Satisfação dos pais em relação ao cuidado em unidade de terapia intensiva pediátrica

RESUMO

Objetivo:

Verificar a satisfação dos pais em relação ao cuidado prestado ao filho internado na unidade de terapia intensiva pediátrica e fatores clínicos associados.

Método:

Pesquisa exploratória, transversal, com 84 pais, em hospital privado de São Paulo, Brasil. A coleta de dados ocorreu de março de 2019 a janeiro de 2020, no pós-alta. Os dados foram analisados por estatística descritiva e Coeficiente de Correlação de Spearman.

Resultados:

A média de satisfação foi alta (5,75) (DP=0,35). Não houve correlação da satisfação dos pais com tempo de internação, gravidade e doença.

Conclusão:

Os pais apresentaram altos níveis de satisfação com o cuidado recebido na terapia intensiva pediátrica, independentemente da classificação da doença, tempo de internação ou gravidade. Observou-se maior satisfação nos domínios atitude profissional, cuidado e cura, informação e participação dos pais.

Palavras-chave:
Unidades de terapia intensiva pediátrica; Qualidade da assistência à saúde; Satisfação do paciente; Enfermagem familiar

ABSTRACT

Objective:

To verify the parents’ satisfaction in relation to the care provided to their child admitted to the pediatric intensive care unit and associated clinical factors.

Method:

Exploratory, cross-sectional study, with a total of 84 parents, in a private hospital in Sao Paulo, Brazil. Data collection took place from March 2019 to January 2020, in the post-discharge period. Data were analyzed using descriptive statistics and Spearman’s Correlation Coefficient.

Results:

Mean satisfaction was high (5.75) (SD=0.35). There was no correlation between parents’ satisfaction and length of hospital stay, severity and illness.

Conclusion:

Parents showed high levels of satisfaction with the care received in pediatric intensive care, regardless of disease classification, length of hospital stay or severity. Greater satisfaction was observed in the domains of professional attitude, care and cure, information and parents’ participation.

Keywords:
Pediatric Intensive Care Units; Quality of health care; Patient satisfaction; Family nursing

RESUMEN

Objetivo:

Verificar la satisfacción de los padres en relación con la atención brindada al niño ingresado en la unidad de cuidados intensivos pediátricos y los factores clínicos asociados. Método: Es una investigación exploratoria y transversal, realizada entre 84 padres en un hospital privado de São Paulo, Brasil. Los datos se recogieron entre marzo de 2019 y enero de 2020, después del alta y se analizaron mediante estadística descriptiva y el Coeficiente de Correlación de Spearman.

Resultados:

La media de satisfacción fue alta (5,75) (DP=0,35). No hubo correlación de la satisfacción de los padres con la duración de la estancia, la enfermedad y la gravedad. Conclusión: Los padres mostraron altos niveles de satisfacción con la atención recibida en cuidados intensivos pediátricos, independientemente del período de la hospitalización, de la clasificación de la enfermedad o de la gravedad de la misma. Se observó mayor satisfacción en los dominios de actitud profesional, cuidado y curación, información y participación de los padres.

Palabras clave:
Unidades de cuidado intensivo pediátrico; Calidad de la atención de la salud; Satisfacción del paciente; Enfermería de la familia

INTRODUÇÃO

A hospitalização da criança é reconhecida como uma experiência muito estressante para os pais, devido ao desconhecimento dos procedimentos realizados, aos diagnósticos identificados e pelas mudanças na rotina e no ambiente1. Quando a internação ocorre na terapia intensiva, sentimentos como angústia e ansiedade se intensificam nesses pais devido à condição crítica de saúde do filho1^-2.

Instituições que se apropriam de estratégias pautadas no cuidado centrado na criança e família apresentam melhores perspectivas para atender as suas necessidades, tornando a experiência de internação menos sofrida, o que pode, ao mesmo tempo, gerar a satisfação com o cuidado. O Modelo do Cuidado Centrado no Paciente e na Família (CCPF) reconhece a família como especialista no cuidado de seus filhos e busca estabelecer e manter a parceria entre família, paciente e os profissionais de saúde3.

Ainda nessa perspectiva, a percepção de satisfação por parte da família é considerada como um parâmetro para avaliar a qualidade da assistência prestada e tem sido foco de pesquisas em diferentes culturas2^,4^,5. Cabe destacar que a satisfação da família com o cuidado está associada, ainda, aos resultados obtidos em relação à melhora do estado de saúde da criança ou à redução dos sintomas críticos4. Considerando estes apontamentos, questiona-se: qual é o grau de satisfação das famílias que tem um filho internado na Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP)? Quais fatores clínicos interferem na percepção de satisfação da família?

A satisfação do paciente e da família é um conceito relacionado à qualidade da assistência percebida. Na assistência ao paciente pediátrico, é um conceito complexo, ao se considerar que a família representa a opinião da criança, em um momento no qual a sua condição emocional exerce influência importante no modo como o cuidado e o ambiente são percebidos6. Nesse sentido, é importante considerar quais aspectos impactam na condição emocional da família: gravidade da doença, idade da criança ou tempo de internação, por exemplo.

Para se definir satisfação com o cuidado, um estudo7 buscou compreender as variáveis que a determinam, dentre as quais se observa a reação cognitiva e emocional relacionada à interação entre as expectativas dos pacientes sobre o cuidado de enfermagem ideal e as suas percepções do cuidado real. A satisfação representa uma combinação de expectativas, percepções e experiências que pode variar entre os pais, pois depende de sua cultura, valores e classe social8.

Ao se apropriar de conceitos sobre satisfação da família descritos na literatura, permeados pelas características culturais do ambiente onde a pesquisa foi realizada, este estudo considerou satisfação da família com o cuidado um atributo que leva em conta o respeito às necessidades dos pais, o engajamento da família no cuidado, o fornecimento de informações que auxiliam na tomada de decisão, um ambiente organizado e as atitudes profissionais que promovem cuidado adequado na perspectiva das famílias.9

Ainda mais complexo do que definir satisfação é encontrar instrumentos que possam mensurá-la. No Brasil, identifica-se carência de instrumentos válidos para avaliar a satisfação da família em Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP), havendo, consequentemente, limitação de estudos que investigam sobre a temática2. Na literatura, foi identificado o questionário Empowerment of Parents in the Intensive Care-30 (EMPATHIC-30), elaborado para avaliar a experiência de pais com filhos internados em unidades de terapia intensiva9.

Conhecer a satisfação da família sobre o cuidado recebido aos seus filhos internados na UTIP, pode contribuir para melhoria dos processos da assistência oferecida, melhor experiência de hospitalização da criança e da família, alcance de melhores resultados e consequentemente aumento da qualidade do cuidado oferecido9.

A presente pesquisa objetiva verificar a satisfação dos pais em relação ao cuidado prestado ao filho internado na unidade de terapia intensiva pediátrica e fatores clínicos associados.

MÉTODO

Trata-se de pesquisa exploratória, transversal, realizada na UTIP, em um hospital privado, localizado em São Paulo, SP, Brasil. A unidade é organizada em 15 leitos, na modalidade de quartos individuais para criança e acompanhantes. É permitido que dois adultos acompanhem a criança no período de 24 horas, sendo as visitas liberadas em qualquer horário e dia da semana. O número de internações é, em média, 600 por ano. A idade de internação varia de dias de vida a 21 anos, com tempo médio de internação de 4 dias. A maioria das crianças é oriunda das unidades de pronto atendimento e centro cirúrgico. Quanto aos escores preditivos de morte hospitalar, cabe ressaltar que nessa unidade a média anual do Pediatric Logistic Organ Dysfunction (PELOD) é zero, e do Pediatric Index of Mortality 2 (PIM2) é 0,8%.

Os dados foram coletados no período de março de 2019 a janeiro de 2020, antes da pandemia pelo coronavírus (SARS-CoV2). A equipe médica avaliava as condições de alta dos pacientes pela manhã e, conforme eram confirmadas, o instrumento de coleta de dados era entregue aos pais que estivessem no quarto para preenchimento, por meio de um dispositivo eletrônico do tipo tablet. Nos casos de presença do pai e da mãe, eles puderam escolher entre si quem iria responder a pesquisa, e este participante recebia informações sobre o preenchimento do questionário, bem como sobre o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), a pesquisadora, então, deixava o questionário com o participante, sem tempo estipulado para o preenchimento.

Participaram do estudo pais de crianças que ficaram internadas na UTIP por mais de 48h, maiores de idade, alfabetizados, independentemente do diagnóstico do paciente e que estiveram presentes no momento da alta. Como critérios de exclusão, definiram-se pais de crianças que não dominavam o idioma português, aqueles cuja criança foi a óbito ou readmitida no período da coleta de dados.

O cálculo amostral foi obtido utilizando-se resultados observados pelo autor do questionário EMPATHIC-30 para as estimativas de variabilidade do escore total. Segundo Latour10, 2.858 pais de crianças internadas em UTIP responderam a todos os itens do questionário EMPATHIC-30, sendo observada média de 5,28, com desvio padrão de 0,61 (IC 95%: 5,26; 5,30) para o escore total. Dessa forma, uma amostra de 70 pais (um por criança internada) seria suficiente para construir um intervalo de confiança de 95%, com amplitude de 0,28 para um desvio padrão de 0,6110. Os cálculos de estimativa de tamanho amostral foram realizados com auxílio do programa PASS [2], com nível de significância bicaudal de 5%, utilizando intervalo de confiança para uma média.

O instrumento de coleta de dados continha as informações sociodemográficas dos pais, o questionário EMPATHIC-30, além de dados e informações da criança, como idade, tempo de internação, diagnóstico, PIM2 e PELOD, uso de ventilação mecânica e presença de dispositivos médicos.

O questionário EMPATHIC-30 foi construído e rigorosamente validado em oito hospitais universitários, nas unidades de terapia intensiva pediátrica e neonatal, em 2009, na Holanda10. Trata-se de instrumento de autopreenchimento que consiste em 30 declarações elaboradas para avaliar a satisfação dos cuidados prestados por enfermeiros, médicos e sobre a estrutura do ambiente hospitalar, bem como, avaliar a experiência de pais em terapia intensiva por meio de um questionário para análise quantitativa da satisfação recentemente validado para o contexto brasileiro10, além das versões em vários outros países, como Australia11, Turquia12 e Espanha13.

A satisfação, variável dependente, foi avaliada pela aplicação do EMPATHIC-30, instrumento dividido em cinco domínios: informação (cinco itens); cuidado e cura (oito itens); organização (cinco itens); participação dos pais (seis itens); e atitude profissional (seis itens). As respostas são fornecidas em uma escala de seis pontos, variando de 1 ("certamente não") a 6 ("certamente sim").

As variáveis independentes do estudo foram as seguintes: Tempo de internação (considerada como dia 1 a data da internação, independentemente do horário em que ela ocorreu); Diagnóstico; Tipo de doença: aguda ou crônica; PIM2 (escore calculado a partir das informações coletadas no momento em que a criança é admitida na UTIP, quantificando o quão doente a criança estava no momento em que iniciou o tratamento intensivo); PELOD: o escore tem amplitude mínima de zero e máxima de 71 pontos, avaliando no momento da admissão a disfunção dos órgãos.

O PIM2 e o PELOD são escores que quantificam a gravidade do paciente e a predição de morte. É importante mensurá-los, pois são utilizados para avaliar os desfechos em UTIP e, consequentemente, a qualidade do cuidado oferecido15.

Os dados passaram por um teste de normalidade e constatou-se que eram assimétricos. Para avaliar a relação do tempo de permanência na UTIP e dos escores de gravidade da doença dos filhos com o de satisfação dos pais, foram utilizados os coeficientes de correlação de Spearman. Os pais de pacientes com doença crônica e aguda foram comparados em relação aos escores de satisfação, por meio de testes não paramétricos de Mann-Whitney. As análises foram realizadas com o auxílio do pacote estatístico SPSS, sendo o nível de significância fixado em 5%.

A coleta de dados foi realizada após a aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) em 2019, sob parecer número 3.183.072. Em atenção à Resolução n.º 466/2012, todos os participantes consentiram a participação na pesquisa após terem sido informados sobre os objetivos do estudo, a forma de participação, os riscos e benefícios, assim como a garantia do anonimato e sigilo, assinando o TCLE.

RESULTADOS

A amostra foi composta por 84 pais de crianças internadas na UTIP, sendo na sua maioria mães (71; 84,5%), com idade entre 33 e 42 anos (56; 66,7%) e casada ou em união estável, conforme apresentado na Tabela 1. Durante o período de permanência dos filhos na UTIP, a maioria dos pais (70; 83,3%) permaneceu em tempo integral. Todos os pais abordados, elegíveis ao estudo, foram incluídos na amostra.

Tabela 1 -
Dados sociodemográficos dos pais de crianças internadas na Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP) (n=84). São Paulo, Brasil, 2020

Pais	n (%)
Sexo
Feminino	71 (84,5%)
Masculino	13 (15,5%)
Idade
23 a 32 anos	10 (11,9%)
33 a 42 anos	56 (66,7%)
43 a 52 anos	17 (20,2%)
mais de 58 anos	1 (1,2%)
Estado civil
Solteiro	4 (4,8%)
Casado ou união estável	77 (91,7%)
Divorciado	3 (3,6%)
Parentesco com o paciente
Mãe	71 (84,5%)
Pai	13 (15,5%)

• Fonte: Dados da pesquisa, 2019-2020.

A mediana de idade, em meses, dos pacientes foi 53,9 (10; 97,5), sendo a maioria do sexo feminino (52,4%), com tempo médio de internação de 6,2 (4,1) dias, por doença aguda (65,5%) e tratamento clínico (77,4%), como pode ser observado na Tabela 2.

Tabela 2 -
Informações sobre os pacientes internados na Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP) (n=84). São Paulo, Brasil, 2020

Idade (meses)	n
Média (DP)	53,9 (61,2)
Mediana (Q1; Q3)	25,2 (9,6; 96)
Mínimo; Máximo	0,0; (204,96)
Sexo
Feminino	44 (52,4%)
Masculino	40 (47,6%)
Tempo de internação (dias)
Média (DP)	6,2 (4,1)
Mediana (Q1; Q3)	5 (3; 7)
Mínimo; Máximo	2; 23
Tipo de doença
Aguda	55 (65,5%)
Crônica	29 (34,5%)
Tipo de tratamento
Cirúrgico	19 (22,6%)
PIM (%)
Mediana (Q1; Q3)	0,8 (0,3; 1,0)
PELOD da admissão
Mediana (Q1; Q3)	0,0 (0,0; 0,0)
Uso de ventilação mecânica
Não	74 (88,1%)
Sim	10 (11,9%)

• Fonte: Dados da pesquisa, 2019-2020. Legenda: PIM- Pediatric Index of Mortality; Pediatric Logistic Organ Dysfunction (PELOD)

Considerando a avaliação de gravidade na admissão na UTIP, o índice PIM 2 variou entre zero e 84%, com mediana de 0,8% (IIQ [0,3% -1,0%]), enquanto o índice PELOD variou entre zero e 31 pontos na admissão na UTIP. Observamos que 74 (88,1%) pacientes não necessitaram de ventilação mecânica e 10 (11,9%) fizeram uso por períodos entre três e 495 horas, com mediana de 60 horas (IIQ [14-168 horas]). Após a alta da UTIP, 64 (76,2%) pacientes foram transferidos para a enfermaria pediátrica.

Foram identificados 132 dispositivos usados nessas crianças, dentre os quais se destacam os cateteres venosos periféricos (54; 76%), o cateter venoso central de inserção periférica (PICC) (20; 28,2%) e a sonda nasogástrica (13; 18,3%). Observou-se que 57 (68%) pacientes utilizaram até dois dispositivos concomitantes durante a internação na UTIP.

A avaliação da satisfação dos pais por meio do uso do questionário EMPATHIC-30 foi extremamente positiva, revelando média geral de 5,75 (DP=0,35). Calculados os escores dos domínios da escala observamos maior satisfação nos domínios atitude profissional, com média 5,85 (DP=0,35), cuidado e cura, com média 5,71 (DP=0,48), informação e participação dos pais, ambos com média 5,65 (DP=0,54 para informação e 0,56 para participação dos pais), e, por último, organização, com média 5,54 (DP=0,56), conforme a Tabela 3.

Tabela 3 -
Escores dos domínios da escala EMPATHIC-30 para avaliação da satisfação dos pais em relação ao atendimento prestado aos pacientes internados na unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP) (n=84). São Paulo, Brasil, 2020

Escores dos domínios da escala EMPATHIC-30	Número de itens	Média (DP)
Informação	5	5,65 (0,54)
Cuidado e cura	8	5,71 (0,48)
Organização	5	5,54 (0,55)
Participação dos pais	6	5,65 (0,56)
Atitude profissional	6	5,85 (0,35)
Total de itens de satisfação	30	5,75 (0,35)

• Fonte: Dados da pesquisa, 2019-2020. DP: desvio padrão; Q1: primeiro quartil; Q3: terceiro quartil; n: número de pais

Na avaliação dos pais em relação ao atendimento recebido na UTIP, observa-se na Tabela 4 que os componentes com maiores proporções de respostas que demonstraram alta satisfação, de acordo com o respectivo domínio, foram os seguintes: Informação, no que se refere à percepção positiva, por poder conversar todos os dias com a equipe médica sobre o cuidado e o tratamento da criança (5,90; DP=0,37); Participação dos pais, ao expressar confiança na equipe médica (5,92; DP= 0,32); outro aspecto positivo elencado foi em relação ao sentimento de respeito à criança e a si próprios (5,90; DP= 0,40); e, por fim, pela possibilidade de permanecer junto ao filho durante os procedimentos (5,90; DP= 0,37).

No domínio Atitude Profissional, o alto grau de satisfação refere-se à sensação de ser bem acolhido na admissão da criança na UTIP. Por outro lado, apresentaram pior escore um item referente ao domínio Organização relacionado ao barulho na unidade, com somente 51 famílias indicando “certamente sim”. Em relação ao item do domínio Participação dos pais que versa sobre a preocupação frequente da equipe de como os pais estavam se sentindo, somente 50 pais tiveram a percepção de que isso ocorreu durante o período de internação do filho.

Os pais que responderam “não se aplica” ou deixaram a resposta em branco para um ou mais itens de um determinado domínio, ficando sem o escore de satisfação nesse domínio. Da mesma forma, o escore do total de itens de satisfação foi calculado apenas para pais com respostas presentes e diferentes de “não se aplica” em todos os itens (respostas válidas).

Tabela 4 -
Medidas descritivas para os escores dos itens da escala EMPATHIC-30 avaliados pelos pais dos pacientes internados na Unidade de Terapia Intensiva Pediátrica (UTIP) (n=84). São Paulo, Brasil, 2020

Itens da escala EMPATHIC-30	Média	DP	n
1. Todos os dias conversávamos com os médicos sobre o cuidado e tratamento do nosso filho	5,90	0,37	84
2. Todos os dias conversávamos com os enfermeiros sobre o cuidado e tratamento do nosso filho	5,78	0,64	83
3. O médico nos informou claramente sobre as consequências do tratamento do nosso filho	5,69	0,77	81
4. Recebemos informações claras sobre a realização e os resultados dos exames e testes	5,52	0,95	83
5. Recebemos informações compreensíveis sobre os efeitos dos medicamentos	5,37	1,09	82
6. Os médicos e enfermeiros trabalham em conjunto	5,58	0,89	83
7. A equipe médica nos preparou bem para alta do nosso filho	5,70	0,80	70
8. As enfermeiras nos prepararam bem para alta do nosso filho	5,58	0,97	71
9. A equipe estava atenta à prevenção e ao tratamento da dor do nosso filho	5,47	1,04	81
10. Os médicos levaram em conta o conforto do nosso filho	5,78	0,52	83
11. Os enfermeiros levaram em conta o conforto do nosso filho	5,62	0,82	84
12. Todos os dias sabíamos quem era o médico responsável pelo nosso filho	5,54	0,94	84
13. Todos os dias sabíamos quem era a enfermeira responsável pelo nosso filho	5,71	0,83	84
14. A equipe trabalhou de forma eficiente	5,76	0,61	84
15. Podíamos facilmente obter informações da UTIP por telefone, quando necessário	5,59	0,82	63
16. Havia espaço suficiente ao redor da cama do nosso filho	5,55	0,87	83
17. A UTIP estava limpa	5,46	1,01	84
18. O barulho da UTI era abafado na medida do possível	5,17	1,36	84
19. Durante a nossa permanência, a equipe perguntou regularmente como estávamos nos sentindo	5,20	1,28	84
20. A equipe nos envolveu ativamente na tomada de decisão sobre o cuidado e tratamento do nosso filho	5,59	0,92	82
21. Fomos incentivados a ficar perto do nosso filho	5,58	1, 02	79
22. Tínhamos confiança nos médicos	5,92	0,32	84
23. Tínhamos confiança nos enfermeiros	5,67	0,68	84
24. Sempre pudemos permanecer perto no nosso filho, mesmo durante os procedimentos	5,88	0,50	84
25. Recebemos apoio dos médicos	5,83	0,49	83
26. Recebemos apoio dos enfermeiros	5,78	0,56	83
27. A equipe trabalhou com higiene	5,85	0,50	84
28. A equipe respeitou a privacidade do nosso filho e a nossa	5,80	0,58	83
29. A equipe demonstrou respeito por nosso filho e por nós	5,90	0,40	84
30. Fomos bem acolhidos na chegada à UTI	5,90	0,37	84

• Fonte: Dados da pesquisa, 2019-2020.
• DP: desvio padrão; n: número de respostas presentes e diferentes de não se aplica.

Foram comparados os escores de satisfação dos pais no que diz respeito ao atendimento prestado relacionados à doença aguda e doença crônica (Figura 1). Não há evidências de diferenças significativas nos domínios, como pode ser evidenciado em informação (p=0,800), cuidado e cura (p=0,563), organização (p=0,479), participação dos pais (p=0,563), atitude profissional (p=0,828) e total (p=0,572) da escala EMPATHIC-30.

Figura 1 -
Relação entre tipo de doença dos pacientes e escores dos domínios do questionário EMPATHIC-30 para avaliação da satisfação dos pais no que diz respeito ao atendimento prestado.

Os coeficientes obtidos indicam falta de correlação do tempo de internação, PIM 2 e PELOD e escores dos domínios do questionário EMPATHIC-30, com todos os valores sem evidências de diferenças quando comparados ao zero. A saber, para cada domínio do questionário e a correlação com o tempo de internação, PIM2 e PELOD da admissão, respectivamente, foram obtidos os seguintes valores conforme Tabela 5.

Tabela 5 -
Domínio do questionário EMPATHIC-30 e a correlação com o tempo de internação, PIM2 e PELOD da admissão. São Paulo, Brasil, 2020

Domínio	n	Tempo de internação	PIM admissão	PELOD admissão
Informação	78	0,032 (p=0,784),	-0,041(p=0,724)	-0,036 (p=0,755)
Cuidado e cura	67	-0,101 (p=0,417)	0,071 (p=0,566)	0,063 (p=0,611)
Organização	63	-0,047 (p=0,714),	0,128 (p=0,317)	-0,137 (p=0,285)
Participação dos pais	77	-0,027 (p=0,816),	0,042 (p=0,717)	0,132 (p=0,253)
Atitude profissional	82	0,037 (p=0,744),	0,171 (p=0,124)	0,087 (p=0,437)

• Fonte: Dados da pesquisa, 2019-2020. Coeficiente de correlação de Spearman (valor p)

Por fim, no total de itens de satisfação, foram obtidos os valores (n=49) de -0,034 (p=0,818), -0,019 (p=0,898) e -0,070 (p=0,633), respectivamente.

DISCUSSÃO

O estudo evidenciou que as famílias de crianças internadas na UTIP revelaram altos níveis de satisfação em relação ao cuidado prestado pelas equipes multiprofissional e de apoio (média de 5,75), sobretudo no que se refere aos domínios “atitude profissional” (5,85), “cuidado e cura” (5,71) e “informação” e “participação dos pais” (5,65). Resultados semelhantes foram identificados em outros estudos nos quais o questionário foi aplicado10^,11^,13.

Nessa população, o nível de satisfação geral com o serviço foi elevado em todos os domínios do questionário, não havendo significância independentemente da classificação ou gravidade da doença (p=0,572) e tempo de internação (p=0,818). A literatura enfatiza que a hospitalização da criança em UTI é sempre um momento crítico e de estresse para a família16^,17, o que poderia influenciar negativamente na sua percepção sobre ambiente e cuidado, ações e atitudes específicas da equipe multiprofissional. No entanto, os dados encontrados neste estudo contradisseram o que a literatura afirma3, mesmo considerando condições clínicas de baixa complexidade e tempo curto de internação.

Pacientes de terapia intensiva e, sobretudo, crianças gravemente enfermas dispõem de reserva limitada para tolerar falhas no cuidado ou tratamento. Por outro lado, esse tipo de paciente pode se beneficiar extraordinariamente quando se amplia a qualidade do cuidado oferecido18. Desse modo, esta pesquisa avançou ao avaliar a satisfação da família com o cuidado recebido, compreendendo a importância desse indicador para a qualidade prestada em uma UTIP e para o empoderamento da família ao ter sua percepção considerada. Tais dados corroboram outro estudo brasileiro sobre o tema10, pois considerar a perspectiva da família e colocá-la como elemento fundamental na internação da criança gravemente enferma fomenta a prática do cuidado centrado na criança e família.

As famílias indicaram que conversar todos os dias com a equipe médica sobre o cuidado e tratamento da criança é uma ação valorizada por elas (escore de 5,98), as quais revelam um bom atendimento por parte da equipe da instituição, gerando sentimento de confiança nos médicos (5,92) e nas enfermeiras (5,67). Nesse escopo, a literatura destaca algumas ações que favorecem a satisfação da família relacionadas à comunicação e participação dos pais, como comprometer-se e estar disposto a ouvir os pais, fornecer informações suficientes e adequadas para que a família possa tomar a melhor decisão, além de desenvolver a autonomia em relação ao tratamento do próprio filho, isso vem de encontro à um dos componentes citados no Modelo (CCPF) que é o compartilhamento de informações.4^,19^,20.

O domínio “participação dos pais” corroborou o nível elevado de satisfação, pelo fato da família primar por ter participado ou estado presente durante todos os procedimentos aos quais a criança foi submetida. Similarmente, tais achados foram identificados em outras investigações10^,11^,13. Estudos previamente realizados enfatizam a importância de participação dos pais no cuidado do filho como atitude que incrementa a sua satisfação com o serviço, inclusive ao permitir que aprendam mais sobre a doença, o tratamento e o prognóstico de seus filhos, agregando valor ao atributo segurança5^,18^,20.

No domínio “atitude profissional”, os subitens melhor avaliados foram “A equipe demonstrou respeito por nosso filho e por nós” e “Fomos bem acolhidos na chegada à UTI”, ambos com média de 5,9. O conceito de respeito pode ser compreendido como algo subjetivo, ou seja, fruto do encontro de subjetividades entre a família e o profissional, com vistas a reduzir o tecnicismo do cuidado e tornar esse encontro mais significativo e humano. Postura atenciosa, confiança e empatia são atitudes valorizadas pelo paciente e família18, as quais podem sinalizar respeito.

Demonstrar interesse pelos sentimentos dos pais e bem-estar da criança estabelece um vínculo entre equipe e família. O conhecimento dos pais pode contribuir com informações importantes e favorecer a intervenção precoce com melhor desfecho de saúde de modo a valorizar a saúde em sua abordagem multidisciplinar16. No entanto, quando comparado a outros aspectos avaliados, o item que abordou a preocupação regular de como a família estava se sentido teve uma pontuação mais baixa do que os demais itens avaliados.

A satisfação geral dos pais no domínio “cuidado e cura” é considerada boa também, porém, o preparo para alta apresentou escore ruim ou baixo quando comparado aos outros padrões, apesar do hospital ter uma filosofia de iniciar o preparo para alta desde o momento da admissão. Tal resultado é similar aos achados do estudo na Austrália11, que também não atingiu a expectativa em relação ao preparo para alta na percepção da família. A admissão em um ambiente de cuidados intensivos, como uma UTIP, tem um impacto emocional maior nas crianças e seus pais em comparação com um ambiente geral de internação pediátrica, o que pode dificultar o processo de orientação/educação para alta ou transferência20. A realização deste estudo apontou para falhas nesse processo, demandando revisão ou readequação para que as famílias possam se sentir confiantes e seguras na transição para outras unidades ou para a casa.

O domínio do questionário “organização” obteve o menor grau de satisfação, avaliação que muito se deveu ao fato de haver insatisfação com o barulho da UTIP, sendo que resultado semelhante foi encontrado no estudo da Espanha14. Apesar do ruído persistente perturbar o ambiente de cura, há muitas atividades que geram ruído, além de sons persistentes de alarmes de monitor, ventiladores mecânicos e bombas de infusão. No momento da realização da pesquisa, ocorria uma obra estrutural em toda a fachada no hospital. Nesse cenário, o barulho de máquinas e colaboradores encaixando os materiais de construção foram constantes e todos os dias havia reclamação por parte dos pais, o que intensificou o ruído em um ambiente que já é considerado complexo em relação a esse fator. Outra pesquisa que avaliou os atributos de satisfação e qualidade na percepção do paciente e da família elencou que um contexto de cuidado pode ser considerado terapêutico quando se manejam de forma efetiva o controle de circulação de pessoas, os ruídos e a viabilização de um ambiente de acolhimento e conforto19.

CONCLUSÃO

Concluiu-se que os pais apresentaram altos níveis de satisfação com o cuidado recebido na UTIP. Não houve correlação entre satisfação dos pais e tempo de internação, tipo de doença, índices de gravidade PIM 2 e PELOD.

Observou-se maior satisfação nos domínios atitude profissional, cuidado e cura, informação e participação dos pais. A comunicação entre a família e a equipe multiprofissional, assim como a possibilidade de a família estar presente em tempo integral ou participar dos cuidados prestados ao seu filho, permeia as iniciativas de cuidado e conduz a níveis mais altos de satisfação da família, além disso reforça os preceitos do Modelo de Cuidado Centrado no Paciente e Família.

Cabe ressaltar que a população estudada representa um estrato cultural e socioeconômico bastante específico, quando comparada a outras instituições de atendimento, assim como o local onde o estudo foi desenvolvido, o que pode ser destacado como limitação desta pesquisa.

O compromisso com a satisfação da família não se encerra nesta pesquisa. Outro estudo vem sendo realizado em parceria com uma instituição pública, cujo intuito é de se ampliar o conhecimento sobre o tema, associando-se o uso do EMPATHIC-30 a outra ferramenta de avaliação de satisfação do usuário. Outros estudos podem ser realizados para avaliar a satisfação da família em contextos mais complexos, como no caso em que ocorreu o óbito da criança, ou para análise da percepção da família em situações de reinternações frequentes.

Agradecimentos:

Ao Programa de Mestrado Profissional em Enfermagem da Faculdade Israelita de Ciências da Saúde Albert Einstein pelo apoio para a realização desta pesquisa e para a publicação deste artigo.

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Datas de Publicação

• Publicação nesta coleção
  23 Maio 2022
• Data do Fascículo
  2022

Histórico

• Recebido
  15 Fev 2021
• Aceito
  25 Ago 2021