005 (RJIAL e FILAC, 2017). Os preceitos jurídicos analisados dos dois documentos têm por âmbito apenas o caráter individual10 10 Detidamente o artigo 2.1. da CDC e o artigo 5º da CIDJ, com o seguintes textos normativos: 1. Os Estados Partes respeitarão os direitos enunciados na presente Convenção e assegurarão sua aplicação a cada criança sujeita à sua jurisdição, sem distinção alguma, independentemente de raça, cor, sexo, idioma, crença, opinião política ou de outra índole, origem nacional, étnica ou social, posição econômica, deficiências físicas, nascimento ou qualquer outra condição da criança, de seus pais ou de seus representantes legais” (Brasil, 1990); “Artigo 5. Princípio de não-discriminação. O gozo dos direitos e liberdades reconhecidos aos jovens na presente Convenção não admite nenhuma discriminação fundada na raça, na cor, na origem nacional, na pertença a uma minoria nacional, étnica ou cultural, no sexo, na orientação sexual, na língua, na religião, nas opiniões, na condição social, nas aptidões físicas, ou na deficiência, no lugar onde se vive, nos recursos econômicos ou qualquer outra condição ou circunstância pessoal ou social do jovem que pudesse ser invocada para estabelecer discriminações que afetem a igualdade de direitos e as oportunidades ao gozo dos mesmos” (OIJ, 2005). do direito a não discriminação. Ainda assim, o exercício de englobar estes documentos jurídicos como parte dos referenciais normativos assegurados às juventudes indígenas (além das infâncias e adolescências), amplia as possibilidades de garantia formal e material do direito a não discriminação.

Ao mesmo tempo, possibilita uma releitura coletiva destes direitos ligados às categorias geracionais como estreitamente vinculados à garantia dos direitos das coletividades étnicas às quais pertencem. Pois, como bem aponta o documento, “[e]l ejercicio de los derechos colectivos de las y los niños [y jóvenes] indígenas se hace efectivo cuando se garantiza los derechos humanos colectivos a su pueblo, como son los derechos a la libre determinación, territorio y sistemas de educación indígena” (RJIAL e FILAC, 2017, p. 15).

Por outro lado, interessante compreender como as e os jovens indígenas identificam os impactos específicos da violação deste direito no âmbito geracional.

31. El problema de la discriminación hacia sus pueblos como el principal impedimento al ejercicio de sus derechos y la existencia de traumas graves como el suicidio y la autolesión. La discriminación daña en primera instancia la identidad de los jóvenes y su pertenencia a un pueblo indígena. Incluso cuando un joven niega su identidad indígena para evitar la discriminación, no puede evitar escapar a los genotipos que lo identifican como indígena. Estos momentos de crisis en la identidad llevan a desarrollar traumas, particularmente en las edades más tempranas, cuando las y los jóvenes son más vulnerables (RJIAL e FILAC, 2017, p. 17).

As adversidades impostas pelas relações sociais discriminatórias com os povos indígenas repercutem diretamente na percepção e autoestima de jovens indígenas para lidarem com seus pertencimentos étnicos e as opressões sociais. As reações juvenis à obstrução do direito a não discriminação, pautadas em diferentes estratégias de sobrevivência via negação identitária, podem resultar em danos físicos, psicológicos e socioculturais, proporcionalmente maior de ocorrer quanto menor a idade dos sujeitos.

Para Rangel (2015)RANGEL, Lúcia Helena. Políticas públicas e participação política: juventude indígena na cidade de São Paulo. In: VICTORIA ALVARADO, Sara; VOMMARO, Pablo (comps.). En busca de las condiciones juveniles latinoamericanas. Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Clacso; Tijuana: El Colegio de la Frontera Norte, El Colef; Manizales: Universidad de Manizales; Sabaneta: Cinde, p.167-225, 2015. e Vale e Rangel (2008)VALE, Cláudia Netto do; RANGEL, Lúcia Helena. Jovens indígenas na metrópole. In: ponto-e-virgula, n. 4, p. 254-260, 2008., a negação identitária como estratégia de sobrevivência é um recurso utilizado por muitos jovens indígenas que migram para a cidade de São Paulo, ou que nasceram nela. Tornar-se invisível aos olhos da sociedade e do Estado no espaço urbano abre um leque de questionamentos indígenas sobre a violação ao reconhecimento étnico e a inadequação das políticas públicas de atendimento à população indígena na cidade, mas é também um recurso estratégico para “usufruir” do contexto urbano, “ocultando sua origem, indiferenciando-se, por vergonha de pertencer a um povo indígena e para escapar ao racismo e à violência” (Rangel, 2015RANGEL, Lúcia Helena. Políticas públicas e participação política: juventude indígena na cidade de São Paulo. In: VICTORIA ALVARADO, Sara; VOMMARO, Pablo (comps.). En busca de las condiciones juveniles latinoamericanas. Ciudad Autónoma de Buenos Aires: Clacso; Tijuana: El Colegio de la Frontera Norte, El Colef; Manizales: Universidad de Manizales; Sabaneta: Cinde, p.167-225, 2015., p. 183).

Urteaga (2019)_____. Jovens indígenas na contemporaneidade: metodologias horizontais e giros epistêmicos. 2019 (Mimeo). também observa que na Cidade do México, as e os jovens indígenas costumam “disfarçar” e, muitas vezes, “apagar” os aspectos da indianidade devido as práticas discriminatórias e a violência racista que atuam no cotidiano das relações sociais. Um recurso frequente é a identificação como mestiço, e não indígena, o que gera também a ênfase na assunção de compromissos de caráter eminentemente individual.

As consequências psicológicas da negação identitária geram danos sociais, como o suicídio e a autoflagelação, os quais delineiam cenários adicionais de vulnerabilização sociocultural com recorte geracional, repercutindo com maior intensidade nas e nos jovens, e também em suas famílias e coletividades.

Porém, a negação ou a crise identitária é também parte dos fluxos de interação social desenvolvidos por jovens indígenas com socialização em múltiplas instâncias internas e externas aos povos indígenas, assim como da capacidade do Estado de ofertar serviços e garantias jurídicas de caráter preventivo e repressivo. A condição de interação social dos sujeitos jovens com espaços de socialização indígena e não-indígenas, gera, em muitos casos, dificuldades de construção subjetiva da identidade étnica e mediação entre diferentes regimes de conhecimentos, na busca pelo equilíbrio (individual e coletivo) do bem viver. Sobre isso, Dinaman Tuxá, ex-membro da Comissão Nacional de Juventude Indígena (CNJI) e atual dirigente da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), além de membro do povo Tuxá, relata:

O bem viver é você tá bem consigo mesmo e com o meio que você vive, é você ter o alimento da terra, é você ter o seu rio pra tomar banho, é você ter sua cabana pra morar, é você poder fazer sua reprodução sociocultural de forma plena, sem qualquer interrupção, é isso que é o bem viver. O que acontece no suicídio, o jovem vai buscar o bem viver fora da sua comunidade e lá ele é tachado como indígena sujo, mendigo, que não pertencem àquele meio. Quando eles vêm para universidade, muitos jovens indígenas, quando nós saímos, nós somos tachados dessa forma, que esse não é nosso meio, não é nosso espaço. E ai você, para se adequar ao meio que te julga, que julga que você não faz parte desse meio, você é tachado que você não é branco, que você está errado, que você não pode usar calça, você não pode usar celular. E aí esse jovem volta para comunidade, modificado pelo meio que ele estava vivendo, quando veio para a cidade você se modificou do contexto de comunidade, tentou se adequar ao meio urbano que você foi julgado que não era [seu], você leva o meio urbano que você adquiriu lá para dentro da comunidade [indígena]. Você chega na comunidade, o povo diz: “êpa! Você está de tênis, você está de calça, você está com celular na mão, você não é mais índio”. Ai o jovem entra no meio termo: ele não é índio, a comunidade não o reconhece, ele não é branco a sociedade não o reconhece, ele é o que? A interrogação (Dinaman Tuxá, entrevistado dia 16/05/2016).

A interrogação é a resultante psíquica do processo constante de questionamento da autenticidade identitária à muitos jovens indígenas, de não serem reconhecidos como indígenas nos espaços não-indígenas, sobretudo urbanos, e pelos conflitos étnicos decorrentes das inovações transculturais que propõe aos seus pares. Isto acaba por afetar o equilíbrio do bem viver, da relação consigo e com os seres, gerando efeitos psíquicos negativos que podem acarretar na consumação do suicídio e das autolesões corporais.

Quanto às recomendações contidas no documento, no caso específico do direito a não discriminação, estão assim definidas:

35. Crear un observatorio regional para visibilizar la situación de discriminación que sufren los jóvenes y niñez indígena (RJIAL e FILAC, 2017, p. 18).

38. Instar a los Estados a tipificar la discriminación racial como un delito de orden público (RJIAL e FILAC, 2017, p. 18).

152. Facilitar a los jóvenes indígenas que han sido objeto de violencia el acceso a refugios, asistencia médica, psicológica y de otra índole, así como a asistencia jurídica y servicios de emergencia. Garantizando el derecho a investigaciones efectivas, esclarecimiento de los casos y acceso a la justicia, así como el goce de una atención y reparación integral según los estándares más altos de derechos humanos (RJIAL e FILAC, 2017, p. 45).

Cada uma destas proposições intervém num espectro da violação do direito a não discriminação. O primeiro, da produção de informações sobre os cenários de discriminação vivenciados. O segundo, de repressão ou criminalização das condutas sociais. E, por último, o atendimento integral às vítimas de discriminação, visando à reparação segundo os parâmetros de direitos humanos, cabendo, no entanto, complementar a noção de reparação para agregar também a perspectiva das demandas e da percepção cultural de cada povo indígena.

Por outro lado, o Informe também aponta as discriminações identitárias que ocorrem dentro dos espaços comunitários de convivência, centrado no modo como os grupos étnicos reagem às mudanças culturais trazidas pelas juventudes no intercambio com as sociedades não-indígenas. Assim, identificando “la existencia de elementos propios de la cultura [indígena], que recrean actitudes discriminatorias” (RJIAL e FILAC, 2017, p. 17).

Particularmente no caso das discriminações internas às juventudes indígenas, o processo de modificação destes cenários “debe partir de los mismo jóvenes y pueblos indígenas. Una intervención externa no-indígena y no-joven, únicamente tiene resultados contraproducentes para su situación” (Idem). Percebe-se o duplo domínio da autodeterminação presente no documento, não apenas enfatizando a autogestão dos povos indígenas para resolução destes conflitos, sem interferência externa, sobretudo estatal, mas também que ela deve ser feita desde uma perspectiva não excludente da presença e do protagonismo da juventude, ou seja, que tampouco pode ser permeada por um adultocentrismo interno que desconsidere as capacidades e os anseios destes sujeitos.

Para partir dos próprios povos indígenas às alternativas de superação da discriminação interna, é necessário rediscutir o diálogo intergeracional e o lugar das juventudes na produção da cultura e da tradição. Nisso, advém um momento chave do Informe, em que se expõe que “recuperar lo tradicional en un marco de innovación es tarea de las juventudes indígenas” (Idem). Portanto, a preservação das tradições indígenas está situada num patamar de recriação e inovação cultural, em que as juventudes indígenas possuem papel central.

O desafio está justamente em como alcançar o equilíbrio entre o respeito às tradições e a dinâmica de transformações vivenciadas pelos sujeitos dentro dos povos indígenas, mas também pelos próprios povos indígenas na relação histórica com as sociedades não-indígenas. Aqui, acredito que haveria que problematizar as mudanças culturais sem centralização específica às juventudes, mas ao contexto coletivo dos povos, para evitar reduzir um efeito que por certo afeta de maneira mais intensa as gerações mais novas, mas que está presente nos povos indígenas de maneira ampla (Vásquez, 2014VÁSQUEZ, Jorge Daniel. Visibilizar el adultocentrismo: conclusiones sobre subjetividades juveniles desde un espacio transnacional. In: Identidades en transformación: juventud indígena, migración y experiencia transnacional en Cañar, Ecuador. Quito: FLACSO, Sede Ecuador; Académie de Recherche et d`Enseignement Supérieur; Universite Catholique de Louvain; Universite de Liège, p. 145-151, 2014.), e não somente da atualidade, mas desde um recorte histórico.

2.2. Terra e território

Território e terra são duas categorias de análise com repercussões distintas no contexto dos povos indígenas. O território é a base socioespacial que tradicional é utilizado por determinado grupo étnico, mediante sistema de uso comum, com os quais os membros do grupo detêm laços de pertencimento e de expressão sociocultural. Segundo Baniwa, a concepção indígena de território engloba “o conjunto de seres, espíritos, bens, valores, conhecimentos, tradições que garantem a possibilidade e o sentido da vida individual e coletiva” (2006, p. 101). Os sistemas de usos comuns representam espaços de produção de formas de gestão de recursos naturais para a reprodução social de grupos ditos etnicamente diferenciados, constituídos a partir de territorialidades específicas “resultantes de diferentes processos sociais de territorialização e como delimitando dinamicamente terras de pertencimento coletivo que convergem para o território” (Almeida, 2008ALMEIDA, Alfredo Wagner Berno de. Terras tradicionalmente ocupadas: processos de territorialização, movimentos sociais e uso comum. In: Terra de quilombo, terras indígenas, “babaçuais livre”, “castanhais do povo”, faixinais e fundos de pastos: terras tradicionalmente ocupadas. Manaus. PGSCA-UFAM, p. 25-68, 2008., p. 29).

Por outro lado, a terra relaciona-se ao procedimento jurídico-administrativo conduzido pelo Estado para regulamentação da demarcação dos territórios tradicionalmente ocupados pelos povos indígenas, incluindo a titulação jurídica auferida como mecanismo de materialização do direito à terra. Em complemento, Baniwa indica que “a delimitação territorial supõe fixação de limites para que dentro deles os índios desenvolvam seus costumes, culturas e seus modos de autogoverno e jurisdição” (2006, p. 103). Por vezes, o território reivindicado por determinado povo indígena é diferente, em dimensão geográfica, da terra titulada pelo Estado, e mesmo quando estes coincidem, há de se considerar que a construção territorial é algo dinâmico e em constante atualização, tanto quanto as próprias culturas dos povos, o que gera um conflito entre a rigidez do procedimento estatal e a fluidez da dinâmica cultural de territorialização11 11 Deve-se abordar, ainda, a preocupação de Almeida (2009) de diferenciar os fundamentos das terras de uso comum do direcionamento para quaisquer das dicotomias estabelecidas entre privado e comunal, entre individual e o coletivo ou, por fim, entre o legal e o fundado nos costumes. Se há que se classificar a dinâmica sociocultural de constituição das terras de uso comum é no espaço vazio – e por isso carregado de possibilidades – do “entre”, ou seja, de construções sócioterritoriais que não podem ser reduzidas às classificações jurídicas estatais justamente porque compreendem, ao mesmo tempo, ambos os polos da dicotomia e algo para além da dicotomia, num fluxo de delimitação própria do dinamismo cultural e das conjunturas político-econômicas. .

O direito à terra e ao pertencimento territorial segundo os fundamentos étnico-culturais indígenas são, certamente, direitos de caráter fundamental para assegurar a sobrevivência física e cultural dos grupos. Sobre isso, a DDPI possui diversas garantias jurídicas, as quais são referidas no Informe. No entanto, a atenção da análise se dá em relação ao artigo 21 da DDPI, para acentuar a presença da categoria juventude relacionada à “creación de condiciones económicas y sociales en los territorios indígenas” (RJIAL e FILAC, 2017, p. 18). Intencionalmente é reforçada a perspectiva de desenvolvimento étnico associada à garantia dos territórios indígenas, pois na análise das múltiplas causas que impedem ou vulnerabilizam a efetividade deste direito, uma delas é tratada por elemento tipicamente juvenil: a migração, especialmente às cidades.

45. La migración de jóvenes indígenas es un tema de fundamental importancia y discusión para el control de los territorios indígenas. Los pueblos indígenas y sus jóvenes son principalmente rurales y en su mayoría poseedores de sus territorios. Sin embargo, un creciente fenómeno es la migración de los jóvenes indígenas a las urbes. Según la observación del estudio “Juventud indígena y afrodescendiente en América Latina: inequidades sociodemográficas y desafíos de políticas” sobre la ronda de censos nacionales de 2000, un “44% de jóvenes indígenas residen en zonas urbanas […] en Argentina, el Estado Plurinacional de Bolivia, Brasil, Chile y la República Bolivariana de Venezuela los jóvenes indígenas se asientan principalmente en las ciudades”. Estos datos evidencian un problema con la relación a los jóvenes indígenas y su territorio (RJIAL e FILAC, 2017, p. 20).

O crescimento do fluxo migratório entre os povos indígenas para as cidades da América Latina está intimamente relacionado às movimentações das juventudes, até mesmo no sentido de construir os referenciais de entendimento do “ser jovem” no contexto étnico e em outros espaços de socialização. No entanto, estes deslocamentos são identificados como fatores de risco para manutenção do direito à terra e da transmissão intergeracional de pertencimento territorial.

No México, Aquino (2012)AQUINO MORESCHI, Alejandra. De las luchas índias al sueño americano. Experiencias migratórias de jóvenes zapotecos y tojolabales en Estados Unidos. México: Centro de Investigaciones y Estudios Superiores em Antropologia Social; Universidad Autónoma Metropolitana Xochimilco, 2012. e Urteaga (2008)URTEAGA, Maritza. Lo juvenil en lo étnico. Migración juvenil indígena en la sociedad conteporánea mexicana. In: Porto-e-Vírgula, n. 4, p. 261-275, 2008. ressalta que os fluxos migratórios juvenis tendem não apenas à urbanização – priorização de saída dos territórios étnicos rumo às cidades – mas também à centralização – concentração migratória em poucas grandes cidades mexicanas e norte-americanas12 12 Segundo Urteaga, “el Distrito Federal y su zona metropolitana, Monterrey y Guadalajara. Ellas y otras 106 áreas en el país con ciudades dinámicas económica y culturalmente – con mayores posibilidades de empleo y estudio – son las que atraen a la población joven expulsada de las regiones indígenas en las que persisten condiciones de mayor exclusión de los índices de bienestar social” (Urteaga, 2008, p. 10). Em complemento, Aquino, que investigou a migração de jovens zapotecos e tojolabales de Chiapas para os Estados Unidos, indica que “Hasta el momento no existen cifras confiables sobre el número de chiapanecos que viven en Estados Unidos. El Consejo Estatal de Población del estado de Chiapas (Coespo) calcula que para el año 2005 habitaban en el país vecino alrededor de trescientos mil chiapanecos, la mayoría de entre 15 y 35 años de edad, provenientes de las zonas rurales… Los lugares de destino de los chiapanecos son de lo más variado. Abarcan estados como Georgia, California, Nueva York, Florida, Arizona y Carolina del Norte” (Aquino, 2012, p. 134). . A motivação migratória está associada à agudização dos efeitos do capitalismo neoliberal na gestão governamental e na exploração dos territórios étnicos, ocasionando a intensificação da deterioração das bases materiais das comunidades e, com isso, processos migratórios que reconfiguram acordos familiares e comunitários, além de marcar a vida dos que se vão e dos que ficam.

No contexto brasileiro, Rangel, Galante e Cardoso (2013)RANGEL, Lucia Helena; GALANTE, Luciana; CARDOSO, Cynthia Franceska. A presença indígena nas cidades. In: VENTURI, Gustavo; BOKANY, Vilma (orgs.). Indígenas no Brasil: demandas dos povos e percepções da opinião pública. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, p. 113-128, 2013. realizaram pesquisa com 402 indígenas de 41 etnias, nas cidades de Campo Grande, Fortaleza, Manaus, Porto Alegre e São Paulo, chegando ao resultado de que “[a] idade média com que [as pessoas entrevistadas] migraram para a cidade é por volta de 19 anos, sendo a maior parcela (23%) entre 15 e 24 anos de idade, 20% saíram da aldeia entre 10 e 15 anos, e 18% depois dos 24 aos 40 anos” (2013, p. 115). As autoras indicam que a migração aldeia-cidade é, muitas vezes, a única opção para acessar os direitos e os serviços, especialmente de educação, trabalho e geração de renda.

A busca por oportunidades para a melhoria das condições de vida, fator preponderante de migração de jovens indígenas, gera um efeito potencialmente negativo de redução populacional, descontinuidade dos vínculos comunitário-culturais – incluindo o pertencimento territorial – e problemas de adaptação ao contexto urbano, sobretudo pela emergência de “novas” discriminações e exclusões sociais.

Além disso, o Informe sinaliza que

49. La migración es un fenómeno que limita el control de los pueblos indígenas sobre sus territorios, la cual está asociada a la no tenencia de tierra en su nivel colectivo e individual y la falta de oportunidades a los jóvenes en las zonas rurales, como es la falta de acceso a educación, a la salud y al empleo. El tema de la migración es un tema preocupante porque no existen las condiciones para que los jóvenes migren; sin embargo la población migrante en los pueblos indígenas es la población joven. La migración tiene raíz en la falta de oportunidades en los territorios indígenas. Los jóvenes indígenas migran porque las familias indígenas sienten que ellos se adaptaran mejor a los cambios en las zonas urbanas, también sienten que la migración abrirá posibilidades laborales, educación y salud a los jóvenes (RJIAL e FILAC, 2017, p. 21).

A relação entre seguridade territorial e presença das juventudes está associada, no documento, à transmissão intergeracional do pertencimento territorial e do desenvolvimento étnico. Mas, nesse caso, desenvolvimento étnico tem relação direta com a capacidade de acessar serviços e direitos dentro dos territórios indígenas. Com isso, busca-se fazer com o que o território étnico oportunize as condições necessárias para o desenvolvimento endógeno dos sujeitos, não necessariamente impedindo que hajam migrações, porém que elas sejam parte de um leque de escolhas que os membros, e particularmente os jovens, possam ter para suas trajetórias de vida, e não a única saída para a sobrevivência socioeconômica, em detrimento dos vínculos culturais e territoriais.

Por isso, dentre as recomendações indicadas no Informe, destacam-se:

51. Instar a los Estados a crear oportunidades de educación, salud y empleo en zonas rurales para mitigar el fenómeno de la migración de jóvenes indígenas a áreas urbanas (RJIAL e FILAC, 2017, p. 21).

150. Apoyar las actividades productivas y económicas de las juventudes indígenas facilitando recursos a sus organizaciones propias, creando incentivos para actividades productivas en el marco del respeto a sus conocimientos, culturas, prácticas tradiciones y saberes ancestrales de los pueblos indígenas (RJIAL e FILAC, 2017, p. 45).

Há uma nítida priorização das reivindicações ao investimento estatal em políticas públicas nos territórios étnicos com foco nas principais demandas de jovens indígenas como mecanismo redutivo do movimento migratório e fortalecedor do pertencimento territorial. Isto, tendo por base, também, o investimento em organizações autogestionadas por jovens indígenas ligadas às atividades produtivas e econômicas, buscando fomentar o desenvolvimento étnico por meio do protagonismo das capacidades juvenis.

Ressalte-se que oportunizar o exercício dos direitos sociais nos territórios indígenas – ou zonas rurais, como colocado no Informe – não quer dizer que o processo migracional das juventudes indígenas será impedido, mas o seu patamar de ocorrência passa a depender de outras razões que não a simples necessidade de sobrevivência socioeconômica. E mais, a valorização da presença juvenil nos territórios étnicos é indício de que a transmissão intergeracional é um dos principais fatores para a garantia da seguridade territorial.

Porém, outro fator ligado à seguridade territorial é a própria existência de titulação das terras aos povos indígenas. Aqui, abre-se outro leque de discussão no Informe, ligado às dificuldades para o reconhecimento formal dos territórios indígenas pela moldagem jurídica do direito à terra. Dentre os fatores analisados no documento, está o processo de titulação e demarcação das terras indígenas, pois além de lentos e burocráticos, e com formalizações jurídicas que mantém a tutela estatal, há o entendimento de que “[e]l proceso de titulación y demarcación no incorpora a los pueblos indígenas, mucho menos a jóvenes y mujeres” (RJIAL e FILAC, 2017, p. 20).

A constatação da ausência ou deficiência de participação dos povos indígenas nos espaços de decisão sobre o processo de titulação e demarcação das terras é complementada pelo entendimento de que esta exclusão é ainda maior com alguns segmentos internos dos povos indígenas, com destaque para jovens e mulheres. Com isso, há reforço do posicionamento de que esta participação não apenas é restrita, mas ainda quando ocorre costuma acentuar a desigualdade de participação entre os membros de determinado povo indígena, sendo espaço de gestão estatal que acaba privilegiando ou fomentando o posicionamento de determinado perfil de sujeitos indígenas, no qual não está, via de regra, contemplado o marcador geracional e de gênero. Portanto, são mecanismos participativos com potencial de gerar o acirramento da exclusão e da desigualdade nas relações de poder dentro dos povos indígenas, podendo desencadear diversos efeitos negativos para a manutenção da organização social e das relações de convivência, entre outros aspectos, com maior intensidade de afetação aos jovens e às mulheres.

De forma complementar, Cameras (2015)CAMERAS MYERS, Mariel. Las siete alianzas. Androcentrismo en la impartición de justicia. In: OLIVEIRA BUSTAMANTE, Mercedes et al. (orgs.). Reproducción social de la marginalidad: exclusión y participación de las indígenas y campesinas de Chiapas. Tuxtla Gutiérrez: UNICACH, p. 383-409, 2015. também analisa, no contexto do município indígena de Oxchuc, em Chiapas, México, como o direito à terra foi reconfigurado com a implantação do Programa de Certificación de Derechos Ejidales (PROCEDE), o qual reforçou práticas sexistas “ao reconocer como titulares de derechos agrários sólo a ejidatarios y comuneros; esto dejó fuera a la inmensa mayoría de mujeres campesinas que no tenían esa calidad jurídica” (2015, p. 392). Além do programa estatal ter mudado a lógica de reconhecimento da terra, de patrimônio familiar para individual, hegemonicamente masculino e adulto, também teve justificada ou naturalizada internamente a consequente exclusão do acesso à titulação da terra às mulheres, pois os pais e chefes de família argumentam que as mulheres não podem herdar a terra devido o casamento implicar a aquisição de outras terras por meio de seus esposos.

O desafio está justamente em discutir processos participativos e mecanismos normativos de demarcação e titulação de terras que atentem para as complexidades e as representatividades internas dentro dos povos indígenas, valorizando os enfoques geracionais e de gênero. Isto porque, muito mais do que enfocar apenas no resultado final, ou seja, na garantia do direito à terra, está-se a problematizar os aspectos processuais presentes neste direito que contém o potencial de gerar maior ou menos grau de afetação à coesão social do grupo. Disto, enfoca-se a necessidade de não somente assegurar a terra como direito fundamental dos povos indígenas, mas de realizar mudanças político-institucionais no mecanismo em si de demarcação e titulação da terra, com base na ênfase à participação e ao empoderamento de jovens e mulheres no contexto dos povos indígenas.

De acordo com García-Falces (2009)GARCÍA-FALCES, Nieves Zuñiga. La Declaración como instrumento para la convivencia intercultural y la cohesión social. In: ÁLVAREZ MOLINERO, Natalia; OLIVA MARTÍNEZ, J. Daniel; GARCÍA-FALCES, Nieves Zuñiga (eds.). Declaración sobre los Derechos de los Pueblos Indígenas: hacia um mundo intercultural y sostenible. Madrid: Catarata, p. 109-128, 2009., isto reforça o aspecto da coesão social relacionado à legitimidade política para estabelecer um grau de pertencimento e de consenso a respeito de um projeto comum por determinado povo indígena. Para isso, aborda o autor, é necessário incorporar todos os setores de uma sociedade, incluindo também a indígena, para a construção política e social da mesma, o que implica na necessidade de gerar condições adequadas de respeito entre os diferentes interlocutores e a comunicação entre eles, fazendo uso dos próprios instrumentos participativo que a DDPI oferece, como a consulta, a cooperação e a adoção conjunta de medidas entre os Estados e as instituições indígenas.

A articulação entre geração e gênero tem início na discussão sobre o direito à terra, mas será revisitada em muitos momentos do Informe, seja para sinalizar que os impactos aos direitos destes sujeitos possuem formas específicas de afetação devido aos seus marcadores identitários, seja para indicar que a efetivação dos direitos indígenas à tais sujeitos precisa ser feito de maneira conjunta com o atendimento de suas necessidades especiais, algo a relembrar, permanentemente, o enunciado do artigo 22 da DDPI.

Por certo, deve-se atentar ao fato de que pelo menos três das entidades que compõe a RJIAL serem organizações de mulheres indígenas: Asociación de Mujeres Ixq'aniil (Guatemala), Mujeres Indígenas del Wanki Tagni (Nicaragua) e Mujeres Indígenas por CIARENA (México). Portanto, a relação entre geração e gênero permeia a própria constituição da militância no campo juvenil, pois muitas jovens – e organizações que atuam com a temática – são mulheres que iniciaram ou constituíram grande parte de sua militância e atuação político-organizacional com a pauta dos direitos e das demandas das mulheres indígenas, fazendo, no campo juvenil, um recorte para tratar temas de gênero pela ótica geracional.

As construções dos significados de ser mulher e ser mulher jovem nos povos indígenas “es uno de los aspectos que más fuertemente está cambiando en el seno de las poblaciones indígenas” (Perez Ruiz, 2008, p. 32), articulado às mudanças sociais que afetam as coletividades e às interações em que as mulheres agem, de modo a formularem demandas específicas de gênero que ora abarcam as mulheres jovens indígenas e ora a totalidade das mulheres indígenas.

Uma das demandas materializa-se, no Informe, pela rediscussão da titulação e posse das terras indígenas com registros de titularidade (individual e/ou coletiva) que incluam os jovens e as mulheres indígenas. Nisso, duas recomendações se destacam:

48. La Declaración garantiza la seguridad de los territorios a nivel colectivo, como titulares de sus territorios, y a nivel individual, a los miembros de sus pueblos. También ven la necesidad de que los pueblos indígenas y los Estados, en un marco de respeto a las instituciones tradicionales, garanticen la tenencia de la tierra a las nuevas generaciones, incluidas a las mujeres (RJIAL e FILAC, 2017, p. 21).

50. Instar a las comunidades y organizaciones indígenas a establecer mecanismos, en el marco del derecho consuetudinario de los pueblos indígenas, para asegurar la tenencia de tierra a jóvenes y mujeres miembros de los pueblos indígenas (Idem).

Há nestas proposições uma preocupação com as relações de poder pautadas em preceitos jurídicos estatais e consuetudinários que produzem condições desiguais de titulação e de posse da terra aos jovens e às mulheres indígenas. Reverter este cenário dar-se-ia com o estabelecimento de novos mecanismos de titulação que assegurassem a igualdade de condições de acesso à terra para todos os membros dos povos indígenas. E, também, de inovação nos direitos consuetudinários dos povos indígenas para contemplar as demandas geracionais e de gênero pela seguridade do pertencimento territorial e da coesão social.

2.3. Saúde

A avaliação do cumprimento do direito à saúde inicia pela apresentação da única medida da DDPI diretamente relacionada ao tema: o artigo 2413 13 “Artigo 24, 1. Os povos indígenas têm direito a seus medicamentos tradicionais e a manter suas práticas de saúde, incluindo a conservação de suas plantas, animais e minerais de interesse vital do ponto de vista médico. As pessoas indígenas têm também direito ao acesso, sem qualquer discriminação, a todos os serviços sociais e de saúde. 2. Os indígenas têm o direito de usufruir, por igual, do mais alto nível possível de saúde física e mental. Os Estados tomarão as medidas que forem necessárias para alcançar progressivamente a plena realização deste direito” (ONU, 2007, p. 13-14). . Este texto normativo possui semelhança de conteúdo com o artigo 25 da Convenção nº. 169 da OIT, de 1989, especificamente quanto aos incisos 114 14 “Artigo 25. 1. Os governos deverão zelar para que sejam colocados à disposição dos povos interessados serviços de saúde adequados ou proporcionar a esses povos os meios que lhes permitam organizar e prestar tais serviços sob a sua própria responsabilidade e controle, a fim de que possam gozar do nível máximo possível de saúde física e mental” (Brasil, 2004). e 215 15 “Artigo 25. [...] 2. Os serviços de saúde deverão ser organizados, na medida do possível, em nível comunitário. Esses serviços deverão ser planejados e administrados em cooperação com os povos interessados e levar em conta as suas condições econômicas, geográficas, sociais e culturais, bem como os seus métodos de prevenção, práticas curativas e medicamentos tradicionais” (Brasil, 2004). , no tocante à igualdade de acesso e qualidade dos serviços ofertados, e o respeito às práticas de saúde tradicional.

Segundo Gomiz e Salgado (2010)GOMIZ, Maria Micaela; SALGADO, Juan Manuel. Convenio 169 de la O.I.T. sobre Pueblos Indígenas: su aplicación en el derecho interno argentino. 2 ed. Neuquén: ODHPI, 2010., isto implica que o serviço de saúde a ser planejado e executado,

respetará las culturas y tradiciones indígenas, reconociendo que el mantenimiento de la salud contiene un elemento social que se descuida cuando, generalmente por prejuicios de la cultura dominante, se pretende aplicar recetas supuestamente universales a condiciones culturales diferentes (2010, p. 292).

Os riscos de aplicação de receitas supostamente universais a condições culturais diferentes geram efeitos negativos de desagregação, submissão e discriminação que agem diretamente na capacidade dos povos indígenas de manterem seus sistemas tradicionais de cuidado e de percepção sobre doença e saúde. Daí o imperativo do reconhecimento das múltiplas dimensões sociocosmológicas que a saúde possui para os povos indígenas, não apenas circunscrita à relação doença-saúde, mas na concepção diferenciada de interação com os seres, de cuidado com o corpo e de desenvolvimento da pessoa, isto desde a infância (Cohn, 2005COHN, Clarice. Antropologia da criança. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2005.; Tassinari, 2007TASSINARI, Antonela. Concepções indígenas de infância no Brasil. In: Revista Tellus, ano 7, n. 13, p. 11-25, 2007. Disponível em: < www.neppi.org/ projetos/gera_anexo. php?id=1282>. Acesso em: 18 ago. 2011.) e ao longo de toda a vida (Baniwa, 2006BANIWA, Gersem dos Santos Luciano. O Índio Brasileiro: o que você precisa saber sobre os povos indígenas no Brasil de hoje. Brasília: Ministério da Educação, Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade; LACED/Museu Nacional, 2006. Disponível em: <http://www.laced.mn. ufrj.br/trilhas/>. Acesso em: 25 mai. 2014.
http://www.laced.mn. ...
; Silva e Silva, 2007SILVA, Anna Cruz de Araújo P.; SILVA JR., Paulo Isan C. Para além de um Estatuto: direitos e obrigações de velhos indígenas. In: XVI Congresso Nacional/CONPEDI, Belo Horizonte - Minas Gerais. Anais do XVI Congresso Nacional do CONPEDI. Florianópolis - Santa Catarina: Fundação Boiteux, 2007.).

No Informe, o diagnóstico sobre o cumprimento do direito à saúde inicia pela análise comparativa com o direito à educação, indicando que aquele direito não teve o mesmo desenvolvimento nos Estados nacionais de que este (RJIAL e FILAC, 2017). Porém, em seguida são apresentados dados estatísticos sobre a maternidade de mulheres adolescentes e jovens (na faixa etária de 15 a 24 anos) indígenas e não-indígenas, classificado no documento como “maternidad temprana” (“maternidade precoce”).

86. El fenómeno de la maternidad temprana afecta principalmente a las jóvenes indígenas en comparación a las jóvenes no-indígenas en cada uno de los países en la tabla... Este fenómeno es alarmante cuando la tendencia de la región está marcada por la iniciación en la vida sexual a más temprana edad en indígenas y no-indígenas. Sin embargo, los resultados de este fenómeno son diferentes: la población no-indígena posterga las uniones y la tenencia del primer hijo, frente a la población indígena que aumenta la maternidad temprana y contrae enfermedades de transmisión sexual. Estos diferentes resultados en esta fenómeno evidencia la falta de acceso a los derechos reproductivos en las jóvenes indígenas (RJIAL e FILAC, 2017, p. 30).

A iniciação sexual em idade “temprana” ou “precoce” é percebida como um problema social para indígenas e não-indígenas, porém com efeitos diferentes ante o marcador étnico das mulheres. Para as não-indígenas, o uso de métodos contraceptivos para adiar a maternidade e o retardamento do matrimonio, atuam como mecanismos de balanceamento das relações sexuais. Para as indígenas, a maternidade “precoce” está em crescimento, assim como a transmissão de doenças sexuais, compreendendo que tais condições evidenciam a falta de acesso aos direitos reprodutivos.

No entanto, existem concepções valorativas em discussão que não são debatidas ou construídas desde um horizonte de recepção da diversidade cultural, incluindo as desigualdades e os conflitos internos às diversidades de gênero e geracionais. O que está em jogo é saber o que seria o “temprana” ou “precoce” desde uma perspectiva indígena, no caso da gravidez? E, além disso, qual seria a concepção de acesso aos direitos reprodutivos?

Por certo, os direitos reprodutivos são um dos campos dos direitos humanos que tem avançado na problematização, em conjunto com os direitos sexuais, das relações desiguais de gênero nos âmbitos que envolvem o planejamento familiar e a autonomia nas escolhas reprodutivas da mulher. Nisso, existem medidas jurídico-administrativas – como os métodos contraceptivos, a igualdade de gênero nas decisões familiares e sexuais, e o direito à informação e ao exercício das formas de expressão da sexualidade – que passaram a se consolidar como direitos humanos justamente para ressaltar o caráter universal da aplicação a todas as pessoas e de obrigação de cumprimento pelos Estados nacionais (Camarena Ojinaga et al., 2017CAMARENA OJINAGAA, Lourdes; et al. Sexual and reproductive health: perceptions of indigenous migrant women in northwestern Mexico. In: Journal of Health Psychology, 22(5), p. 661–673, 2017. Doi: 10.1177/1359105315611954
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).

Mas, no contexto dos povos indígenas, existe também uma dimensão geracional na adoção dos direitos reprodutivos e sexuais. A consideração à construção sociocultural de categorias geracionais, há o entendimento de que a pluralidade cultural dos povos indígenas implica no reconhecimento de condições diferenciadas de simbolização dos ciclos de vida. Portanto, “ser criança” ou “ser jovem” possui bases culturais distintas para representar os critérios de classificação e socialização, com maior ou menor grau de interação com os valores da sociedade não-indígena. Com isso, deve-se considerar como esta diversidade de concepção sobre os ciclos de vida reverbera na regulação dos elementos de produção da cultura, como os sentidos e as práticas atribuídas à gravidez, ao matrimônio e às relações sexuais. Assim, o caráter “precoce” da gravidez é uma avaliação que precisa considerar as percepções locais sobre geração, gênero e sexualidade, de modo a construir as bases valorativas da argumentação em sintonia com os aportes culturais, não desconsiderando as relações de poder, desigualdade e de violência que permeiam a convivência comunitária e social, sobretudo em relação às jovens mulheres indígenas.

Nisso, Camarena Ojinaga et al. (2017) e Priego-Hernández (2017)PRIEGO-HERNÁNDEZ, Jacqueline. Sexual health in transition: A social representations study with indigenous Mexican young women. In: Journal of Health Psychology, 22(5), p. 661–673, 2017. Doi: 10.1177/1359105315611954
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desenvolveram pesquisas sobre saúde sexual com jovens mulheres indígenas no México, em que a representação do acesso aos serviços, às informações e aos medicamentos de caráter reprodutivo é majoritariamente contrastado aos valores culturais do povo a que pertencem16 16 Para Camarena Ojinaga et al.: “In some cases, couples discussed family planning with each other, but sociocultural barriers prevented them from communicating about sexuality with their children. The health sector is a major source of information about sexual and reproductive health although not about sexuality or gender” (2017, p. 245). , indicando tratar-se de uma melhoria social e individual que precisa “transpor-se” as condições culturais de regulação das relações sexuais, de gênero e matrimônio17 17 Segundo Priego-Hernández: “Indigenous young women positioned themselves as part of the indigenous group, which is consistently believed to marry girls early and to expect them to bear many children, according to agrarian modes of reproduction. In taking this as a reference to avoid, they also inserted themselves in the contemporary generation, with their current needs and projects, thereby questioning the relevance of the sexual and reproductive practices they have seen in others, distancing themselves from the evident disadvantages of past generations and displacing this knowledge for one that better suits their realities” (2017, p. 666). identificadas como “conversadoras”, muitas vezes defendidas pelas mulheres indígenas mais velhas e não pelas mais jovens.

O problema de enveredar por esta perspectiva de entendimento dos direitos reprodutivos e sexuais está na adoção destes direitos como mecanismos de “correção” das práticas culturais, de modo a reificar a colonialidade do poder que subjuga os modos de vida dos povos indígenas. Por certo, como aponta Sieder (2017)SEIDER, Rachel. Introducción. Mujeres indigenas y pluralidades legales en América Latina: repensando la justicia y la seguridade. In: SEIDER, Raquel (coord.). Exigiendo justicia y seguridade: mujeres indígenas y pluralidades legales em América Latina. Ciudad de México: Centro de Investigaciones y Estudios Superiores em Antropología Social, p. 13-48, 2017., o ativismo político-organizacional das mulheres indígenas tem utilizado da linguagem e dos instrumentais dos direitos para nomear as injustiças de gênero e procurar transformações sociais, de modo a desconstruir aspectos da “tradição” e da “cultura” que gerem efeitos negativos às suas vidas18 18 E complementa Sieder: “... las mujeres pueden padecer discriminación sistemática y violencia en sus propias comunidades y familias, reflejando los históricos sesgos de género en la sociedad. ‘La costumbre’ se esgrime a menudo a nivel local como justificación para continuar con las formas íntimas y patriarcales de exclusión y control. Estas normas y prácticas reflejan ideologías de género específicas y son reproducidas por hombres y mujeres a fin de imponer ciertas formas de conducta femenina o para evitar que las mujeres tengan el derecho igualitario a las tierras, a la educación y a la participación en asuntos comunitarios” (2017, p. 21). .

Porém, a apropriação dos valores imbuídos nas concepções de direitos – seja os de caráter sexual ou qualquer outro tema – sem o olhar atento aos fundamentos culturais destas concepções e os efeitos sociais da aplicação aos contextos indígenas, gera uma ordem unilateral de mudanças a serem implantadas, via a compressão de que só caberia aos povos indígenas adotarem tais direitos tal como estipulados num plano universal, e não o procedimento reverso, é dizer, de como as práticas culturais de saúde, reprodução e sexualidade – e os sistemas jurídicos indígenas – podem “melhorar” ou interculturalizar os direitos reprodutivos e sexuais. Sobre este segundo ponto, o Informe chega a propor que

90. En relación a la seguridad física que la salud debe proteger. Los jóvenes, con preocupación, identifican la falta de desarrollo de una perspectiva intercultural de los derechos reproductivos. La falta de esta perspectiva ha producido embarazos tempranos y transmisión de enfermedades sexuales. Las juventudes indígenas tienen el derecho de acceder al ejercicio de sus derechos sexuales en el marco de un debate intercultural y abierto. En este sentido, los jóvenes han identificado prácticas tradicionales que vulneran la salud física y emocional de jóvenes y niñas, como es el matrimonio infantil (RJIAL e FILAC, 2017, p. 33).

95. Realizar talleres y consensos para la elaboración de una propuesta intercultural de derechos reproductivos (RJIAL e FILAC, 2017, p. 34).

O exercício de produção do “debate intercultural e aberto” dos direitos reprodutivos e sexuais exige um cuidado com o uso de termos e conceitos sob uma base valorativa pretensamente universal, mas marcadamente colonial. Da mesma forma como em relação à gravidez “precoce”, a discussão sobre o matrimônio infantil também é apresentada no Informe como prática tradicional de caráter negativo ou violador de direitos humanos. Porém, a adoção deste posicionamento parece está mais ligado à defesa de direitos universalizados, do que na interculturalização dos elementos que fundamentam a base normativa, como infância, maternidade, gravidez e gênero. Isto não significa desconsiderar as relações de poder e as formas de violência, apenas impede que estas sejam pensadas pela ótica da generalização dos cenários de vida e da aplicação dos direitos.

Portanto, o desafio de construir a interculturalidade nos direitos reprodutivos e sexuais, exige problematizar: como a diversidade cultural entre os povos indígenas repercute na diversidade de materialização das relações de gênero, geração e sexualidade? De que modo estas relações podem gerar condições desiguais de convivência entre homens e mulheres, assim como de orientação sexual19 19 Aliás, cabe sublinhar que toda discussão de direitos sexuais e reprodutivos é desenvolvida, no Informe, sobre uma base de igualdade de gênero, mas não de reconhecimento das orientações sexuais. Portanto, este seria outro ponto a avançar na análise para entendimento sobre realidades no campo juvenil dos povos indígenas e as articulações com direitos, práticas culturais e medidas a serem adotadas. ? E, quais medidas poderiam ser adotadas, respeitando os direitos e a autodeterminação dos povos indígenas?

Considerações finais

A mobilização político-organizacional e a proposição discursiva de jovens indígenas inseridos na RJIAL concebem uma perspectiva de direitos indígenas associada ao dinamismo e à expansão dos conteúdos associadas aos termos “direitos” e “indígenas”. As informações contidas no Informe, sobre a avaliação do cumprimento da DDPI, atestam o compromisso de jovens indígenas na defesa das demandas estruturais dos povos indígenas acrescida de inovações de análise e reivindicação de ações socioestatais, ligadas ao enfoque geracional das violações e das demandas de direitos. Ao mesmo tempo, problematizam as relações de poder instituídas entre povos indígenas, sociedade e Estado, de modo a estabelecer um olhar crítico sobre a realidade social dos povos indígenas e a apropriação das categorias geracionais de infância, adolescência e juventude.

Por outro lado, demandam, constantemente, a articulação entre geração e gênero para discutir condições de igualdade de direitos mais complexa e voltada à visibilização de condicionantes culturais e de injustiças sociais ligadas aos povos indígenas que precisam acentuar uma leitura das especificidades internas dos sujeitos étnicos, assim como do englobamento de outros campos jurídicos, como os direitos reprodutivos e sexuais, que possam ampliar a capacidade de leitura dos direitos indígenas.

Em suma, as e os jovens indígenas colocam em evidência que o reconhecimento da pluralidade cultural e do protagonismo dos povos indígenas, precisa ser feito de maneira ampla e radical, num esforço crescente de interculturalização do Estado e da sociedade, de modo a fazer das diversidades o eixo central de acesso aos direitos. Por outro lado, a movimentação de jovens indígenas em relação ao enfoque geracional dos direitos indígenas também está atenta à situação histórica e atual do diálogo intergeracional e das relações de poder internas aos povos indígenas. Nisso, colocam a importância de ampliar os espaços de interação intergeracional para o fortalecimento dos elos de socialização entre as gerações indígenas e a construção de pontes de interlocução entre inovações e tradições culturais.

Com a chegada do 10º aniversário da DDPI, em 2017, percebe-se a consolidação do papel e da inserção de jovens indígenas nos espaços de discussão do direito internacional dos povos indígenas. Porém, coloca-se em debate os possíveis riscos desta produção político-discursiva militante quando se articula os direitos indígenas com critérios ou valores universais dos direitos humanos, como o critério de responsabilidade para categorização das juventudes indígenas e os direitos reprodutivos e sexuais para discussão do planejamento familiar e autonomia das mulheres indígenas. Alerta-se, sobretudo, à necessidade de garantir a apropriação de conceitos e categorias dos direitos humanos desde uma perspectiva que sempre interrogue as origens histórico-culturais das categorias e dos direitos, fazendo, com isso, uma necessária apropriação baseada no potencial propositivo da diversidade cultural e da interculturalidade.

Desde uma perspectiva interseccional, a configuração das realidades e demandas de jovens indígenas demonstra o caráter acumulativo das desigualdades e opressões sociais vivenciadas. Por isso, falar de direitos para as juventudes indígenas, especialmente no Informe da RJIAL, implica também reconstruir os imaginários das relações sociais comunitárias e das condições de formulação e aplicação de direitos nos contextos culturais.

  • 1
    A partir das seguintes representações institucionais: Rede de Juventude Indígena (REJUIND/Brasil); Centro de Estudios Multidisciplinarios-Aymara (CEM-Aymara/Bolivia); Asociación de Mujeres Ixq'aniil (Guatemala); Mujeres Indígenas del Wanki Tagni (Nicaragua); Mujeres Indígenas por CIARENA (México); Colectivo Yani Tundavii Dikuintii (México); e, Congreso General Embera de Alto Bayano (Panamá).
  • 2
    Dentre estes eventos, listam-se: a Asamblea Latinoamérica de Jóvenes Indígenas, realizada na comunidade indígena do Faisán, em Oaxaca/México, entre os dias 6 e 7 de agosto de 2016; o Seminário Virtual Perspectiva Regional de Jóvenes Indígenas a 10 años de la Declaración de la Naciones Unidas sobre los Derechos de los Pueblos Indígenas, ocorrido no dia 27 de março de 2017; a reunião junto à Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e o Global Indigenous Youth Caucus, em Roma/Itália, durante os dias 5 e 8 de abril de 2017; e, por último, a Reunião Latinoamericana de Jovens Indígenas com a Organização Pan-americana de Saúde (OPAS), entre os dias 11 e 12 de abril de 2017, em Brasília/Brasil.
  • 3
    Esta unidade foi criada mediante resolução aprovada na XII Assembleia Geral Ordinária da FILAC, ocorrida entre 16 e 17 de julho de 2015, em Bogotá/Colômbia. Na minuta das resoluções deste evento, consta: “Que, el equipo técnico de la Presidencia del Consejo Directivo presentó una propuesta de Plan Estratégico para el periodo 2015 a 2016 contemplando los ejes de los Programas Emblemáticos que se han venido impulsado hasta la fecha a los que se han sumado dos nuevos programas: el de Juventud y el de Pueblos Indígenas en aislamiento voluntario” (FILAC, 2015, p. 3).
  • 4
    “As discussões sistematizam 8 eixos temáticos da avaliação da Declaração: direito a não discriminação, terra e território, cultura, educação, saúde, participação, trabalho e comunicação e informação. Cada tema é analisado en quatro subíndices: (i) desenvolvimento do direito, (ii) situação e dados em relação à implantação do direito, (iii) análise da implantação do direito e (iv) tarefas a realizar” (RJIAL e FILAC, 2017, p. 14. Tradução nossa). Optei por tratar destes três temas por conterem diversos elementos que possibilitam problematizar a perspectiva geracional de jovens indígenas, além de serem assuntos e direitos estruturais para os povos indígenas.
  • 5
    Entre os documentos, listo: Convenção para Prevenção e Sanção ao Genocídio, de 1948; Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, ambos de 1966; Convenção para Eliminação da Discriminação Racial, de 1968; Convenção do Patrimônio Mundial Cultural e Natural, de 1972; Convenção nº. 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), de 1989; Convenção da Diversidade Biológica, de 1992; Declaração Universal sobre a Diversidade Cultural, de 2001; Convenção da Diversidade de Expressões Culturais, de 2005; DDPI, de 2007; e, Declaração Americana dos Direitos dos Povos Indígenas, de 2016.
  • 6
    “Artigo 21. [...] 2. Os Estados adotarão medidas eficazes e, quando couber, medidas especiais para assegurar a melhora contínua das condições econômicas e sociais dos povos indígenas. Particular atenção será prestada aos direitos e às necessidades especiais de idosos, mulheres, jovens, crianças e portadores de deficiência indígenas” (ONU, 2007ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas. Rio de Janeiro: Nações Unidas, 2007., p. 12-13).
  • 7
    “Artigo 22. [...] 1. Particular atenção será prestada aos direitos e às necessidades especiais de idosos, mulheres, jovens, crianças e portadores de deficiência indígenas na aplicação da presente Declaração” (ONU, 2007ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas. Rio de Janeiro: Nações Unidas, 2007., p. 13).
  • 8
    Infância como as pessoas até 18 anos, adolescência de 10 a 19 anos e juventude de 15 a 24 anos (RJIAL e FILAC, 2017). No Brasil, as definições são diferentes, com a infância até os 12 anos incompletos e a adolescência de 12 até os 18 anos incompletos. Por fim, a juventude dos 15 aos 29 anos. Em ambos os casos, perceba que as delimitações acabam se sobrepondo em determinados períodos etários, o que torna ainda mais complexa a aplicação jurídica dos critérios e dos direitos.
  • 9
    “Artigo 2º. Os povos e pessoas indígenas são livres e iguais a todos os demais povos e indivíduos e têm o direito de não serem submetidos a nenhuma forma de discriminação no exercício de seus direitos, que esteja fundada, em particular, em sua origem ou identidade indígena” (ONU, 2007ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas. Rio de Janeiro: Nações Unidas, 2007., p. 5).
  • 10
    Detidamente o artigo 2.1. da CDC e o artigo 5º da CIDJ, com o seguintes textos normativos: 1. Os Estados Partes respeitarão os direitos enunciados na presente Convenção e assegurarão sua aplicação a cada criança sujeita à sua jurisdição, sem distinção alguma, independentemente de raça, cor, sexo, idioma, crença, opinião política ou de outra índole, origem nacional, étnica ou social, posição econômica, deficiências físicas, nascimento ou qualquer outra condição da criança, de seus pais ou de seus representantes legais” (Brasil, 1990BRASIL. Decreto N° 99.710, de 21 de novembro de 1990 (Promulga a Convenção sobre os Direitos da Criança). Brasília: Casa Civil, 1990. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/D99710.htm >. Acesso em: 25 mai. 2014.
    http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/dec...
    ); “Artigo 5. Princípio de não-discriminação. O gozo dos direitos e liberdades reconhecidos aos jovens na presente Convenção não admite nenhuma discriminação fundada na raça, na cor, na origem nacional, na pertença a uma minoria nacional, étnica ou cultural, no sexo, na orientação sexual, na língua, na religião, nas opiniões, na condição social, nas aptidões físicas, ou na deficiência, no lugar onde se vive, nos recursos econômicos ou qualquer outra condição ou circunstância pessoal ou social do jovem que pudesse ser invocada para estabelecer discriminações que afetem a igualdade de direitos e as oportunidades ao gozo dos mesmos” (OIJ, 2005ORGANIZACIÓN IBEROAMERICANA DE JUVENTUD (OIJ). Convención Iberoamericana de Derechos de los Jóvenes. Madrid; Buenos Aires: OIJ, 2005.).
  • 11
    Deve-se abordar, ainda, a preocupação de Almeida (2009)_____. Terras de preto, terras de santo, terras de índio: uso comum e conflito. In: GODOI, Emília Pietrafesa de et al (org.). Diversidade do campesinato: expressões e categorias. São Paulo, Editora UNESP; Brasília, Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento Rural, p. 39-66, 2009. de diferenciar os fundamentos das terras de uso comum do direcionamento para quaisquer das dicotomias estabelecidas entre privado e comunal, entre individual e o coletivo ou, por fim, entre o legal e o fundado nos costumes. Se há que se classificar a dinâmica sociocultural de constituição das terras de uso comum é no espaço vazio – e por isso carregado de possibilidades – do “entre”, ou seja, de construções sócioterritoriais que não podem ser reduzidas às classificações jurídicas estatais justamente porque compreendem, ao mesmo tempo, ambos os polos da dicotomia e algo para além da dicotomia, num fluxo de delimitação própria do dinamismo cultural e das conjunturas político-econômicas.
  • 12
    Segundo Urteaga, “el Distrito Federal y su zona metropolitana, Monterrey y Guadalajara. Ellas y otras 106 áreas en el país con ciudades dinámicas económica y culturalmente – con mayores posibilidades de empleo y estudio – son las que atraen a la población joven expulsada de las regiones indígenas en las que persisten condiciones de mayor exclusión de los índices de bienestar social” (Urteaga, 2008URTEAGA, Maritza. Lo juvenil en lo étnico. Migración juvenil indígena en la sociedad conteporánea mexicana. In: Porto-e-Vírgula, n. 4, p. 261-275, 2008., p. 10). Em complemento, Aquino, que investigou a migração de jovens zapotecos e tojolabales de Chiapas para os Estados Unidos, indica que “Hasta el momento no existen cifras confiables sobre el número de chiapanecos que viven en Estados Unidos. El Consejo Estatal de Población del estado de Chiapas (Coespo) calcula que para el año 2005 habitaban en el país vecino alrededor de trescientos mil chiapanecos, la mayoría de entre 15 y 35 años de edad, provenientes de las zonas rurales… Los lugares de destino de los chiapanecos son de lo más variado. Abarcan estados como Georgia, California, Nueva York, Florida, Arizona y Carolina del Norte” (Aquino, 2012, p. 134).
  • 13
    “Artigo 24, 1. Os povos indígenas têm direito a seus medicamentos tradicionais e a manter suas práticas de saúde, incluindo a conservação de suas plantas, animais e minerais de interesse vital do ponto de vista médico. As pessoas indígenas têm também direito ao acesso, sem qualquer discriminação, a todos os serviços sociais e de saúde. 2. Os indígenas têm o direito de usufruir, por igual, do mais alto nível possível de saúde física e mental. Os Estados tomarão as medidas que forem necessárias para alcançar progressivamente a plena realização deste direito” (ONU, 2007ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU). Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas. Rio de Janeiro: Nações Unidas, 2007., p. 13-14).
  • 14
    “Artigo 25. 1. Os governos deverão zelar para que sejam colocados à disposição dos povos interessados serviços de saúde adequados ou proporcionar a esses povos os meios que lhes permitam organizar e prestar tais serviços sob a sua própria responsabilidade e controle, a fim de que possam gozar do nível máximo possível de saúde física e mental” (Brasil, 2004_____. Decreto nº 5.051, de 19 de abril de 2004 (Promulga a Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho – OIT sobre Povos Indígenas e Tribais). Brasília: Casa Civil, 2004. Disponível em: <http://www.planalto. gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2004/Decre to/D5051.htm>. Acesso em: 18 fev. 2018.
    http://www.planalto. ...
    ).
  • 15
    “Artigo 25. [...] 2. Os serviços de saúde deverão ser organizados, na medida do possível, em nível comunitário. Esses serviços deverão ser planejados e administrados em cooperação com os povos interessados e levar em conta as suas condições econômicas, geográficas, sociais e culturais, bem como os seus métodos de prevenção, práticas curativas e medicamentos tradicionais” (Brasil, 2004).
  • 16
    Para Camarena Ojinaga et al.: “In some cases, couples discussed family planning with each other, but sociocultural barriers prevented them from communicating about sexuality with their children. The health sector is a major source of information about sexual and reproductive health although not about sexuality or gender” (2017, p. 245).
  • 17
    Segundo Priego-Hernández: “Indigenous young women positioned themselves as part of the indigenous group, which is consistently believed to marry girls early and to expect them to bear many children, according to agrarian modes of reproduction. In taking this as a reference to avoid, they also inserted themselves in the contemporary generation, with their current needs and projects, thereby questioning the relevance of the sexual and reproductive practices they have seen in others, distancing themselves from the evident disadvantages of past generations and displacing this knowledge for one that better suits their realities” (2017, p. 666).
  • 18
    E complementa Sieder: “... las mujeres pueden padecer discriminación sistemática y violencia en sus propias comunidades y familias, reflejando los históricos sesgos de género en la sociedad. ‘La costumbre’ se esgrime a menudo a nivel local como justificación para continuar con las formas íntimas y patriarcales de exclusión y control. Estas normas y prácticas reflejan ideologías de género específicas y son reproducidas por hombres y mujeres a fin de imponer ciertas formas de conducta femenina o para evitar que las mujeres tengan el derecho igualitario a las tierras, a la educación y a la participación en asuntos comunitarios” (2017, p. 21).
  • 19
    Aliás, cabe sublinhar que toda discussão de direitos sexuais e reprodutivos é desenvolvida, no Informe, sobre uma base de igualdade de gênero, mas não de reconhecimento das orientações sexuais. Portanto, este seria outro ponto a avançar na análise para entendimento sobre realidades no campo juvenil dos povos indígenas e as articulações com direitos, práticas culturais e medidas a serem adotadas.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Jun 2019
  • Data do Fascículo
    Apr-Jun 2019

Histórico

  • Recebido
    26 Fev 2019
  • Aceito
    23 Mar 2019
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