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Uma alternativa de interpretação do II PND

An alternative interpretation of the II PND

RESUMO

Este artigo tem como objetivo apresentar uma interpretação alternativa da lógica de concepção e implementação do II PND. Utiliza a contribuição de Weber e de outros autores que desenvolveram o conceito de patrimonialismo para melhor compreender a forma como o Estado brasileiro conduziu esse projeto. Destaca que o plano não se pautou exclusivamente por uma lógica econômica, mas também por razões políticas.

PALAVRAS-CHAVE:
II PND; história econômica do Brasil; planejamento econômico; crises econômicas; patrimonialismo

ABSTRACT

This article aims to present an alternative interpretation of the logic of the II PND’s conception and implementation. It uses the contribution of Weber and other authors that developed the concept of patrimonialism to better understand the way Brazilian State conducted that project. It emphasizes that the plan was not guided exclusively by an economic logic but also by political reasons.

KEYWORDS:
II PND; economic history of Brazil; economic planning; economic crisis; patrimonialism

1. INTRODUÇÃO

Nos dias de hoje, em que as reformas no Estado se tornam necessárias para a estabilidade política e econômica no Brasil, a análise sobre a natureza do Estado adquire importância central para que se possa compreender mesmo a economia brasileira. Essa análise torna-se ainda mais relevante ao pretender estudar a tipicidade dessa “organização política hegemônica” no período em que se inicia a transição política, pois os instrumentos utilizados pela “estrutura de dominação” a partir de 1974 para viabilizar a “liberalização política” e, em particular, a continuação do célere crescimento econômico evidenciam, em grande parte, a forma pela qual o Estado brasileiro age sobre a economia e relaciona-se com a sociedade. Apontam, por conseguinte, a de reestruturação do Estado sobre novas bases.1 1 As bases da legitimidade compreendem os motivos pelos quais as pessoas reconhecem a autoridade do Estado. Weber vale-se desse conceito e, mais especificamente, das diversas características que podem ser representadas por ele em diferentes configurações históricas para construir os três tipos puros de dominação legítima (ver Weber, 1922, vol. 1, cap. 3).

Com base na categoria neopatrimonialismo, inspirada em Weber, pretende-se analisar a forma pela qual o Estado brasileiro conduziu o Segundo Plano Nacional de Desenvolvimento e, dessa forma, dar significado às decisões tomadas no período. Ao se analisar a dinâmica político-econômica de implementação do II PND, será possível apontar que esse plano não se mostra exatamente como uma escolha que “contém uma alta dose de racionalidade econômica” (Castro, 1985CASTRO, A. B. & F. E. P. SOUZA (1985) A economia brasileira em marcha forçada. São Paulo, Paz e Terra, 2ª ed. , p. 35), mas como um projeto cuja racionalidade foi politicamente determinada.

Cumpre ressaltar que o uso do neopatrimonialismo não implica ausência de traços racionais-legais no Estado brasileiro: 1) devido ao nível político e socioeconômico atingido pelo país e 2) pelo fato de Weber ter apresentado o tipo racional-legal como dominante em seu pensamento. Ademais, utiliza-se o neopatrimonialismo não no intuito de verificar a premência deste tipo ideal no Brasil, mas exatamente pode-se desconfiar que o Estado brasileiro tenda sempre a se aproximar mais daquela racionalidade legal sem ter deixado reminiscências de seu passado patrimonial2 2 Motivações distintas, em diferentes situações, podem muito bem propiciar a justaposição relativa de tipos, inexistindo, portanto, qualquer determinação final. Daí a opção de Weber pelo termo dominação, como probabilidade ou tendência, em vez de determinação. . Ao longo deste artigo, será ressaltada a necessidade de compreensão da especificidade do Estado brasileiro para que se possa entender a forma como o II PND foi conduzido e suas implicações para as décadas seguintes.

Este tipo de análise permite, dessa forma, perguntar quem dirige e como dirige o Estado. Possibilita, consequentemente, a análise do processo político-social em conjunto, por apresentar esse processo como tendência ao longo da formação político-econômica do país. Permite-nos ainda indagar sobre os motivos pelos quais as pessoas atribuem legitimidade ao Estado, ou seja, as bases da legitimidade, e o tipo de dominação pretendida pelo Estado. É possível, destarte, verificar a especificidade de certa sociedade, em determinado período, mediante a análise das relações causais ou das articulações existentes entre as bases políticas e seus representantes, de um lado, e a estrutura de dominação, juntamente com suas agências, burocracias ou instrumentos, de outro.

Pelo fato de este artigo se dirigir principalmente a economistas, faz-se necessário ressaltar alguns conceitos políticos que nortearão a análise de mais uma interpretação “parcial” sobre o II PND.

2. TENTATIVA DE CARACTERIZAÇÃO DA NATUREZA dO ESTADO BRASILEIRO

2.1. O neopatrimonialismo

Com o propósito de verificar a especificidade da estrutura de dominação brasileira e assinalar dessa forma elementos próprios do desenvolvimento do país, para que se possa apresentar uma alternativa de interpretação do II PND, pretende-se lançar mão do conceito de neopatrimonialismo (Eisenstadt, 1979EISENSTADT, S. N. (1979) Revolução e a transformação das sociedades - um estudo comparativo de civilizações. Rio de Janeiro, Zahar . ), o qual foi derivado do pensamento weberiano. É importante ressaltar que Weber se utiliza de conceitos a fim de “identificar a lógica das instituições humanas e compreender as singularidades das instituições. Essa forma de conceitualização leva Weber a perguntar qual a influência exercida pelo modo de dominação sobre a organização e a racionalidade da economia” (Aron, 1987ARON, Raymond (1987) “Max Weber”. In Aron, Raymond (1987) As etapas do pensamento sociológico. São Paulo, Martins Fontes, 4ª ed. , p. 519). Ademais, a conceitualização também objetiva apresentar os problemas de causalidade ou influências recíprocas entre diferentes setores da sociedade.

O neopatrimonialismo3 3 Utiliza-se aqui o conceito de “neopatrimonialismo” como uma tentativa de incorporação dos tipos weberianos em um único subtipo, a fim de analisar melhor o caso brasileiro. É relevante assinalar que: “All forms of domination occurring in history constitute, according to Weber, ‘combinations, mixtures, adaptations, or modifications’ of the charismatic, the traditional, and the legal type” (Bendix, 1960, p. 330). Por conseguinte, lança-se mão do “neopatrimonialismo”, pelo fato de essa categoria consistir em modificação ou adaptação do patrimonialismo de Weber - um subtipo da dominação tradicional -, ou melhor, por ser uma combinação dos tipos racional-legal e patrimonial. Ressalta-se ainda que alguns autores fazem uso de terminologias diferentes ao utilizarem-se desse mesmo conceito. Schwartzman, por exemplo, prefere empregar o termo “patrimonialismo burocrático”, enquanto Eisenstadt refere-se ora ao “patrimonialismo moderno”, ora ao “neopatrimonialismo”. apresenta, basicamente, os seguintes aspectos: 1) o centro monopoliza cada vez mais poder e recursos políticos; 2) existe um grau relativamente pequeno de transformação estrutural da periferia pelo centro; 3) a cristalização do centro não gera um alto grau de comprometimento com a ordem social nem novas motivações para “despolitizar” as estruturas do Estado; 4) há um constante crescimento da importância das políticas paternalistas e distributivas, acumulativas e extrativas; 5) o centro acaba controlando a maior parte dos recursos e dos mecanismos necessários ao desenvolvimento econômico; 6) o centro tenta manipular outros setores e, nesse sentido, monopoliza a formulação das políticas de bem-estar social e de distribuição; 7) as regras tendem a enfatizar a mediação do centro entre os diferentes grupos de interesses; 8) o principal meio de luta política passa a ser a crescente cooptação ou alternação das clientelas ou de arranjos corporativistas. Em razão de o neopatrimonialismo ter sido utilizado para a análise do caso brasileiro (Schwartzman, 1982SCHWARTZMAN, Simon (1982) Bases do autoritarismo brasileiro. Rio de Janeiro, Campus. ; Camargo e Diniz, 1989CAMARGO, A. & E. DINIZ (orgs.) (1989) Continuidade e mudança no Brasil da Nova República. São Paulo, Vértice. ), acredita-se que esse tipo ideal pode fornecer elementos importantes para que se possa compreender a natureza do Estado brasileiro.

Entretanto, qual é o “elo analítico” que nos permite dizer que o Estado brasileiro possui não apenas características racionais-legais, mas também “neopatrimoniais”? Consoante Weber, as formas modernas de dominação - que são burocráticas - resultaram das forças conflitivas desenvolvidas nas sociedades ao longo do processo de modernização. Como observa Schwartzman, Weber estabelece, de um lado, uma linha de continuidade entre patrimonialismo e dominação patrimonial-burocrática. Também aponta, de outro, uma continuidade entre feudalismo e dominação racional-legal, que está relacionada ao surgimento do capitalismo e do Estado moderno. Neste sentido, a distinção entre patrimonialismo e feudalismo e entre o tipo de “luta política” estabelecida por esses dois tipos de sociedades “tradicionais” ao longo do processo de “modernização” mostra-se necessária para que se possa compreender por que enquanto as sociedades feudais tendem a desenvolver um tipo de Estado tendencialmente mais racional-legal, as patrimoniais tendem a desenvolver uma estrutura de dominação tendencialmente mais patrimonial-burocrática - questão que nos remete à distinção entre racionalidade formal e substantiva.

A racionalidade formal ou legal compreende “uma série de normas explícitas do comportamento, ou ‘leis’, que definem o que deve e o que não deve ser feito pelo administrador em todas as circunstâncias” (Schwartzman, 1982SCHWARTZMAN, Simon (1982) Bases do autoritarismo brasileiro. Rio de Janeiro, Campus. , p. 48). Este tipo de racionalidade é próprio da dominação política racional-legal, peculiar às formas de dominação com bases contratuais, bastante eficientes e adequadas às necessidades do capitalismo moderno. Já em sociedades cujo desenvolvimento não se deu em bases contratuais, onde não houve uma burguesia ascendente com a mesma força ou importância como a burguesia da Europa ocidental, a racionalidade substantiva tende a prevalecer sobre a racionalidade formal. A racionalidade substantiva é aquela que maximiza um conjunto determinado de objetivos independentemente de regras e regulamentos”. Como assinala Weber: “As a rule, the negative aspect of this arbitrariness is dominant, because - and this is the major point - the patrimonial state lacks the political and procedural predictability, indispensable for capitalist development, which is provided by the rational rules of modem bureaucratic administration” (Weber, 1922WEBER, Max (1922) Economy and Society: An Outline of Interpretive Sociology. Roth, G. & C. Wittich (eds.). New York, Bedminster Press, 1968. Primeira edição alemã, 1922. , pp. 1094-1095).

Devido ao fato de se pretender apontar a racionalidade política do II PND, mostra-se relevante assinalar que o tipo de racionalidade - formal ou substantiva - específica de uma forma de dominação influencia na condução da economia.4 4 É importante enfatizar que os quatros tipos de ação social de Weber (racional referente a fins, racional referente a valores, afetiva e tradicional) expressam a possibilidade de as pessoas agirem com base em outros motivos, fora o econômico. Além disso, Weber percebe que é possível “imputar” a racionalidade a grupos e, assim, a partir do momento em que certo grupo deseja obter um determinado objetivo, sua ação será caracterizada por um tipo específico de racionalidade. A racionalidade formal é uma racionalidade conformada aos fins com os meios mais adequados, guiada por uma ação social que se aproxima mais do tipo de ação racional referente a fins. Weber define a racionalidade formal de uma gestão econômica como o grau de cálculo que é tecnicamente possível e se aplica na realidade. No entanto, a racionalidade substantiva, que é a que nos interessa neste trabalho, por ser mais identificada com o regime patrimonial, leva em conta o suprimento de bens de um grupo ou mais de homens, por meio de uma ação social de caráter econômico, orientada por valores. Trata-se de políticas de grupos de interesses, por exemplo, cujos pontos de vista valorativos são ilimitados.

Assim, a racionalidade substantiva mostra-se como obstáculo para o desenvolvimento do capitalismo e do Estado moderno, pois o cálculo racional e previsível do capital não pode dar-se sem uma racionalidade formal. A isso acrescenta-se o fato de o desenvolvimento do mercado apresentar-se restringido, uma vez que os monopólios públicos, que são influenciados pelos quadros administrativos do Estado, minam a capacidade de formação de capitais privados. Com efeito, o caráter arbitrário ou voluntarista do patrimonialismo impede a calculabilidade indispensável para a formação do mercado e constitui, inclusive, o motivo de sua debilidade do ponto de vista político.

Ao apontar que o Estado brasileiro não se apresenta apenas como um Estado racional-legal, mas que também tende a adquirir a forma de dominação “neopatrimonial”, e ao ressaltar que a reminiscência desse tipo de dominação possibilita a adoção de políticas fundadas numa racionalidade substantiva, acredita-se que será possível apresentar o II PND como um projeto politicamente determinado, em vez de um plano dotado de “alta racionalidade econômica”.5 5 É importante enfatizar que os quatros tipos de ação social de Weber (racional referente a fins, racional referente a valores, afetiva e tradicional) expressam a possibilidade de as pessoas agirem com base em outros motivos, fora o econômico. Além disso, Weber percebe que é possível “imputar” a racionalidade a grupos e, assim, a partir do momento em que certo grupo deseja obter um determinado objetivo, sua ação será caracterizada por um tipo específico de racionalidade.

2.2. Alguns elementos específicos do “neopatrimonialismo” brasileiro

Os termos “corporativismo” e “cooptação política” possibilitam entender o tipo de relação existente entre o Estado e a sociedade; pois o corporativismo “se refere à forma como os grupos sociais estão organizados e relacionados entre si e com o Estado”, sendo possível dizer “que em regimes corporativistas o Estado é mais forte que a sociedade; e a cooptação realizada pelo Estado tende a reduzir o conflito político pela limitação do seu escopo, ao estabelecer monopólios de privilégios. “No caso brasileiro, a coexistência de um Estado com fortes características neopatrimoniais levou, no passado, à tentativa de organização da sociedade em termos corporativos tradicionais, criando uma estrutura legal de enquadramento e representação de classe que dura até hoje. Ao mesmo tempo, no entanto, o mercado se expandia, a sociedade se tornava mais complexa, e formas autônomas de organização e participação política eram criadas. O termo cooptação política ... busca captar o tipo de relacionamento entre estes dois sistemas de participação, ou seja, o processo pelo qual o Estado tratava, e ainda trata, de submeter a sua tutela formas autônomas de participação” (Schwartzman, 1982SCHWARTZMAN, Simon (1982) Bases do autoritarismo brasileiro. Rio de Janeiro, Campus. , p. 53).

Em virtude de o Estado revelar-se uma arena incorporadora de novas demandas e interesses, a política tende a girar em torno desse “centro” e, por conseguinte, o Estado tenderá a expandir-se no decorrer do processo de “modernização”. Como analisado por Eisenstadt, esta expansão é marcada: 1) pelo estabelecimento e manutenção de estruturas políticas novas e mais amplas; 2) pela habilidade do centro em incorporar novas elites, para participação no processo político; 3) pelo desenvolvimento econômico e/ou administrativo e modernização e 4) pelas respostas do centro para novas demandas dos novos grupos sociais.

É possível afirmar, portanto, que devido ao surgimento de diferentes demandas e ao consequente tipo de expansão realizado pelo Estado, este revela-se incapaz de conciliar os diversos interesses. Com efeito, a incapacidade do Estado em responder às crescentes demandas sociais e o modo pelo qual ele realiza a sua expansão traduzem-se em possibilidades de crises. Certamente, estas crises tendem a se cristalizar em torno do próprio Estado: de natureza “patrimonial”, que tende a agir de acordo com os “grupos de interesses” cooptados, ou seja, com base numa racionalidade substantiva, em detrimento da racionalidade formal.

Ademais, uma das principais características das dominações de tipo patrimonial é a lealdade, pois a cooptação leal não apresenta um caráter racional; pelo contrário, ela ocorre de forma incondicional e, por isso, possui características patrimoniais, ou melhor, neopatrimoniais. Existem grupos, por exemplo, que ao serem leais recebem privilégios econômicos. A ação destes, principalmente, gera um processo de acomodação, de forma que esses grupos não pretendem sair do governo. Logo, o Estado, ao promover programas políticos/econômicos que envolvem novos e diferentes interesses, vê-se obrigado a cooptar novos grupos. E, por conseguinte, realiza um processo de expansão desordenado, como analisado por Eisenstadt.

De acordo com Weber: “A compulsory political organization with continuous operations (politischer Anstaltsbetrieb) will be called a ‘state’ insofar as its administrative staff successfully upholds the claim to the monopoly of the legitimate6 6 Grifos de Weber use of physical force in the enforcement of its order” (Weber, 1922WEBER, Max (1922) Economy and Society: An Outline of Interpretive Sociology. Roth, G. & C. Wittich (eds.). New York, Bedminster Press, 1968. Primeira edição alemã, 1922. , p. 54). Observa-se, assim, que o tipo de dominação pretendida pelo Estado sempre será legítimo, independente da sua natureza. Não se pode dizer, pois, que um Estado ou regime político seja ilegítimo; pode-se, no entanto, reconhecer a impossibilidade de um regime político se institucionalizar ou se sustentar em um tipo de base legítima permanente, como foi o caso do regime autoritário brasileiro. Como ressalta Bendix: “All rulers ... develop some myth of their natural superiority, which usually is accepted by the people under stable conditions but may become the object of passionate hatred when some crisis makes the established order appear questionable” (Bendix, 1960BENDIX, Reinhard (1960) Max Weber: An Intellectual Portrait. London, Heinemann. , p. 297).

Porém, como precisar melhor o tipo de crise vivida pelo Estado neopatrimonial brasileiro no período em que se pretende estudar? E de que forma essa “organização política” consegue conter esse tipo de crise? Acredita-se que no final do governo Médici o tipo de crise vivida pelo Estado neopatrimonial brasileiro traduzia-se na incapacidade de o regime político sustentar-se em bases autoritárias permanentes. Ao analisar o conceito de regime autoritário formulado por Linz7 7 De acordo com Linz, regimes autoritários são: “Sistemas políticos com pluralismo político limitado, não responsável, sem ideologia orientadora e elaborada, mas com mentalidades distintas, sem mobilização política extensiva ou intensiva, exceto em alguns pontos do seu desenvolvimento, e no qual um líder ou, ocasionalmente, um pequeno grupo exerce o poder dentro de limites formalmente mal definidos, mas, na realidade, bem previsíveis”(Linz, 1979, p. 121). , é possível afirmar que desde 1964 o regime autoritário brasileiro encontrava-se incapaz de sustentar-se em bases “bem previsíveis” sem precisar recorrer ao uso de símbolos de poder, como a propaganda política e os projetos de desenvolvimento econômico.

O “movimento político” de 1964 propunha o estabelecimento da ordem interna, a contenção do inimigo externo e a restauração da democracia num longo prazo. Uma década após o golpe, contudo, os argumentos que justificaram a instauração do regime autoritário brasileiro não eram mais suficientes. De um lado, inexistia um real inimigo externo e, de outro, a promessa de restauração da democracia brasileira ainda não havia sido cumprida. Além disso, as ações políticas dos sucessivos governos desde 1964, como o periódico uso de atos institucionais, reformulações constitucionais, mudanças das regras eleitorais e os conflitos militares internos, não possibilitaram a institucionalização do regime autoritário. Com efeito, manifestava-se no Brasil “uma crise de regime político que, enquanto conjunto e instituições de valores que regulavam o exercício do poder, demonstrava ser incapaz de se legitimar em bases autoritárias permanentes” (Mello, 1989MELLO, Leonel Itaussu Almeida (1989) “Golbery revisitado: da abertura controlada à democracia tutelada”. In Moisés, J. A. & Albuquerque, J. A.G. (orgs.) (1989) Dilemas da consolidação da democracia. São Paulo, Paz e Terra . , p. 200). E é por isso que, consoante a Linz, não se manifestou um regime político autoritário no Brasil pós-64 e, sim, uma “situação autoritária”.

Convém notar que em 1974 o Estado brasileiro, também devido ao fim do “milagre” e à repressão política, não poderia mais superar esta “situação autoritária” por intermédio de projetos econômicos simplesmente. Ademais, nenhuma das quatro formas alternativas de institucionalização de regimes autoritários, analisadas por Linz8 8 Linz cita quatro formas através das quais um regime autoritário poderia constituir-se em bases estáveis: 1) carismática, 2) corporativa, 3) a partir de um partido hegemônico fascista/populista e 4) através de um sistema multipartidário com um partido revolucionário hegemônico, como no México. E chega à conclusão de que nenhuma destas formas resultariam na institucionalização do regime político brasileiro, por não traduzirem a conjuntura política do Brasil pós-64 ou por não estarem de acordo com a história política do país. , poderiam construir bases autoritárias legítimas para o Estado brasileiro. Fazia-se necessário, portanto, conciliar os planos econômicos com medidas “nacionalistas, anti-imperialistas, que vão contra a retórica americana” (Linz, 1972, p. 253), e com medidas que buscassem iniciar um processo de abertura política. A impressão que se tem, ao estudar o II PND, o “pragmatismo responsável” da política externa e a política de “liberalização”, é de que os estrategistas do governo Geisel seguiram à risca a sugestão feita por Juan Linz em 1972. Reafirma-se, portanto, que tanto a “liberalização política” como o II PND apresentaram-se como medidas que objetivavam superar a “situação autoritária” brasileira.

Em uma economia, como a brasileira, que se tornou estruturalmente incapaz de financiar seu próprio desenvolvimento - mormente no que se refere à natureza do sistema financeiro -, o mecanismo de cooptação leal e a forma de expansão da estrutura de dominação neopatrimonial, sem falar dos efeitos derivados da “situação autoritária”, acabaram acarretando sérias consequências para o próprio Estado. Neste sentido, é relevante assinalar que à medida que o Estado assumia maiores compromissos, ou seja, à medida que grupos particulares eram beneficiados pelo tipo de industrialização realizada pelo centro - baseada em incentivos governamentais -, ocorria uma transferência de recursos públicos para o setor privado. Dessa forma, este processo se dava em detrimento do principal ator do desenvolvimento socioeconômico do Brasil: o Estado. Como consequência deste processo de expansão, o Estado brasileiro se encontrará sozinho nos anos Geisel para realizar o II PND.

3. O SEGUNDO PLANO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO

A conjuntura político-econômica derivada do milagre acarretou modificações estruturais no país, como o crescimento da participação do Estado na economia, a expansão oligopolística do setor financeiro, a consolidação de uma tecnoburocracia com interesses próprios e a predominância de multinacionais em detrimento do setor privado nacional. As mudanças estruturais empreendidas de 1964 a 1968 privilegiaram uma estratégia que além de se basear no famoso tripé, analisado por Bresser-Pereira (1977BRESSER-PEREIRA, Luís Carlos (1977) Desenvolvimento e crise no Brasil. São Paulo, Brasiliense . ), Martins (1985MARTINS, Luciano (1985) Estado capitalista e burocracia no Brasil pós-64. Rio de Janeiro, Paz e Terra. ) e Evans (1980EVANS, Peter (1980) A tríplice aliança: as multinacionais, as estatais e o capital nacional no desenvolvimento dependente brasileiro. Rio de Janeiro, Zahar. ), da colaboração entre Estado, iniciativa privada nacional e multinacional, pautou-se pela tentativa de voltar o país para uma atividade muito mais internacionalizada do que a que vinha sendo seguida pelo processo de industrialização mediante substituição de importações desde 1930. A mudança de governantes, o choque do petróleo, os péssimos resultados eleitorais para o regime autoritário - acontecimentos que se concentraram em 1974 - marcam a mudança da estratégia que irá redundar no II PND, com a retomada do processo de substituição de importações.

A manutenção do tripé já não era mais possível. De um lado, a iniciativa privada multinacional não estava disposta a se engajar num plano ambicioso em momento de recessão mundial, quando se agravavam as incertezas geradas pelas mudanças no mercado financeiro internacional. Considerando-se a campanha contra a estatização aprofundada no governo Geisel, o setor privado nacional também sentia, por sua vez, o efeito do crescimento da participação relativa do Estado e, em menor medida, do capital multinacional na composição do produto nacional. Bresser-Pereira, já em 1978, declarava o “colapso de uma aliança de classes” ao afirmar que “a crescente retirada de apoio da burguesia à tecnocracia estatal representa um golpe decisivo não apenas no modelo político do tripé, mas na própria continuidade do próprio regime” (Bresser-Pereira, 1978BRESSER-PEREIRA, Luís Carlos (1978) O colapso de uma aliança de classes. São Paulo, Brasiliense . , p. 127). O termo aliança de classes talvez não seja o mais apropriado para designar a relação que se estabeleceu entre capital nacional e Estado entre 1964 e 1974. Pela forma como se deu o estabelecimento do regime autoritário no Brasil, talvez fosse mais apropriado dizer que a burguesia nacional aderiu ao Estado, mas não assumiu algum compromisso com ele. O grau de solidez desta adesão estava diretamente relacionado ao nível dos benefícios que fossem auferidos no processo de crescimento. Tendo-se em conta a campanha contra a estatização, pode-se dizer que tais benefícios foram julgados insuficientes. Esmaecia-se, assim, a aproximação do Estado com o capital nacional.

Devido ao afastamento do capital nacional e das multinacionais em relação ao Estado - sem mencionar a repressão política-: os quadros socioeconômico e político do Brasil pós-milagre, agravados com a não-institucionalização do regime autoritário, já apontavam a necessidade de redefinição oficial do modelo político-econômico. Mostrava-se imperioso, com efeito, que “as forças dominantes que formavam a estreita base de sustentação do regime (e que eram suas grandes beneficiárias) viessem a se transformar em forças dirigentes, constituindo um eixo hegemônico que articulasse outros setores sociais de um arco de alianças” (Mello, 1989MELLO, Leonel Itaussu Almeida (1989) “Golbery revisitado: da abertura controlada à democracia tutelada”. In Moisés, J. A. & Albuquerque, J. A.G. (orgs.) (1989) Dilemas da consolidação da democracia. São Paulo, Paz e Terra . , p. 201).

A despeito disso, com o choque do petróleo, “subitamente foi posto em xeque o padrão de crescimento da economia mundial, cuja estrutura produtiva era baseada principalmente na matriz energética americana ... A economia brasileira não significa uma exceção. Naquele momento é posta a nu a vulnerabilidade congênita do balanço de pagamentos com a súbita piora nas relações de troca” (Schwartsman, 1990SCHWARTSMAN, Alexandre (1990) Auge e declínio do Leviatã: mudança estrutural e crise na economia brasileira. Dissertação de mestrado, FEA-USP. , p. 21). Consequentemente, o “milagre” vê-se definitivamente ameaçado.

A conjuntura político-econômica brasileira, somada com a crise do petróleo, exigem, destarte, que o próximo governo faça uma avaliação dos custos e benefícios do sistema político interno, do padrão de desenvolvimento econômico e da política externa brasileira. Entre as respostas que o novo governo castelista dará a este desafio, interessa-nos, em particular, o II PND.

3.1. As interpretações existentes sobre o II PND

Pretende-se aqui apontar, em especial, duas “visões” distintas a respeito do II PND: a de Castro e a de Bonelli e Malan. Castro acredita que o II PND consista num plano fundamentado numa “racionalidade econômica”, enquanto Bonelli e Malan questionam a “racionalidade” desse projeto. Após a apresentação dessas duas interpretações, se estabelecerá uma breve análise sobre a questão da racionalidade, levando-se em conta não apenas os motivos puramente econômicos, mas também as razões políticas que influenciaram na formulação e na implementação do II PND. Será possível, dessa forma, assinalar que o Segundo Plano Nacional de Desenvolvimento representa uma decisão tomada com base numa racionalidade politicamente determinada e, não, simplesmente econômica.

Castro não concorda com a chamada “sabedoria convencional” de que estava implícito na estratégia o caráter transitório do choque do petróleo. O autor reconhece que o II PND buscou promover um ajuste diretamente pela formação de capital, sem mediações pela demanda agregada. Não haveria, consequentemente, postergação da solução dos problemas da economia brasileira, mas um ataque à raiz do problema, com o propósito de buscar soluções duradouras para a crise. “Optou-se aqui por uma autêntica transformação: da economia e de seu relacionamento com o exterior. Diante desta opção, o “financiamento”, propriamente dito, nada mais seria que a escolha da passividade, enquanto o ajustamento convencional equivaleria à mera climatização da economia” (Castro, 1985CASTRO, A. B. & F. E. P. SOUZA (1985) A economia brasileira em marcha forçada. São Paulo, Paz e Terra, 2ª ed. , p. 34).

Para Castro, os esforços de ajustamento do Brasil à crise de 1974 não foram tardios. O autor assinala a necessidade de reconhecimento do prazo de maturação exigido pelos investimentos do II PND, de forma que estes ainda não tinham sido maturados em 1976/78. Verifica-se, assim, que o economista desenvolve uma análise em defesa do II PND. Castro afirma, com efeito, que “a escolha feita em 1974 contém uma alta dose de racionalidade econômica ... ao evitar uma crise conjuntural possivelmente de enorme gravidade, e, sobretudo, ao entreabrir novas e amplas possibilidades futuras” (Castro, 1985CASTRO, A. B. & F. E. P. SOUZA (1985) A economia brasileira em marcha forçada. São Paulo, Paz e Terra, 2ª ed. , p. 35). Apesar disso, é importante assinalar que o economista reconhece “o primado da vontade política nas decisões tomadas a partir de 74” (Castro, 1985CASTRO, A. B. & F. E. P. SOUZA (1985) A economia brasileira em marcha forçada. São Paulo, Paz e Terra, 2ª ed. , p. 35). Não estabelece, contudo, uma interligação entre fatores econômicos e políticos ao privilegiar a análise econômica.

Bonelli e Malan, diferentemente, acham que a precária situação econômica do Brasil pós-milagre foi diagnosticada pelos projetistas do II PND apenas como um problema conjuntural de balanço de pagamentos que se atribuía basicamente aos efeitos da elevação do preço do petróleo. De acordo com esses autores, a interpretação oficial sobre as dificuldades pelas quais passavam a economia brasileira mostrava-se insatisfatória por apresentar escassa atenção à evolução da economia internacional nos anos anteriores; por sobre-enfatizar os gastos com petróleo para o desequilíbrio do balanço de pagamentos; por minimizar o custo contínuo da conta capital e serviços da dívida para a economia brasileira ao adotar uma política de crescimento com déficit; por conter a ideia de que assim que a crise de 74 estivesse debelada a economia brasileira retomaria o seu crescimento com controle da inflação e balanço de pagamentos equilibrado e por não considerar problemas de médio e longo prazo na realocação dos recursos econômicos em beneficio de atividades produtoras de tradables.

Bonelli e Malan ainda assinalam que a súbita elevação do preço do petróleo contribuiu certamente para agravar a situação da economia brasileira num longo prazo, tendo em vista a deterioração dos termos de troca e o aumento da taxa de inflação, mas foi fundamentalmente o processo de crescimento seguido pela economia brasileira no período 68/73 que teria gerado pressões inflacionárias e desequilíbrio em conta corrente num curto prazo. Os autores enfatizam, portanto, a necessidade de adoção de uma política de curto prazo para combater o déficit no balanço de pagamentos e criticam, assim, a política adotada via controle seletivo e rígido de importações, porquanto essa política utilizava a taxa de câmbio para controlar a conta capital - tendo em vista que uma desvalorização do câmbio não beneficiaria o mercado financeiro nem a dívida externa brasileira - e, dessa forma, acabava impedindo a elevação das exportações (sobretudo em 1976, quando o mercado internacional já se encontrava recuperado), que, por sua vez, acarretava excesso de acumulação e desestruturava a oferta nacional em relação à demanda. Como resultado, o problema central - balanço de pagamentos deficitário - não estava sendo tratado por não incentivar a produção de tradables.

Bonelli e Malan, por conseguinte, questionam a “racionalidade econômica” do II PND, no que se refere, em especial, à adoção de uma política de substituição de importações. Esta medida mantinha a taxa de câmbio valorizada e, com efeito, não permitia passar a nova estrutura de preços internacionais para dentro do país. De forma que o II PND acabou isolando o Brasil do funcionamento dos níveis dos preços relativos internacionais.

Evidencia-se ainda mais a gravidade do problema quando nos lembramos que a elevação do preço do petróleo, que se tornou permanente, também acarretou alterações constantes nos preços relativos mundiais. Isso, por sua vez, propiciou a mudança do padrão tecnológico e da matriz energética. Por não ocorrer a compatibilização dos preços relativos domésticos, o II PND foi realizado num ambiente que incentivava a implementação de indústrias dentro de um padrão tecnológico compatível com a manutenção da matriz energética. Mesmo levando-se em conta os esforços do governo para desenvolver fontes alternativas de energia e aumentar a produção da energia em uso, não é possível afirmar que o II PND refletia preocupação com a mudança dos preços relativos mundiais, uma vez que todos os esforços de elevação da produção interna de energia foram feitos dentro do mesmo padrão de uso intensivo de combustíveis. É discutível, portanto, que o plano estivesse procurando realizar um ajustamento energético como quer Velloso (1986VELLOSO, João Paulo dos Reis (1986) O último trem para Paris. Rio de Janeiro, Nova Fronteira. ).

Cumpre asseverar que com o II PND foi implementada uma indústria que não levou o mercado em consideração. Fishlow assinala que o projeto foi julgado em função da economia de importações, ou seja, de dólares, que fazia. Trata-se de fato revelador do critério que norteou as decisões de investimento, o qual se traduziu em preocupação com a autonomia da produção industrial brasileira em relação às importações, contrariamente ao que Prebisch (1949PREBISCH, Raul (1949) “O desenvolvimento econômico da América Latina e seus principais problemas”. Revista Brasileira de Economia, v. 3, nº 3. ) sugeria ser o critério mais adequado para a implantação de indústrias substitutivas de importações. Consoante a esse autor, a adoção de um programa de substituição requer a existência de capacidade ociosa na economia, caso contrário faz-se necessário aumentar o nível das importações. Ao adotar-se o II PND, a economia estava no máximo da sua capacidade, de forma que foi preciso incrementar a importação do país.

Outro aspecto da discussão que merece nossa atenção refere-se ao que Silva (1979SILVA, Adroaldo (1979) “Evolução recente da economia brasileira”. Estudos Econômicos, vol. 9 (3). ) desenvolveu em 1979. Naquele artigo, o economista salientava a importância de dois elementos para a análise do período de realização do II PND. O primeiro era o crescente nível de incerteza na economia mundial na década de 70, facilmente perceptível pelas transformações no mercado financeiro. O segundo ponto relaciona-se à fragilidade da economia brasileira, dado o elevado nível de concentração da renda. Para Silva, a junção desses dois elementos indicava que o processo de industrialização brasileiro deveria buscar sua continuidade na concentração de esforços para a produção de bens de salário. Neste ponto ele se aproxima de Bonelli e Malan, já que bens de salário são tradables. Mostrava-se imperioso, segundo o economista, reduzir o custo da reprodução da força de trabalho, pois essa era a melhor forma de se manter um crescimento sustentável num mundo em grandes transformações. Certamente a estratégia do II PND relegava esse objetivo para uma etapa posterior do processo de industrialização, visto que se privilegiava a produção de bens de capital e de insumos pesados.

Em 1949 Prebisch já havia assinalado que a substituição de importações consiste num processo de engajamento na economia mundial. Deve, assim, ser promovida com o objetivo de eliminar a proteção industrial local. Caso contrário, como observou Hirschman em 1968HIRSCHMAN, Albert O. (1968) “The Political Economy of Import-Substituting Industrialization in Latin America”. The Quarterly Journal of Economics, vol. LXXXII, nº 1, February. , possibilita-se a cristalização de interesses internos que vão dificultar a continuidade do processo de substituição de importações. Daí a necessidade de se continuar protegendo não apenas o grupo ligado a essa nova etapa, mas também o grupo privilegiado na etapa anterior.

De um lado, Castro afirma que os motivos econômicos são suficientes para justificar o II PND. De outro, a análise de Bonelli e Malan, juntamente com as de Fishlow, Hirschman, Prebisch e Silva, já colocam em dúvida a viabilidade dos objetivos puramente econômicos para compreender as razões que levaram o governo Geisel a implementar o II PND. Em resumo, se a racionalidade econômica não é suficiente para justificar a formulação desse ambicioso projeto, deve(m) existir outro(s) motivo(s) que, somado(s) àqueles puramente econômicos - como analisado por Castro -, justifique(m) melhor o tipo de “racionalidade” que levou o grupo que estava no poder a adotar o II PND.

Em um tipo de sociedade como a brasileira, em que o desenvolvimento socioeconômico sempre se deu com a presença ativa do Estado na economia, os motivos puramente econômicos mostram-se insuficientes para a compreensão da gênese de um plano desenvolvimentista que não procura adequar a estrutura de preços relativos do país ao cenário econômico internacional. Em especial quando se trata de um plano de maturação de longo prazo. No caso dos planos de maturação breve, a possibilidade de se readequar a estrutura de preços relativos doméstica à sua congênere internacional é mais imediata. Como ressaltam Bonelli e Malan, “é imperioso aprofundar a questão para além das querelas ‘técnico-acadêmicas’ acerca dos erros e acertos de política econômica de curto prazo, na direção de um esforço por captar as características estruturais da economia brasileira (e sua associada superestrutura política), que hoje, como no passado, configuram os (estreitos) limites do possível em termos de opção de política econômica” (Bonelli e Malan, 1976BONELLI, R. & P. S. MALAN (1976) “Os limites do possível: notas sobre o balanço de pagamentos e indústria nos anos 70”. Pesquisa e Política Econômica, Rio de Janeiro, 6(2), ago. , p. 406).

Afirma-se, dessa forma, que está implícita no II PND uma racionalidade substantiva - imputada por motivos políticos -, que pode ser comprovada não apenas pelas críticas econômicas feitas ao plano, mas também pelo contexto da “liberalização” política, pelo pragmatismo responsável da diplomacia, pelos novos instrumentos de dominação legítima que, qualitativamente, diferenciam o governo Geisel do governo Médici, em suma, pela natureza do regime político brasileiro.

3.2. Uma alternativa de interpretação do II PND

Com o II PND inicia-se um novo processo de acumulação, liderado pelo Estado, pelas empresas estatais e pelo setor financeiro, que era apoiado pelo Estado. Porém, a realização deste plano não se deu de forma linear; pois ao surgirem obstáculos ao seu desenvolvimento, o Estado procurou estabelecer uma complexa “cooptação leal” de “novos” e de “velhos” grupos de interesses relevantes.

A complexidade do novo cenário político-econômico

Dias e Aguirre (1992DIAS, G. L. da S. & B. M. B. AGUIRRE (1992) “Crise político-econômica: as raízes do impasse”. Estudos Avançados, 6 (14). ) ressaltam duas razões para a alteração da rota do II PND: (1) o deslanchamento do processo de abertura teria de aguardar a neutralização dos segmentos pertencentes ao governo que eram contra a realização do II PND e (2) a necessidade de cooptação de determinados grupos da sociedade brasileira para que a fase em que o processo de substituição de importações se encontrava não sofresse solução de continuidade.

O primeiro motivo encontra-se relacionado à existência de grupos diferentes, cujos interesses mostravam-se incompatíveis com o II PND. Para os militares o plano traduzia-se em possibilidade de desenvolvimento de políticas favoráveis à indústria estratégico-militar; os empresários nacionais, por sua vez, já viam o plano como possibilidade de influir mais diretamente nas decisões do governo; enquanto os trabalhadores, em geral, achavam que a “liberalização” política mostrava-se um meio de obtenção de conquistas trabalhistas. No entanto, para que o Estado pudesse obter sucesso em relação à “liberalização” e ao II PND, ele precisaria, pelo menos, do apoio de parte da classe empresarial nacional.

Porém, o grupo empresarial que ia ser cooptado pelo governo nesse novo processo de industrialização seria aquele ligado à indústria de bens de capital, ao setor financeiro e à construção civil. O que significa que o governo deveria passar a proteger as indústrias de capital pesado em detrimento das indústrias de consumo duráveis. Esta nova etapa fez com que o Estado buscasse apoio de novos grupos fora do eixo Rio-São Paulo. O Estado passaria, logo, a cooptar antigas oligarquias regionais que haviam ficado à margem do processo de industrialização brasileiro. Contudo, a realização das propostas do II PND exigia enorme volume de capital, que não podia ser fornecido pelas oligarquias regionais.

Verifica-se, assim, que o capital produtivo nacional não tinha condições financeiras para participar desse novo processo e, dado o cenário de crise internacional, o volume de capital de risco externo investido no Brasil caíra bruscamente. De forma que duas pernas do “modelo do tripé” foram enfraquecidas, restando apenas o Estado. Um Estado que se apoiava em um projeto que resultaria na última fase da industrialização brasileira, cujo principal ator eram as empresas estatais. Como resultado desta nova conjuntura político-econômica, constituiu-se uma nova aliança política formada, grosso modo, pelo capital financeiro nacional, pelas grandes empreiteiras e pelo Estado.

O surgimento de demandas divergentes: “fracasso” ou “marcha forçada”?

Mais ou menos no início de 1977 Carlos Lessa “sepulta” o II PND. De acordo com o autor, o “fracasso” desse plano devia-se a existência de barreiras à sua realização, pois o II PND traduz-se em uma estratégia: 1) que afeta os interesses do setor financeiro privado, “menina-de-ouro, grande personagem na fase anterior; 2) que se propõe a conter a expansão da indústria de bens de consumo duráveis, de peso predominante dentro do sistema industrial brasileiro; 3) que implica na reordenação espacial que, pela primeira vez, coloca as regiões periféricas como vitais ao processo da expansão da economia, ou seja, estratégia que na verdade ataca e atinge toda uma constelação de interesses sumamente poderosos e 4) que não leva em conta o fato de operações especulativas terem tido um peso crescente no período do “milagre”( ... ). No Brasil, ... “em 1969-70, foi apresentada à classe média a grande proposta de ‘poupar’. É evidente que a classe média não poupou. O que se fez foi uma prodigiosa especulação em torno da Bolsa ... Logo depois tivemos interessantes operações especulativas com imóveis” (Lessa, 1977LESSA, Carlos (1977) “Visão crítica sobre o II Plano Nacional de Desenvolvimento”. Revista Tibiriçá, Ano II, nº 6, jan.-mar. , p. 61). O economista ainda ressalta o surgimento do open market a partir de 1974, mecanismo que possibilitou a amplificação da órbita financeira que, em suma, “significa uma redistribuição de ganhos a favor do capital financeiro contra o capital industrial” (Lessa, 1977LESSA, Carlos (1977) “Visão crítica sobre o II Plano Nacional de Desenvolvimento”. Revista Tibiriçá, Ano II, nº 6, jan.-mar. , p. 61).

Tavares, ao assinalar a existência de “um conflito no seio da classe dominante”, também reconhece a dificuldade de se aglutinarem os grupos de interesses em torno da estratégia definida pelo “centro”. O que existe “por um lado é o conflito entre o salário das classes ativas trabalhadoras e os ordenados daquelas inativas que se dizem trabalhadoras ... e, por outro lado, a transferência de renda das classes produtoras capitalistas ... para as classes improdutivas capitalistas que vivem apenas de renda” (Tavares, 1977TAVARES, Maria da C. (1977) “Conflito no seio das classes dominantes”. Revista Tibiriçá, Ano II, nº 6, jan.-mar. , p. 156).

Apesar das interpretações econômicas surgidas em 1977, o II PND não foi “sepultado” neste período. Tendo em vista que o Estado era, de facto, o agente econômico principal do II PND e que os resultados econômicos desempenhariam um papel fundamental para o sucesso da “liberalização” política, vice-versa, coube ao próprio Estado tomar iniciativas que visassem à contenção do “conflito” existente, de forma a prosseguir na implementação da sua estratégia econômica. “O pacote de abril de 1977 foi, claramente, uma tentativa de realinhamento das forças políticas em função de um projeto de abertura acoplado à decisão de seguir adiante na substituição de importações” (Dias e Aguirre, 1992DIAS, G. L. da S. & B. M. B. AGUIRRE (1992) “Crise político-econômica: as raízes do impasse”. Estudos Avançados, 6 (14). , p. 89). Esse “Pacote” funcionou como garante da continuidade de controle da “liberalização” e como meio de neutralização dos resultados das eleições parlamentares de 1978, nas quais o MDB obteve novamente grande votação. Ademais, “ao estabelecer um novo pacto de sustentação do governo central, com a ampliação da representação parlamentar das regiões menos desenvolvidas, foi introduzida uma poderosa força conservadora sobre as despesas do Orçamento Geral da União (OGU)” (Dias e Aguirre, 1992DIAS, G. L. da S. & B. M. B. AGUIRRE (1992) “Crise político-econômica: as raízes do impasse”. Estudos Avançados, 6 (14). , p. 91). O Estado angariava, dessa forma, força política para prosseguir com o seu projeto político-econômico. Contudo, as demandas das oligarquias regionais revelam-se inconsistentes com aquelas do setor de bens de consumo duráveis, no que se refere, por exemplo, aos interesses da indústria do Sul e à sobrevalorização cambial, instrumento tradicional usado pelo Estado para introduzir o investimento industrial, que retira competitividade internacional de todos os setores exportadores.

Pelo fato de os grupos de interesses só realizarem uma cooptação leal do “centro” enquanto este salvaguardar os interesses daqueles, acredita-se que a conturbada trajetória do II PND e da “liberalização” política traduzem-se em tentativa de contenção do crescimento do baixo nível de lealdade já existente entre Estado e sociedade. Assinala-se, destarte, que os “conflitos no seio na classe dominante” ou as “barreiras” referidas por Lessa ou mesmo as demandas inconsistentes do “velho” e do “novo” não produzem o “fracasso de um sonho”, nem mesmo o colapso de um projeto político-econômico, visto que o Estado brasileiro acentua seu processo de expansão centralizada ao tentar estabelecer uma “lealdade negociada” com os vários grupos de interesses. De forma que: “Dali por diante, em marcha forçada, a economia subiria a rampa das indústrias capital-intensivas e tecnológico-intensivas” (Castro, 1985CASTRO, A. B. & F. E. P. SOUZA (1985) A economia brasileira em marcha forçada. São Paulo, Paz e Terra, 2ª ed. , p. 76). “O que sim convém frisar, é que o parque manufatureiro aqui existente não mais cabe - sequer como caso-limite - dentro do perímetro do subdesenvolvimento” (Castro, 1985CASTRO, A. B. & F. E. P. SOUZA (1985) A economia brasileira em marcha forçada. São Paulo, Paz e Terra, 2ª ed. , p. 82).

No entanto, como ressalta Castro, verifica-se nos anos 80 o “fim da custosa marcha forçada”. Para que se possa compreender o porquê dessa estagnação econômica, que está relacionada ao esgotamento da capacidade do “centro” em continuar promovendo o processo de desenvolvimento socioeconômico, é preciso averiguar a forma pela qual o Estado neopatrimonial brasileiro viabilizou a realização das metas do II PND - mesmo quando alguns economistas já o tinham “sepultado” - ao conseguir, de certa forma, atender às diferentes demandas sociais. Esta análise enfatizará, em especial, a natureza do financiamento empreendido pelo “centro” ao implementar o II PND.

A expansão do Estado e o financiamento do II PND

Faz-se necessário enfatizar, em primeiro lugar, que nem o Estado nem as empresas estatais apresentavam a autonomia financeira requerida pelo II PND. Em segundo lugar, o Estado enfrentou a baixa solidariedade empresarial, em particular no que se refere às manifestações contra a “estatização econômica”. Observa-se, assim, a presença de uma relação de conflito e oposição - entre Estado e classe empresarial - e a presença de um Estado que já vinha realizando um processo de expansão desordenado. Uma interpretação derivada da inter-relação desses dois fatores permite a identificação da estrutura de dominação brasileira como tipicamente neopatrimonial, sobretudo ao se verificar o enorme “esforço” feito pelo “centro” na promoção de uma nova etapa desenvolvimentista, modernizante. Ressalta-se, portanto, que o processo de financiamento do II PND, ou seja, de expansão das empresas estatais - principal agente econômico do plano -, realizado pelo Estado, é cercado de empecilhos e contradições.

Devido às resistências empresariais Geisel limita em 20% o limite superior de reajuste das tarifas públicas, por intermédio da deliberação do CDE de 15 de janeiro de 1975, dificultando assim o autofinanciamento das estatais. De forma semelhante, quando o setor privado não aprovou a implementação de integrações horizontais e verticais, o governo também procurou impedir que a grande empresa estatal aumentasse o volume de seus lucros.

Ademais, as empresas públicas tinham limitado acesso ao Tesouro e ao sistema financeiro oficial - destinado prioritariamente ao setor privado. Com efeito, as estatais tiveram de recorrer ao endividamento externo, fator que irá contribuir para a “estatização da dívida externa”, fenômeno que acarretará grandes problemas para a economia brasileira, como analisado por vários economistas.

Além disso, a economia brasileira manifestava sérios desequilíbrios macroeconômicos de curto prazo, concernentes à inflação e ao balanço de pagamentos. Foi nesse contexto que se deu o confronto entre o grupo “desenvolvimentista” - liderado por Velloso - e o grupo “contencionista” - representado por Simonsen - do governo. Conflito que foi, grosso modo, resolvido com o aumento da taxa de juros e com a intensa entrada de capital externo, ampliando, assim, o hiato financeiro na operação da dívida pública usada para financiar a conversão do saldo líquido dos recursos externos.

A elevação da taxa de juros não agradava ao setor privado, fato que levou o governo a abrir várias linhas de crédito subsidiado. Como resultado, o problema do desequilíbrio financeiro do Tesouro aumentou por causa das pressões privadas. Assim, a velocidade do giro da dívida pública, o déficit financeiro incontrolável e a entrada de um enorme volume de capital externo acabaram criando pressões autodestruidoras da meta inicial de contencionismo creditício. De forma que a política cambial ficou dependente da política de financiamento externo e do crescente custo da dívida externa.

Esses conflitos e obstáculos permitem compreender por que a realização do processo de substituição de importações resultou em graves consequências político-econômicas para a sociedade brasileira. “Este enorme esforço, feito por um Estado sem solidariedade empresarial e com endividamento externo, parece ter nos levado a uma crise mais profunda do que as que sucederam às tentativas anteriores de instalação da indústria pesada no Brasil” (Fiori, 1990FIORI, José Luís de (1990) “Sonhos prussianos crises brasileiras: leitura política de uma industrialização tardia”. Texto para discussão número 235, UFRJ, abr. , pp. 16-17). A crise manifesta-se, de certa forma, a partir de 1979. Contudo, só a partir de 1982, com a explosão da crise da dívida externa, é que se observa “o nó central da crise: o encilhamento financeiro geral, que destrói qualquer possibilidade desenvolvimentista no momento em que este (o Estado) enfrenta o desafio de uma transição de­mocrática” (Fiori, 1990FIORI, José Luís de (1990) “Sonhos prussianos crises brasileiras: leitura política de uma industrialização tardia”. Texto para discussão número 235, UFRJ, abr. , p. 17).

Atesta-se, assim, que a crise socioeconômica brasileira da década de 80 teve sua origem, grosso modo, com o II PND. Em particular devido às dificuldades em atender aos diferentes interesses de grupos “novos” e “velhos”. Fiori chama essas dificuldades de “ambiguidade estratégica do II PND”, a qual se deve à presença de um Estado “dividido entre sua opção desenvolvimentista e sua gestão estabilizadora; entre seu projeto de nação potência e seu financiamento externo; entre sua vocação estatista e a sua submissão aos pactos e compromissos cartoriais, corporativos e regionais que privatizaram e limitaram a própria possibilidade de modernização e eficácia do Estado” (Fiori, 1990FIORI, José Luís de (1990) “Sonhos prussianos crises brasileiras: leitura política de uma industrialização tardia”. Texto para discussão número 235, UFRJ, abr. , p. 17). O modo pelo qual as estatais se endividaram por causa da estratégia desenvolvimentista do II PND e por causa da política de estabilização também se mostra uma “ambiguidade”, tendo em vista que as empresas estatais atuam como tomadoras de moeda externa a fim de fechar o balanço de pagamentos. De forma semelhante, o endividamento público interno e externo também se revela uma “ambiguidade estratégica” do Estado neopatrimonial brasileiro, pois o endividamento público interno deixa de realizar seu papel fiscal de captação de recursos e passa a ser usado como instrumento de política monetária de curto prazo, com o objetivo de reajustar o balanço de pagamentos e de combater a inflação.

A agravante desse processo de expansão centralizadora resume-se no fato de o Estado acabar adotando medidas “ambíguas” a fim de continuar beneficiando os vários grupos de interesses, ou seja, a fim de preservar a “lealdade” desses grupos. Em outros termos, a consequência desse processo centralizador evidencia-se ao perceber-se que os custos da crise dos anos 80 não foram distribuídos de forma uniforme entres os atores econômicos, porquanto ao adotar desvalorizações cambiais, elevação da taxa de juros interna e ao realizar o arrocho salarial promovia-se uma redistribuição da renda em favor do setor empresarial privado. Ademais, permitia-se a ocorrência de uma modificação patrimonial de ativos e passivos entre setor público e setor privado, como analisado por Schwartsman (1990SCHWARTSMAN, Alexandre (1990) Auge e declínio do Leviatã: mudança estrutural e crise na economia brasileira. Dissertação de mestrado, FEA-USP. ). De um lado, o setor público aumenta seu estoque da dívida externa e interna. E, de outro, o setor privado diminui seu endividamento, liquida sua dívida externa e interna, tomando-se credor líquido do Banco Central e, assim, credor indireto do setor público.

Uma alternativa de interpretação “compreensiva” da economia brasileira

Reafirma-se, portanto, que o neopatrimonialismo mostra-se como categoria analítica relevante para a compreensão de economias que, como a brasileira, têm o Estado como agente central, propulsor do desenvolvimento socioeconômico. E quando se constata que o “centro” terá de realizar um esforço de expansão tremendo a fim de viabilizar a implementação de um projeto desenvolvimentista - como o II PND, por exemplo -, torna-se imperioso correlacionar os fatores econômicos aos elementos políticos.

Assim, afirma-se que a decisão de implementação de um projeto desenvolvimentista, que visava a um último passo para completar o parque industrial brasileiro, fundou-se, de fato, em motivos políticos e não puramente econômicos. É possível salientar, destarte, que o Segundo Plano Nacional de Desenvolvimento consistiu num projeto elaborado e implementado com base numa racionalidade substantiva, orientada por grupos de interesses, por intermédio de uma ação tendencialmente mais valorativa. No entanto, cumpre enfatizar que ao apontar a racionalidade política do II PND não se objetiva desconsiderar a relevância dos fatores ditos “puramente econômicos”. Enfatiza-se ainda que esse fluido/dinâmico fenômeno sociocultural chamado Segundo Plano Nacional de Desenvolvimento revela-se, em um primeiro momento, um projeto política e economicamente determinado - que recebe influência de fatores políticos e econômicos - e, em um segundo instante, um projeto político e economicamente determinante - acaba influenciando a economia e a política do país.

Entretanto, a análise do II PND como fenômeno politicamente determinante não será detalhadamente realizada neste trabalho. Pretende-se apenas apontar, na conclusão, que o neopatrimonialismo - conceito que tende a caracterizar melhor o Estado brasileiro, geralmente conhecido como nacional-desenvolvimentista - mostra-se como instrumento relevante para o entendimento da natureza da estrutura de dominação brasileira e, em especial, da forma como o Estado conduz a economia. Baseando-se no conceito de “dominação neopatrimonial”, pretende-se sugerir ainda a necessidade de mudança deste tipo de Estado.

4. CONCLUSÃO

Com o propósito de evidenciar a influência exercida pelo modo de dominação sobre a racionalidade da economia, faz-se necessário verificar até que ponto o Estado brasileiro, durante o período Geisel, encontrava-se mais próximo do tipo racional ou do tipo neopatrimonial. Poder-se-á, assim, asseverar a relevância da política para que se possa entender a dinâmica da economia brasileira, em particular no que se refere ao II PND.

Existem elementos importantes que distinguem o Estado racional-legal do Estado neopatrimonial. Enquanto no racional-legal o staff administrativo é composto por “profissionais”, é possível encontrar não apenas profissionais no Estado neopatrimonial, mas também pessoas ligadas ao “centro” por algum vínculo de fidelidade e/ou privilégio. Concernente ao tipo de participação política, em uma sociedade tipicamente composta por uma estrutura de dominação mais racional, a probabilidade de a participação política ser estendida a todos os cidadãos é maior. Em geral os partidos têm mais força política, assim como os sindicatos e as organizações sociais em geral, ao passo que em uma sociedade de tipo neopatrimonial, a participação política tende a ser mais monopolizada pelo centro, ou seja, pelos grupos “elitistas” que cooptam o Estado. Ademais, no Estado racional, o processo de desenvolvimento econômico mostra-se menos dependente do Estado, com maior ênfase na economia de mercado. Diferentemente do neopatrimonial, em que se evidenciam o alto grau de dependência do Estado para a promoção do desenvolvimento socioeconômico e a presença de um setor privado acostumado a beneficiar-se dos privilégios do “centro”. Enquanto a expansão do Estado racional tende a acompanhar o desenvolvimento socioeconômico do país, a fim de realizar as funções típicas de um Estado moderno, o Estado neopatrimonial tende a conciliar os interesses dos grupos “novos” e “velhos” - à medida que a sociedade vai ficando mais complexa e a economia mais moderna - com o intuito de atender às demandas dos diversos grupos cooptados pelo “centro”. No que se refere ao tipo de política econômica promovida pelo “centro”, o Estado racional, de um lado, mostra-se mais guiado pela racionalidade econômica do que por outros motivos. O Estado Neopatrimonial, de outro lado, tende a desenvolver políticas de cunho paternalista, distributiva, acumulativa e extrativa. Este tipo de medidas econômicas acabam sendo derivadas da necessidade de o Estado preservar a lealdade dos diversos grupos de interesses cooptados.

É possível assinalar que, diferentemente do período Médici, a estrutura de dominação do governo Geisel apresenta alguns elementos que se aproximam mais de um Estado tipicamente racional, como a) as reformas efetuadas por Geisel no âmbito ministerial, com maior ênfase na “profissionalização” do staff administrativo e no intercâmbio entre os diferentes ministérios, não havendo, assim, nenhum “superministro”, como ocorria no governo Médici; b) a redução das atribuições do CMN - agência que concentrava todos os instrumentos de política econômica-; c) a criação do CDE, um órgão mais especializado do que o CMN, embora também seja mais centralizado e d) a “liberalização” política, que indica que a forma de representação política da sociedade encontrava-se, de certa forma, a caminho de um tipo mais “racional” e menos neopatrimonial.

Apesar de o Estado brasileiro do período Geisel apresentar-se, grosso modo, mais racional em relação ao período anterior, a estrutura de dominação do país ainda possuía fortes características neopatrimoniais. Estas características podem ser reveladas a) pela presença do Estado no comando de mais uma etapa da industrialização brasileira, ressaltando-se aqui o papel central desempenhado pelas empresas estatais na implementação de setores básicos do II PND; b) pela formação de uma nova aliança política, a partir do Pacote de Abril, a fim de dar continuidade à estratégia político-econômica do Estado; c) pelos “dilemas de política econômica” surgidos ao longo da trajetória do II PND, tendo em vista que o “centro” deveria atender às demandas de grupos de interesses “novos” e “velhos” (chamado por Fiori de “ambiguidades estratégicas do II PND”) e d) pelo tipo de política econômica adotado com o II PND - como a estatização da dívida externa e a adoção de novos subsídios e de novas resoluções do Banco Central -, tendo em vista que essa política proporcionou uma transferência de renda do setor público para o setor privado.

Em resumo, verifica-se, de um lado, a presença de um Estado disposto a acionar os mecanismos de voz, a superar a crise de regime político vivida pelo país desde 1964 e a introduzir, de certa forma, elementos de ordem mais “racional” na estrutura de dominação brasileira. De outro lado, o Estado encontrava-se comprometido com a aliança política de 1964 e com uma “nova” aliança, derivada do Pacote de Abril. Essas alianças - entre Estado e grupos cooptados - traduzem-se em lealdade negociada, o que impede que o Estado brasileiro realize uma expansão mais racional e menos neopatrimonial. O Estado brasileiro, dessa forma, acabou realizando um processo de expansão desordenado e centralizado, como analisado por Eisenstadt, ao longo da implementação do II PND. De forma que “o que se observou no país foi um processo de fragilização financeira do setor público (Tesouro, Autoridade Monetária e setor produtivo estatal) por conta” do endividamento externo e interno promovido pelo Estado, “o que tem sérias implicações sobre o modo de funcionamento da economia brasileira na década de oitenta .... Deste modo ... a década de 70 (que) assistiu ao auge do Leviathan ... , foi também espectadora do lançamento das sementes que conduziram ao seu declínio na década seguinte” (Schwartsman, 1990SCHWARTSMAN, Alexandre (1990) Auge e declínio do Leviatã: mudança estrutural e crise na economia brasileira. Dissertação de mestrado, FEA-USP. , p. 220).

Durante os anos Geisel, a presença do Estado como agente principal do desenvolvimento econômico e como locus de acomodação de interesses específicos torna-se problemática, pois a sociedade fica mais complexa e, portanto, “o Esta-do se vê dardejado por uma onda de solicitações contraditórias, que é incapaz de conciliar e atender” (Belluzzo e Cardoso de Mello, 1981BELLUZZO, L. G. de M. & CARDOSO DE MELLO, J. M. (1981) “Reflexões sobre a crise atual”. In Belluzzo, L. G. de M. & Coutinho, R. (orgs.) (1981) Desenvolvimento capitalista no Brasil: ensaios sobre a crise. São Paulo, Brasiliense, vol. 1. , p. 157). Consequentemente, a política econômica definida pelo II PND foi fortemente influenciada não apenas pelos interesses do grupo que se encontrava no poder, mas também pelas “solicitações contraditórias” daqueles que negociavam com o Estado. Observa-se, assim, que ao sofrer um processo de “modernização” ao longo da História, a sociedade brasileira conservou fortes características patrimoniais, não chegando a se organizar conforme os padrões das democracias ocidentais. Como resultado, o célere desenvolvimento socioeconômico do Brasil não permitiu que os grupos sociais menos favorecidos - que se encontravam à margem do “centro” - desfrutassem dos benefícios auferidos pela “modernização”. De forma que esta “modernização” adquire características tipicamente neopatrimoniais, ao apresentar tanto elementos de ordem “racional” como de caráter “patrimonial”.

Acredita-se que a análise realizada neste trabalho permita-nos entender por que ao se estudar a natureza do Estado torna-se possível mostrar por que a transição política brasileira não se traduziu em consolidação efetiva da democracia, e por que até mesmo em ambiente relativamente mais democrático os planos econômicos adotados sobretudo na década de 80 não obtiveram o êxito esperado. Esta alternativa de interpretação da economia brasileira possibilita-nos ainda assinalar o esgotamento de um tipo de desenvolvimento econômico que vem sendo promovido pelo Estado “neopatrimonial” brasileiro desde 1930 e entender por que o surgimento de novas alternativas de modelo para o Estado se torna tão difícil.

Brasílio Sallum ressalta a necessidade de construir um “novo padrão hegemônico de dominação” ao se referir “às crises do padrão anterior de articulação entre capitais locais - privado nacional e estatal - e o capital internacional; da forma corporativa anterior de agregação de interesses econômicos sociais gerados por uma sociedade cada vez mais complexa; e da relação entre o setor público e o privado no processo de desenvolvimento capitalista” (Sallum, 1994SALLUM, Brasílio Júnior (1994) “Transição política e crise de Estado”. Lua Nova, nº 32, CEDEC, São Paulo. , p. 163). Observa ainda que ao longo da Nova República, “todas as tentativas de resolver a crise ... padecem de uma limitação básica: tentaram resolver os problemas derivados da crise do Estado desenvolvimentista dentro de seu antigo quadro de referência” (Sallum, 1994SALLUM, Brasílio Júnior (1994) “Transição política e crise de Estado”. Lua Nova, nº 32, CEDEC, São Paulo. , pp. 164-165). Contudo, nos anos 80 e 90, para que se pudesse consolidar a democracia e obter a estabilidade econômica, “os quadros do antigo pacto teriam que ser mudados”, fazia-se necessário, portanto, alterar as bases ou a natureza do Estado brasileiro, a fim de que as medidas adotadas conduzissem “à queda dos padrões patrimonialistas de regulação estatal” (Sallum, 1994SALLUM, Brasílio Júnior (1994) “Transição política e crise de Estado”. Lua Nova, nº 32, CEDEC, São Paulo. , p. 167).

Evidencia-se, assim, que a forma pela qual o Estado brasileiro vem promovendo o desenvolvimento socioeconômico do país, e que foi exemplificada neste trabalho por intermédio da análise do II PND, não condiz mais com as necessidades do Brasil dos anos 80 e 90: momento em que se questiona o êxito do uso legítimo da força monopolizada por um Estado de natureza “neopatrimonial “. A crença na legitimidade de um sistema de dominação, como nos ensina Weber, não apenas indica diferenças bastante reais entre os sistemas de dominação, mas também mostra-se essencial para a estabilidade de uma relação de autoridade. Se a crença na legitimidade de um Estado de caráter neopatrimonial é questionada, e se este tipo de Estado tem um caráter instável sobretudo com respeito à dominação legal, pode-se dizer que a construção de bases que se aproximem mais do tipo racional-legal mostra-se imperiosa para que o Estado e, por conseguinte, o regime político brasileiro consigam resgatar a “funcionalidade” e a credibilidade tão necessárias para a consolidação da democracia e da estabilidade econômica. Não se trata de demolir o Estado, mas de construi-lo sobre novas bases.

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  • 1
    As bases da legitimidade compreendem os motivos pelos quais as pessoas reconhecem a autoridade do Estado. Weber vale-se desse conceito e, mais especificamente, das diversas características que podem ser representadas por ele em diferentes configurações históricas para construir os três tipos puros de dominação legítima (ver Weber, 1922WEBER, Max (1922) Economy and Society: An Outline of Interpretive Sociology. Roth, G. & C. Wittich (eds.). New York, Bedminster Press, 1968. Primeira edição alemã, 1922. , vol. 1, cap. 3).
  • 2
    Motivações distintas, em diferentes situações, podem muito bem propiciar a justaposição relativa de tipos, inexistindo, portanto, qualquer determinação final. Daí a opção de Weber pelo termo dominação, como probabilidade ou tendência, em vez de determinação.
  • 3
    Utiliza-se aqui o conceito de “neopatrimonialismo” como uma tentativa de incorporação dos tipos weberianos em um único subtipo, a fim de analisar melhor o caso brasileiro. É relevante assinalar que: “All forms of domination occurring in history constitute, according to Weber, ‘combinations, mixtures, adaptations, or modifications’ of the charismatic, the traditional, and the legal type” (Bendix, 1960BENDIX, Reinhard (1960) Max Weber: An Intellectual Portrait. London, Heinemann. , p. 330). Por conseguinte, lança-se mão do “neopatrimonialismo”, pelo fato de essa categoria consistir em modificação ou adaptação do patrimonialismo de Weber - um subtipo da dominação tradicional -, ou melhor, por ser uma combinação dos tipos racional-legal e patrimonial. Ressalta-se ainda que alguns autores fazem uso de terminologias diferentes ao utilizarem-se desse mesmo conceito. Schwartzman, por exemplo, prefere empregar o termo “patrimonialismo burocrático”, enquanto Eisenstadt refere-se ora ao “patrimonialismo moderno”, ora ao “neopatrimonialismo”.
  • 4
    É importante enfatizar que os quatros tipos de ação social de Weber (racional referente a fins, racional referente a valores, afetiva e tradicional) expressam a possibilidade de as pessoas agirem com base em outros motivos, fora o econômico. Além disso, Weber percebe que é possível “imputar” a racionalidade a grupos e, assim, a partir do momento em que certo grupo deseja obter um determinado objetivo, sua ação será caracterizada por um tipo específico de racionalidade.
  • 5
    É importante enfatizar que os quatros tipos de ação social de Weber (racional referente a fins, racional referente a valores, afetiva e tradicional) expressam a possibilidade de as pessoas agirem com base em outros motivos, fora o econômico. Além disso, Weber percebe que é possível “imputar” a racionalidade a grupos e, assim, a partir do momento em que certo grupo deseja obter um determinado objetivo, sua ação será caracterizada por um tipo específico de racionalidade.
  • 6
    Grifos de Weber
  • 7
    De acordo com Linz, regimes autoritários são: “Sistemas políticos com pluralismo político limitado, não responsável, sem ideologia orientadora e elaborada, mas com mentalidades distintas, sem mobilização política extensiva ou intensiva, exceto em alguns pontos do seu desenvolvimento, e no qual um líder ou, ocasionalmente, um pequeno grupo exerce o poder dentro de limites formalmente mal definidos, mas, na realidade, bem previsíveis”(Linz, 1979LINZ, Juan (1979) “Regimes autoritários”. In Pinheiro, Paulo Sérgio (org.) (1979) O Estado autoritário e os movimentos populares. São Paulo, Paz e Terra . , p. 121).
  • 8
    Linz cita quatro formas através das quais um regime autoritário poderia constituir-se em bases estáveis: 1) carismática, 2) corporativa, 3) a partir de um partido hegemônico fascista/populista e 4) através de um sistema multipartidário com um partido revolucionário hegemônico, como no México. E chega à conclusão de que nenhuma destas formas resultariam na institucionalização do regime político brasileiro, por não traduzirem a conjuntura política do Brasil pós-64 ou por não estarem de acordo com a história política do país.
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    JEL Classification: N16; O21.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Jul 2022
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 1997
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