Caracterização organizacional e pedagógica dos cursos técnicos em enfermagem das Escolas do SUS

RESUMO

Objetivos:

conhecer as características organizacionais e pedagógicas dos cursos técnicos em enfermagem das Escolas Técnicas do Sistema Único de Saúde da Região Nordeste.

Métodos:

estudo qualitativo, descritivo, desenvolvido em seis escolas que ofertam este curso. Foram utilizados, como fonte de dados, o Projeto Político Pedagógico e os Planos de Ensino, em busca de informações sobre as características organizacionais e pedagógicas dos cursos, mediante documentação indireta, empregando três roteiros estruturados.

Resultados:

a maioria das características dos cursos é convergente entre as escolas, mas itens da caracterização pedagógica inexistem, apresentando-se como fragilidade quanto ao delineamento de tais características normativas.

Considerações Finais:

A caracterização dos cursos demonstra empenho das escolas para formação de profissionais visando à qualidade da atenção à saúde/enfermagem no/para o Sistema Único de Saúde. Contudo, a fragilidade encontrada nos documentos emergiu como desafio a ser superado, a fim de melhor subsidiar o ensino-aprendizagem e qualificar a formação.

Descritores:
Educação Técnica em Enfermagem; Educação em Enfermagem; Enfermagem; Escolas para Profissionais de Saúde; Sistema Único de Saúde

ABSTRACT

Objectives:

to know the organizational and pedagogical characteristics of vocational courses in nursing of Unified Health System Vocational Schools in northeastern Brazil.

Methods:

this is a qualitative, descriptive study, developed in six schools that offer this course. As a data source, Pedagogical Political Project and Teaching Plans were used to search for information on courses’ organizational and pedagogical characteristics through indirect documentation, using three structured scripts.

Results:

most of the characteristics of the courses are convergent between schools, but pedagogical characterization items do not exist, presenting themselves as fragility regarding the outline of such normative characteristics.

Final Considerations:

the characterization of the courses demonstrates the schools’ commitment to training professionals aiming at quality of healthcare/nursing in/for the Unified Health System. However, the weakness found in the documents emerged as a challenge to be overcome, in order to better subsidize teaching and learning and qualify training.

Descriptors:
Nursing Education Research; Nursing; Training, Vocational; Research, Nursing Education; Nursing Research, Educational

RESUMEN

Objetivos:

conocer las características organizativas y pedagógicas de los cursos técnicos de enfermería en las Escuelas Técnicas del Sistema Único de Salud de la Región Nordeste.

Métodos:

estudio cualitativo, descriptivo, desarrollado en seis escuelas que ofrecen este curso. Como fuente de datos se utilizó el Proyecto Político Pedagógico y los Planes Docentes, en búsqueda de información sobre las características organizativas y pedagógicas de los cursos, a través de documentación indirecta, utilizando tres guiones estructurados.

Resultados:

la mayoría de las características de los cursos son convergentes entre escuelas, pero no existen elementos de caracterización pedagógica, presentándose como fragilidad en el esquema de tales características normativas.

Consideraciones Finales:

la caracterización de los cursos demuestra el compromiso de las escuelas con la formación de profesionales orientados a la calidad de la atención/enfermería en/para el Sistema Único de Salud, sin embargo, la debilidad encontrada en los documentos surgió como un desafío a superar, con el fin de subsidiar mejor la enseñanza y el aprendizaje y calificar la formación.

Descriptores:
Educación Técnica en Enfermería; Educación en Enfermería; Enfermería; Escuelas para Profesionales de la Salud; Sistema Único de Salud

INTRODUÇÃO

A formação técnica em enfermagem tem a finalidade de proporcionar aos educandos conhecimentos, saberes e competências profissionais imprescindíveis ao exercício profissional e à cidadania, tendo em vista a atuação diante das atuais demandas do sistema público de saúde brasileiro, o Sistema Único de Saúde (SUS), e das necessidades de saúde da população no que concerne à promoção, prevenção, recuperação e reabilitação dos processos saúde-doença^(1-2).

Na década de 1980, no contexto de estratégias de enfrentamento à desarticulação dos setores educação e saúde com vistas à formação para o SUS, foram criadas as Escolas Técnicas do SUS (ETSUS). Tais instituições públicas visavam, a priori, qualificar os trabalhadores de saúde de nível fundamental ou médio empregados no sistema de saúde brasileiro, tendo seus princípios e diretrizes como eixos norteadores dos planos de ensino. Configuram-se, na atualidade, como uma referência no Brasil para a formação, qualificação, (re)profissionalização e atualização de trabalhadores de saúde, exercendo papel significativo na reorientação e qualificação da prática profissional⁽³⁾.

O Brasil possui, atualmente, 40 ETSUS que compõem a Rede de Escolas Técnicas do SUS, instituída pela Portaria 1.298/2000, a qual, dentre outros objetivos, intenciona difundir metodologias e recursos tecnológicos destinados à melhoria das atividades de ensino, pesquisa e cooperação técnica, de modo que se apresenta como estratégia de construção de conhecimento em Educação Profissional em Saúde. A Região Nordeste, particularmente, conta com 12 escolas, das quais seis oferecem a formação técnica em enfermagem, o que a caracteriza como a região que, numericamente, mais oferta esse curso em relação às demais⁽⁴⁾.

No que se refere à dimensão pedagógica desta formação, alguns instrumentos normativos direcionam e facilitam o processo de ensino-aprendizagem, tendo em vista a realidade de saúde e da sociedade. Dentre esses instrumentos, destacam-se o Projeto Político Pedagógico (PPP) e os Planos de Ensino, documentos oficiais com propostas e estratégias que descrevem os valores, as concepções e intenções da formação⁽⁵⁾.

Torna-se, portanto, oportuno pensar a formação técnica em enfermagem considerando suas características organizacionais e pedagógicas, no contexto das ETSUS da Região Nordeste brasileira, uma vez que é imperativa a sua formação para o SUS. Além disso, destaca-se a relevância da atuação do técnico em enfermagem, por corresponder a, aproximadamente, 55% do total da força de trabalho da enfermagem, notadamente na linha de frente do cuidado⁽⁶⁾.

Ademais, verifica-se a incipiência de estudos nacionais que abordam a formação técnica em enfermagem, aspecto comprovado por meio de busca na Biblioteca Virtual em Saúde, em janeiro de 2018, utilizando o descritor “educação técnica em enfermagem” e os filtros “educação técnica em enfermagem”, “Brasil” e “artigos”, a qual identificou 11 publicações. Destas, quatro apresentaram duplicidade, totalizando sete produções apenas, cujas datas situavam-se entre 1977 e 2017. Os temas tratados nessas produções, em linhas gerais, foram biossegurança, saúde do trabalhador, Sistematização da Assistência de Enfermagem e a formação técnica em enfermagem, a qual foi enfocada em dois trabalhos.

Especificamente nos artigos em que a formação técnica em enfermagem foi tema/objeto de investigação, não foram abordadas as características organizacionais e/ou pedagógicas desta formação, entendidas, haja vista, como imprescindíveis para conhecer o perfil do profissional que se pretende formar. O primeiro trabalho versou sobre os aspectos históricos e éticos da formação profissional do técnico em enfermagem e apontou para um aprendizado marcado por desgaste e frustração, devido à dissociação entre os projetos da escola e o cotidiano institucional taylorizado. Por conseguinte, o segundo estudo abordou a profissionalização de atendentes de enfermagem e constatou tendência de ampliação na oferta de cursos e na demanda para a formação e as especializações de nível técnico.

Assim, diante da inquietação e preocupação com a formação de recursos humanos para o SUS, destacando o lugar estratégico das Escolas Técnicas, com foco nas características organizacionais e pedagógicas dos cursos e o caráter decisivo ocupado pelos trabalhadores técnicos de nível médio em enfermagem para a consolidação da política nacional de saúde, questiona-se: quais as características organizacionais e pedagógicas dos cursos técnicos em enfermagem das ETSUS para formação no/para o SUS?

OBJETIVOS

Conhecer as características organizacionais e pedagógicas dos cursos técnicos em enfermagem das Escolas Técnicas do Sistema Único de Saúde da Região Nordeste.

MÉTODOS

Aspectos éticos

O estudo observou os princípios éticos e científicos para pesquisa com seres humanos especificados na Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde, tendo sido aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa. Resguardou-se o anonimato das escolas coparticipantes, as quais foram identificadas com uma sigla, cognominada ETSUS, seguida de um algarismo arábico.

Tipo de estudo

Estudo qualitativo, descritivo, recorte da dissertação de mestrado intitulada “Formação em Enfermagem nas Escolas Técnicas do SUS”, na condição de bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, com desdobramentos nos Projetos de Pesquisa para o SUS.

Cenário do estudo

O estudo foi desenvolvido em seis ETSUS localizadas no Nordeste, após aplicado como critério de inclusão, nas 12 escolas da região, a oferta do curso técnico em enfermagem.

A aproximação às instituições coparticipantes ocorreu, primeiramente, por contato telefônico. A posteriori, foram enviados, por correio eletrônico, Carta de Apresentação e Convite, Termos de Autorização da Instituição Coparticipante e de Concessão, além de cópia do projeto.

Coleta e organização dos dados

No sentido de responder à questão de pesquisa, buscou-se identificar nesses documentos informações sobre as características organizacionais e pedagógicas dos cursos. Para tanto, foi solicitado que cada ETSUS enviasse, via e-mail, o PPP da unidade escolar e o Plano de Ensino do curso técnico em enfermagem.

O PPP e os Planos de Ensino foram utilizados como fonte de dados, os quais foram disponibilizados em junho de 2017. A escolha desses documentos foi justificada por direcionarem e facilitarem o processo de ensino-aprendizagem com vistas à adequação da formação com a realidade da sociedade e de saúde, sendo, portanto, documentos oficiais que expõem o perfil do curso.

A coleta de dados se deu através da técnica da documentação indireta⁽⁷⁾, por meio de três roteiros estruturados, os quais possuíam questões relacionadas às características organizacionais e pedagógicas dos cursos. Referente às organizacionais, foram considerados objetivo, carga horária, currículo e perfil do egresso pretendido e, quanto às pedagógicas, analisadas a atualização e a equipe de elaboração do PPP; ementa, objetivos, data de atualização, conteúdos programáticos, metodologias de ensino e processo de avaliação dos Planos de Ensino. Os referidos dados constituíram o corpus da pesquisa e foram compilados e organizados no Microsoft^® Office Word para fins de sistematização e análise.

Análise de dados

Com base na análise do corpus da pesquisa, a qual se fundamentou na análise de conteúdo de Franco⁽⁸⁾, os dados foram organizados em duas categorias intituladas: “Características organizacionais dos cursos técnicos em enfermagem” e “Características pedagógicas dos cursos técnicos em enfermagem”.

Os dados foram interpretados e respaldados com base na literatura vigente referente à educação e, mais especificamente, à educação profissional técnica de nível médio, na qual podem ser acessadas normativas e diretrizes que tratam dos aspectos em níveis organizacional e pedagógico do curso em tela, apresentadas pelo Conselho Nacional de Educação. Desse modo, foi possível explorar, triangular e comparar os dados, retratando-os descritivamente e também representando-os por meio de figura e quadros.

RESULTADOS

Características organizacionais dos cursos técnicos em enfermagem

O objetivo dos cursos foi convergente entre as unidades de ensino investigadas, o qual é formar técnicos em enfermagem com compromisso social e ética profissional, que atuem conforme as necessidades de saúde da população e demandas do sistema de saúde brasileiro, com foco na melhoria da qualidade da atenção em enfermagem.

O perfil dos egressos pretendido também foi semelhante entre as escolas e guardou relação com o desenvolvimento das competências a serem aprimoradas pelos educandos, as quais envolvem as quatro dimensões do saber (saber, saber-ser, saber-fazer, saber-conviver).

Referente à carga horária, todas as escolas respeitam as 1200 horas mínimas destinadas ao curso. Contudo, há uma variação da carga horária total em função da adição da carga horária relacionada ao componente curricular Estágio Supervisionado, de modo que quatro escolas perfazem 1800 horas e as duas restantes, 1890 e 1440 horas (Figura 1).

Figura 1
Distribuição da carga horária dos cursos técnicos em enfermagem das Escolas Técnicas do Sistema Único de Saúde da Região Nordeste, Salvador, Bahia, Brasil, 2018

Nota: ETSUS - Escolas Técnicas do Sistema Único de Saúde.

Em relação ao currículo, todas as escolas adotam o modelo por competência, cuja atualização não foi informada por duas escolas, e o currículo mais atual data de 2016.

Características pedagógicas dos cursos técnicos em enfermagem

Referente à elaboração/atualização do Projeto Político Pedagógico, o Quadro 1 descreve algumas características, nomeadamente data e atores envolvidos:

Quadro 1
Elaboração/atualização do Projeto Político Pedagógico das Escolas Técnicas do Sistema Único de Saúde da Região Nordeste, de acordo com a data e os atores envolvidos, Salvador, Bahia, Brasil, 2018

ETSUS	Data	Atores envolvidos
ETSUS1	2016	Gestores
ETSUS2	2007	Gestores, docentes, discentes, corpo técnico
ETSUS3	2016	Gestores, discentes, docentes, famílias
ETSUS4	2014	Equipe multidisciplinar, atores da ETSUS
ETSUS5	2013	Não consta
ETSUS6	2016	Corpo técnico, docentes, discentes

• Nota: ETSUS - Escolas Técnicas do Sistema Único de Saúde.

Destaca-se o fato de que na ETSUS1, somente a equipe gestora partilhou do processo de construção do PPP, enquanto a participação da comunidade externa, representada pela família, ocorreu exclusivamente na ETSUS3.

Já os Planos de Ensino conformam-se em um único documento, configurando-se como o arquivo principal e norteador do curso. Neste documento, portanto, estão descritas as informações referentes às especificidades do curso técnico em enfermagem, sobretudo em relação à distribuição e conformação das unidades didáticas (Quadro 2).

Quadro 2
Detalhamento dos planos de ensino dos cursos técnicos em enfermagem das Escolas Técnicas do Sistema Único de Saúde da Região Nordeste, Salvador, Bahia, Brasil, 2018

Planos de ensino	Data	Ementas	Objetivos	Conteúdos programáticos	Metodologia de ensino	Avaliação	Referências
ETSUS1	Não consta	Não constam	Detalhados por unidades didáticas	Descritos sequencialmente	Problematização	Processual e contínua.	Não constam
ETSUS2	2015	Não constam	Não constam	Não constam	Problematização	Processual e contínua.	Não constam
ETSUS3	2012	Não constam	Detalhados por unidades didáticas	Descritos sequencialmente	Problematização	Processual e contínua.	Não constam
ETSUS4	2013	Constam	Detalhados por unidades didáticas	Descritos sequencialmente	Problematização	Processual e contínua.	Detalhadas por unidades didáticas
ETSUS5	2013	Não constam	Detalhados por unidades didáticas	Descritos sequencialmente	Não consta	Processual e contínua.	Não constam
ETSUS6	2016	Não constam	Detalhados por unidades didáticas	Descritos sequencialmente	Problematização	Processual e contínua.	Não constam

• Nota: ETSUS - Escolas Técnicas do Sistema Único de Saúde.

Nota-se que há itens relativos ao detalhamento dos Planos de Ensino que não constam nos documentos analisados, os quais se apresentam com lacunas quanto ao delineamento de tais características.

DISCUSSÃO

O estudo demonstrou que o objetivo da formação de técnicos teve enfoque na melhoria da qualidade da atenção de enfermagem, considerando o compromisso social e a ética profissional, conforme as necessidades de saúde da população e demandas do SUS, guardando relação com uma formação que afiance, concomitantemente, a habilitação técnica de excelência e a relevância ética e social. Nesse sentido, nota-se que a formação permite o entendimento da necessidade do cuidado em saúde, bem como o comprometimento com a cidadania e com o SUS.

Os processos de formação constituem um recurso valioso para a consolidação do sistema de saúde brasileiro e, portanto, são fundamentais para alinhar os princípios e as diretrizes do SUS com o que almejam os cursos de saúde para a formação de profissionais⁽⁹⁾. Em se tratando do curso técnico em enfermagem, este alinhamento torna-se ainda mais imperativo, tanto por suas atribuições no cuidado direto ao indivíduo-família-comunidade quanto pelo contingente expressivo de trabalhadores pertencentes a esta categoria^(6,10).

O perfil pretendido do egresso, por conseguinte, baseou-se nas dimensões do saber que dizem respeito aos quatro pilares da educação para o século XXI⁽¹¹⁾. O egresso, portanto, necessita suplantar os limites do conhecimento, empenhando-se na aquisição de habilidades e atitudes, inclusive relacionais, desenvolvendo competências alicerçadas em multidimensões, nas quais o profissional desenvolva capacidades para o desempenho da sua função com confiabilidade, reverberando os conhecimentos em ações concretas^(12-13). Assim, o perfil do egresso deve ser focado no modelo de desenvolvimento das competências com o propósito de superar a centralidade na transmissão dos conteúdos, em prol de um ensino mais ativo, interdisciplinar e contextualizado.

Tal afirmativa converge com as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Profissional Técnica de Nível Médio, que sinalizam para as competências na proposição de fornecer uma educação na qual o trabalhador tenha condições de mobilizar e articular conhecimentos e habilidades necessários para o desempenho eficiente e eficaz de atividades requeridas pela natureza do trabalho⁽¹⁾. No entanto, ainda há discussões sobre como essa formação estimula uma leitura crítica da sociedade e do mundo em que vive, com vistas à intervenção e transformação deste.

No que se refere à carga horária, todos os cursos respeitaram o quantitativo mínimo exigido de 1200 horas. Entretanto, a carga horária de estágio supervisionado foi divergente, variando de 240 horas a 600 horas. É pertinente destacar que, atualmente, não há uma definição específica e clara quanto à carga horária do estágio, contudo é indicado que seja adicionada à carga horária mínima atribuída ao curso⁽¹⁴⁾. Tal indefinição aponta para certa fragilidade no processo formativo, visto que a aproximação e apropriação da realidade do trabalho constituem-se como engrenagem central na formação profissional.

Diante disto e considerando que a educação profissional tem seu cerne na habilitação para o trabalho e no desenvolvimento prático das suas atribuições⁽¹⁾, é imprescindível considerar uma carga horária satisfatória para o aprimoramento das competências necessárias para o exercício laboral, uma vez que a competência se revela na prática e é no estágio, momento prático e de vivência da realidade do trabalho, que se concretiza a oportunidade de formação e aperfeiçoamento de conhecimentos, habilidades e atitudes⁽¹⁵⁾.

Ademais, torna-se indispensável por possibilitar que os cursos tenham uma orientação definidora e normativa. Além disso, oferta ao discente a garantia de um tempo e espaço, respaldados e estratégicos, para o desenvolvimento das competências profissionais almejadas para o técnico em enfermagem no contexto dos SUS.

Em relação ao PPP, observou-se que uma das Escolas fez sua última atualização em 2007, característica que o qualifica como estanque e defasado. A atualização contínua do PPP como fruto de um processo de avaliação e discussão do que deu certo ou não é de extrema importância para a qualidade da educação que se intenciona, uma vez que oportuniza autocorreção e direciona a possibilidade de alterações e reprogramação para o alcance do desejado⁽¹⁶⁾.

Notou-se ainda que apenas um dos PPP teve a participação de toda a comunidade escolar. O PPP é um instrumento de coordenação das atividades e ações a serem desenvolvidas pelos múltiplos sujeitos envolvidos no processo educativo e entende-se que, para tanto, deve ser elaborado de forma coletiva e democrática e atualizado constantemente⁽¹⁷⁾. É imprescindível, portanto, o diálogo entre todos os atores escolares, de modo que a elaboração seja em conjunto, a fim de traduzir suas necessidades, seus anseios e ideais. Ademais, esta prática conjunta e interativa permite uma ação democrática que confere direitos e corresponsabilidades e, além disso, fortalece a autonomia institucional e a transparência.

Alusivo aos Planos de Ensino, estes devem estar coerentes com o PPP e, obrigatoriamente, conter um mínimo de itens caraterizadores e definidores da proposta pedagógica para os cursos técnicos⁽¹⁾. Os Planos de Ensino dos cursos pesquisados, por sua vez, apresentaram-se frágeis, uma vez que foram verificadas lacunas quanto ao seu detalhamento nos quesitos data de atualização, ementa, objetivos, conteúdos programáticos, metodologia de ensino e referências, de modo que as informações existentes colocam em debate a execução da proposta delineada e a formação em foco.

Outra fragilidade identificada diz respeito à inexistência das ementas, as quais constituem o registro, em síntese, dos pontos essenciais que serão abordados no componente curricular, configurando-se como elemento descritivo basilar e fundamental para o direcionamento da proposta de ensino-aprendizagem⁽¹⁸⁾. Assim, cabe refletir como ocorre a idealização da proposta dos temas e conteúdos dos componentes curriculares, pois a ausência das ementas compromete tal plano e pode dificultar o desenvolvimento da prática educativa. Ainda, é oportuno salientar que o texto das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Profissional Técnica de Nível Médio recomenda que esta prática aconteça de maneira interdisciplinar, compreendendo diálogo, articulação e comunicação entre os componentes curriculares⁽¹⁾.

Na análise dos Planos de Ensino, observou-se ainda que não foram descritas, em sete deles, as referências bibliográficas, indo de encontro às recomendações ministeriais que preconizam que os componentes curriculares devem sugerir sua respectiva referência, tanto a básica quanto a complementar⁽¹⁾. As referências básicas dizem respeito aos textos que serão de fato abordados e utilizados em aula e as complementares subsidiam a ampliação e o aprofundamento do tema.

Constatou-se também convergência quanto à metodologia de ensino adotada pelos cursos, uma vez que cinco destes adotam a problematização, a qual é coerente com a proposta de formação para o SUS. Este tipo de metodologia ativa de aprendizagem implica ruptura com o ensino tradicional, centrado no professor como mero transmissor de informações aos alunos, e fortalecimento do estudante como sujeito, protagonista do seu processo de aprender, baseado em problemas extraídos da realidade, buscando identificá-los e solucioná-los, transformando-a⁽¹⁹⁾.

No contexto do ensino técnico em enfermagem, essa metodologia se configurou como aspecto potencializador do reconhecimento do profissional como agente de transformação da realidade de saúde, uma vez que possibilita uma aprendizagem referenciada na realidade, em um problema palpável, com vistas ao desenvolvimento de uma postura reflexiva, crítica e intervencionista⁽²⁰⁾.

Em relação à avaliação da aprendizagem, verificou-se que todas as escolas trabalham de forma processual e contínua. A avaliação é um importante elemento da prática educativa, constituindo-se como subsidiária de decisões a respeito da aprendizagem e, por meio desta, pode-se identificar e compreender alguns fatores que facilitam ou dificultam a construção do conhecimento por parte dos estudantes⁽²¹⁾. Em se tratando da educação técnica em enfermagem, o processo de avaliação ganha ainda mais realce, na medida em que permite a reflexão e a retomada da ação, tendo em vista o alcance dos objetivos pretendidos - a formação de excelência e a melhoria da qualidade da assistência à saúde.

No que diz respeito ao detalhamento dos demais itens constitutivos dos Planos de Ensino, o preenchimento completo foi feito apenas por um dos cursos estudados. Isto, portanto, pode comprometer a produtividade do ensino e a garantia da aprendizagem, visto que o planejamento permite a estruturação, organização e decisão do melhor caminho para o alcance dos objetivos propostos, a fim de afiançar a objetividade, a funcionalidade e a eficácia das ações planejadas⁽¹⁸⁾.

Diante do exposto, a caracterização organizacional e pedagógica dos cursos técnicos em enfermagem sinaliza para uma formação no e para o SUS, mas apresenta fragilidades significativas demonstradas a partir das lacunas no detalhamento dos documentos pedagógicos. Essas fragilidades, portanto, se colocam como desafios urgentes a serem superados com vistas à qualificação na formação técnica em enfermagem.

Limitações do estudo

As limitações do estudo foram relacionadas à coleta de dados realizada de forma documental, o que restringiu a análise dos sujeitos e atores envolvidos na oferta do curso, de modo que pode haver dissonância entre o proposto e o executado. Sugere-se a realização de outras pesquisas, recorrendo-se a outras fontes de dados, de forma a aprofundar a compreensão da temática e verificar se os resultados encontrados representam a realidade e, portanto, podem ser generalizados.

Contribuições para a Área da Enfermagem

Estudos que contribuam para re(pensar) a formação técnica em enfermagem para o sistema de saúde brasileiro ganham destaque, pois podem ir de encontro à fragilidade da produção científica neste campo, contribuindo para a construção do conhecimento. Além disso, podem tornar ainda mais evidente o quanto é necessário pesquisar acerca desta formação, diante de sua importância em virtude do técnico em enfermagem contemplar a maior força de trabalho neste campo, bem como por prestar cuidados diretos ao indivíduo-família-comunidade.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo sinalizou que a maioria das características organizacionais dos cursos técnicos em enfermagem das ETSUS da Região Nordeste é convergente. Percebe-se um alinhamento entre os cursos, o que contribui para o fortalecimento da Rede de Escolas Técnicas do SUS. Entretanto, os documentos pedagógicos apresentaram fragilidade expressiva quanto aos seus detalhamentos, principalmente em relação às ementas, ao conteúdo programático e às referências bibliográficas.

Diante dos resultados encontrados, evidencia-se a necessidade de pesquisas nessa temática para refletir a formação técnica em enfermagem, nas diversas regiões do país, a fim de aprofundar a compreensão do tema e verificar se os resultados encontrados são representados a partir de outras fontes de dados. Faz-se imprescindível discutir acerca desta formação, tendo em vista o seu distanciamento do ensino tecnicista para o mundo do trabalho e sua aproximação a propostas pedagógicas que busquem uma formação integral e transformadora.

Como potencialidade, considera-se que as informações concernentes aos pontos fortes e à melhora dos cursos em tela são subsidiárias para o enfrentamento e superação das dificuldades da formação técnica nas ETSUS, com vistas à melhoria da assistência à saúde e do SUS.

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Editado por

EDITOR CHEFE: Dulce Barbosa

EDITOR ASSOCIADO: Italo Rodolfo Silva

Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  05 Fev 2021
• Data do Fascículo
  2021

Histórico

• Recebido
  02 Ago 2018
• Aceito
  30 Set 2020