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AUTOBIOGRAFIAS EM MOÇAMBIQUE: A ESCRITA COMO MONUMENTO (2001-2013)* * Esse artigo é um dos resultados do projeto de pesquisa "Independência, utopia e memória na escrita moçambicana", desenvolvido em Moçambique com apoio da Fapesp, entre 2013 e 2014. Todas as fontes e referências foram indicadas.

AUTOBIOGRAPHIES IN MOZAMBIQUE: WRITTING AS MONUMENT (2001-2013)

Resumo

O artigo tem como foco textos de caráter autobiográfico publicados em Moçambique a partir de 2001, nos quais as relações entre memória e poder projetam-se como uma aliança determinante na condução da história recente do país. Compreendendo a escrita como uma arena, os autores recolhem/selecionam/produzem as lembranças do período da luta armada de libertação e propõem uma leitura em que a história é delineada por vozes que, mesmo procurando incorporar uma carga de subjetividade aos discursos que registram, confluem no esforço de consolidação da macronarrativa oficial.

Palavras-chave:
Moçambique; memória; história; escrita; contemporaneidade

Abstract

The article focuses on autobiographical texts published in Mozambique since 2001, in which the relations between memory and power are projected as a determining alliance in the conduct of the country's recent history. Understanding writing as an arena, the authors collect / select / produce the memories of the armed liberation struggle period and propose a reading in which history is delineated by voices that, while seeking to incorporate a charge of subjectivity into the discourses they record, converge in the effort to consolidate the official macronarrative.

Keywords:
Mozambique; memory; history; writing; contemporaneity

Quatro décadas após as independências dos países africanos da metrópole portuguesa, são muitos os sinais que evidenciam a permanência do legado que a experiência da dominação impôs, mantendo-se a certeza de que a expansão europeia e o sistema colonial vincaram a realidade para muito além do continente de onde saíram os barcos e recortam o presente nas muitas margens tocadas pelos invasores. Entre os aspectos bastante interessantes em que podemos observar o prolongamento de certos vínculos encontramos o investimento na memória associada à derrubada do império que vem também mobilizando gestos variados nos processos de gestão de um passado que se projeta no presente e acaba por converter também a escrita em espaço de luta e disputa pelo poder. Tais disputas podem ser captadas tanto no plano externo, colocando em confronto ex-colonizadores e ex-colonizados, como podem ser percebidas no campo interno, iluminando às vezes de maneira mais discreta arenas que se formam dentro de cada país.

Se o olhar é direcionado para a ex-metrópole, a atenção, já faz alguns anos, é atraída nas livrarias portuguesas para a profusão de livros de caráter memorialístico cujo foco recai no período da guerra colonial e no apagar do império português no continente africano. São dezenas e dezenas de obras, baseadas em relatos e/ou em imagens que procuram recompor a atmosfera dos anos que teriam marcado o fim de um tempo para uns e o início de uma nova era para outros. Se um título ou outro havia sido publicado antes, não há dúvida de que o começo de século XXI assiste a uma verdadeira explosão no campo da memória. Apresentadas como autobiografia, relato de experiências ou com algumas tintas romanescas, as narrativas traduzem o desejo de recuperar percursos interrompidos, ligados a um tempo e a um espaço projetados no solo africano.

Em certa medida, essa onda retoma e prolonga, em chave bastante diversa, o movimento iniciado com a chamada literatura sobre a guerra colonial que teve entre os autores mais significativos nomes como António Lobo Antunes, Carlos Vale Ferraz, João de Melo, Lídia Jorge, Manuel Alegre e Mário de Carvalho. Em obras como Os cus de judas, Nó cego, Autópsia de um mar de ruínas, A costa dos murmúrios, Jornada de África e Os alferes, a guerra colonial está no núcleo e possibilita um olhar diverso sobre a identidade portuguesa associada sempre à aventura da viagem e à decantada capacidade de incorporar terras e gentes. De acordo com Isabel Alegro Magalhães:

A guerra desvela, de modo trágico, uma situação constante do ser português, desde a Idade Média ao tempo presente: a ideia-metáfora do país como Cais. Toda a literatura portuguesa dá testemunho dessa realidade-metáfora (MAGALHÃES, 2002MAGALHÃES, Isabel Allegro de. Capelas imperfeitas: configurações literárias da identidade portuguesa. In: RAMALHO, Maria Irene & RIBEIRO, António Sousa (org.). Entre ser e estar. Raízes percursos e discursos da identidade. Porto: Afrontamento, 2002., p. 314).

Não há, pois, como negar que a imagem do país como "cais" é uma constante no imaginário lusitano povoado pela ideia de conquista, fenômeno que conheceria um contraponto depois da retirada dos colonos nos anos 1970. A vitória dos movimentos de libertação africanos determinou um outro tipo de viagem, a viagem de retorno ao país que, perdendo a condição de metrópole, experimentava um processo de estilhaçamento da identidade. 1 1 Idem, 2002. Esses homens que regressam trazem à cena portuguesa bastante transformada após o golpe militar de 25 de abril uma presença incômoda sob vários aspectos. Sua chegada materializava a derrota e o fim de um período glorificado e, ao mesmo tempo, evocava a memória de Salazar e seu sinistro regime que, impulsionados pelas lutas anticoloniais no continente africano e com apoio de movimentos populares portugueses, os "capitães de abril" tinham derrotado. Em confronto com essa nova situação, os "retornados" precisariam elaborar outras imagens de si próprios e da experiência agora condenada. Segundo Tania Macêdo: "Se nos caixotes, os colonos procuravam embalar os bens (poucos ou muitos) amealhados em África, neles estava também, simbolicamente, o império que ruíra". 2 2 MACEDO, Tania. O romance de retornados. Texto inédito, gentilmente cedido pela autora, a quem agradeço o gesto.

O choque diante da nova situação provocaria a combinação de uma forte nostalgia com uma grande necessidade de exaltação, "ambas regidas por uma memória seletiva na qual se cruzam os mundos privados dos que viveram em África, com o mundo público da história que deles se conta". 3 3 Idem. Diferentemente do que ocorre nos romances diretamente associados à guerra colonial, essas narrativas de um modo geral reiteram o enaltecimento do projeto colonial, procurando legitimar a qualquer custo o lugar que ocupavam na terra alheia. De certa forma, essa espécie de permanência na contemporaneidade lusitana do "labirinto da saudade", para usarmos a instigante expressão de Eduardo Lourenço, funda questões produtivas tanto para o conhecimento e reconhecimento do império como para o debate acerca do lugar da memória na formação do indivíduo e das sociedades. 4 4 O Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra tem desenvolvido pesquisas nesse campo, com alguns projetos coordenados pela profa. dra. Margarida Calafate Ribeiro.

Não se trata de fenômeno inédito, nem muito diferente do que ocorre em outros contextos selados por conflitos e transformações. Na Argentina, como tão bem analisa Beatriz Sarlo, explosões dessa natureza dominaram a atmosfera vivida no período que se segue à derrocada da última ditadura. No Brasil dos anos 1980, nos muitos relatos dos antigos guerrilheiros plasmava-se o desejo de corrigir versões e/ou preencher silêncios que a ditadura iniciada em 1964 havia imposto. Com acertos e equívocos, tais textos investiam na sensação de um novo tempo, anunciado pela emergência de outras vozes empenhadas no combate à versão oficial da história construída sob o signo do autoritarismo.

Com menos visibilidade em seu começo, mas conquistando grande espaço na última década, a memória e seus movimentos vêm ampliando o seu espaço no universo editorial em Moçambique, o que permite estabelecer um jogo de espelhos sempre rico quando confrontamos a antiga metrópole e a ex-colônia. Embora seja possível localizar similaridades entre o que ocorre nos dois países, há diferenças relevantes nos processos. Se no caso de Portugal a autoria dos livros contempla uma enorme variação de sujeitos que vão de militares diretamente envolvidos na guerra a tantos homens e mulheres que, de variados modos, participaram em diferentes momentos do processo colonial, em Moçambique, a escrita da memória surge circunscrita a um grupo mais fechado, com seus protagonistas ligados mais diretamente à grande mudança histórica que se deu dos anos 1950 até a década de 1980. Estamos diante da fala de "antigos combatentes", denominação que, englobando ex-guerrilheiros e ex-presos políticos, é utilizada para designar os que participaram do processo de independência e são, por isso, merecedores de um estatuto especial.

A leitura atenta desses textos que vêm em forma de autobiografias, biografias autorizadas (muitas vezes com evidente participação do biografado) e outras modalidades de relatos, se não nos conduz a um terreno firme em relação à história (como é o desejo anunciado de alguns autores), permite pensar o significado que ganha esse investimento na retomada de um passado que remonta sempre ao processo de mudança(s) por que Moçambique passou na segunda metade do século XX. A preparação da luta anticolonial, a própria guerra de libertação, a fundação do Estado nacional e os primeiros anos de governo independente constituem o foco dessas obras, cuja análise pode revelar em que medida há uma tradução local de um fato que é comum em certas situações, mas deixa também ver o que há de peculiar nessa produção, tendo em conta as respostas desses textos a uma determinada conjuntura.

Considerando, pois, o panorama editorial moçambicano, salta à vista a dimensão que as biografias, as autobiografias e as coletâneas de depoimentos vêm alcançando. Entre 2001 e 2013, entre outros, temos os seguintes títulos: Vidas, lugares e tempos, de Joaquim Chissano; Memórias de um combatente da luta de libertação. O passado que levou o verso da minha vida, de Aurélio Langa; Por que Sakrani? Memórias de um médico de uma guerrilha esquecida, de Hélder Martins; Memórias da luta clandestina, de Matias Mboa; De todos se faz um país, de Óscar Monteiro; Memórias de um voo rasante, de Jacinto Veloso; Participei, por isso testemunho, de Sérgio Vieira; Lutei pela pátria. Memórias de um combatente da luta de libertação nacional, de João Facitela Pelembe; Mandionerepi: donde é que me viram?, de Jorge Dick; Embaixador nos USA, de Valeriano Ferrão; Da Udenamo à Frelimo e à diplomacia moçambicana, de Lopes Tembe Ndelana; A vida do casal Pachinuapa, de Raimundo Pachinuapa e Marina Pachinuapa; Zedequias Maganhela - uma biografia contextualizada, de Teresa Cruz e Silva; I Congresso da Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO) -Memórias, de Raimundo Pachinuapa; Protagonistas da luta de libertação, de Ana Mussanhane.

Seu alcance deve ser pensado para além dos dados relativos à publicação, ou seja, é preciso considerar também a repercussão das edições no que podemos chamar de agenda política e cultural do país com evidentes ecos na vida literária. A solenidade dos lançamentos, o envolvimento de diferentes atores sociais e a ampla cobertura dada pela imprensa em geral são indicadores do destaque que essa escrita conquista, como se dela viessem grandes revelações no plano do conteúdo ou grandes novidades no plano da forma.

Se nos demoramos nos números, poderemos acreditar que a quantidade implica a pluralidade e que estamos próximos da possibilidade de travarmos contato com outros lados de uma história que, tocada por tanta instabilidade, foi orientada pelo senso da unidade e da coesão. Essa aposta na coesão atinge seu ponto extremo na interdição dos arquivos oficiais do partido e do Estado, impedindo a pesquisadores moçambicanos e estrangeiros o acesso à documentação referente à luta armada de libertação. Em nome da defesa da "linha justa", mantém-se o território do sigilo e nessa equação que combina o bloqueio das fontes com a glorificação dos combatentes temos a elevação da luta armada: de fato histórico ela passa ao terreno da mitologia. Desse modo, a libertação figura como conquista apenas da guerrilha, verificando-se o apagamento da participação de outros atores na construção da independência. A hierarquia entre guerrilheiros e presos políticos que ainda se nota no discurso político diz bem do peso dessa mitificação.

Na análise desse período observamos que, por razões ainda a merecer análise, em Moçambique, ao contrário do que ocorre com outros países, a luta de libertação permaneceu fora até mesmo do universo ficcional. Em texto recentemente publicado, Luís Bernardo Honwana recorda um debate em que Ungulani Ba Ka Khosa manifestou "a sua estranheza pela aparente relutância dos escritores moçambicanos em 'pegar' literariamente no tema luta de libertação nacional". 5 5 HONWANA, Luís Bernardo. A velha casa de madeira e zinco. Maputo: Alcance, 2017, p.124 Concordando com o autor de Ualalapi sobre a hipótese em alguma instância do desencorajamento à abordagem literária do tema, Honwana pondera que o procedimento "significou a tentativa de preservar o território/patrimônio onde ancora em termos históricos a construção da nação moçambicana quanto à responsabilidade que a Frelimo entendia ser exclusivamente sua, na condução desse processo". 6 6 Ibidem, 2017, p. 125. A gestão dos mitos e a composição das imagens que deviam formar a nação estavam nas mãos de quem detinha o maior capital simbólico. A euforia da independência, as ameaças da guerra e a instabilidade regional concorriam, assim, para a formação de um quadro em que qualquer discordância podia ser encarada como o anúncio de uma traição. Para João Paulo Borges Coelho:

A memória da luta de libertação e da experiência revolucionária das zonas libertadas desempenhou assim um papel central na política e na vida após a independência, não só como um passado que reverberava no presente, mas também como um farol e referência na caminhada para o futuro. (...) luta armada cumpriu esse papel não só ao ser o ato que permitiu aos moçambicanos surgir com uma identidade nacional, mas também na medida em que forneceu a base da legitimidade das políticas governamentais após a independência, e uma espécie de carte blanche para as decisões políticas e de desenvolvimento, no sentido em que essas decisões, tomadas pelos mesmos protagonistas que haviam vencido a luta, eram apresentadas como uma espécie de continuação das práticas adotadas nas antigas zonas libertadas. 7 7 BORGES COELHO, João Paulo. Abrir a fábula. Questões de política do passado em Moçambique. Revista Crítica de Ciências Sociais, n. 106, Coimbra: CES, 2015, p. 2.

É verdade ainda que tais condicionalismos políticos encontravam algum lastro em dimensões culturais com nítidos reflexos na condução do poder nos primeiros tempos da jovem república. A estrutura hierárquica da sociedade tradicional, temperada pelo caráter excludente da sociedade colonial, combinava-se à composição militarizada da Frelimo, resultando num sistema indiscutivelmente centralizado, cuja origem foi quase sempre atribuída pelos críticos do governo e/ou do sistema essencialmente à opção socialista, à influência do Leste, ao regime de partido único. Segundo José Luís Cabaço, "o poder que se institui, se bem que portador de uma natureza popular, teorizou o autoritarismo de Estado e a repressão de interesses e ideologias divergentes ou dissidentes assim como das suas formas de expressão social". 8 8 CABAÇO, José Luís. A longa estrada da democracia moçambicana. In: MAZULA, Brazão. Moçambique. Eleições, democracia e desenvolvimento. Maputo: Ed. do Autor, 1995, p. 84. Derivado de fatores vários, o centralismo em vigor está na origem de um comportamento zeloso, refratário a interpretações mais abertas dos caminhos que levaram à libertação e à formação do estado nacional.

Muito embora a implantação do pluripartidarismo, consagrada nos acordos de Roma em 1992, tenha alimentado as expectativas de separação entre o Estado moçambicano e o Partido Frelimo, na prática alguns resquícios do sistema monopartidário continuam tonalizando a atmosfera institucional. Entre as consequências temos a referida interdição aos documentos relativos à luta de libertação, ou seja, uma forma de privatização pelo poder político que promove uma espécie de encapsulamento da história. A dose de secretismo que pairava sobre a sociedade explica a inquietação gerada pela eclosão das memórias que poderiam ser uma via de conhecimento de fatos e processos até então recolhidos aos subterrâneos. Esperava-se que, tal como sucedeu na América Latina, a multiplicação dos relatos trouxesse à ribalta outras encenações do vivido, revelando outros atores e mesmo outras faces dos mesmos atores e dos enredos que vivenciaram. Vindas à luz já no século XXI, praticamente dez anos depois do fim do sistema de partido único, as autobiografias em sua dimensão testemunhal com certeza propiciariam o acesso a outros acontecimentos e favoreceriam hipóteses de um novo quadro, tendo em conta que o território da escrita poderia abrir debates há tanto tempo adiados. Na realidade, entretanto, as autobiografias pouco trazem de novo, esmerando-se na confirmação de imagens de um passado em permanente celebração pelo discurso político que sagrou a "grande narrativa" como se, para sua relativização, não sobrassem argumentos no presente geral do país. E no presente de alguns dos autores, pode-se acrescentar.

Diante de certa dose de desilusão que a ausência de grandes revelações gerou, o leitor pergunta-se o que fazer com tais textos, que sentidos essa reiteração pode carregar. Ao estudioso, resta-lhe perseguir questões como: em que medida a memória concorre para retocar os caminhos que a história delineou? Como interpretar o registro de fatos e versões que migram da história contada para a memória que agora se começa a escrever? Como compreender o significado das reiterações e dos silêncios que falam tanto nesses relatos?

Em uma rápida divisão do material, identificamos três tipos de obras. Temos as coletâneas de depoimentos, as biografias e as autobiografias. Cabe observar que no caso das biografias há aquelas resultantes de um efetivo trabalho de pesquisa, do qual temos um excelente exemplo em Zedequias Maganhela - uma biografia contextualizada, da autoria de Teresa Cruz e Silva 9 9 CRUZ E SILVA, Teresa. Zedequias Manganhela: uma biografia contextualizada (1912-1972). Maputo: Marimbique, 2014. e aquelas que, situadas mais próximas do campo da laudação, apoiam-se na informação do biografado ou de gente próxima. Há ainda algumas com algum trabalho com fontes, como é o caso das publicadas pelo Arpac (Instituto de Investigação Sociocultural), que fazem parte de um programa específico por orientação da Presidência da República e, segundo o diretor do órgão, com avaliação direta do presidente. 10 10 A informação foi dada em uma consulta ao Arpac pelo diretor da instituição em fevereiro de 2014. A produção e a publicação desses opúsculos obedecem a um calendário definido que leva em consideração a data da morte dos chamados heróis da luta de libertação. Faz parte do programa a distribuição desse material pelas escolas e o tom é o padronizado por iniciativas dessa natureza.

Interessam-nos aqui nesse momento as autobiografias, cuja relevância é perceptível nesse panorama. Além do número expressivo de obras nessa modalidade, o cariz testemunhal que particulariza tais textos levanta aspectos instigantes acerca da relação entre discurso e experiência. Dessa maneira, a reflexão sobre a escrita do eu possibilita compreender também o processo de constituição do sujeito que responde pela sua própria dicção narrativa, como observa Paul Ricoeur, ao afirmar que

Em nenhum registro de experiência viva, quer se trate do campo cognitivo, prático ou afetivo, a aderência do ato de designação do sujeito à intenção objetal de sua experiência é tão total. Ao se lembrar de algo, alguém se lembra de si. 11 11 RICOEUR, Paul. A memória, a história, o esquecimento. Campinas: Editora Unicamp, 2007.

As palavras de Ricoeur iluminam pontos dessa produção e ajudam a pensar também acerca da repercussão das publicações do gênero em Moçambique. Entre 2001 e 2017, temos quase duas dezenas de textos na linha da autobiografia, um número significativo para o quadro do país. A respeito desse conjunto, antes de mais nada, assinale-se o ritmo que o movimento editorial ganhou através dos anos. Entre o primeiro, publicado em 2001 por Hélder Martins (o primeiro ministro da Saúde), e o segundo, assinado por Jacinto Veloso (o primeiro ministro da Segurança) em 2006VELOSO, Jacinto. Memórias em voo rasante. Maputo: António José Correia Paulo, 2006., passaram-se cinco anos. Entre 2007, quando é publicado o terceiro, e 2013 encontramos nove títulos. Nota-se, pois, uma tendência, que é reforçada pela edição acelerada dos outros gêneros a que nos referimos, mas que não serão contemplados neste artigo.

Impossível não perceber nesse movimento a ausência da voz feminina, que aparece apenas como parte integrante de um casal em A vida do casal Pachinuapa. Quando se trata de coletânea de depoimentos, como é o caso do volume Protagonistas da luta de libertação, organizado por Ana Mussanhane, entre os 43 depoentes há nove mulheres. O único volume em que a voz das mulheres emerge com exclusividade é Moçambique marcou-nos para sempre, que traz 15 interessantes depoimentos de um grupo de mulheres estrangeiras que se definem como internacionalistas, organizado por Elisa Fuchs, uma integrante do mesmo grupo. Ou seja, a voz feminina mais expressiva na recordação e avaliação de um tempo é estrangeira. No prefácio, assinado por Gita Honwana Welch, uma jurista moçambicana, podemos ler:

O livro relata "pedaços" da vida pessoal e profissional de um grupo de mulheres internacionalistas vivendo e trabalhando em Moçambique entre o fim dos anos 70 e a década de 80. É um relato que ilustra como a experiência de Moçambique contribuiu para o desenvolvimento individual de membros do grupo, para o ajuste de percepções e até mesmo mudança de perspectivas em relação a questões de gênero e de desenvolvimento social. 12 12 WELCH, Gita Honwana. Prefácio. In: FUCHS, Elisa. Moçambique marcou-nos para a vida. Maputo: JV Editores, 2016.

Destacando a força do "viver moçambicano" como o grande legado na vida dessas mulheres, Welch, ressalta a energia das trocas que aquele período propiciou. Ficamos, entretanto, com a sensação de que essa forte convivência não derrubou os limites que ainda percebemos na relação entre escrita e gênero em Moçambique, fato que repercute ainda na produção literária. 13 13 O número de obras, sobretudo no campo da narrativa, produzidas por mulheres ainda é reduzido. O fenômeno ganha interesse se nos lembramos que a presença rarefeita das mulheres no universo da escrita contrasta com a atuação feminina na vida pública, no desempenho de funções de relevo em empresas e instituições de natureza variada.

Para além da reduzida presença da mulher, outro dado desperta interesse: trata-se da "estirpe" dos autores, em sua enorme maioria ocupantes destacados dos gabinetes do governo e/ou do Partido Frelimo, o que, durante algum tempo, tinha quase o mesmo significado. Com raras exceções, como é o caso de Aurélio Langa, os autores estiveram em postos importantes: foram ministros, governadores, embaixadores, em alguns casos acumulando cargos no governo com lugares no Comitê Central ou no Bureau Político da Frelimo, tendo, alguns, prestado serviço diretamente à presidência e/ou à segurança. Em outras palavras: as obras são assinadas por estrelas de primeira grandeza da história do país. Embora alguns desses nomes estejam hoje apartados do centro do poder, a maioria conserva-se fiel ao partido e/ou ao grupo que o administra.

Se, após algumas décadas, os protagonistas que estiveram envolvidos em missões de relevo vêm contar o que viveram, é a voz da elite que estamos a ouvir. De certa maneira - imaginamos -, os donos da voz trazem a voz do dono e, assim, tais relatos autobiográficos facultariam o acesso a um conjunto de verdades guardadas por essas falas autorizadas. Assim, somos levados a acreditar que diante de nossos olhos, mesmo que a partir de simples lembranças, desfilariam as verdades de que autores/atores tão especiais são portadores. O resultado, todavia, é outro. Nenhuma grande revelação surpreende o leitor, fato que ganha maior importância quando sabemos que alguns desses autores estiveram em postos relevantes no setor da segurança, terreno fundamental na organização do Estado. Ao longo dos textos, às vezes sequer há referência a esse dado; aliás, a preferência é por interromper o relato no fim da luta de libertação, deixando expressa ou subentendida a fidelidade a um projeto cuja realização não discutem com profundidade. Os erros, os desvios, as limitações desse projeto são, portanto, ignorados nesses textos que poderiam trazer alguma clareza a momentos nebulosos do itinerário que o país cursou.

É interessante ainda a forte predominância de obras assinadas por guerrilheiros ou militantes que estiveram diretamente ligados à guerrilha, ficando mais uma vez patente o lugar de menor relevo ocupado por aqueles que tiveram outra forma de participação na luta pela independência, incluindo os militantes que foram presos e não puderam participar da luta armada. Ainda por estudar, certamente pelas tensões que envolve, a divisão entre guerrilheiros e presos políticos permanece viva no imaginário das elites moçambicanas, em especial nos setores ligados à gestão do poder político. Se uma famosa reunião iniciada em março de 1978, sob a direção do próprio presidente Samora Machel, avançou no processo de integração dos ex-presos políticos no partido e no aparelho de estado, até o presente não se conseguiu diluir a carga de ressentimentos que de algum modo sobrevive na configuração dos dois grupos. Apenas Memórias da luta clandestina, de Matias Mboa, e Memórias de um combatente da causa, de Aurélio Langa, assinados por ex-PPs, 14 14 Expressão comumente utilizada para designar os presos políticos do tempo colonial. configuram-se dessa maneira exceções nesse panorama e demandam uma análise mais demorada que será objeto de outro trabalho.

Obviamente, perante esse manancial de lembranças e a dimensão desse tempo que é percorrido, algumas indagações se colocam. Uma delas diz respeito à motivação da "tarefa". Em se tratando de homens reconhecidos como protagonistas de uma fase fundamental na história do país, compreende-se que alimentem a convicção de que têm algo a dizer, como assegura o major-general João Facitela Pelembe, autor de Lutei pela pátria, de 2012PELEMBE, João Facitela. Lutei pela pátria. Memórias de um combatente da luta de libertação nacional. Maputo: Edição do Autor , 2012., que, na "nota do autor", esclarece:

Decidi escrever as minhas memórias da luta armada contra o regime colonial português com o objetivo de informar o povo moçambicano sobre esta importante epopeia que nos conduziu à conquista da independência de Moçambique.

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Torna-se, portanto, importante escrever as memórias da luta armada em tempo oportuno para se evitar deturpações de vária ordem em tempo tardio. As memórias devem ser escritas com toda a transparência, isenção e o máximo de objetividade. 15 15 PELEMBE, João Facitela. Lutei pela pátria. Memórias de um combatente da luta de libertação nacional. Maputo: Edição do Autor, 2012.

No desejo de informar, desse modo inscreve-se a prevenção no cuidado de evitar o que para o autor seriam "deturpações". A defesa da "transparência, isenção e o máximo de objetividade" sendo honesta, sabemos, esbarra na natureza da linguagem que, carregada de ambiguidade, por natureza e definição, não pode corresponder a esse desejo, sobretudo quando se trata de narração em primeira pessoa. Acresce-se ainda o fato de que estamos diante de um fenômeno coletivo, que vem ganhando corpo e que, mesmo não sendo programático, exprime um processo que nos faz perguntar: o que levaria esses homens ainda bastante ocupados a escrever o que viveram ou pensam ter vivido? Neles não podemos colar o selo do narrador tradicional, segundo Walter Benjamin, que vê no ócio uma característica básica do ato de narrar. O distanciamento que confere alguma sabedoria épica não faz parte da experiência de tais autores que estão no corre-corre da vida, participando de alguma maneira das operações que movem o país. Ou que, de certo modo, o paralisam, diriam os mais críticos da gestão do país. Mesmo atuando na chamada iniciativa privada, muitos cultivam sua proximidade com o círculo do poder, condição que os depoimentos nem sequer aludem.

Do centro ou da beirada do poder, mas sempre inseridos na rede, eles constroem uma fala que, segundo afirmam muitos deles, nasce da solicitação de outros. Em seu discurso, empenham-se em fazer passar sinais de uma hesitação entre o dever de prestar o testemunho e o cultivo da humildade, insinuado uma hipotética dificuldade de assumir a grandeza de seus feitos. A verossimilhança do sentimento espelha-se na constante necessidade de explicar (ou justificar?) o livro como resultado de pedidos e/ou apelos. Em Memória em voo rasante, de Jacinto Veloso, temos:

Já há algum tempo, vários camaradas, familiares, jovens e amigos, tanto nacionais como estrangeiros, têm vindo a sugerir que eu escreva, contando um pouco da minha experiência de vida nos últimos quarenta ou cinquenta anos, em particular a minha vivência na Frelimo. 16 16 VELOSO, J. Memória em voo rasante. Maputo: JV Editores, 2006, p. 11.

No texto de abertura de Vidas, lugares e tempos, intitulado "Dedicatória e agradecimentos", Joaquim Chissano faz questão de declarar:

Não falo neste volume de minha esposa e dos meus filhos, porque ele não cobre o período de formação e da vida desta parte de minha família. Mas quero que os leitores saibam quanta gratidão devo à minha adorada esposa. (...) Também aos meus filhos, que embora no princípio parecessem alheios ao trabalho que eu estava a fazer, foram ganhando interesse e desejo de me ver levar a sério a escrita deste livro, para que eles pudessem beneficiar dele, já que eu não tinha tempo para lhes contar de viva voz o que aqui escrevi e o que ainda estou a escrever. 17 17 CHISSANO, Joaquim. Vidas, lugares e tempos. Maputo: Texto Editores, 2010, p. 3-4.

Em De todos se faz um país, de Óscar Monteiro, o procedimento se refina: é Guiyani, o filho do autor, que assume a palavra no prefácio para esclarecer:

Tudo começou quando os amigos, por vezes de longe, vinham à nossa casa e nós ouvíamos estória após estória. Ou, quando lhe pedíamos detalhes sobre uma frase pronunciada numa entrevista ou ainda, quando lhe fazíamos perguntas no momento em que preparava uma palestra. Vimos que cada experiência, cada momento e cada pessoa tinham, à sua maneira, moldado o nosso pai.

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Porque essa vivência não devia ficar conosco, movemos uma campanha familiar para que o Pai a escrevesse. 18 18 MONTEIRO, Óscar. De todos se faz um país. Maputo: Associação dos Escritores Moçambicanos, 2012.

Ao noticiarem essa espécie de convocação, os narradores dão indicações de alguns aspectos que lhes marcam a escrita. Atendendo a pedidos, eles estão colmatando lacunas que a escrita da história não cobre, ou seja, mais uma vez eles vêm desempenhar uma tarefa de valor. Quem libertou a pátria conta agora a história dessa libertação e dessa pátria, acentuando a sua condição de protagonistas de uma "aventura única", capaz de fazê-los tributários de uma ética rara. Ao direito à memória que todo cidadão deve ter fica mesclado o dever da memória a que, nesse quadro, os próprios eleitos se atribuem, incentivados pelos que lhe são próximos. Diversamente, entretanto, do que ocorreu em vários momentos da história, em que se ergue a voz silenciada antes por algum tipo de violência, falam aqui os que conquistaram essa possibilidade em 1975 e desde então ocuparam o centro. Não se coloca, portanto, a necessidade de se contrapor à versão oficial, uma vez que se trata de um grupo que integrou o coro do discurso hegemônico e no momento que escreve não coloca em dúvida a legitimidade do seu lugar. Noutras palavras, esse dever não se compõe como aquela tarefa ética que, na acepção de Jeanne Marie Gagnebin "consistiria em preservar a memória, em salvar o desaparecido, o passado, em resgatar, como se diz, tradições, vidas, falas e imagens". 19 19 GAGNEBIN, Jeanne Marie. Lembrar, escrever, esquecer. São Paulo: Editora 34, 2006, p. 97.

Na indicação dos destinatários de sua escrita, fica insinuado o perfil dos leitores: os interessados, ou seja, os próximos, os que de alguma forma pertencem ou sonham pertencer à linhagem, ou, pelo menos, a reconhecem. A dimensão do privado se manifesta dando os contornos de um gesto que, em outros espaços, almejava o público. A mistura dessas esferas, presente em tantos níveis da vida social e política do país, é aqui reiterada, ao mesmo tempo que não se contempla a perspectiva do Outro, daqueles que não partilharam o projeto. Em síntese, o projeto da Frelimo deve continuar a ser confundido com a hipótese de país que Moçambique precisa ser, ainda que às matrizes essenciais desse projeto o próprio partido credenciado por elas tenha renunciado.

Aproxima esses textos a confessada falta de rigor na abordagem de fatos históricos. Alegando, por razões variadas, dificuldade na consulta a documentos ou inibição na identificação de fontes, os autores de modo geral se dispensam de comprovar o que narram a respeito de si próprios ou de outros. Sem cerimônia, apoiam-se no percurso desataviado da rememoração, assumindo as imprecisões como resultado das condições em que escrevem e/ou como estilo. Constituem exceções os casos de Por que Sakrani?: memórias de um médico de uma guerrilha esquecida, e Memórias de um combatente da causa: o passado que levou o verso da minha vida. Seus autores, Hélder Matins e Aurélio Langa, revelam ter feito alguma pesquisa e entrevistas com companheiros, procurando corrigir os naturais desvios da memória. Todo o esforço de Aurélio Langa é descrito e valorizado pela editora em nota que abre o volume, texto importante porque desvela o processo de composição da obra, registrando a dimensão coletiva desse trabalho, uma vez que aí se evidencia a participação da equipe:

Até à fase final da edição do livro, Aurélio Langa aparecia, junto da equipa de redação com novas narrativas, novos episódios dizendo: "Mas eu ainda não relatei este fato". E logo acrescentávamos as suas notas que integravam mais um importante acontecimento.

Todo esse processo fez com que a edição do livro demorasse mais do que o tempo previsto. Um outro fator contribuiu também para o alongar dos prazos. O autor, não se detendo na sua experiência, incluiu na obra um significativo conjunto de entrevistas, realizadas a mais de 100 companheiros da luta de libertação nacional. Este trabalho foi efetuado em condições difíceis, sem gravador, sem uma boa organização e conservação dos dados recolhidos no terreno, sem qualquer apoio técnico adequado. 20 20 VELOSO, Maria Teresa. Nota da editora. In: LANGA, Aurélio Valente. Memórias de um combatente da luta de libertação. O passado que levou o verso da minha vida. Maputo: JV Editores, 2011, p. 11.

As informações prestadas pela editora se, por um lado, atestam o método utilizado pelo autor, por outro lado, indicam que houve um trabalho de edição, o que justificaria uma reflexão mais detida sobre o lugar desse tipo de texto no campo editorial moçambicano.

Como se pode notar, uma certa diversidade caracteriza esse movimento de registros da memória. Em todos eles, contudo, temos que atentar para o tipo de contrato que o texto autobiográfico propõe: uma forma de pacto que está centrado na recepção e, assim, marca a distinção entre a autobiografia e a autoficção. A ênfase que ganha o leitor como ponto a ser atingido e, evidentemente, convencido do que está escrito pode ser percebida na aparente espontaneidade que as narrativas ostentam, para além das notas que os textos introdutórios registram, tal como referimos. A noção de verdade se expressa, como se estivéssemos diante do passado e não de uma transfiguração de um outro tempo, o que implica deslocamentos, apagamentos, recobrimentos, reconstrução. Philippe Gasparini, em um instigante artigo sobre a autoficção, chama a nossa atenção para a utilização de artifícios na produção da espontaneidade e para alguns aspectos que cercam o problema da sinceridade que, na linguagem de Lejeune, não deixam de fazer da autobiografia uma "ficção produzida em condições particulares". 21 21 LEJEUNE, P. L'autobiographie en France. Paris: Armand Colin, 1971, p. 20-21. Gasparini recorda o caso de Jean Paul Sartre:

Sartre desenvolve essa argumentação em O ser e o nada para fazer da alegação de sinceridade uma forma de duplicidade. De fato, se "a existência é distância de si", defasagem, afirmar a coincidência consigo mesmo tem a ver, na melhor das hipóteses, com a ilusão e, na pior, com a má-fé. Essa crítica da sinceridade, enquanto projeto, não o impedirá de escrever um texto autobiográfico, Les mots [As palavras]. Mas Sartre deixará bem claro que se trata de uma espécie de romance (...) um romance no qual eu creio, mas que continua sendo, apesar de tudo, um romance. 22 22 GASPARINI, P. Autoficção é o nome de que? In: NORONHA, Jovita (org.). Ensaios sobre a autoficção. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2014, p. 187-8.

As linhas tangenciais que encontramos entre o texto autobiográfico e a ficção tornam, como vemos, muito improvável a total dissociação entre as duas práticas narrativas. E se assim compreendemos, não cabe colocar em discussão o primado da memória individual para a autobiografia que, como gênero, é pautada pela subjetividade, o que justificaria que, na composição dessas obras, surgisse a tendência para preencher determinadas lacunas em nome da coerência e do convencimento. Entretanto, para esse elenco de obras, algumas outras questões se põem. Uma delas liga-se ao vínculo que os autores defendem entre o que contam e a história, como alude João Pelembe no excerto já transcrito. Em Participei, por isso testemunho, de Sérgio Vieira, a nota sobre os apelos recebidos abre o livro: "Muitos me disseram para escrever. Memórias. (...) O que devo dizer sobre a minha vida? A quem interessa?". Na sequência das perguntas, o autor formula: "Há um campo, porém, que ainda está por explorar: a história recente deste país, dos seus combates para transformar a configuração da sociedade moçambicana e da África Austral". 23 23 VIEIRA, Sérgio. Participei, por isso testemunho. Maputo: Ndjira, 2010, p. 35. A conexão entre a sua decisão e as lacunas por preencher é sugerida e será reforçada em vários momentos da narrativa, insistência que se torna mais complexa diante da tonalidade peremptória do relato. Há uma espécie de modulação totalizadora que traduz uma aspiração monológica, contra a qual somos alertados por Beatriz Sarlo, para quem:

É certo que a memória pode ser um impulso moral da história e também uma de suas fontes, mas esses dois traços não suportam a exigência de uma verdade mais indiscutível que aquelas que é possível construir com - a partir de - outros discursos. (...) Não há equivalência entre o direito de lembrar e a afirmação de uma verdade da lembrança; tampouco o dever da memória obriga a aceitar essa equivalência. 24 24 SARLO, Beatriz. Tempo presente. Cultura da memória e guinada subjetiva. São Paulo: Companhia das Letras/ Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2007.

Em um período historicamente tão marcado, com contornos frágeis e situado num território de disputas de tantas ordens, certas incongruências ganham maior importância justamente porque o sujeito que escreve carrega consigo um grupo e a capa de um projeto que ele designa nacional. É essencial assinalar ainda que eles escrevem em um contexto cultural em que a palavra assume o estatuto de verdade em função da autoridade de quem a pronuncia. E, é óbvio, o protagonismo que via de regra esteve em sua trajetória e/ou que as suas lembranças instituem acaba por revestir a sua voz de uma certa aura que é cultivada pelos próprios. A subjetividade, nesse jogo, ganha foros de objetividade e modifica o passado para interferir no presente com o desejo, possivelmente, de condicionar o futuro.

Na visita ao passado multiplicam-se os acertos, os bons sentimentos, a certeza de que contribuíram com desprendimento para a independência. Assumem-se como personagens centrais encarando como um dever patriótico a passagem de seu testemunho. Ao reiterarem, por exemplo, a essencialidade da luta armada como base quase única da nacionalidade moçambicana e a legitimidade exclusiva da Frelimo para gerir o país, os autores investem na consolidação de uma mitologia que não resiste ao confronto com o presente, com a realidade institucional em vigor. Isto é, são perfeitamente ignoradas as mudanças que se processaram nas últimas décadas, como se elas não tivessem acontecido e não pudessem conferir outros sentidos ao que se passou e ao que se conta. As narrativas dessas memórias frequentemente se encerram à volta da declaração da independência, dispensando-se de fazer qualquer balanço sobre os rumos trilhados, isto é, sobre a história presente, na qual grande parte dos autores permanece intervindo.

Num olhar retrospectivo, sem descermos a causas e condições que as determinaram, podemos localizar três grandes mudanças que interferiram diretamente na realidade cotidiana dos moçambicanos nessas cinco décadas. A primeira se dá em 1975 com a proclamação da independência e as transformações que ela acarretou. A segunda localizamos em fins dos anos 1980 com a renúncia ao projeto de inspiração socialista e o processo das desnacionalizações, o que afetou o funcionamento da sociedade e recompôs nitidamente a hierarquia de classes que fora posta em questão. A terceira temos na assinatura do acordo de paz entre a Frelimo e a Renamo e a instituição do multipartidarismo.

No confronto entre as mudanças, situam-se diferenças de grande significado. Nos anos 1970, a passagem da colônia para o estado independente foi caracterizada não só por uma substituição, mas pela mudança radical do grupo dirigente. Saem os comprometidos com o sistema anterior e entram em cena os excluídos, os marginais e/ou aqueles que, rompendo com o lugar que tinham na sociedade colonial, marginalizaram-se por adesão a um outro projeto. Mesmo em termos visuais temos uma impactante alteração dada pela questão racial. A nova elite, com ligeira participação de mestiços e nacionais de ascendência asiática e europeia, era predominantemente negra e composta em grande parte por integrantes de uma primeira geração urbanizada. À proposta de transformação correspondia uma nova cara da classe responsável agora pela gestão do país.

No fim dos anos 1980 processa-se uma outra transformação sem que se alterem os agentes. Essa falta de correspondência entre as propostas que decorrem da guinada neoliberal e a ascensão de novos condutores sugere senão um grau de anormalidade pelo menos uma dose de estranheza ao processo que acompanha o movimento de mudanças. A gestão do novo modelo, constituída sobre alterações de base, será assumida não só pelo mesmo grupo - o que permanece como dirigente -, mas majoritariamente pelos mesmos indivíduos. Em suas mãos, o partido que se constituiu para transformar o destino coletivo será a partir de então conduzido por outros rumos. Tendo alcançado o lugar central na administração pela participação na luta pela independência e pela adesão ao projeto de Estado nacional derivado da vitória sobre o colonialismo, o velho grupo renova-se na demissão dos valores com que se firmou no panteão dos heróis e mantém o controle do aparelho estatal. Nesse novo período, tal controle será também com frequência uma alavanca para a produção da riqueza pessoal.

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, poderíamos repetir com Camões, o grande poeta do Renascimento, uma época de transformações exponenciais. Em Moçambique, a partir dos anos 1990, as grandes mudanças geraram naturalmente outras vontades; surpreende, todavia, o apego a uma espécie de lógica discursiva que parece imune a esses movimentos. No caso dos nossos ex-combatentes, é como se o foco na vida prática e a opção por procedimentos consentâneos com a cartilha neoliberal não implicassem o afastamento do código defendido para a legitimação do lugar ocupado e a defesa de princípios contra os quais houve uma guerra. Ao contrário, reitera-se nessas narrativas o lugar da Frelimo no comando das mudanças. E, dessa forma, como se fosse possível ignorar a profundidade das transformações, o aceno à unidade permanece, com a guerrilha no coração da grande épica. Na rede discursiva que as autobiografias montam, o lastro continua assentado no passado. Desse material e do movimento em que, ao fim e ao cabo, ele se insere, Amélia Neves Souto 25 25 Agradeço muito à autora que, em 2015, me cedeu o texto em língua portuguesa antes que ele fosse publicado. E agradeço especialmente pela generosa interlocução que foi fundamental para a compreensão de muitos pontos à volta desse trabalho. A versão em inglês desse texto foi editada mais tarde e consta da bibliografia. oferece uma acutilante síntese:

Estas, na prática, nada de novo trazem em relação aos relatos orais do passado da luta de libertação e mantêm sua lealdade em relação à "história oficial". São pessoas que não problematizam, não questionam, não analisam, não interrogam. Têm certezas absolutas. Porque estiveram lá. É interessante verificar que nenhum deles procura ligar essa sua história ao presente, e como eles se veem e veem o seu partido neste presente porque, de fato, é apenas a memória do passado que os une, os identifica e que os distingue dos outros. 26 26 SOUTO, Amélia Neves. História, memória e identidade na história da Frelimo/Moçambique. In: CONFERÊNCIA INTERNACIONAL - OS INTELECTUAIS AFRICANOS FACE AOS DESAFIOS DO SÉCULO XXI. Em memória de Ruth First (1925-1982). Anais. Maputo, 28-29 de novembro de 2012.

A necessidade de distinção talvez seja uma das respostas para a pergunta sobre motivação do gesto que conduziu esse texto. Em certa medida, os autores se mostram desejosos de renovar a carte blanche a que se referiu João Paulo Borges Coelho citado anteriormente. O desejo de remarcar o lugar nesse presente, que coloca em pauta o sentimento da caducidade das coisas, aciona mecanismos de lembrança e alimenta na escrita do eu estratégias de conservação, como se desvelam nesse boom memorialístico que, não sendo programático, adquire contornos de operação coletiva. O movimento conduz ao registro do passado que os autores viveram ou julgam ter vivido, fenômeno comum nos processos de grande investimento na memória que constitui uma das matrizes da contemporaneidade. Sem dúvida, não constitui novidade alguma que o ato de relembrar traz em si o engodo que, mais que um risco, incide na natureza do gênero autobiográfico que, na acepção de Doubrovsky, uma referência na reflexão a respeito da autoficção, é um gênero que se define como uma das modalidades da escrita do eu:

Nenhuma memória é completa ou fiável. As lembranças são histórias que contamos a nós mesmos, nas quais se misturam, sabemos bem disso hoje, falsas lembranças, lembranças encobridoras, lembranças remanejadas segundo as necessidades da causa. 27 27 DOUBROVSKY, Serge. O último eu. In: NORONHA, Jovita (org.). Ensaios sobre a autoficção. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2014, p. 123.

Das palavras de Doubrovsky, ressoa o eco das "lembranças remanejadas segundo as necessidades da causa", levando-nos a pensar em tantas causas que mobilizaram tantos relatos. Em sua maioria, a restauração do vivido está associada a experiências traumáticas, a sentimentos de mutilação impostos por formas variadas de violência de que são exemplos vigorosos os textos produzidos após a opressão ditatorial e as guerras com suas modalidades de campos de extermínio. A novidade aqui está na diferença que essa produção estabelece com tais contextos: no quadro da escrita dos antigos combatentes vislumbra-se o que na operação de reconstrução dos acontecimentos o historiador Henry Rousso designa "vetor oficial". 28 28 ROUSSO, Henry. Le syndrome de Vichy. De 1944 à nos jours. Paris: Seuil, 1990. Cercada pela atmosfera de celebração, a escrita identifica-se com os monumentos que tentam materializar a sagração de fatos e homens. Isso explica que não haja espaço para as tintas da melancolia tão marcantes nas narrativas autobiográficas. Aqui, as pontas da nostalgia que por vezes emergem não surgem para dar notícia de uma consciência fragmentária que precisa recuperar uma identidade ferida. Sem abalo nas certezas, a escrita reafirma-se como material para reiterar a épica, como se ela pudesse passar incólume pelas experiências que o país viveu.

  • *
    Esse artigo é um dos resultados do projeto de pesquisa "Independência, utopia e memória na escrita moçambicana", desenvolvido em Moçambique com apoio da Fapesp, entre 2013 e 2014. Todas as fontes e referências foram indicadas.
  • 1
    Idem, 2002.
  • 2
    MACEDO, Tania. O romance de retornados. Texto inédito, gentilmente cedido pela autora, a quem agradeço o gesto.
  • 3
    Idem.
  • 4
    O Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra tem desenvolvido pesquisas nesse campo, com alguns projetos coordenados pela profa. dra. Margarida Calafate Ribeiro.
  • 5
    HONWANA, Luís Bernardo. A velha casa de madeira e zinco. Maputo: Alcance, 2017, p.124
  • 6
    Ibidem, 2017, p. 125.
  • 7
    BORGES COELHO, João Paulo. Abrir a fábula. Questões de política do passado em Moçambique. Revista Crítica de Ciências Sociais, n. 106, Coimbra: CES, 2015, p. 2.
  • 8
    CABAÇO, José Luís. A longa estrada da democracia moçambicana. In: MAZULA, Brazão. Moçambique. Eleições, democracia e desenvolvimento. Maputo: Ed. do Autor, 1995, p. 84.
  • 9
    CRUZ E SILVA, Teresa. Zedequias Manganhela: uma biografia contextualizada (1912-1972). Maputo: Marimbique, 2014.
  • 10
    A informação foi dada em uma consulta ao Arpac pelo diretor da instituição em fevereiro de 2014.
  • 11
    RICOEUR, Paul. A memória, a história, o esquecimento. Campinas: Editora Unicamp, 2007.
  • 12
    WELCH, Gita Honwana. Prefácio. In: FUCHS, Elisa. Moçambique marcou-nos para a vida. Maputo: JV Editores, 2016.
  • 13
    O número de obras, sobretudo no campo da narrativa, produzidas por mulheres ainda é reduzido. O fenômeno ganha interesse se nos lembramos que a presença rarefeita das mulheres no universo da escrita contrasta com a atuação feminina na vida pública, no desempenho de funções de relevo em empresas e instituições de natureza variada.
  • 14
    Expressão comumente utilizada para designar os presos políticos do tempo colonial.
  • 15
    PELEMBE, João Facitela. Lutei pela pátria. Memórias de um combatente da luta de libertação nacional. Maputo: Edição do Autor, 2012.
  • 16
    VELOSO, J. Memória em voo rasante. Maputo: JV Editores, 2006, p. 11.
  • 17
    CHISSANO, Joaquim. Vidas, lugares e tempos. Maputo: Texto Editores, 2010, p. 3-4.
  • 18
    MONTEIRO, Óscar. De todos se faz um país. Maputo: Associação dos Escritores Moçambicanos, 2012.
  • 19
    GAGNEBIN, Jeanne Marie. Lembrar, escrever, esquecer. São Paulo: Editora 34, 2006, p. 97.
  • 20
    VELOSO, Maria Teresa. Nota da editora. In: LANGA, Aurélio Valente. Memórias de um combatente da luta de libertação. O passado que levou o verso da minha vida. Maputo: JV Editores, 2011, p. 11.
  • 21
    LEJEUNE, P. L'autobiographie en France. Paris: Armand Colin, 1971, p. 20-21.
  • 22
    GASPARINI, P. Autoficção é o nome de que? In: NORONHA, Jovita (org.). Ensaios sobre a autoficção. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2014, p. 187-8.
  • 23
    VIEIRA, Sérgio. Participei, por isso testemunho. Maputo: Ndjira, 2010, p. 35.
  • 24
    SARLO, Beatriz. Tempo presente. Cultura da memória e guinada subjetiva. São Paulo: Companhia das Letras/ Belo Horizonte: Editora da UFMG, 2007.
  • 25
    Agradeço muito à autora que, em 2015, me cedeu o texto em língua portuguesa antes que ele fosse publicado. E agradeço especialmente pela generosa interlocução que foi fundamental para a compreensão de muitos pontos à volta desse trabalho. A versão em inglês desse texto foi editada mais tarde e consta da bibliografia.
  • 26
    SOUTO, Amélia Neves. História, memória e identidade na história da Frelimo/Moçambique. In: CONFERÊNCIA INTERNACIONAL - OS INTELECTUAIS AFRICANOS FACE AOS DESAFIOS DO SÉCULO XXI. Em memória de Ruth First (1925-1982). Anais. Maputo, 28-29 de novembro de 2012.
  • 27
    DOUBROVSKY, Serge. O último eu. In: NORONHA, Jovita (org.). Ensaios sobre a autoficção. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2014, p. 123.
  • 28
    ROUSSO, Henry. Le syndrome de Vichy. De 1944 à nos jours. Paris: Seuil, 1990.

Referências bibliográficas

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Dez 2019
  • Data do Fascículo
    2019

Histórico

  • Recebido
    20 Fev 2018
  • Aceito
    09 Set 2018
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